O cu vacilão
- Eu sou gay! – afirmei enfático, sendo contemplado com olhares incrédulos, tão logo perceberam não se tratar de nenhuma brincadeira.
A afirmação foi dita diante dos meus pais e meu irmão mais velho quando se fizeram alguns comentários acerca de uma notícia veiculada no telejornal que estávamos assistindo na sala de casa.
Eu cursava então a faculdade de direito, estava na metade do curso que nunca foi meu desejo profissional. Tinha sido mais por uma imposição velada do meu pai, dono de um escritório de advocacia no qual já trabalhava um primo e meu irmão recém-formado. Digo velada porque meu pai tinha um modo muito peculiar de expressar o que ele chamava de sugestões. Não a questionei à época em que fazia os vestibulares para não gerar atritos familiares e por achar que talvez acabaria gostando tanto do curso quanto da futura profissão, uma vez que minha cabeça era um verdadeiro poço de dúvidas; entre elas estava a minha própria sexualidade. Eu tinha noção de que era diferente dos demais garotos da minha idade e dos com quem convivia, embora não soubesse explicar exatamente no que consistiam essas diferenças. Achava estranho não ter o mesmo interesse pelas garotas, nas conversas que praticamente só giravam em torno delas nas rodinhas de colegas, no tesão que deixava meus amigos de pau duro quando uma delas lhes acenava, mesmo que sutilmente, com um sorriso bobo ou a possibilidade de um encontro num cinema escuro ou algo do gênero. Sempre tive um extenso rol de amigas, na verdade, vivia cercado delas, mas não sentia o menor desejo por seus corpos, apenas gostava da companhia e dos papos delas. Contudo, me sentia mais à vontade com os garotos, tinha facilidade de conquistar a amizade deles, muito embora tivesse passado por experiências desagradáveis de bullying com alguns rapazes nos tempos do colégio. Nessa época eu não podia afirmar que sentia qualquer tipo de atração por rapazes ou que ficasse admirando seus corpos, apenas que estar na companhia deles me deixava mais tranquilo e me fazia sentir mais parecido com eles e menos com aquelas inquietações que surgiram após a minha puberdade tardia.
- Que bobagem é essa agora? – perguntou meu pai, tão logo se refez do impacto que minha afirmação causou nele.
- Faz algum tempo que estava me preparando para revelar que sou gay. Tenho lutado comigo mesmo nesses últimos cinco ou seis anos tentando entender quem eu sou de fato e, desde que passei a aceitar melhor a minha condição, resolvi que vocês seriam as primeiras pessoas para quem contaria, porque os amo e, porque somos uma família na qual acho eu, não deveria haver segredos. - respondi
- Você nasceu homem e deve se comportar como um homem! Ninguém espera de você mais do que isso! – retrucou meu pai, enquanto meu irmão tentava disfarçar um sorriso de escárnio com a notícia.
- Sim, nasci homem, mas um homem gay! Não fui eu quem tomou a decisão de acordar um belo dia e dizer a mim mesmo – agora vou ser gay – essa condição me é inata, por isso gerou tantas inseguranças e dúvidas em mim, até eu concluir que não podia fazer nada para mudar isso. – devolvi. Minha mãe continuava em estado de choque, parecia estar num mundo paralelo.
- Você tem sim, o que fazer contra isso! Basta querer e reprimir qualquer impulso que te desvie da sua condição de homem. – simplificou meu pai, como se bastasse comutar um interruptor e deixar de ser quem eu era.
- Isso é uma fase! Você tem estado sob pressão nesses últimos anos por conta dos estudos e da própria entrada na maturidade, é normal questionar-se sobre a própria identidade. – sentenciou minha mãe, saindo do transe no qual a notícia a havia lançado.
- É esse o seu diagnóstico como psicóloga? Que o fato de alguém se descobrir gay é uma fase? É isso que você orienta aos teus pacientes quando lhe contam que são gays, que estão passando por uma fase e que isso vai passar algum dia? Que tipo de conhecimentos você adquiriu durante a sua formação e, pior, que tipo de profissional é você que diz a seus pacientes que eles não sabem quem são, que estão passando por um dilema existencial? – questionei, me exaltando um pouco diante da única pessoa que achei que poderia compreender a minha situação.
- Veja como fala com a sua mãe? Ela não é só sua mãe, é uma profissional muito respeitada em seu meio, como você bem sabe, e as considerações dela são importantes. – interveio meu pai, defendendo a esposa. – O mais importante, é que essa podridão não saia de dentro dessa família, de nós quatro, e que não caia na boca das pessoas mesmo que sejam parentes. – sentenciou meu pai, o que encheu meus olhos de lágrimas, ao ouvir meu próprio pai me classificando como ‘podridão’ quando sempre procurei ser um filho exemplar.
No dia daquela conversa eu não fazia a menor ideia da extensão que a minha revelação causaria nos dois anos subsequentes dentro daquela casa. Meu irmão que sempre foi muito brincalhão comigo, que vivia me aplicando chaves de braço para provar que era mais forte do que eu, que me contava detalhes picantes do que fazia com as garotas com as quais saia, que, como todo macho convencido, tinha um arsenal de piadas sobre gays que ia me contando assim que ficava sabendo de alguma nova, foi se afastando de mim. Passamos a conversar e interagir pouco, ele nunca mais tocou no meu corpo, como se eu fosse algum leproso e pudesse contaminá-lo com a minha doença. Meu pai sugeriu que eu não aparecesse muito no escritório, especialmente quando estava recebendo algum cliente, mesmo sabendo que eu precisava de um estágio para as atividades extracurriculares da faculdade. Minha mãe fazia vigilância cerrada sobre mim. Qualquer pessoa do sexo masculino com a qual eu conversava por alguns minutos a mais, ela já suspeitava de estar havendo algum entendimento de cunho sexual.
- É melhor você não trazer mais homens aqui para dentro de casa! – disse-me ela, sem nenhum rodeio, depois de eu ter recebido um amigo de infância, nosso vizinho de muitos anos, com o qual meu irmão e eu crescemos brincando e desenvolvendo muitos interesses em comum.
- Homens? É o Gustavo, mãe! É o Gustavo que frequenta essa casa desde que éramos crianças, o Gustavo que ia à escola conosco, o Gustavo cuja família sempre esteve ligada com a nossa. Eu não acredito que você seja capaz de falar tamanha asneira! – retruquei exasperado e incrédulo.
- E o Gustavo é o quê, não é um homem? – redarguiu ela, como se as questões sobre a natureza humana lhe fossem totalmente desconhecidas.
- E porque o Gustavo é homem você acha que eu vou dar o cu para ele, é isso? – indaguei furioso.
- Cala essa boca, Felipe! Deixe as tuas depravações fora dessa casa! – berrou ela.
- De que depravações você está falando? Qual foi a depravação que eu cometi simplesmente recebendo um amigo que frequenta a nossa casa há anos? Se te interessa saber, eu sou tão virgem quanto no dia que nasci! Nunca toquei ou fui tocado por outro homem com segundas intenções. Você é ridícula, patética! Vá se tratar com algum dos teus colegas de profissão, mas cuide para que não seja um tão preconceituoso e desinformado quanto você! – gritei de volta. Nunca tinha afrontado nenhum dos meus pais daquela maneira, e após o fazer naquele dia, tive a exata dimensão do abismo que nos separava.
- Deixe a porta desse quarto aberta, Felipe! – ordenou ela, noutra ocasião, durante a comemoração do aniversário do meu pai, com a casa cheia de parentes, quando meu primo Lucas, com o qual sempre tive um relacionamento muito estreito e amistoso desde criança, estava disputando um jogo no videogame comigo em meu quarto. O Lucas ficou sem entender o significado daquela frase, uma vez que tínhamos feito isso inúmeras vezes antes, inclusive ele tendo dormido algumas noites no meu quarto quando garotos.
- Ah sim, Lucas! Agora essa casa está cheia de regras, todas voltadas para mim. Temos que manter a porta do quarto aberta, pois vai que você resolve foder o meu cu! – exclamei sarcástico, o que a fez apelar ao meu pai, que surgiu em seguida.
- Pode nos dar uma licença, Lucas? – pediu meu pai, fazendo o Lucas deixar o quarto. – Não abuse da minha tolerância, Felipe! Nunca mais se atreva a repetir o que acabou de falar para a sua mãe! Eu te avisei que essa podridão fica apenas entre nós, não tente me desafiar, ou vai arcar com as consequências que, te garanto, você não vai gostar. – ameaçou ele, aos berros tão logo meu primo deixou o quarto e ele fechou a porta para que a discussão não vazasse.
- Tolerância? Você nem sabe o que essa palavra significa. Eu estou farto dessa marcação cerrada que a mãe vem fazendo comigo. O que se passa nessas cabeças doentias de vocês, acham que vou dar o cu aqui dentro de casa para o vizinho amigo ou para meu próprio primo? Eu nunca vi atitude mais infame do que essa! Quem vocês pensam que eu sou, uma puta qualquer que se deita com o primeiro macho que aparecer? Que subsídios vocês têm para pensar isso ou qualquer outra coisa depravada sobre mim? Eu já falei para a mãe, e vou repetir para você também, eu sou tão virgem quanto no dia que nasci. A podridão só existe na cabeça de vocês. Vão à merda! – gritei descontrolado, disparando porta afora do quarto e de casa, sentando-me ao volante do carro sem um rumo certo. Eu só precisava ficar longe daquilo tudo, precisava concatenar as ideias, precisava de paz, o que não existia mais dentro daquela casa.
Só voltei para casa no dia seguinte, pedi abrigo na casa de um colega da faculdade, sem lhe explicar nada a respeito do problema que estava enfrentando. Passaram-se dois anos naquele clima insuportável dentro de casa. Não havia mais diálogo, nem mesmo as coisas mais banais do cotidiano eram trocadas em frases amistosas. Eu me fechei em mim mesmo, aquelas pessoas outrora queridas e entre as quais julgava estar seguro, se tornaram completos estranhos com os quais me via obrigado a conviver sob o mesmo teto.
- Aqui está, meu diploma de bacharel em direito, e o diploma de honra ao mérito por ter sido nesses últimos quatro anos o melhor aluno da turma! Faça o que quiser com ele, é seu, não meu! – afirmei, entregando os dois papeis nas mãos do meu pai após a cerimônia de diplomação na universidade. – Fiz o curso para satisfazer aos teus caprichos, nunca quis ser um causídico e, já não me sinto mais obrigado a ser aquele filho que vocês idealizaram, pois nunca vou conseguir ser quem não sou. Também estou a lhe entregar as chaves do carro com o qual me presentaram quando entrei na faculdade, é de vocês, não vou levá-lo comigo. Estou levando apenas as minhas roupas, mas posso pagar por elas se assim o desejarem; só lhes peço um tempinho para juntar o dinheiro para reembolsá-los pelo prejuízo. – meu pai me ouvia, mal conseguindo respirar. Minha mãe, próxima, começava a ficar abalada com as minhas palavras, ditas sem nenhuma emoção, frias e distantes como havia sido nosso relacionamento nesses últimos dois anos. – Estou deixando essa casa! Obrigado pelo que fizeram por mim, e nem vou me atrever a lhes pedir perdão por não ser o filho que sonharam, pois sei que são incapazes de concedê-lo. – concluí sereno e determinado.
- Ninguém te pediu para sair dessa casa! É uma escolha sua! – ouvi meu pai dizer às minhas costas enquanto me dirigia ao Uber que me aguardava no portão. Da minha mãe só ouvi o choro contido. – Para onde está indo? Precisa de algum dinheiro? – questionou meu pai, sem obter uma resposta.
Eu estava estranhamente calmo, pois enquanto me preparava dias antes de tomar essa decisão, estava tomado por uma angustia sufocante, achando que na hora me faltaria coragem, ou que fosse cair no choro assim que deixasse tudo esclarecido. O que eu sentia no meu peito naquele momento era um alívio, um aceno de liberdade, e uma paz comigo mesmo. Não estava iludido achando que teria tempos fáceis pela frente, muito pelo contrário, tinha a real convicção de que passaria por muitos perrengues, ao perder meus esteios de sustentação. Eu estava só, contava apenas comigo mesmo, não tinha um emprego fixo, minha conta bancária não seria mais reabastecida mensalmente para os itens básicos, e nem um apoio moral estava a minha disposição. Tudo o que tinha era uma pequena poupança feita com os trabalhos amadores de freelancer em fotografia que vinha fazendo desde a adolescência, mais como um hobby do que pelo retorno financeiro. Agora a coisa havia mudado de figura, eu pretendia viver disso, teria que me custear com esses trabalhos.
Fui morar numa pensão barata para rapazes num bairro popular, era tudo que meus provimentos podiam bancar. Dividi o quarto acanhado com banheiro na casa de uma viúva de meia idade com um operário de fábrica que veio do Rio Grande do Sul tentar um emprego melhor remunerado em São Paulo. Saulo, era o nome dele, um sujeito reservado, torneiro mecânico que fazia muitas horas extras numa empresa não muito distante da pensão. Quando viu as roupas que eu usava, a maneira como me expressava com um vocabulário rico e diversificado, sempre apropriado para a situação, meus modos à mesa durante o desjejum e, às vezes, na janta quando descia para a sala de jantar da casa que servia de refeitório uma vez que ela passava o dia todo fora; se mostrou bastante retraído ao notar a diferença social que nos separava. Tentei ser o mais amistoso possível com ele, fazendo-o enxergar que estava na mesma situação de penúria que ele, mas meus esforços nesse sentido pouco adiantaram, e nossa interação nunca deixou de ser formal e distante.
Nunca tinha compartilhado um espaço tão íntimo quanto um quarto com outra pessoa, muito menos um estranho e homem. Saulo não era um sujeito bonito de rosto, mas tinha um corpo robusto e másculo. Eu evitava de olhar para ele quando chegava do trabalho, tomava banho e vestia algo mais confortável, pois notava que ele se sentia limitado em sua liberdade. Ademais, apesar de nos últimos tempos estar reparando bem mais do que antes nos homens, eu não via nada de especial nele para perder meu tempo analisando e admirando suas características físicas. O respeito nesse sentido era mútuo, embora eu notasse que ele ficava incomodado quando eu deixava o banheiro só de cueca e me vestia diante do armário com as minhas roupas. Demorei alguns meses antes de descobrir a origem desse incomodo, que muitas vezes o fazia sair do quarto nessas ocasiões. Por mais discreto que fosse meu comportamento, eu tinha a nítida impressão de que na minha testa estava escrito ‘gay’ em letras reluzentes. Foi algo que surgiu depois de ver minha família me repudiar por minha sexualidade. Ao contrário de mim, o Saulo se excitava quando olhava para a minha bunda carnuda metida nas cuecas slip que eu costumo usar. Quando a ereção que se formava em suas calças atingia proporções indisfarçáveis, ele se afastava de mim para não dar bandeira. Eu não sabia nada da vida privada dele, se tinha namorada ou não, se frequentava algum bordel para aliviar os colhões, enfim, se tinha uma vida amorosa ou sexual fora daquelas quatro paredes. Não que isso me interessasse, mas ficava a imaginar um cara jovem, saudável, com aquele corpo viril certamente atormentado pela testosterona e longe de casa, privado dos prazeres do sexo regular. O fato de não poder olhar para a bunda de outro homem me dizia que ele devia estar privado dessa benesse. Eu nunca me insinuei para ele, depois dessa constatação, inclusive passei a me trocar dentro do banheiro para não causar nenhuma situação embaraçosa.
Vi minha poupança se esvaindo como se fosse água num escoadouro e já começava a pressentir uma nuvem negra sobre a minha cabeça quando recebi a ligação de um sujeito que queria que fotografasse os produtos que ele negociava por e-commerce. Ele tinha visto um trabalho que eu fiz para o site de um Garden Center quando ainda cursava a faculdade e fazia uns bicos para ir juntando minha poupança. Combinamos um encontro numa das cinco lojas físicas que ele ainda mantinha, mas que rendiam bem menos que o e-commerce. Ele trabalhava com uma ampla gama de produtos, seriam milhares de itens a serem fotografados e muitos em diversos ângulos diferentes que figurariam no site da loja virtual; trabalho para alguns meses. Levei meu acanhado portfólio, que montei quando passei a me dedicar com mais ênfase à fotografia, para que pudesse avaliar a qualidade do meu trabalho. Nele constavam as fotografias para o Garden Center, inúmeras fotos que tirava de paisagens e locais por onde tinha viajado, situações banais do cotidiano que captava de pessoas sem que elas o percebessem, e fotografias que fiz para o catálogo de produtos de uma rede de óticas. Eu estava tão nervoso durante a entrevista que tremia da cabeça aos pés, o que o fez me oferecer água por diversas vezes.
Kemal Özdemir, um turco da província de Usak na região do Mar Egeu, estava no Brasil há quase dez anos quando a família imigrou para cá, estabelecendo-se no comércio. Estava com 35 anos quando nos conhecemos e tocava seu negócio próprio desvinculado da família. Era um homem bonito, lindo para ser bem sincero, com um rosto viril onde se destacava uma barba e bigode trazidos rentes, uma vasta cabeleira negra ligeiramente ondulada que estava sempre em desalinho e lhe conferia um ar esportivo, olhos também negros como fossem duas pedras de ônix incrustadas abaixo de suas sobrancelhas largas que quase se juntavam na ponte do nariz, uma leve depressão no centro do queixo, que só se via nos primeiros dias depois de ele aparar a barba, completava sua expressão cativante. No dia do encontro, ele usava um jeans escuro no qual se amoldavam suas grossas e vigorosas coxas e, uma camisa branca, cujas mangas estavam enroladas até a altura dos cotovelos, com os dois primeiros botões desabotoados, deixando à mostra um peitoral largo forrado de pelos densos e negros como seu cabelo. Não consegui ser indiferente a ele, era o homem mais sexy que já tinha observado, e aquele resquício de sotaque que ainda lhe restava acrescentava mais charme à sua figura. Ele falava com desenvoltura e segurança, o que só serviu para me deixar ainda mais tenso. Todo traquejo que eu ainda não tinha parecia sobrar nele.
- Estou impressionado com seu trabalho, é muito bonito e profissional! – afirmou ele, quando terminei de lhe mostrar o portfólio, suando em bicas e tentando controlar as mãos tremulas.
- Obrigado! Mas, preciso esclarecer que não sou profissional, nunca fiz um curso de fotografia, todas essas imagens são bastante amadoras. – revelei sincero, pois não queria passar uma imagem errada.
- Bem, se você acha que essas fotografias são amadoras, preciso lhe informar que consultei alguns fotógrafos que se diziam profissionais, mas não tinham imagens tão bem captadas como as tuas. Há sensibilidade no seu trabalho, é isso que valoriza suas fotografias. Quando podemos começar? – mal consegui articular uma resposta, meu primeiro trabalho importante, pelo qual seria remunerado. Me senti nas nuvens. Ele percebeu meu entusiasmo, e pareceu se divertir com ele.
- Amanhã mesmo! Você só precisa me dizer onde e por quais itens devo começar. – respondi afoito, fazendo-o rir.
- Calma! Quero começar o quanto antes, estou renovando o site com uma nova empresa e eles devem precisar do material para breve, mas você ainda nem me passou os valores do seu trabalho, os horários que tem disponíveis, um contrato que estipule nosso acordo. – disse com naturalidade, percebendo minha inexperiência. Eu corei de vergonha, esses detalhes nem haviam passado pela minha cabeça. Novamente senti uma expressão empática naqueles olhos maravilhosos.
- Ah, claro! Já ia tocar nesse assunto. – disfarcei para não parecer tão tolo. Ele voltou a rir da minha mentirinha.
- Bem, você vai ter uns dias para pensar em todos os detalhes e colocá-los num papel. Por hora quero venha almoçar comigo, estou varado de fome, e faz tempo que não tenho uma companhia tão agradável quanto a sua. – sentenciou. A capacidade que ele tinha de me encabular era impressionante, a tal ponto de eu precisar respirar fundo e me concentrar para conseguir encarar aquele rosto que me parecia estar fascinado por mim. Salvo algum juízo equivocado de minha parte.
Deixamos a loja e seguimos pela calçada por meio quarteirão para pegar o carro dele no estacionamento. Assim que surgia a chance, ele me deixava caminhar ligeiramente à frente, e seus olhos penetrantes não desgrudavam do gingado da minha bunda. Me senti como se fosse a presa de algum predador voraz, o me que intimidava ao mesmo tempo em que me sentia lisonjeado. Ele dirigiu sem pressa até um pequeno restaurante de comida turca, parecendo mais interessado em mim do que na fome exacerbada que havia proclamado. Deixou-me fazer os pedidos, enquanto me observava sobre o cardápio que mantinha aberto a sua frente e que lhe servia de escudo para não parecer muito invasivo.
- Não sei se sou a pessoa mais indicada para fazer os pedidos, talvez você não aprove minha escolha. – argumentei, mal conseguindo me concentrar no cardápio com aquele olhar me examinando como se eu estivesse nu.
- Devo me penitenciar, nem te perguntei se gosta de comida turca. Podemos ir a outro lugar se você preferir. – retrucou
- Não, aqui está bom para mim! – respondi nervoso. Eu simplesmente não conseguia relaxar, e não saberia explicar o que estava se passando comigo.
- Então o que você escolher estará bom, tudo aqui é muito gostoso! – devolveu ele, voltando a me escrutinar, dessa vez sem a barreira do cardápio, e com os lábios tentadoramente úmidos formando um discreto sorriso. Nunca me senti tão desestabilizado, esse cara estava a fim de me enrabar e não fazia segredo nenhum disso. – Você conhece a comida típica do meu país? – perguntou, quando percebeu que eu estava prestes a ter um colapso.
- Algumas coisas! Há alguns anos atrás fiz uma viagem à Turquia nas férias com a minha família. – revelei
- Você gostou?
- Sim, bastante! Há tantas peculiaridades que a gente fica fascinado. Tirei muitas fotos nessa viagem. – respondi
- Do que mais gostou?
- Dos inúmeros bazares de Istambul, do pôr do sol sobre o Bósforo, do passeio de balão na Capadócia, das praias e ruínas romanas em Antália, as chaminés-de-fada no Vale do Amor. – citei, engolindo em seco assim que citei o último lugar, pois me lembrei do formato sugestivo das imensas formações rochosas que pareciam pintos gigantes apontando para o céu. Já era tarde, o Kemal sorria mostrando descarado os dentes brancos contrastando com sua barba. Fiquei vermelho feito pimentão, e enfiei a cara no pidé que estava no meu prato para disfarçar.
- Deve ter sido uma viagem bem interessante! – exclamou irônico.
- Foi!
Haviam se passado mais de duas horas depois que me despedi do Kemal quando voltei a me sentir relaxado. Fiquei imaginando se todos os nossos encontros seriam tão perturbadores, eu certamente não resistiria a muitos deles. A figura atlética e máscula dele também não saía dos meus pensamentos, era a primeira vez que sentia tesão por um homem, e um tesão tão intenso que mal dava para explicar. No encontro seguinte, ele me apresentou o local, dentro de uma das lojas, onde eu poderia trabalhar, devido a luz abundante que entrava pelas janelas amplas, pela proximidade com que todos os itens a serem fotografados podiam ser transportados para o local e pela facilidade de instalação de refletores que ele se propôs a instalar segundo minhas solicitações. Em outro encontro subsequente, tratamos da questão do contrato, para o qual pedi ajuda do meu primo que trabalhava com meu pai, pedindo para ele manter em sigilo o que estava a lhe pedir.
- Esse valor é suficiente pelo seu trabalho? – quando ele me perguntou isso após examinar o contrato pensei que tinha chutado um valor muito alto que poderia impedir o acordo. Fiquei uns instantes sem ter uma resposta pronta. – Acrescente 15% ao montante e negócio fechado. Mesmo assim, seu preço está abaixo das outras propostas que recebi. – afirmou ele, rasurando o valor impresso no contrato e escrevendo o novo com sua letra espremida.
- Obrigado pela sinceridade! Como te precavi, sou totalmente inexperiente! – devolvi, agradecido pela honestidade dele.
- Um virgem! Deliciosamente virgem! – exclamou ele jocoso, eu nem sabia onde enfiar a cara. – Vejo que até para receber um elogio você fica tímido. Não deveria, Felipe, pois você é lindo e gostoso demais para não se habituar aos elogios. – se me intimidar foi o propósito dele, conseguiu, eu tremia novamente como juncos varridos pelo vento.
Poucas semanas depois, já tarde da noite, eu fotografava uns itens dos quais a empresa que estava desenvolvendo o site precisava com urgência. A funcionária que o Kamel havia designado para me trazer os produtos mal se aguentava em pé de tanto sono.
- Pode ir para casa, Regina, eu ajudo o Felipe com isso aqui! – disse o Kamel, trazendo uma expressão de alívio para a cara exausta da garota.
Ele realmente se mostrou empenhado em trazer os itens a serem fotografados, mas isso durou menos de meia hora, quando o interesse dele se focou exclusivamente em mim, para ser mais preciso, na minha bunda que o vinha atentando desde que nos conhecemos. Concentrado em obter o ângulo correto, ajustar o foco da câmera e posicioná-la de modo que valorizasse o produto, nem notei a aproximação dele, apenas que sua respiração se encontrava a centímetros da minha nuca. Contudo, foi uma encoxada firme que quase me fez deixar a câmera cair das minhas mãos, que me fez voltar a atenção para ele.
- Você é um tesão, Felipe! Me controlei até onde deu, mas você precisa saber o quanto está mexendo comigo. – disse ele, afastando-se um pouco para que eu notasse sua ereção.
- Acho bom você segurar a sua onda, ou não consigo terminar isso hoje! – retruquei, sentindo meu corpo sendo invadido por um calor abrasador.
Acredito que ele nem prestou atenção às minhas palavras, pois, feito um gato manhoso, voltou a se aproximar, me envolveu pela cintura e me trouxe para junto dele. Para um cara gay como eu que nunca esteve com um homem, o calor e as vibrações que vinham do corpão másculo dele me deixaram ligeiramente atemorizado e cheio de tesão. Foi como se eu fosse uma presa com o predador fechando o cerco sobre mim. Ele aproximou o rosto lentamente, até sua boca se juntar com a minha, faceira e ávida. O beijo foi longo, os lábios se devoravam mutuamente, o sabor dele invadiu minha boca e fez meu cuzinho experimentar os primeiros espasmos, já sabendo que a virgindade de suas preguinhas estava por um fio. Por mais filmes gays que tenha assistido, eu simplesmente não sabia como agir; a minha única certeza era que eu queria aquele homem, queria-o para mim e em mim. Fui cedendo aos poucos, não porque estivesse oferecendo qualquer resistência, mas porque queria me entregar àquelas mãos de pegada forte, àquela boca sensual que tinha sua língua se movendo dentro da minha, àquelas coxas vigorosas que me prensavam contra a mesa onde os produtos estavam alinhados, ao caralhão que, de tão duro, estava quase a estourar a calça, enquanto roçava nas minhas coxas. O Kamel desnudou meu torso, acariciou-o cheio de sensualidade, brincou com meus mamilos enrijecidos tomado pela cobiça. Eu não resisti e comecei a afagar o peitoral peludo dele, algo que sempre me fascinou nos homens, o que o fez tirar a camisa e o oferecer livre e sensual para mim, comprazendo-se pela maneira carinhosa como meus dedos o exploravam. Ele abriu a minha calça, eu a dele, chegando a nos atrapalharmos nessa simples tarefa devido ao tesão que nos consumia. Ele foi mais ligeiro, quando suas mãos agarraram minhas nádegas numa pegada firme, eu soltei um gemido, nunca as mãos de um homem haviam tocado daquela maneira nelas. Ele esboçou um sorriso ao notar meu receio, ele o excitava, lhe confirmava que estava no domínio da situação. Quando eu consegui arriar a calça dele, o caralhão saltou para fora e se mostrou em todo vigor. Era uma baita pica, grossa, revestida de veias sinuosas saltadas, com uma glande protuberante em forma de um imenso cogumelo arroxeado, que brotava de um chumaço de pentelhos negros no qual também se camuflava um escroto avantajado que pendia pesado com as duas bolas em alturas diferentes. Ao mesmo tempo em que me sentia atraído por aquele cacetão, meu medo cresceu, ao associá-lo com o que um pauzão daquele tamanho faria no meu cuzinho inexperiente. Lembrei-me de alguns filmes pornôs, no qual o passivo gritava com a vara do macho socando seu cu, e já me via padecendo como um deles.
- Ficou assustado? – a pergunta dele não podia ser mais embaraçosa e lasciva ao mesmo tempo. O Kamel tinha ciência de seu dote, e podia ver a paúra brilhando nos meus olhos.
- Nunca estive com um homem antes! – exclamei, pois fiquei com vergonha de admitir que aquele cacetão estava me intimidando. Ele apenas sorriu e acariciou meu rosto, colocando mais um beijo carinhoso na minha boca.
Livramo-nos por completo das calças que estavam emboladas aos nossos pés. O Kamel voltou a me puxar para junto dele, agora completamente nu, roçando-se todo em mim e me deixando num êxtase tamanho que eu quase implorei para ele me foder. Ele colocou ambas mãos sobre meus ombros e os forçou para baixo. Esse gesto e a maneira como me encarava me fizera saber o que ele queria. Ajoelhei-me diante dele, peguei o caralhão babando e o levei sutilmente à boca. Ouvi o gemido longo do Kamel quando envolvi a cabeçorra com meus lábios e sorvi o pré-gozo. Se eu já estava ensandecido com a nudez, a virilidade e o cacetão do Kamel, sentir o aroma de sua virilha e o sabor de sua excitação terminaram por me fazer esquecer qualquer receio. Chupei carinhosa e delicadamente a rola dele, percorrendo toda sua extensão, lambendo o sumo que ela vertia, chupando os testículos maçudos, o que o fazia grunhir e soltar o ar num sopro ruidoso por entre os dentes. Ao mesmo tempo que mamava a jeba dele, eu acariciava a barriga peludinha dele, até que esses afagos todos o fizeram perder o controle e partir para cima de mim. Ele me puxou para cima pelo tórax, me beijou apressadamente, amassou minha bunda e deslizou um dedo no meu reguinho. Eu voltei a gemer, sem parar, o tempo todo que aquele dedo devasso vasculhava o fundo do rego estreito. O Kamel me virou abruptamente me inclinando sobre a mesa e afastando um pouco as minhas pernas. Passou lasciva e descaradamente a mão na linha estreita que separava as nádegas, sentindo a carne rija e quente completamente arrepiada com sua investida. Eu fechei os olhos para que todos os meus sentidos aflorassem e se concentrassem naquela mão, gemendo baixinho. Ele se ajoelhou atrás de mim, abriu os glúteos cheirando meus feromônios que lhe informavam que eu estava pronto para receber seu falo. Senti um toque sutil da língua dele no meu cuzinho, o que fez sobrevir um espasmo e me obrigou a gemer. O beijo dele cobriu toda a minha rosca anal, fiquei quase sem ar e, quando ele enfiou a língua dentro dela, eu gritei; sem mais nenhum domínio sobre o meu corpo. Ele se pôs de pé, envolveu meu tronco com seus braços e se inclinou sobre mim. Encaixou o caralhão nas minhas nádegas e o esfregou no reguinho, enquanto colocava beijos úmidos no meu pescoço e ombros, extraindo gemidos que afloravam dos meus lábios. Por uns segundos me concentrei em seus beijos e, descuidando da bunda, não percebi que o Kamel encaixou o cacetão e me penetrou. Eu só fui me dar conta do que estava acontecendo, quando um novo impulso meteu toda cabeçorra no meu cuzinho, rasgando as pregas. Eu precisei gritar, mas o ar ficou preso; enquanto isso, ele entrava em mim fazendo o caralhão deslizar sobre a mucosa sensível do meu ânus que ia acolhendo generosamente sua carne rija e pulsátil. Espalmei minhas mãos sobre o tampo da mesa, querendo fazer delas ventosas para me agarrar a alguma coisa firme e poder suportar as estocadas potentes que ele dava no meu cu. A posição o favorecia, ele conseguia me penetrar profundamente socando minha próstata e desencadeando uma dor como jamais senti. Eu tremia da cabeça aos pés, parecia estar convulsionando; mas, instintivamente empinei a bunda contra a virilha dele, como se quisesse ser fecundado por ele. Lancei minha cabeça para trás no ombro dele e gania choroso feito uma cadela, ao mesmo tempo em que ele enfiava dois dedos na minha boca e me fazia chupá-los regido por uma agonia sem fim. Meu pinto balançava livre e quanto mais o Kamel socava aquele cacetão no meu cu, mais minhas entranhas se revolviam fazendo crescer a necessidade de gozar. Ao mesmo tempo que gemia de prazer, meu pinto esporrava lançando longe os jatos de esperma leitoso. O gozo terminou por exaurir minhas forças, ele continuava apossado do meu corpo, satisfazendo-se no meu cuzinho apertado, úmido e quente.
- Tesão de rabo do caralho que você tem, Felipe! A partir de hoje ele é meu, só meu! – grunhia ele, mordiscando minha nuca.
No meio dessa tara desenfreada, as estocadas dele me feriam, os esfíncteres ardiam com aquele vaivém abrutalhado e ao mesmo tempo gentil. Meus gemidos manhosos começaram a retesar seus músculos, contraiam seu baixo ventre e o levaram a gozar. O urro selvagem dele ecoou pelo salão amplo e quase vazio produzindo um eco primal, enquanto ele despejava seus jatos abundantes de porra no meu cuzinho, até deixá-lo completamente inundado.
Poucos meses depois eu estava apaixonado feito um adolescente, rendido a uma paixão que parecia não ter fim, fazendo sexo com aquele macho fogoso como se fosse uma coelha, dia sim, outro também. Aquela sensação de fazer parte da vida de um homem era a coisa mais maravilhosa que eu já havia sentido. O Kamel não era apenas meu porto seguro, era o homem que dava à minha sexualidade uma razão de existir, uma fonte de prazer e não um motivo de me esconder, de viver uma vida clandestina como tinha sido até então. Quando incorporamos nossos círculos de amigos, não houve necessidade de inventar mentiras, dizíamos simples e abertamente que estávamos namorando, que formávamos um casal apaixonado. Com a vida sentimental deslanchando num céu de brigadeiro, até nossas vidas profissionais ganharam um impulso renovado pelo entusiasmo.
Paralelamente ao trabalho que estava desenvolvendo para a empresa do Kamel, eu consegui outros trabalhos através de um site que um dos funcionários da empresa que estava desenvolvendo o site do Kamel fez para mim, acredito como meio para me seduzir.
Tratava-se de um garotão que acabara de completar 20 anos, jeitosinho, cara de safado, um apetite sexual voraz que o levava a estender seu cardápio sem nenhuma restrição de gênero. Como durante a montagem do site ele precisava passar um tempo comigo para descarregar as fotografias dos produtos e ordená-las para que produzissem um bom visual da página, acabamos por nos tornar amigos. Ele nunca disfarçou o tesão que sentia por mim, foi a única coisa que precisei refrear nele para que a questão profissional não fosse prejudicada por assuntos libidinosos. Bastávamos ficar próximos um do outro para ele começar a soltar indiretas que não podiam ser mais objetivas, do tipo – uma delícia esse seu perfume, é de marca ou é sua pele? – ou, o que eu não faria para sentir teus lábios na minha boca! – ou ainda, deviam te prender como torturador, olha como você me deixa com esse bundão tesudo que você tem! – quando então se formava uma ereção indisfarçável entre suas coxas. Eu me fazia de sonso, fingia não notar seu assédio escrachado e, quando não dava para ignorar suas ereções eu zoava com ele dizendo que era coisa de adolescente, o que o deixava bravo, ou o mandava tomar uma ducha fria, para a qual o sacripanta me convidava lascivamente. Foi ele quem me sugeriu fazer um site para expor meu trabalho, e me mostrou o esboço do que tinha feito para mim. Achei a ideia interessante, saímos para tomar um café ou fazer alguma refeição para discutir a proposta, o que o fez pensar que estava a um passo de enfiar sua rola intrépida no meu cuzinho, tornando-o mais assanhado do que nunca.
- Vamos deixar uma coisa bem esclarecida, sou grato por você ter se proposto a fazer o site para mim, mas não vá pensando que vou pagá-lo com favores sexuais, está me entendendo! Você é um garotão muito gostoso, tenho que admitir, mas não será comigo que vai aliviar seus testículos. Está cheio de menininhas por aí que venderiam a alma ao diabo para te sentir dentro delas; portanto, invista nelas e pense em mim apenas como um amigo. – esclareci.
- Puxa! Como você pode ser tão insensível, deixando meu parceiro aqui sofrendo por sua causa? – questionou, fazendo um muxoxo que me fez rir de sua interpretação cômica, ao mesmo tempo em que alisava mais uma de suas ereções indiscretas.
Sendo bastante requisitado, eu trabalhava 14 horas por dia, no mínimo, para dar conta do serviço. Me sentia realizado, estava fazendo o que gosto e via minha poupança aumentando no banco, o que me fez pensar num lugar só meu, uma vez que o quarto na pensão era a única coisa que ainda restringia um pouco.
Eu raramente visitava algum parente. Quando saí da casa dos meus pais, deixei de comparecer aos encontros familiares e aniversários para não ter que dar explicações sobre minha saída de casa. Porém, um dia recebo uma ligação da minha avó paterna querendo me ver. Todos os meus avós sempre gostaram de mim, os do lado materno me tinham verdadeira adoração e não escondiam sua predileção em relação aos outros netos; isso provavelmente porque não sabiam da minha sexualidade.
- Hoje à noite, vó? Ando bastante ocupado com o trabalho, não pode ser outro dia? – perguntei, ante a insistência dela para o encontro.
- Vou fazer uma viagem à Europa com algumas amigas, o voo para Amsterdam é no sábado eu queria conversar com você antes disso. – informou ela
- Mas seremos apenas você e eu, não é? Não será um daqueles seus jantares de família; pois, se for, eu estou fora você bem sabe. – devolvi
- Sim, seremos apenas nós dois! Você ainda precisa me explicar direitinho porque saiu de casa e, o porquê dessa relutância em participar dos encontros de família, você sempre gostava, o que foi que aconteceu?
- É uma longa história, qualquer dia conversamos sobre isso, mas não agora por telefone. Estarei aí às 20h00, pode ser? – afirmei, para não me estender.
- Está ótimo! Vou fazer aqueles pimentões recheados que você tanto gosta. Não se atrase!
- Serei pontual, vó! Beijão, te amo!
- Também te amo, querido!
A verdade é que fiquei inquieto pelo restante da tarde depois dessa ligação, intrigado sobre qual seria o assunto que ela queria discutir comigo. E, já me preparava espiritualmente para eventuais questionamentos sobre o fato de eu ter revelado ser gay. E fui ao encontro disposto a deixá-la falando sozinha com as paredes caso esse fosse o assunto.
Meu avô tinha-lhe deixado um bom patrimônio, além de uma pensão que, por si só, já lhe permitia dispor de uma vida confortável, como sempre tivera antes de ele falecer. Entre os imóveis deixados, e que estavam alugados, havia um velho galpão desgastado que já tinha abrigado diversos comércios numa rua pela qual trafegavam mais pedestres do que veículos, ao qual ela se referiu, assim que entrou no assunto que a levou a me convidar para o jantar. Tratava-se de um prédio de pé direito alto com a fachada de tijolos aparentes, em estilo holandês antigo, diretamente na calçada larga, conforme minhas lembranças, pois havia estado no imóvel apenas uma única vez quando ainda era criança.
- As adaptações que o último inquilino fez, detonaram o imóvel. Do jeito que está só consigo vendê-lo por um preço muito abaixo do mercado e, foi aí que tive a ideia de dá-lo a você como um presente. Com alguma reforma, será um bom lugar para você montar um estúdio talvez, já que está trabalhando com fotografia e não naquilo para que se formou. – disse ela.
- Não posso aceitar vovó! Estou precisando de um lugar para trabalhar e, para morar também, para ser bem sincero, não resta dúvida que a localização é boa, mas não vou aceitar como um presente. Talvez eu possa alugar, fazer uma pequena reforma para se adaptar as minhas necessidades, se você topar. – devolvi
- Deixa de ser orgulhoso, menino! Sou sua avó, te quero muito bem, qual o problema de eu te dar o imóvel de presente? – questionou ela.
- Não se trata de orgulho vó, mas de princípios!
- Que princípios ridículos são esses que te impedem de aceitar um presente da sua avó? Bobagem! É seu e não se discute mais! Vou pedir para o seu pai tratar da papelada para colocar o imóvel no seu nome. – afirmou determinada.
- Não vou aceitar, vó! E, quanto mais meu pai ficar fora dessa história, melhor. Não toque no assunto com ele, te peço isso como um favor muito especial. – devolvi
- Mas você é turrão, Felipe! Por que você está agindo assim com seus pais, o que deu em você? Sempre foi um garoto comportado e ajuizado, o que mudou?
- Não quero falar sobre isso, vó!
- Façamos assim, então, eu te dou 50% do valor do imóvel como um presente e você compra o restante pagando como puder. Entenda uma coisa Felipe, me incomoda saber que está morando numa pensão barata quando podia estar vivendo muito bem instalado na casa dos teus pais. Faça essa sua velha avó feliz, Felipe! Não me negue esse desejo. – ela podia estar com uma boa idade, mas estava bem lúcida e sabia fazer chantagem como ninguém.
- Preciso fazer umas contas antes, mas esse me parece um acordo aceitável! – devolvi
- Ah, que garoto cabeça-dura! Aceitável não, já temos um acordo, e não admito que volte atrás!
- Se eu sou turrão tive a quem puxar, não é? – questionei
- Fico feliz por você querido! Aqui estão as chaves! Quando terminar a reforma me chame, quero ver como ficou!
Nos dias subsequentes não fiz outra coisa que não contas, contas e mais contas, para ver se conseguia arcar com a minha parte no acordo sugerido pela minha avó. Cheguei à conclusão que sim, com a vida espartana que já levava, e mais alguns apertos aqui e acolá, eu conseguiria saldar minha dívida com ela e fazer a reforma que o imóvel exigia. Felizmente, trabalho não faltou e, embora a grana entrasse por um lado, logo saía pelo outro, mas eu estava contente com o andamento das coisas, teria meu próprio teto.
Enquanto reforma transcorria, o Kamel me pediu para ir morar com ele, alegando que já não se sentia mais confortável em não me ter ao seu lado o tempo todo.
- Esses encontros com hora marcada para começar e terminar estão me dando nos nervos. Quero você morando comigo, acordando comigo todas as manhãs, deitando comigo na cama todas as noites, quero te pegar na hora que o tesão pede e não quando sobra uma lacuna nas nossas agendas. Faz tempo demais que estamos apaixonados nessa lengalenga. Fora que a logística para uma simples trepada é quase uma novela. – sentenciou ele, depois de termos passado a noite juntos transando, e estarmos seguindo para o trabalho sem uma perspectiva certa para a próxima trepada. Eu concordei, amava-o e queria estar o maior tempo possível ao lado dele.
Mudei-me para o apartamento do Kamel na semana seguinte por conta de um feriadão prolongado que facilitaria a mudança. Para um cara solteiro o lugar até era bem ajeitado, como pude comprovar em vezes passadas quando ia dormir com ele. De qualquer modo, um entrosamento sob o mesmo teto leva algum tempo, mas até isso tiramos de letra.
Assim que terminei o trabalho para o site das lojas dele, que agora se restringiam a apenas duas, ele me propôs uma viagem à Turquia para me mostrar outros lugares que eu ainda não conhecia. Foi um mês maravilhoso, de muito namoro, paixão e noites tórridas de amor e sexo. Foi um período de relaxamento e descanso depois de ambos estarem há meses atolados no trabalho. Cada minuto que passei com ele parecia ser a recompensa pelos anos que passei questionando minha sexualidade, reprimindo desejos, ocultando a verdade de todos. Ser gay, ter seu homem, e poder viver esse relacionamento estava me fazendo mais feliz do que nunca.
O edifício onde ficava o apartamento do Kamel só tinha duas unidades por andar e, desde que me mudei, o apartamento de frente sempre esteve desocupado. Era verão e no início da tarde de uma sexta-feira quando o Kamel e eu estávamos de saída para um final de semana no litoral, notamos um movimento de entra e sai de funcionários de uma transportadora no apartamento vizinho. Chegados à garagem, vimos um carinha que devia ter a minha idade, gerenciando o transporte da mobília. A vaga da garagem que sempre estivera vazia, tinha agora um carro bem mal estacionado que atravancava a saída do SUV do Kamel. Se havia algo que deixava o Kamel furioso era o desrespeito das pessoas, e ele logo tomou aquele carro atravancando o dele como uma afronta, pois mesmo vendo que nós estávamos colocando as bagagens no porta-malas o dono não se manifestou em retirá-lo do caminho. Prevendo um bate-bocas, antecipei-me e fui perguntar ao sujeito se o carro era dele e se podia estacioná-lo corretamente na vaga para que pudéssemos sair. De longe já percebi que era gay, flanava feito uma libélula, a voz fina e esganiçada estava sendo motivo de deboche dos funcionários da transportadora.
- Oi! Esse carro é seu? – perguntei, simpático
- Oi! Aí querido, eu estou tão atarantada que nem sei mais o que fazer. É meu sim, por quê? – respondeu o sujeito, se abanando como se estivesse na menopausa.
- Porque ele está atravancando a nossa saída, como você pode notar! – respondi, firme, mas educadamente.
- Ai, mais essa agora! Querido, nem sei onde enfiei as chaves. Geralmente sei tudo que enfio em mim, mas hoje estou perdidinha! – miou o sujeito. – Nossa! Quem é aquele? Seu irmão, primo, amigo? Aí, chega a me dar calor! – exclamou gorjeando feito um passarinho na primavera.
- É meu marido! – respondi, elevando a voz o que atraiu a atenção dos carregadores sobre mim.
- Ai, me desculpe! Tem horas que perco a noção. Por favor, querida, não me interprete mal, eu não estava dando em cima do seu marido. Foi apenas uma constatação, e como minha boca não consegue ficar fechada, me mete nessas enrascadas. – fiquei puto quando ele me chamou de ‘querida’. Primeiro, porque não lhe dei abertura para tamanha ousadia; segundo, porque ser o passivo da relação não significava que eu havia mudado de gênero e passado a ser adjetivado com pronomes femininos e; terceiro, porque uma pontinha de ciúmes começava a fazer minha testa coçar.
- Bem, talvez fosse inteligente procurar nos bolsos, ou nos locais por onde passou e, quem sabe até na ignição. – devolvi, deixando a simpatia de lado e sendo bastante direto e seco.
- Você tinha razão, estão penduradas aqui! – exclamou aos encontrá-las presas na ignição.
O Kamel já bufava dentro do carro com toda aquela demora, e ficou ainda mais irritado ao perceber que o sujeito tinha dificuldade em manobrar entre as colunas de sustentação.
- Por que demorou tanto conversando com essa bicha? – perguntou-me quando entrei no carro.
- O suficiente para fazê-lo descobrir onde tinha enfiado as chaves do carro. – respondi.
- Belos vizinhos acabamos de encontrar! Só espero que esse imbecil não estacione tão mal todas as vezes. – retrucou o Kamel
- Ele te achou lindo! Chegou a suspirar quando te viu e me perguntou quem você era. – revelei
- E você?
- Eu o quê?
- O que disse?
- Que você é meu marido, a verdade, ora! O que você queria que eu respondesse? – respondi
- E ficou puto assim, por quê? – questionou, esboçando uma risadinha velada e irônica.
- Porque não curto sujeitos abusados como ele!
- Ficou com ciúmes? – ele desviou o olhar da rua para ver minha reação.
- E se tivesse ficado, qual o problema? – questionei exasperado, o que o fez rir e colocar a mão sobre a minha perna. – Mantenha-se longe desse sujeito! – emendei ligeiro
- Acho difícil, seremos vizinhos!
- Não estou brincando, Kamel! Não tem graça! Você entendeu o que eu quis dizer! – retruquei
- Quem diria? Essa faceta sua eu desconhecia! Ciúmes de mim. Meu Felipe se roendo de ciúmes do marido! – tripudiou, me puxando pela nuca e me beijando, enquanto esperava o semáforo abrir. Dirigi-lhe um rosnado.
Não sei o que me levou a ter esse sentimento, tão repentinamente. Eu nem sabia que era capaz de sentir ciúmes de alguém. Por que deveria estar preocupado com aquela bicha espalhafatosa, com poucos atrativos físicos que, seguramente, tinha melhorado a aparência do rosto com cirurgias plásticas e cujo tamanho da bunda só podia ser resultado de próteses de silicone? O arrojo que nele sobrava enquanto faltava em mim, essa era a resposta a essa pergunta. A ousadia, a cara de pau, com isso eu devia me preocupar, pois meu instinto me dizia que esse sujeito ia dar em cima do Kamel toda vez que pudesse.
- Por que está tão calado? – perguntou-me o Kamel quando já estávamos na estrada.
- Seja sincero, você se envolveria com um sujeito como aquele? – quando terminei a pergunta me senti ridiculamente inseguro.
- Não seja bobinho, Felipe! Eu nem olhei direito para ele, só por ter meu carro bloqueado já não fui com a cara dele. Não tem porque você me fazer uma pergunta dessas. – devolveu ele
- Sou uma besta, não é? – perguntei, eu estava quase chorando, o que me fez sentir patético.
- Não, você não é uma besta! Você é meu Felipinho amado que está se roendo de ciúmes à toa, só isso! Assim que chegarmos à praia eu vou te fazer esquecer esse sujeito e tirar essas caraminholas da tua cabecinha linda. – asseverou ele, voltando a me acariciar a nuca. Eu não estava me reconhecendo, isso nunca me aconteceu antes.
Numa das manhãs da semana seguinte, quando o Kamel e eu estávamos seguindo para o trabalho, demos de cara com os nossos novos vizinhos no hall dos elevadores.
- Bom dia! – cumprimentou de pronto a libélula espalhafatosa, dirigindo seu cumprimento e seu olhar avarento especialmente para o Kamel. – Ai, amor, esses são nossos vizinhos. Eu me atrapalhei todinha no dia da mudança e acabei travando o carro deles na vaga. No sufoco que eu estava naquele dia até me esqueci de onde tinha enfiado a chave, foram eles que me ajudaram a encontrar. – relatou, sem desgrudar o olhar da camisa aberta do Kamel por onde se viam os pelos do tórax dele. – Ah, eu até me esqueci de perguntar o nome de vocês! Para vocês terem uma ideia de como sou atrapalhada. Esse é meu marido Caio e eu sou Dija para os íntimos, pois detesto o Dijalma que consta no meu registro de nascimento. – emendou, sem tomar fôlego.
- Bom dia! – cumprimentei educado, mas curto.
- Bom dia! Muito prazer! – cumprimentou gentil e polido o marido do sujeito, estendendo a mão.
- Bom dia! – cumprimentou o Kamel, mais risonho para o tal “Dija” do que para o Caio, que me examinava da cabeça aos pés, espichando o olhar pouco discretamente para a minha bunda; o que fez o Kamel me puxar para junto dele pelo ombro e afagar minha nuca, num recado explícito do tipo – esse já é meu – para o Caio.
A minha primeira impressão quanto ao Dijalma não tinha mudado, uma aversão mais que comprovada. Podia ser ciúmes, mas não era apenas isso. Nossos santos não se cruzavam, apesar do pouco que sabíamos um sobre o outro. Era como se houvesse uma repulsa mútua que fizesse com que a proximidade nos repelisse instintivamente. Caio, o marido da libélula, era um cinquentão atlético, gostoso e tesudo; naquela manhã usava um terno muito bem ajustado ao corpão que valorizava seu porte e não lhe tirava a jovialidade. Era notório que era o ativo da relação e bancava o parceiro, tipo um sugar daddy; até porque ainda sobravam no Dijalma resquícios de uma origem humilde, o que não seria problema algum, pois dinheiro nunca fez a personalidade e o caráter das pessoas, e nunca foi um fator que me impedisse de travar amizades. Porém, nele esses resquícios estavam ligados à falta de respeito com os outros, a um modo impositivo e agressivo de impor às pessoas a sua condição de homossexual; isso sem mencionar o fato de dar em cima de qualquer macho sem se importar se esse homem tinha um relacionamento, como estava fazendo agora, pela segunda vez. Também não posso afirmar que o olhar cobiçoso do Caio tenha me deixado lisonjeado, o que acontecia às vezes quando eu notava um homem másculo me examinando, uma vez que havia nesse olhar uma cobiça pérfida e incomoda.
Apesar do Kamel estar me abraçando, o Caio puxou conversa querendo saber da minha profissão e mostrando-se muito interessado quando mencionei o trabalho fotográfico, além de declarar que era um entusiasta e gostava da fotografia como hobby. Enquanto isso, o Dijalma roubava a atenção do Kamel para si, elogiando seus bíceps que ficavam bastante destacados dentro daquela camisa que estava usando, e seus demais músculos, perguntando se ele malhava. O que me fez dar beliscão discreto nas costelas do Kamel foi aquele interesse repentino em responder àquelas perguntas descabidas, mesmo notando que o sujeito o comia com os olhos.
- Talvez possamos jantar juntos um dia dessa semana, para nos conhecermos melhor. Não é uma boa ideia, amor? – propôs o Caio.
- Claro, claro! Vai ser lá em casa, faço questão! Vocês vão babar no meu baião-de-dois, minha especialidade! – exclamou a libélula. – Na sexta, não é amor? É um dia bom para vocês? – continuou.
- Infelizmente já temos um compromisso na sexta-feira! Vamos deixar em aberto. Pelo visto vamos nos encontrar pelos corredores e garagem mais vezes e podemos combinar a melhor ocasião. – respondi apressado, antes que o Kamel pudesse confirmar qualquer coisa, uma vez que não tínhamos compromisso algum para a sexta-feira.
- Não faltarão oportunidades! – exclamou o Caio. – Eu e o Dija temos uma relação aberta, e vocês? – emendou
- Somos um casal estritamente monogâmico! – revidou apressado o Kamel, valendo-se da mesma tática que eu acabara de usar.
Quando o elevador chegou ao andar estava quase cheio e cedemos os lugares para nossos vizinhos, nos despedindo rapidamente, quando fiz questão de pronunciar o nome do Dijalma ressaltando bem o “i” que eu podia apostar que constatava assim, erroneamente escrito, na sua certidão de nascimento. Só faltou ele rosnar para mim e voar no meu pescoço, o que confesso foi bem divertido e maldoso de minha parte.
- Qual é a desse sujeito? Relacionamento aberto, essa foi demais! O que ele está pensando, que vai comer o teu cu na minha frente? Filho da puta do caralho! – esbravejou o Kamel, fervendo de raiva, assim que ficamos a sós.
- E que risinhos idiotas foram aqueles quando a bicha não parava de elogiar os teus músculos? Por falar nisso, eu vou dar um fim nessa camisa, já te falei que está apertada demais, e trate de abotoar esses botões, precisa ficar com esse peitão todo exposto? – retruquei, pois também estava me roendo por dentro.
- Você sempre gostou! Quem é que tem o costume de enfiar a mão no meu peitoral e ficar acariciando meus pelos? – devolveu o Kamel, cínico e atrevido.
- Pois a partir de hoje, não gosto mais! Trate de fechar suas camisas até em cima, especialmente na frente dessa bicha desvairada que fica te comendo com os olhos e se insinuando com aquela bunda siliconada. Você tem uma ao natural e bem mais gostosa à sua disposição, para ficar babando por uma artificial! – respondi.
- Outra crise de ciúmes? – indagou ele. – Vou te provar que não precisa ficar todo enciumado, deixa a gente chegar na garagem e eu te mostro que não estou nem um pouco interessado no Dija.
- Nem vem! Eu estou todo esfolado da noite passada! – revelei
- Pois vai passar o dia com esse cuzinho ardendo e todo galado pelo teu macho! – exclamou autoritário, abrindo a porta do passageiro do meu carro e me lançando para dentro dele de bruços sobre o banco.
Fiquei desesperado olhando tudo em volta para ver se alguém podia nos flagrar cometendo aquela indecência na garagem do prédio. O Kamel não parecia nem um pouco preocupado, desabotoou meu jeans, arriou-o até os joelhos, tirou a benga excitada dele da calça e a enterrou no meu cuzinho com uma estocada brusca. Como eu me debatia, ele abraçou meu tronco me contendo, e continuou forçando fazendo o caralhão entrar em mim. Rendido e subjugado, gani enquanto ele me fodia como se já não o fizesse há muito tempo, com uma gana desmedida. A posição incomoda e forçada não me permitia relaxar, minha musculatura estava toda contraída, especialmente a do anel anal, o que me fazia sentir dor a cada estocada seca que ele dava. Algumas pessoas se dirigiram a seus veículos alguns metros distantes da minha vaga e não perceberam o que estava acontecendo com aquele carro que não parava de balançar. Eu gania com os dentes cerrados para não chamar a atenção, e me entregava à tara do Kamel, que cumpriu a ameaça, deixando meu cuzinho lanhado e sensível encharcado de sêmen.
- Pronto, agora pode ir trabalhar! Aposto que não vai deixar de pensar em mim um segundo sequer durante todo o dia! E hoje à noite vai ter mais, vou deixar os testículos bem cheios para você! – afirmou, desmontando de cima de mim, guardando despreocupadamente aquele cacetão dentro da calça e me colocando um beijo úmido nos lábios.
- Brutão! Insensível! – protestei, puxando a cueca e o jeans para cima, enquanto dava a volta no carro com passos capengas para assumir o volante. O safado ria quando acenou do carro dele antes de sair do estacionamento.
Já na rua, minutos depois, eu também tinha um sorriso aparvalhado na cara, e sentia a umidade viril dele formigando na ampola retal inundada.
Nunca aceitamos o convite dos nossos vizinhos. Contudo, meses depois, o Caio ainda me assediava e de maneira mais ultrajante, como se eu fosse a mesma bisca fácil do parceiro. Ele devia pensar que todos se submeteriam às suas vontades porque tinha condições de bancá-las e sustentá-las. E, as minhas negativas, pareciam só aumentar o tesão e disposição dele em me ter sob seu jugo de macho.
De uma hora para outra, o Kamel resolveu se exercitar, e seguia cedo por quatro quarteirões até uma praça das proximidades para fazer uma corrida. Quando o questionei a respeito ele me respondeu que se sentia muito sedentário, o que eu não engoli. Num domingo, até um pouco chuvoso, acordei mais tarde que de costume e ele não estava mais na cama, nem em outro cômodo do apartamento. Me vesti e intentava ir até uma padaria que ficava algumas quadras mais distante para comprar um pão do qual ele gostava. Ao chegar à garagem, da porta do elevador, vi o Dijalma pendurado no pescoço dele, cobrindo seu rosto de beijos e pegando no cacetão dele por cima do short folgado. O Kamel não parecia nem um pouco desconfortável com a situação, pois ambas mãos estavam apertando freneticamente a bunda siliconada. Senti tudo rodando ao meu redor e tive que me amparar na parede para não cair. O ar simplesmente não entrava nos meus pulmões, por mais esforço que eu fizesse. Parecia que eu havia acabado de levar um chute na barriga, e precisei comprimi-la com os braços e me dobrar sobre ela para controlar os espasmos das entranhas. Como o elevador não subiu e eu ainda estava impedindo o fechamento da porta por estar interposto no facho do sensor, voltei a me lançar para dentro dele. Cheguei ao apartamento chorando convulsivamente, sem acreditar naquilo que meus olhos me obrigaram a ver. Meu marido, meu homem por quem eu tinha um amor incomensurável e fiel, estava se esfregando com uma bicha escrota das mais vulgares. Só podia ser um pesadelo, pensei de início, motivado pelo ciúme. Contudo, não era; as corridas matinais começaram a fazer sentido, bem como ele voltar delas algumas vezes com a benga ainda à meia-bomba, evitando se aproximar muito de mim antes de se enfiar na ducha para que eu não notasse o perfume adocicado e enjoativo que o Dijalma deixava impregnado todo o corredor ao passar por ele.
Tentei ser forte, respirei fundo quando o ouvi mexendo na fechadura, jurei a mim mesmo que não faria um escândalo, que não protagonizaria um espetáculo circense, que me mostraria equilibrado e centrado. Mas, assim que vi aquele sorrisinho de satisfação na cara do Kamel, tive vontade de esganá-lo com as próprias mãos. Examinei-o da cabeça aos pés, a procura de algum indício daquela traição.
- Já acordou, amor? – perguntou ele, ao me ver sentado cabisbaixo na sala, sem notar que estivera chorando.
- Como foi a sua corrida? – a voz não saiu firme como eu pretendia.
- Foi ótima! Está fresquinho lá fora por conta da chuva recente. – revelou.
- Mas você deve estar fervendo, não é? – indaguei, pois já não conseguia mais olhar na cara dele sem que me subisse a raiva.
- Como assim? Estou suando um pouco, mas nada fora do normal.
- E o calor na pica também está normal, depois do Dijalma ter brincado com ela? – ele parou o que estava fazendo e se voltou abruptamente na minha direção. – Gostou de apalpar todo aquele silicone?
- O que você está falando?
- Não se faça de sonso, Kamel! Não me faça de idiota, eu vi vocês dois agora há pouco na garagem, se beijando e se esfregando, nem sei como não treparam ali mesmo. – berrei descontrolado.
- Você só pode estarEstou o quê, Kamel? Estou enganado, é isso que você quer que eu acredite? Eu vi, Kamel! Eu vi, e não acredito que você foi capaz de me trair com aquela bicha escrota. Aquilo é uma puta ambulante e você se deixou enrabichar por ela. Vá lá agora, bata na porta deles e diga ao Caio o que você acabou de fazer com o marido dele. Vá, Kamel!
- Acalme-se, meu amor, para podermos conversar civilizadamente! – disse ele, querendo me tocar.
- Você me traiu, Kamel! Quer que eu seja civilizado? O cacete que eu vou ser civilizado! Eu sou de carne e osso, tenho sentimentos e, da mesma maneira intensa com que sempre te amei, agora eu te odeio, Kamel!
- Você precisa se acalmar, vai acabar tendo um troço! – exclamou ele, impotente diante dos meus argumentos.
- Eu já tive um troço, Kamel! Tive quando vi você com aquela coisa abjeta pendurada em você mexendo no seu pau com uma intimidade deslavada. – Acabou, Kamel! Você e eu, acabou! Você me traiu, quebrou a minha confiança, destruiu todo amor que sentia por você. – sentenciei, desabando num choro descontrolado. Eu nunca senti tanta dor; ela não estava localizada num lugar específico, e sim distribuída por todo meu ser.
- Não diga isso, Felipe! Eu amo você! Vamos esclarecer isso tudo direito. – balbuciou desesperado.
- Se você tivesse um mínimo de sentimentos por mim, não teria me desrespeitado! Esteja certo de que acabou, Kamel! Eu sou um homem de uma única palavra, você já deveria saber disso! – revidei.
Quando senti que tinha forças suficientes para ficar em pé, comecei a juntar minhas coisas para deixar aquela casa que pensei seria minha e dele para toda vida. Só que não havia mais uma vida em comum a ser vivida, não para mim ao lado de alguém em quem não confiava mais. O Kamel fez de tudo para me demover de sair de casa, mas desistiu temporariamente para não aumentar o conflito, achando que, comigo mais calmo, dentro de alguns dias tudo se resolveria a favor dele. Isso nunca aconteceu.
Me mudei para o galpão reformado que minha avó me presenteou. Alguns dias instalado confortavelmente nele, percebi o quão inteligente tinha sido a ideia de fazer dele um loft. A ideia surgiu quando o madeiramento reforçado de peroba-rosa foi exposto durante as obras. Grossas vigas e caibros formavam um bonito treliçado com terças e tesouras sustentando o telhado, lixadas e envernizadas, elas ganharam vida e resolvi deixá-las expostas. Como o pé direito do galpão era bem alto, deu para fazer um descolado apartamento no andar superior sustentado por uma laje. Assim, eu tinha o espaço de trabalho e moradia bem definidos, e tinha contado com a ajuda providencial de uma amiga para decorar a parte residencial. Um cãozinho e plantas distribuídas em frente aos altos janelões e portas de vidro, se encarregaram de diminuir a minha solidão. O Kamel tentou uma reconciliação por meses. Num momento de vulnerabilidade e fraqueza quase caí na esparrela de voltar com ele; porém, felizmente o bom-senso e a razão falaram mais alto que o coração carente.
Aconteceu numa noite fria de inverno durante um encontro com amigos que tínhamos em comum. Eu estava sem carro, pois ele estava na revisão. Tinha tomado uma caipirinha de vodka e tangerina, mais dois gin fizz; o segundo passou da conta, e me fez esquecer que aquele sacripanta que estava diante dos meus olhos, ainda continuava um macho lindo e gostoso, e tinha me traído com uma bicha vadia. Gays passivos são, no meu entender, menos racionais que emocionais; tendem a ser mais sensíveis a carinhosos, o que os faz mais vulneráveis, especialmente quando um machão ativo lhes acena com alguns momentos de prazer. Se nem todos fossem assim, e isso não passasse de mera conclusão minha, eu, naquela noite ao menos, era um desses gays. O Kamel me ofereceu carona, já era madrugada, e não fiquei ligado no caminho que ele estava fazendo ao rumar em direção ao apartamento dele, talvez o gin fizz tivesse sua parcela de culpa por eu não estranhar o caminho que percorri por tantas vezes na companhia dele. A ficha caiu quando eu já estava pelado, depois de muitos beijos ardorosos dele e de estar enrodilhado em seus braços vigorosos e quentes, com o tesão a me contorcionar as pregas carentes do cuzinho. Mais alguns beijos, aquele olhar cheio de tesão quase colado no meu rosto e aquelas palavras melosas confessando a saudade que sentia de mim, foram me fazendo abrir as pernas, deixar meu reguinho exposto e servir de convite para ser enrabado. O pauzão dele nem pensou duas vezes, deslizou até o talo para dentro de mim, que gania entorpecido pelo êxtase e pelo álcool. Quando acordei na manhã seguinte com parte do cacetão dele ainda entalado no meu cu, aqueles pelos do torso dele roçando minhas costas e aquela respiração morna no meu cangote, já era tarde para me lamentar, eu estava completamente molhado com o esperma que ele despejou em mim. Aquela foi a última vez que me recusei a voltar com ele; fui tão enfático que ele se deu por derrotado.
Havia algum tempo já que sentia dores nas costas, alguns dias elas eram tão pungentes que mal conseguia fazer meu trabalho sem necessitar de analgésicos. O ortopedista me mandou fazer uns exercícios para alongar a coluna sob a supervisão de um profissional habilitado, algumas sessões de fisioterapia e outro profissional para me ajudar a melhorar a postura. Quando notei a melhora e, como tinha sido orientado a manter alguns exercícios regularmente, matriculei-me numa academia que o fisioterapeuta tinha me indicado e que não ficava muito longe de casa. Comecei indo duas vezes por semana, o personal trainer, Eduardo, era formado em educação física como todos os demais na academia e, após uma boa avaliação da minha coluna, me ajudou a implementar os exercícios mais adequados. Os resultados não demoraram a aparecer, eu sentia menos dores e cansaço no final do dia, mesmo que tivesse sido estafante, tinha melhorado a postura e até achei que tinha realmente ficado mais bonito com os elogios que começaram a pipocar vindos dos amigos e até clientes. O Eduardo era um tesão, alto, ombros largos, moreno e tipão bem másculo, fazia a mulherada suspirar toda vez que ele se aproximava. Eu gostava do sorriso gentil dele, não menosprezando todo o resto, inclusive o volumão que balançava dentro do short dele, mas não era um homem com o qual eu me envolveria sentimentalmente, e ele logo sentiu esse limite, muito embora precisasse se esforçar para controlar as ereções que o acometiam quando via minhas nádegas proeminentes e carnudas deslizando dentro do short de fendas laterais largas que, às vezes, deixavam à mostra a dobra entre elas e as coxas grossas. Eu não o torturava quando notava a repetida necessidade que ele tinha para ajeitar o cacete no short, alegando precisar de um tempo para respirar, ou inventando algo que o liberasse por alguns instantes e lhe permitisse recuperar o autocontrole. Nas vezes em que o Eduardo não podia me ajudar a fazer os exercícios, por ter faltado ou estar com outro cliente da academia necessitando de mais supervisão, era um dos sócios da academia que vinha me ajudar. O Fabian devia ter pouco mais de trinta anos, também era um tesão de macho por quem a mulherada e os clientes gays só faltavam se despir diante dele e pedir – me fode – com toda força do desejo. Eu o achava lindo, mas um pouco esnobe, quando não grosseiro com alguns funcionários. Parecia haver dias em que ele acordava com o pé esquerdo e nessas ocasiões ele tinha esse comportamento; no mais, era um cara gentil, apesar de sorrir pouco e ser bastante reservado.
- Você vai renovar o seu pacote semestral, ele vence na próxima semana! – avisou-me o Eduardo quando me ajudava com a barra, e me desestabilizava todo com a visão da rola grossa e das bolas que apareciam pela abertura das pernas do short, enquanto ele se mantinha com as pernas ligeiramente abertas sobre a minha cabeça.
Hein? Hã? Ah, sei, quer dizer, sim! Foi bom você me lembrar, vou fazer isso hoje mesmo quando acabar a sessão. – respondi meio hipnotizado por aqueles genitais avantajados.
- Não precisa ser hoje! Vou deixar anotado para a recepcionista te lembrar da próxima vez que vier. Vai ser um prazer continuar com você, noto seu progresso e espero que esteja conseguindo te ajudar com as dores na coluna. – ele tinha uma fala mansa; perigosíssima para um gay num homem como ele, cuja simples visão já embotava o pensamento; e gostava de usá-la comigo, talvez esperançoso de ela um dia o levar diretamente para dentro da minha bunda.
Chovia fraco na semana seguinte no dia em que saí da academia após o treino. Ainda não eram nove horas, mas as ruas molhadas e uma queda na temperatura durante a tarde devido a uma frente fria, tinha esvaziado as calçadas e ruas. No mesmo instante em que tirava o carro do estacionamento, o Fabian passou por mim montado em sua barulhenta Triumph Rocket 3R de carenagem vermelha, acelerando e, sem esperar por um espaço entre os carros que trafegavam na avenida, sumiu das minhas vistas quando entrei na avenida. O primeiro semáforo estava fechado e eu o alcancei ficando imediatamente atrás dele à espera do verde. Assim que o semáforo abriu ele disparou novamente na minha frente, ao mesmo tempo em que uma maluca falando ao celular me ultrapassava pela direita numa velocidade incompatível com a via. O semáforo do quarteirão seguinte estava no amarelo quando tanto o Fabian quanto a mulher aceleraram para atravessá-lo antes de fechar. Ela acabou atingindo a traseira da motocicleta ao tentar mudar de faixa sem sinalizar, e lançou o piloto longe, enquanto a motocicleta deslizando sobre o asfalto levantava faíscas. Ela se esgueirou entre o corpo caído do Fabian, a motocicleta e os carros que esperavam na primeira fila, tentando a fuga, porém foi bloqueada pouco a frente por um motorista de táxi que presenciou o acidente. Como minha câmera estava ao alcance das minhas mãos no banco do passageiro, aproveitei para fotografar a traseira do carro dela antes que pudesse empreender a fuga. Junto com outros motoristas, desci para acudir o Fabian. Ele ainda estava um pouco grogue quando começou a se levantar sozinho.
- Permaneça deitado, Fabian! Melhor não mover a cabeça, pode ter afetado a coluna durante a queda. – afirmei, procurando mantê-lo deitado no asfalto.
- Não, eu estou bem! Só me ralei a perna no asfalto e bati com o ombro, mas estou legal! Cadê a moto? – respondeu ele
- O taxista, e esse moço a colocaram na calçada. Tem certeza de que está bem? Eu te levo para o Pronto Socorro. É melhor um médico te examinar! Sugeri.
- Não precisa, estou bem! – insistiu teimoso.
- Não está não! Olha como a sua perna está sangrando! Vem para a minha picape, eu te levo, você precisa fazer um curativo ou ver o tamanho do estrago. – voltei a propor, com mais ênfase.
- E a moto?
- Vou pedir para o pessoal me ajudar a colocá-la na caçamba, fique tranquilo. Entre na picape, agora! – eu já estava perdendo a paciência com a teimosia dele.
Rodamos três quarteirões e ele procurava avaliar o estrago, gemendo um pouco quando tocava na perna onde havia um rombo no jeans pelo qual só se via uma enorme mancha de sangue.
- Tem algum lugar de preferência, pelo convênio médico, sei lá? – perguntei. Ele demorou a responder, distraído com o ferimento na perna.
- Não, não tenho! Não vou para nenhum hospital, foi só uma coisinha superficial. – respondeu.
- Cara, tu é teimoso, hein! Caraca!
- É só parar de me encher com essa história de Pronto Socorro e o escambau! – revidou exasperado. – Não tenho carteira de habilitação para pilotar motocicletas, e estou sem a documentação da moto comigo, está satisfeito agora? A última coisa que eu preciso agora é me ver envolvido numa ocorrência com polícia no meio! – emendou
- Me desculpe, eu não sabia! – retruquei. – É só isso mesmo, ou está sendo procurado vivo ou morto pela polícia? – provoquei brincando.
- Engraçadinho! – rosnou para mim. – Que caminho é esse, para onde está me levando? – questionou
- Para a minha casa, vamos avaliar o ferimento, se for possível fazer alguma coisa caseira, fazemos lá mesmo, caso contrário, te levo para o Pronto Socorro, com ou sem polícia! – afirmei.
Acomodei-o na sala inicialmente, para ter uma ideia do estado dele. Alguns centímetros abaixo do cós do jeans até quase o joelho não havia mais tecido cobrindo a perna dele. A jaqueta de couro estava rasgada o ombro esquerdo e em parte das costas, também arrancada pela aspereza do asfalto sobre o qual ele deslizou. Fui ajudando ele a se livrar da jaqueta e do jeans sob resmungos de ‘Ais” e “Uis”, enquanto a ferida da perna se mostrava em toda extensão. Era uma abrasão extensa comprometendo toda epiderme da lateral superior da coxa, tendo atingido a derme e a hipoderme em alguns pontos, com sangramento ativo em forma de lençol.
- Vamos tirar essas roupas! Vou lavar todo esse sangue e essa ferida no chuveiro para que possamos fazer alguma coisa. – avisei. Ele, ou não estava prestando atenção, ou resolveu me deixar tomar conta da situação. Até o encarei para ver se não ia desmaiar ou algo parecido, pois o estava achando pálido e calado demais nos últimos minutos.
- Você mora aqui sozinho?
-Não, o Samuca mora comigo!
- Samuca é esse pentelho peludo?
- É!
- Com o que você trabalha? É médico ou uma porra parecida?
- Não, faço fotografia!
- Por isso tem essa porrada de lentes e câmeras? Isso dá dinheiro?
- Paga minhas contas! Não tenho do que reclamar! – respondi, ante a cara descrente dele. – Entra no box, vamos limpar essa ferida. – ordenei
- Vou precisar tirar a calça?
- Que calça? Isso agora é só um trapo! Claro que precisa, anda! Apoia em mim se precisar.
- Você é muito mandão!
- E você um vacilão!
- Você está maluco se pensa que vou te deixar esfregar essas gazes na ferida! Vai doer para caralho! – sentenciou
- Precisa eliminar qualquer resto de sujeira, senão essa porra infecciona!
- Quem te disse isso, se não é médico?
- O bom-senso!
- Ai cacete! Vai devagar com essa mãozona pesada! Quer arrancar a carne dos meus ossos?
- Não se preocupe, tem muita carne aqui, e não pretendo arrancar nem um naco dela!
Nossa conversa ia aos trancos e barrancos com ele reclamando de tudo, até a ferida ficar completamente limpa e eu poder fazer compressão para estancar o sangramento.
- Não aperta com tanta força, porra! Já falei que está doendo!
- Precisa fazer compressão senão o sangramento não para! Faça você então, se acha que a sua mão é mais leve do que a minha. – revidei, no limite da minha paciência.
- Tudo bem, faz você! Não sou muito chegado em sangue! – afirmou, revirando os olhos, o que me fez rir.
- Eu vou sair para comprar umas ataduras, pomada antibiótica, e uns curativos para cobrir essa ferida, procure não desmaiar na minha ausência, qualquer coisa pede para o Samuca te acudir! – exclamei, antes de ir à farmácia.
- Muito engraçadinho! – retrucou, apontando o dedo médio de uma das mãos em riste.
Fiquei perturbado com a imagem dele deitado completamente nu na minha cama, quando voltei com os itens que precisava para fazer o curativo. Aquela cama nunca tinha sentido outro corpo que não o meu deitado nela, e o do Fabian era um colírio para os olhos e uma tentação para um cuzinho carente como o meu, com meses de jejum. Ele seguia minhas mãos com o olhar atento, elas estavam a centímetros do caralhão grosso e flácido, e do sacão cavalar abaixo dele. Eu apertava as pálpebras na tentativa de mudar o foco de visão, que não queria olhar para outra coisa que não aquele instrumento lindo e intimidador. As palpitações não me deixavam sossegado, minha vontade era pegar aquela coisa e colocá-la na boca, chupando-a até ser brindado com o leite viril do Fabian. Esses pensamentos lascivos davam uma ideia da falta de sexo que eu estava sentindo, de um homem para acarinhar. Consegui aplicar a pomada antibiótica e o curativo e cobrir a ferida, o que deixou ambos mais aliviados.
- E o ombro, como está? – perguntei ao terminar com a perna
- Dói um pouco, mas não é nada comparado com a perna. – respondeu ele
- Vou trazer um pouco de gelo num saco plástico para cobrir o ombro. Esses analgésicos vão tirar a dor, me garantiu o farmacêutico. – Está com fome?
- Comeria um boi! – exclamou mais descontraído, colocando até um sorrisinho naquele rosto hirsuto e viril, para o qual evitava olhar para não ficar tentado a cobri-lo de beijos, particularmente aquela boca sensual.
Descongelei algumas coisas que tinha no freezer e o ajudei a sentar recostado na cabeceira da cama.
- O cheiro está uma delícia! – afirmou. – Você cozinha?
- Às vezes, mas essa comida foi feita por uma senhora de quem compro alguns congelados para facilitar a vida. – respondi. Por que eu estava com a sensação de que ele fazia tempo não recebia tanta atenção e carinho. Talvez fossem seus olhos verdes tristonhos.
- Estou começando a ficar com sono, é melhor eu ir para casa! – disse ele, após devorar tudo que estava no prato e repetir.
- É a medicação fazendo efeito! Acho melhor você ficar por aqui essa noite. Estropiado desse jeito você não vai longe. – sugeri
- Você só tem esse quarto e essa cama? – perguntou
- Tenho outro quarto, mas ainda não está mobiliado. E cama só tenho essa! Não tenha receio, vou me acomodar no sofá. – respondi.
- Fica aqui! Vai que eu precise de alguma coisa, ou sinta dor durante a noite, teria que sair perambulando por aí atrás de você. – eu ri; para quem não queria ajuda alguma, ele até que estava curtindo ter um enfermeiro particular à sua disposição.
- Falei alguma coisa engraçada? Por que está rindo?
- Nada, não! Vou pegar mais travesseiros.
Deixei o Fabian bem acomodado, diminuí a intensidade das luzes e ele dormiu logo, efeito da medicação que o farmacêutico me forneceu mesmo sem a receita médica, depois que lhe expliquei a finalidade. Fui lavar a louça do jantar, alimentei o Samuca e me enfiei sob a ducha deixando a água morna escorrer pelos ombros e costas que estavam tensos e doloridos. Ao me deitar ao lado dele, ele abriu os olhos um tanto quanto sonolento e atordoado, balbuciando algumas palavras desconexas ao se perceber num ambiente estranho.
- Volte a dormir, você precisa descansar! – avisei
- Minha perna está doendo muito! – murmurou fatigado.
O curativo que eu havia aplicado estava empapado de sangue que já tingia as ataduras que enrolei sobre ele, o que me deixou preocupado. Aquele ferimento precisava ser examinado por um médico.
- Voltou a sangrar, eu vou te levar a um Pronto Socorro, vai ser melhor para você.
- Não! Eu não vou a nenhum Pronto Socorro, quero ficar aqui. – retrucou ele, ficando mais desperto para impor sua vontade.
Refiz o curativo aplicando mais compressas de gaze e pomada antibiótica, envolvendo a coxa grossa e peluda com camadas de ataduras reforçadas. Ele novamente me acompanhava com o olhar e calado, mas quando estava finalizando a fixação da atadura, ele cobriu a minha mão que estava mais próxima do pauzão com a dele e a levou até o órgão. Tão logo sentiu o toque da minha mão, começou a latejar adquirindo lentamente uma consistência mais rija. Minha mão que até então estava firme, começou a tremer, enquanto minhas palpitações voltavam e como que galopavam no meu peito. Demorei uns minutos antes de criar coragem para encará-lo, pois sabia que ao me deparar com seus olhos expressivos, dificilmente controlaria meus instintos. Não deu outra, ele colocou a mão embaixo do meu queixo e levantou meu rosto, me encarando sem dizer nada, pois seu olhar exprimia tudo. Inclinei-me até conseguir colocar o cacetão pesado na boca, envolvendo a glande com meus lábios e afastando o prepúcio para a expor por inteiro. O gemido longo que o Fabian soltou não foi como os anteriores, associados a dor na perna; foi um gemido externando deleite. À medida em que eu lambia e chupava, a rola ia endurecendo na minha mão, transformando-se num mastro maciço e voluntarioso que pulsava forte no mesmo ritmo dos batimentos cardíacos dele. Comecei a sentir o sabor delicioso do pré-gozo dele se mesclando à minha saliva, o que pôs os meus esfíncteres anais em polvorosa, piscando alvoroçados. Fazia tempo que eu não segurava numa benga, e a do Fabian grossa e avantajada não era do tipo que estava dando sopa por aí; era, isso sim, um verdadeiro sonho de consumo para qualquer passivo. Se algo de bom sobrou do meu relacionamento com o Kamel, foi como cuidar da pica de um macho, de modo a fazer com que se sentisse o mais valorizado e privilegiado dos machos. Não foi apenas a carência que me levou a me dedicar por inteiro a chupar o órgão portentoso do Fabian, mas o sabor maravilhoso dele. Brinquei, massageei e chupei carinhosamente cada uma de suas bolas; fiz o mesmo com o pauzão, lambendo-o, mordiscando-o com sutileza e brandura, extraindo grunhidos do Fabian que vinham das profundezas de seu tórax. Enquanto a minha mão o masturbava, a boca chupava a chapeleta estufada em movimentos concatenados. O Fabian se contorcia todo, sua mão pesada estava espalmada sobre a minha cabeça garantindo que minha boca não se afastasse de seu membro e, num grunhido rouco, ele gozou, enchendo minha boca de porra, que precisei engolir às pressas para não sufocar, e porque estava simplesmente deliciosa.
- Pronto! Acho que chega de estripulias para você por hoje, não acha? – indaguei, quando terminei de lamber e limpar todo o sêmen que havia na caceta dele, enquanto ele segurava meu rosto pelo queixo e me dirigia um sorriso abobalhado.
- Você daria um excelente enfermeiro! – exclamou com uma cara travessa.
Acomodei-me rente a beirada da cama deixando um espaço maior para ele poder se movimentar com mais liberdade, evitando deitar sobre a perna machucada. Porém, poucos minutos depois de apagar as luzes, ele veio se encaixar nas minhas costas. Senti um arrepio perpassando todo corpo quando o torso quente e peludo dele roçou minha pele. Aquele homem nu e com o cacetão ainda bastante duro se acoplando às minhas curvas era algo que não me permitia relaxar. Eu estava tomado pelo tesão. Ao mesmo tempo em puxava minha cueca para baixo, seu braço envolvia meu tronco, me prendendo junto a ele. Ele cheirava minha nuca numa atitude primal, como se o cheiro da minha pele lhe desse informações sobre a minha disponibilidade sexual, meu papel e posicionamento no sexo, minha aceitação ao assédio dele. Minhas nádegas enrijeceram travando o cuzinho assim que senti o cacetão dele roçar meu rego. Fui vagarosamente suspendendo uma perna e ele logo se encaixou sobre a minha bunda empinada e, sem me avisar, enfiou seco e de uma só vez, o pauzão no meu cuzinho rijo e apertado, meu corpo se envergou, precisei morder o lábio ao soltar um grito enquanto ele colava o peito nas minhas costas e ia metendo cravando o caralhão tão fundo que chegava a me faltar o ar. Meus gemidos, liberados com a cara afundada no travesseiro, iam se tornando mais altos à medida em que me contorcia com o cacetão me rasgando por dentro. Gozei melando meu pinto e o lençol, enquanto recebia as estocadas potentes e rápidas em meio aos ganidos abafados. O Fabian trabalhava para chegar ao clímax, me penetrando com vontade e força, até sobrevir o gozo, quando ejaculou fartamente, deixando aqueles jatos libertadores encharcarem meu cuzinho com seu sêmen espesso e viscoso, e o cacetão cravado profundamente para garantir que cada gota entrasse no meu corpo. Virei meu rosto na direção dele e sua boca, com a respiração ofegante, cobriu a minha num beijo que entrelaçou nossas línguas. No ar do quarto pairava o cheiro de sexo com seu aroma almiscarado, nos embalando no sono.
Como não tinha compromisso agendado para o dia seguinte, me demorei na cama não querendo despertar o Fabian que dormia a sono solto, ressoando tranquilo ao meu lado. Para desencargo de consciência, ergui a cabeça para dar uma espiada na perna dele; as ataduras estavam secas, o sangramento havia parado e, pela maneira relaxada como ele dormia, também a dor devia ter diminuído.
- Que horas são? – perguntou, quando me flagrou observando-o em silêncio.
- Passa um pouco do meio-dia! Como você se sente, ainda sente dor?
- Estou legal! Só dói um pouco quando movo a perna. Tenho que ir para casa. – disse, erguendo-se para ficar sentado na cama.
- Acho melhor darmos mais uma olhada nessa ferida e trocar os curativos. Tem certeza que não quer ficar mais um tempo por aqui descansando? Não tenho nenhum compromisso hoje, posso ficar com você. – me dispus.
- Tudo bem trocar os curativos, mas, depois disso, vou para casa, já abusei muito de você! – devolveu ele.
Ele é adulto, não insisti e após trocar os curativos levei-o para casa, deixando-o na frente do edifício que ele me apontou como sendo onde ficava seu apartamento. Ele não me permitiu levá-lo até o apartamento, despedimo-nos no carro.
Não o encontrei nas vezes seguintes em que fui à academia para os treinos. O Eduardo me disse que ele estava viajando e não viria naquela semana, o que me fez suspeitar que o Fabian não mencionou aos funcionários sobre o acidente, e eu não toquei no assunto. Só fui reencontrá-lo no último treino da semana seguinte. Ao contrário do que fazia costumeiramente, circulando pelo salão entre os aparelhos e supervisionando a atuação dos personal trainers e seus clientes, ele permaneceu sentado num canto da recepção. Fui ter com ele depois de findo o treino e ter tomado uma ducha para saber como estava. Por precaução, devido à proximidade da recepcionista, não mencionei o acidente.
- Como você está? Melhorou? – perguntei, com um sorriso leve e amistoso.
- Estou bem! – respondeu secamente
- Que bom, fico feliz de saber que está sarando! Podemos ir até a lanchonete para um café e conversar um pouco? – perguntei, pois queria saber um pouco mais de sua recuperação e não queria fazê-lo na frente da recepcionista.
- Estou sem tempo para isso! Olha, Felipe, vou deixar bem claro e, antes que você comece a ter ideias a meu respeito, que uma simples foda não significa que eu tenha qualquer interesse em você. Estou cheio de clientes que vem aqui para dar em cima de mim achando que vão se dar bem às minhas custas por ser dono da academia e ter alguma grana. Vou te responder o mesmo que já falei para essa mulherada e gays caça-marido, eu não estou disponível, ok! – eu ouvia aquelas palavras estarrecido, sem acreditar que ele pudesse me jogar um absurdo desses na cara. Meu sangue ferveu.
- Oi? Como é? – perguntei, espumando de raiva
- Acho que você me entendeu muito bem!
- Você é o maior idiota que eu já conheci! Eu te fiz um favor, seu imbecil! Não quero nada de você! Babaca, cretino! Vá à merda! Vá se foder! – exclamei exaltado, o que atraiu olhares sobre nós.
Deixei a academia tremendo de raiva, entrei no carro e comecei a chorar para liberar toda aquela fúria que me consumia. Qual era a daquele cretino? Eu o ajudei quando poderia ter simplesmente seguido meu caminho e deixar que os agentes de trânsito e o serviço de resgate se encarregassem de tirá-lo da rua. Fui um idiota, me enchi de preocupação por ele. Não acredito que tenha chupado a pica desse sujeito, engolido seu sêmen, me deixado foder e coberto esse desgraçado com meus beijos carinhosos. Que gay imbecil eu sou, que vai logo dando tudo de si para homens ativos, para depois ser traído ou desprezado por eles? Eu socava o volante enquanto esses pensamentos enchiam a minha cabeça, e repetia quase aos berros – cretino ... cretino ... cretino – para me conscientizar de quem sou, chorando sem controle.
Em casa, com a cabeça encostada nos travesseiros, ouvindo This Guy’s in Love with You de uma coletânea de sucessos de Burt Bacharach no Podcast, e acariciando a barriga do Samuca, sentia as lágrimas rolando pelo rosto e a determinação de não voltar mais a academia se materializando na minha mente. Decisão tomada, abandonei os treinos temporariamente; se os fosse retomar algum dia, seria noutra academia.
O Eduardo me ligou perguntando por não ter ido à academia. Disse-lhe que tinha desistido deles, sem entrar em detalhes.
- Mas você acabou de renovar o pacote por todo semestre, e as dores nas costas podem voltar sem os exercícios. – lembrou.
- Eu te agradeço pela atenção e por toda sua dedicação, Edu, mas não vou voltar. – respondi.
Alguns dias depois, foi a recepcionista quem me ligou perguntando pela minha ausência. Dei-lhe a mesma resposta – desisti dos treinos. Ela também voltou a me lembrar do pacote que tinha acabado de fechar.
- Você tem o crédito aberto, e devo lhe lembrar que no contrato está especificado que não fazemos a devolução do pagamento. – disse ela, tomando cuidado com as palavras.
- Eu conheço a cláusula! Não se preocupe, diga a seu chefe que pode ficar com o dinheiro, e aproveite para mandá-lo à merda! – despejei revoltado.
Passei dias enfezado com a atitude descortês do Fabian, tentando entender o que levava homens ativos e dominadores como ele a tratar mulheres e gays como seres inferiores, quando é justamente nelas e neles que encontram acolhimento, compreensão e carinho. Quando a indignação e a raiva iniciais passaram, e eu já as estava relegando ao esquecimento do passado, me surpreendo ao atender a porta num sábado pela manhã e me deparando com um entregador portando um sofisticado buquê de flores.
- Me desculpe, não vou receber a encomenda. Pode devolvê-la ao remetente! – afirmei ao entregador, após ler o cartão preso ao buquê.
- Não sei se posso fazer isso, preciso consultar a dona da floricultura, pois isso nunca aconteceu antes. – me retrucou confuso o rapaz da entrega. Tirando em seguida o celular do bolso e consultando sua chefia.
- Então entregue as flores à primeira mulher com quem cruzar na rua, jogue-as no lixo, ou simplesmente leve-as de volta. Eu não as quero! – disse, fechando a porta na cara dele.
Não chegou a se passar nem meia hora, e recebo uma mensagem do Fabian no celular – as flores são um pedido sincero de desculpas – dizia o texto. Bloqueei o número dele, sem responder.
Uma chuva fina que começou no meio da tarde engrossou ao anoitecer, se transformando num temporal de primavera. O interfone tocou quando já estava escuro, mas a câmera registrava a presença do Fabian diante do portão metido numa jaqueta de couro tomando toda aquela água na cabeça. Não atendi. Os toques continuaram insistentes, sempre com o mesmo resultado negativo. Apesar de cessarem depois de um tempo, o Samuca continuava inquieto, latindo de vez em quando e rondando a porta de entrada, sinalizando haver alguém em frente de casa. Examinei as imagens da câmera e lá continuava o Fabian, agora sentado na calçada rente à fachada, enquanto a chuva pesada não dava trégua. Que se dane, murmurei para mim mesmo. Contudo, após repetir a blasfêmia mais algumas vezes, me veio aquela sensação de culpa, o que me fez sentir raiva de mim mesmo. Panaca, como você ainda consegue sentir pena desse estrupício depois de tudo o que ele te falou? Era a pergunta que não calava.
O Fabian já estava a mais de duas horas sentado lá embaixo debaixo de chuva, quando minha paciência se esgotou e aquele sentimento altruísta de ajudar os outros e, particularmente aquele homem que ressuscitou o desejo no meu ânus carente, não parava de me incomodar. Voltei ao interfone.
- O que pensa que está fazendo? Tome seu rumo e me deixe em paz! – exclamei exaltado
- Não antes de falar com você! – respondeu determinado
- Não temos nada para falar um ao outro! Saia da frente da minha casa se não quiser que eu chame a polícia. – ameacei
- Você vai me ouvir, por bem ou por mal! Chame a polícia, o prefeito, o presidente, o papa ou o caralho que você quiser, eu não saio daqui antes de falar com você! – devolveu obstinado. Destravei o portão e o deixei subir. Meus nervos já estavam um bagaço.
- Fale de uma vez e suma, sendo o mais breve possível. Você já acabou com a minha paciência! – afirmei quando ele entrou no loft.
- Oi Samuca, amigão! Sentiu saudades? – perguntou, enquanto o traidor do Samuca não parava de fazer festa para aquele patife, saltando ao redor de suas pernas. – Fala para o seu dono que eu estou arrependido do que falei, que estava com a cabeça cheia e que vim pedir desculpas. Mas diga isso com jeito, porque ele é danado de bravo. – ao ouvi-lo conversar com o cachorro e fazer carinho nele, precisei segurar o riso.
- Se você veio aqui para brincar com o meu cachorro, já brincou, e pode voltar por onde veio! – soltei, tentando ser o mais sério e impositivo possível.
- Eu vim te ver; para me desculpar pela grosseria que você não merecia e para te pedir para voltar aos treinos na academia; não é justo você se privar dos exercícios por minha causa. – disse ele
- Posso muito bem continuar treinando noutra academia! Assim você não terá que se preocupar com um gay dando em cima de você interessado na sua conta bancária. – revidei
- Caralho, como você é difícil! Desculpe, perdão, escusas, misericórdia, absolvição por tudo que lhe seja sagrado! Pisei na bola, reconheço! Fui uma besta, confesso! Mas, me dê uma chance, olha nos meus olhos e sinta que estou sendo sincero. – implorou.
Nem me atrevi a encará-lo, sabia que esse seria o meu fim, que capitularia diante daquele olhar que me fazia estremecer todo. Porém, ele não esperou pela minha iniciativa, tomou meu rosto entre as mãos e grudou afoita e forçosamente a boca contra a minha. O sabor dele fez bambear as minhas pernas, uma vez que toda masculinidade que ele me fez sentir na noite em que me possuiu se fez presente naquele beijo libidinoso. Sentindo que eu não resistia, ele foi me envolvendo, trazendo meu corpo para junto do dele, me assediando com a língua depravada que capturava a minha, descendo aquelas mãos enormes e vorazes pelas minhas costas até que se fecharam amassando minhas nádegas.
- Pode ir parando! O que você está pensando, que é só chegar aqui com essa cara deslavada, soltar meia dúzia de palavras melosas, me bolinar e tudo fica esquecido? Engano seu, meu amigo! Não sou nenhum desesperado por homens do seu tipo, se te interessa saber! – proferi, me desvencilhando dele.
- Teve o beijo! – retrucou
- O quê? – fiquei perdido com o que ele disse.
- Ao mencionar o que fiz com você, se esqueceu de mencionar o beijo que acabamos de trocar, e que você não tem como negar que gostou. – sentenciou sorrindo
- Você é abusado demais! Quem te disse que esse beijo teve qualquer importância?
- Seu corpo, que estremeceu nos meus braços, ficou quente e arrepiado! Sem mencionar a delícia do teu cuzinho apertado que deve estar piscando até agora! – asseverou o convencido, como se pudesse comprovar sua afirmação.
- Vai embora, Fabian!
- Não vou! Quero te mostrar como está a cicatrização do belo e dedicado trabalho que você fez. Também quero fazer outras coisas com você, agora que estou 100% recuperado, aquelas que fizemos naquela noite. – ele não tinha papas na língua.
- Eu devia te esganar, seu convencido!
- Mas não vai fazer! Sabe por quê? Porque você sabe muito bem que rolou muito mais do que apenas sexo entre nós naquela noite. Nós nos conectamos. Eu não consigo te esquecer, você vive no meu pensamento 24 horas por dia. Eu te quero, Felipe! – confessou. Eu tinha que admitir, sentia o mesmo por ele, por mais bizarra que fosse essa realidade.
- Você é um saco Fabian, sabia! – desabafei, sem ter como contra argumentar. – Tire essas roupas, estão encharcadas, vai acabar pegando uma pneumonia! Vou providenciar uma toalha. – intimei
- Vai ser sempre assim, toda que vez que eu vier a sua casa vai me mandar tirar a roupa? É bom saber que sente tesão em me ver pelado! – devolveu ele, com sarcasmo e rindo. Abri mão de responder, com a determinação que ele estava ficaríamos batendo boca por horas. Ademais, nisso ele estava certo, ele nu me deixava com tesão.
A cicatrização estava completa, ainda se via a cor da pele mais rosada e sem pelos na área oval com mais de um palmo de extensão que havia sido completamente escoriada quando ele deslizou sobre o asfalto. Fiz um esforço tremendo para focar apenas na cicatriz, mas estava difícil lutar contra a nudez do Fabian, aquele corpão viril, todos aqueles músculos, aquele cacetão grosso e cabeçudo, se assemelhavam e pequenos demônios me atiçando para o pecado. Ele percebeu o quanto seu dote cavalar me instigava, e divertia-se com minha introversão.
- Gostou? – a dupla conotação da pergunta era evidente, e resolvi provocá-lo.
- Gostei ... das duas coisas! – respondi sério. Ele riu.
- Pensei que fosse das três! – exclamou cheio de malícia.
- Ah, é verdade! As três estão lindas! – ironizei, entrando no joguinho pérfido dele.
- Você sabe que se continuar me falando essas coisas vou ficar de pau duro, depois não me venha acusar de ser convencido.
- Você já nasceu convencido!
- Fala sério, Felipe! Diz que me perdoa pelas coisas ofensivas que te falei. Aquilo escapou sem querer, eu estava puto com algumas coisas que estavam acontecendo na academia e descontei em você, foi isso. Se eu te contar a quantidade de clientes que ficam me dando cantadas só por acharem que tenho grana e posso ser um partidão, você ia ficar abismado. A maioria dos clientes que frequenta a academia está lá para caçar marido ou um macho bonito, não para cuidar da saúde. Com o tempo, a gente vai ficando sem paciência para aturar esse tipo de gente, faz pela profissão, faz pelo dinheiro que paga as contas e, acaba fazendo vista grossa para esses assédios. – revelou.
- Está bem, vá lá, está perdoado! Não vou ficar aqui perdendo meu tempo discutindo com você quem tem ou não razão. O que eu tinha para te falar já falei naquele dia, no momento em que me ofendeu. – retruquei
- Tô perdoado! Graças a Deus! Tô para conhecer um gay mais bravo que você. – afirmou rindo. – Mais bravo e mais difícil! A maioria deles fica se oferecendo, enquanto você compra briga com os homens. – emendou.
- É que vocês machões sempre se acham os alfas do bando, e no direito de espezinhar os menos valentes ou mais sensíveis, e isso me tira do sério.
- Você deve ter tido experiências ruins com esses tais “machões alfa” como você diz, mas se me deixar mostrar que não sou assim, talvez mude de opinião a meu respeito. – lançou, usando sua sensualidade.
- Por que quer que eu mude de opinião a teu respeito?
- Porque te acho um tesão e, depois do que fez por mim, um cara carinhoso e doce que está abalando as minhas estruturas. Quero te namorar, quero ser seu homem! – respondeu objetivamente. – Você despertou a minha atenção já nas primeiras vezes que foi a academia. Não tinha como não reparar no seu corpo, no seu rosto de garotão inocente, nessas coxas gostosas e lisas e nesse bundão tesudo que põem o caralho da gente numa agitação danada de boa. Não sei se você sabe, mas teve uma disputa entre os personal trainers, assim que botaram os olhos na tua bunda, para ver quem ia te treinar, todos só pensando em te enrabar. Quando o Eduardo ganhou a aposta, deu dois meses para meter a pica em você. Depois de mais de seis meses sem conseguir nada, a galera anda tirando o sarro dele, e você ganhou fama de difícil. Quem acabou dando sorte fui eu. – revelou ele
- E aposto que foi logo espalhando a proeza! – exclamei estarrecido, por saber que meu cu estava sob disputa.
- Não! Viu como sua opinião a meu respeito está equivocada, eu jamais revelo quem levei para a cama e com quem fiz ou faço sexo, é uma questão de retidão de caráter, de honra de macho. – retrucou com firmeza. – Namora comigo! Me deixa passar a noite aqui, estou louco para te conhecer a fundo. – continuou, com a voz mais melosa e libertina. – Eu sinto que você foi com a minha cara, que gosta de mim, mesmo que seja só um tantinho assim.
- Vou pensar no seu caso! Tudo bem, pode ficar. Até porque suas roupas não secaram. Mas, não vá criando ilusões de que vá rolar outra transa, ainda não sei se dá para confiar num safado feito você. – devolvi.
Ele veio me abraçar, colocou um beijo casto na minha testa e quis apostar comigo que eu não aguentaria nem um mês sem uma nova transa. Por precaução e tendo certeza quase absoluta que ele venceria a aposta, resolvi não comprar a briga.
Começamos a namorar. Ele assumiu meus treinos quando conseguiu me levar de volta para a academia. Passávamos frequentemente os finais de semana na casa de praia dele; e meu loft foi progressivamente acumulando seus pertences, no armário do closet, nas gavetas da bancada da pia do banheiro, nas prateleiras da estante da sala, quando não espalhadas pelos cantos indicando que estava se apossando do território tanto quanto já tinha se apossado do meu coração e do meu cuzinho. Faltava apenas ocuparmos o mesmo espaço e vivermos como um casal, mas para isso eu ainda estava relutante. A minha experiência anterior com o Kamel me deixou ressabiado, e temeroso de uma nova traição ou de outra desilusão amorosa, pois homens como o Kamel e o Fabian pareciam ter uma necessidade inata de serem recompensados por sua virilidade, procurando indefinidamente por suas presas; enquanto eu ainda não tinha desistido do sonho de viver uma romântica e intensa relação monogâmica com um parceiro fiel e carinhoso.
- Do que você tem medo? Por que não se entrega para mim por inteiro? – questionou-me ele, inesperadamente, numa noite pouco depois de nos deitarmos.
- Não tenho medo! Já me entreguei a você inúmeras vezes, não entendi o motivo dessa pergunta. – respondi.
- Tem medo sim! Você é muito carinhoso durante as nossas transas, eu adoro isso, mas sinto que você não está ali, naquele momento, em sua totalidade; o corpo está lá, mas sua alma, a essência de quem você realmente é, não está. – afirmou.
- Você está dizendo que eu não te amo?
- Não, não é isso, eu sei que me ama; mas você não se entrega a esse amor, tem alguma coisa que te bloqueia. – declarou. – Não sei o que os outros homens da sua vida fizeram para você para ter todo esse receio de se entregar para mim. Eu não sou como eles, não vou te machucar! – emendou, quando já estava todo dentro de mim, me beijando simultaneamente ao seu discurso.
- Está fazendo isso agora mesmo, meu cuzinho que o diga! – retruquei, com o cacetão dele estocando cadenciadamente minhas entranhas.
- Bem, esse tipo de machucado não tenho como evitar, mesmo fazendo com todo cuidado como estou fazendo agora, por você ser tão deliciosamente estreito e apertado. Você sabe a que tipo de machucado eu me refiro, e esse eu juro que nunca vou fazer. Eu te amo, Felipe! Jamais farei qualquer coisa para te magoar, para que deixe de confiar em mim e no quanto te quero. – não sei se sou tolo demais, mas eu acreditava sinceramente nele, embora tivesse acreditado tão piamente no Kamel e me dado mal.
Diante do dilema entre acreditar no que seus olhos apaixonados me diziam e o que proferia, preferi dar um voto de confiança naquele olhar e no beijo úmido e libidinoso que me fez gozar em sincronia com ele. Enquanto eu me esporrava o ventre, ele se despejava no meu cuzinho. Segundo a confissão dele, foi a primeira vez que eu me doei inteiro para ele, e agora ele tinha certeza do quanto eu o amava. Não me arrependi de ter confiado nele, cada dia que temos compartilhado tem me mostrado que aquele amor monogâmico com o qual sempre sonhei era possível, e eu o usufruía.