CAPÍTULO XX
*** EDUARDO PORTO ***
OS LÁBIOS DE JOÃO me devoram em uma conversa muda, mas que diz tanta, tanta coisa. Sua língua envolve a minha em carícias profundas e seu gosto domina minha boca. Nos seus braços, sendo tocado por suas mãos e, devorado por sua boca, finalmente, sinto-me em casa. O beijo dura uma eternidade e eu me apego a ela com tudo o que posso. Seus lábios abandonam os meus e cobrem cada centímetro do meu rosto de beijos, minhas bochechas, queixo, nariz, olhos, nada escapa.
Eu andava de um lado para o outro na sala, impaciente, preocupado com a demora dele em voltar para casa, em voltar para mim, estava tão aéreo, que somente quando a porta foi aberta, me dei conta de que aquilo pelo que eu vinha esperando, finalmente havia acontecido, João chegou. Me virei, buscando por ele com meus olhos e sendo completamente pego de surpreso com seu estado.
As roupas, antes, tão caprichosamente alinhadas, agora, estavam completamente largadas no corpo, os cabelos, uma completa bagunça, o lábio, cortado, um lado do rosto, avermelhado, e os olhos, pequenos e vermelhos, denunciando seu sono e cansaço. Porém, foi sua expressão que mais me assustou. Desespero, foi o que vi nela. Ele avançou em minha direção com verdadeiro desespero.
Não esperei, caminhei para ele, encontrando-o no meio do caminho e o que aconteceu foi tão natural, que nada mais poderia ser esperado, nossos corpos souberam exatamente o que fazer, se envolveram um no outro e nossos lábios se procuram. Nos beijamos.
− Ah, meu amor! Porra, Edu... - A voz baixa começa em um tom de preocupação, mas tanto quanto o alívio, a agonia fica evidente em sua voz.
− Me desculpa, me desculpa, João... Eu só... eu só precisava sair de lá... -justifico, afundando meu rosto em seu peito, circulando sua cintura com meus braços, apertando-o contra mim e sentindo-me relaxar. Seu nariz se perde em meus cabelos molhados e ele aspira meu cheiro profundamente: − Eu queria ter sido mais forte, juro que queria, mas eu não consegui, eu... eu só precisava sair de lá...
Suas mãos levantam meu rosto, obrigando meu olhar a encontrar o seu.
− Do que você está falando? Você é a porra do homem mais forte, mais incrível, que eu conheço, mas você me deixou desesperado, amor! Eu não sabia onde você estava, pra onde tinha ido...
Fecho os olhos e sua testa gruda na minha. Ele expira com força. Soprando ar morno sobre a minha boca.
− Eu não sei onde meu celular foi parar... Só me dei conta depois que cheguei em casa... E o telefone da Norma descarregou...
Sua cabeça se move lentamente, concordando, e seus braços descem pelo meu corpo, abraçando-me forte, apertando-me contra si, levo minhas mãos até seu rosto, acariciando a pele avermelhada, deslizo meu polegar pelo corte em seu lábio e ele faz uma careta de desdém, dizendo, silenciosamente, que não é nada.
− Ele ficou muito pior...
− Você parecia possuído...
− Eu te prometi que ninguém, nunca mais, ia te tratar diferente do que você merece, e eu lamento, Eduardo, eu lamento de verdade que eu não tenha conseguido impedir toda essa merda, mas assistir calado, isso eu não faria.
− Você não estava exatamente conversando...-Ergo as sobrancelhas, abrindo meus olhos, em uma careta de obviedade para ele.
− Alguns imbecis só entendem
certos tipos de linguagem... -Deito a cabeça em seu peito, ignorando o fato de que sua justificativa absurda me parece coerente.
− Me perdoa, meu amor! Me perdoa! -Pede, pegando-me de surpreso.
Seus dedos se infiltram em meus cabelos, e eu, mais uma vez, levanto o rosto, voltando a olhar para o dele. Agora, é ele quem cola a testa na minha, fecha os olhos, e Deus, eu amo esse homem, eu amo demais.
Um pigarro alto faz com que nos lembremos de que não estamos sozinhos, e, sem me soltar, João vira o pescoço e olha para trás, reconhecendo a presença de Norma e seu Newton. Deixo que meus braços caiam frouxos ao lado do meu corpo com a intenção de me desvencilhar de João Pedro, mas ele não permite, se move para trás de mim, cola seu peito em minhas costas e aperta minha cintura com os braços, eu deveria reclamar do quão inapropriado ele está sendo, mas tudo o que faço é deitar a cabeça em seu peito e, quando presto atenção em Norma, ela está sorrindo.
− Bem, crianças, acho que está
na hora de eu ir...
− Obrigado, Norma, muito obrigado... -Peço, querendo abraçá-la, porém, completamente preso pelos braços de João, que parece determinado a não me soltar, ergo os braços para ela, mostrando justamente isso, e Norma gargalha, achando graça do apego repentino e um pouco sem sentido do homem.
− Obrigado por cuidar dele pra mim... -João pede e deixa um beijinho em meus cabelos.
− Nos vemos segunda! -Norma se despede sorrindo, seu Newton acena com a cabeça, também vestindo um sorriso em seu rosto, e os dois passam pela porta, deixando-nos sozinhos. Expiro com força, aproveito o silêncio, a presença de João Pedro, seu corpo colado ao meu, a sensação de segurança, tudo. Sei que deveria perguntar o que aconteceu depois que saí, que deveria perguntar sobre seus pais e o que eles pensaram sobre tudo isso, mas eu não quero, não quero.
− Eu te amo... -sussurra em meu ouvido, embalando-me ainda mais em sua presença, em seu cheiro, em casa.
Viro-me em seus braços, acaricio seu rosto e me rendo aos seus olhos. Deixo que eles façam o que eles fazem de melhor desde a primeira vez que me viram, me tragar. Em silêncio, nos olhamos por muito tempo, uma lágrima escorre pelo canto de um dos meus olhos, mas, apesar de todo o caos em que essa noite se transformou, é de felicidade, e nada mais.
Felicidade, porque, mesmo com tudo o que aconteceu, eu ainda estou aqui. Não era um pesadelo, era a vida, difícil e inconstante, como sempre, mas, dessa vez, eu não estou sozinho para enfrentá-la e isso é tão bom, que é impossível querer ou impedir que a emoção transborde pelos meus olhos. Inspiro o cheiro de João, o cheiro de lar, o cheiro do lugar onde o meu coração está.
− Casa comigo? -Sua voz é baixa e lenta, seus olhos permanecem fixos nos meus sem nem mesmo piscar. A pergunta me assusta, não pela súbita quebra do silêncio, mas pelo que significa, interrompo nosso contato visual por alguns instantes e, quando o reestabeleço, aqueles olhos azuis ainda estão focados em mim, tão, tão... tantas coisas, que eu nem mesmo sei por onde começar a enumerar. Surpreso, afasto meu rosto do dele.
− O quê? -Minha voz é falha,
quase muda, mas ele escuta.
− Casa comigo, Eduardo? Seja meu, inteiro, pra sempre? Me deixa ser seu, inteiro, e pra sempre?
Abro a boca, completamente chocado, porque eu não ouvi errado. Percebo rapidamente que esse vai ser um daqueles momentos em que as vogais, consoantes, os adjetivos, verbos e substantivos correm da minha mente, deixando-me abandonado de coerência e, totalmente desprovido da capacidade de fala. João Pedro está me pedindo em casamento e o meu coração decidiu que agora era uma excelente hora para treinar sapateado. Ele não martela, agride ou retumba em meu peito, ele sapateia, pisoteando cada milímetro do meu interior, provocando beliscões e pequenos impactos que fazem eu me perguntar se estou infartando.
João Pedro me pediu em casamento. Santo Deus! Casamento.
Fecho a boca, abro-a outra vez, e fecho de novo. Não adianta, as palavras realmente me abandonaram.
− Eu vou continuar pedindo
todos os dias, até você aceitar e, talvez, até depois disso... -Sinto as lágrimas queimarem meus olhos, quero dizer que sim, mas sei que devo dizer que não. A noite foi péssima, mas isso não é motivo para nos casarmos. Vai passar, tudo passa, já está passando...
− Eu sei o que você está pensando... -lê meus olhos, como sempre: − Mas você está errado... Eu não estou fazendo isso por culpa, ou, porque tivemos uma noite ruim. Eu tô fazendo isso porque nunca senti tanto medo na vida, quanto quando não encontrei você, Edu... -Suspira e balança a cabeça para os lados, negando. A agonia que seus olhos vestiam assim que pisou em casa, volta a aparecer em seus olhos, deixando claro o nível de verdade existente em suas palavras: ̶ Eu fiquei apavorado com a ideia de que você tivesse fugido de mim, desesperado com o simples pensamento de que eu poderia ter te decepcionado. -Sua testa cola na minha, arrastando seu olhar para ainda mais perto do meu, dando a ele ainda mais espaço para consumir-me por completo.
− Eu te amo, Eduardo... E, até você chegar, eu não fazia ideia do que isso significava... Mas, agora, eu sei... Eu sei que amor é a felicidade que toma conta de mim todos os dias nos últimos dois meses quando acordo, e você tá ali, do meu lado. Eu sei que amor é a sensação completamente arrasadora que me inunda todas as vezes que eu tenho você assim, nos meus braços.
̶ Eu sei, meu bem, que amor é querer me perder nos seus olhos, mesmo que eles façam exatamente isso comigo, Edu, façam com que eu me sinta perdido em meio a tanta coisa que me dizem e mostram. Eu não sou perfeito, meu amor, porra! Eu não sou! Eu já te disse uma vez, e vou repetir, eu vou fazer merda, como fiz essa noite, colocando minha raiva na frente da minha preocupação com você! E mesmo que você não me cobre isso, eu sei que quebrei minha promessa, e, ao invés de me afastar, você confiou em mim, você voltou pra nossa casa! Porra, eu quase enlouqueci, achando que você tinha fugido de mim, e o alívio, o alívio que eu senti quando vi o carro da Norma estacionado na calçada, eu nunca senti nada parecido, porque eu nunca quis nada nesse mundo, como eu quero dividir a minha vida com você...
Fico em silêncio, absorvendo suas palavras, absorvendo o fato de que ele está dizendo todas as coisas certas. O sapateado em meu peito tornou-se ainda mais intenso, agora, meu coração decidiu incorporar ginástica artística aos seus movimentos e, dá também, saltos e cambalhotas a cada palavra que ouve, alongando-se, esticando-se, pronto para gritar que sim, aceita, no exato instante em que as palavras decidirem acabar com sua corrida noturna e retornarem aos meus lábios. O silêncio se estende entre nós, mas eu não faço nada por ele, não posso, não consigo.
Quando percebe que eu não vou falar nada, ele recomeça.
− Eu aceitaria qualquer coisa que você me desse, Eduardo. Se, essa noite tivesse terminado diferente, eu teria procurado por você em cada canto desse maldito planeta, e te daria o que você me dissesse que era necessário pra ficar tudo bem... -Seus polegares acariciam minhas bochechas, sua expiração sopra meus lábios e, a essa altura, muitas outras lágrimas já se juntaram à primeira que escorreu pelo canto dos meus olhos.
− Se você quisesse espaço, se fosse isso o que você precisasse, tudo bem! Eu daria pra você, amor! Eu dormiria na janela do seu quarto, te observaria do outro lado da rua, eu te olharia de longe pelo tempo que fosse necessário... Eu imploraria pra não fazer isso, mas, se fosse o necessário, eu faria... -Sua boca está... tão perto... tão perto... que quase sinto seu sabor a cada vez que ela abre e fecha: − Eu
imploraria. Imploraria, porque, se eu mal pude suportar quando você me afastou antes de eu te amar, agora, isso me mataria aos poucos, eu sei que sim... -E acontece, as lágrimas rolam, mas não é dos meus olhos que elas saem, são dos de João. Ele chora...
Nunca, em momento algum, em todo o tempo que o conheço, imaginei que veria João Pedro Govêa chorar, e, se em algum surto criativo ou de loucura o pensamento tivesse atravessado minha mente, eu jamais ousaria sequer sonhar que seria por minha causa. Alcanço seu rosto com minhas mãos e seco suas lágrimas.
− Eu tô com medo... -Minha voz é quase um sussurro: ̶ E se você acordar amanhã, daqui a um mês, um ano, e se arrepender disso, achar que foi uma escolha impensada? -Ele balança a cabeça, negando, vira o rosto e beija a palma da minha mão que está segurando sua bochecha.
− Eu sei que não faz sentido prometer manter promessas, mas eu te garanto, Eduardo... Eu ainda vou errar muito durante a nossa caminhada, eu não tenho dúvidas, eu vou... Mas, eu nunca mais vou deixar você sozinho... Eu sempre vou estar aqui... Casa comigo, Eduardo... Me deixa ser a sua casa? -Não é um pedido, é uma súplica, e enquanto meu coração se dedica a um número cada vez maior de esportes para lidar com a carga de emoções que recebe, minha mente sente-se uma expectadora, como se tudo isso não estivesse acontecendo com ela. Simplesmente não consegue acreditar que tudo isso está sendo dito para ela.
− Deixa a minha mãe surtar e gritar pro mundo inteiro que você vai ser o genro dela? Me deixa sorrir feito um idiota, imaginando você no altar? Me deixa conhecer sua mãe e dizer que ela criou o homem mais especial desse mundo inteiro? Me deixa te amar como você merece e passar o resto da minha vida tentando ser digno de ser amado por você? Em, Edu? Deixa? -Aproxima o rosto do meu a cada pergunta, terminando com a boca colada na minha, esperando pela minha decisão.
E, entendendo que o amor não é um salto, é uma sequência deles. Entendendo que o amor não é abrir mão do medo e nunca mais temer, é ter certeza que sentir medo vale a pena, e confiar que a pessoa que você escolheu amar nunca vai deixar que ele se transforme em realidade. Entendendo que o amor é mais, muito mais do que uma medida que cabe num copo, numa xícara, ou num balde, o amor transborda e falha. Entendendo que ele é tudo, e que o risco de ficar sem nada é muito pequeno, quando comparado a tê-lo, eu salto. Pulo, de braços abertos, aproveitando a queda, e sabendo que, em algum momento, próximo ou distante, eu vou sentir o chão muito perto, mas que vai estar tudo bem, desde que seja apenas a sensação, e nunca o impacto real.
Beijo João Pedro. Beijo sua boca completamente entregue. Dizendo sim para cada um de seus pedidos, aceitando todas as suas promessas e fazendo as minhas próprias. Prometo errar, prometo nunca fugir, prometo escolhê-lo todos os dias, prometo pular todas as vezes que forem necessárias, mesmo que o próximo vão me apavore. Prometo ser inteiramente meu, para poder me tornar verdadeiramente dele. Prometo amá-lo intensamente, vivendo o significado de cada vogal, consoante e sílaba que forma a palavra em nada menos do que plenitude.
João Pedro me pega no colo pela segunda vez em menos de vinte e quatro horas. Seus passos são lentos, mas não vacilam nem uma vez sequer enquanto caminham até nosso quarto, e sua boca não deixa a minha nem por um instante.
Ele me coloca no chão, seus braços circulam meu corpo e puxam-me para si, eu vou. Deslizo as mãos pelo seu rosto, pelos seus ombros, até alcançar seu tórax e começar a desfazer os botões de sua camisa. Sua língua dança dentro da minha boca, saboreando cada cantinho por onde passa, movendose junto à minha e provocando-me inteiro com a habilidade de sempre, mas que hoje, parece determinada a significar muito mais. Suas mãos alisam cada pedacinho meu que conseguem tocar.
Empurro a camisa aberta para
fora de seu corpo, deixando seu torso nu. Toco sua pele quente com meus dedos, deslizo-os por seus ombros, costas, braços, até alcançar o peitoral forte. Interrompemos o beijo para respirar, e eu mantenho minha boca aberta na sua, arfando, necessitado de ar de um jeito completamente diferente do que aconteceu mais cedo. As mãos de João tiram minha roupa, deixando-me quase completamente nu. Seus olhos me aquecem quando descem pelo meu rosto, pescoço, peito, barriga, chegam ao meu sexo e continuam a carícia lenta, sensual e provocante até alcançarem meus pés e refazerem exatamente o mesmo caminho, agora, ao contrário.
− Eu nunca vou me cansar de dizer o quanto você é lindo... -Começa a dizer quando seus olhos estão subindo pelas minhas pernas e termina quando eles alcançam meu olhar: − Eu quero ouvir você dizer, Eduardo...
− Que você é o homem mais lindo do mundo? -pergunto enquanto meus dedos passeiam pelas veias saltadas dos seus braços, e João estreita os olhos para mim, fazendo um bico inacreditavelmente fofo em um homem desse tamanho.
− O que você ainda não disse em
voz alta... quero ouvir, Edu... -Me puxa, espremendo meu peito nu em seu peito, colando a testa na minha, esperando.
− Que eu te amo mais do que achei que era possível amar alguém? Lambo seu lábio e ele chupa minha língua: − Que eu nunca fui tão feliz na minha vida inteira, e que foi você que me ensinou como chegar até aqui? sussurro, acariciando seu rosto com a ponta do meu nariz.
− Ou, que sim? Eu me caso com você? -O sorriso que toma conta de seus lábios ilumina o quarto inteiro, que ainda tem todas as luzes apagadas. Sua boca desce sobre a minha como se minhas palavras tivessem libertado toda a sua fome e necessidade, mas seu beijo não faz com que eu me sinta apenas devorado, faz eu me sentir cultuado, adorado, amado, sobre todas as coisas, faz meu coração, que já tinha parado de dançar, rebolar e saltar, ser afundado em uma quantidade tão grande de amor, que acho que ele jamais será capaz de voltar a superfície, e não há nada no mundo que eu queira mais do que mantê-lo eternamente submerso.
O desejo borbulha em mim, transformando-se em uma necessidade exigente, latente, desesperada, nesse momento, eu não quero a pele de João sob meus dedos, sua boca na minha, ou seu corpo enterrado no meu. Eu preciso de todas essas coisas. Minhas mãos agarram seu cinto quase de maneira autônoma, desfazendo-o, e, logo depois, desabotoam sua calça, ansiosas por deixarem-no tão nu quanto eu estou. De costas, sou conduzido até a cama, sento-me nela e, infiltrando meus dedos nas laterais de suas roupas, abaixo sua calça e cueca de uma vez, agradecendo aos céus por seus sapatos terem ficado largados em algum lugar.
João se desfaz do que não consigo, arrancando as últimas barreiras entre nossas peles, incluindo a minha cueca, que é arrancada de mim sem nenhuma calma. Volto a me levantar, e, agora, sem absolutamente nada entre nós, o toque de nossos corpos quentes reverbera por cada pedaço meu, eletrificando até mesmo meu sangue, se é que isso é possível. Sinto sua ereção gostosa e dura apontando em minha barriga e cheiro seu pescoço. Suas mãos agarram meus quadris, erguendo-me. Cruzo as pernas em sua cintura, lambo seu peitoral duro, definido, tão absurdamente gostoso.
Arrasto minha boca por ele, lambendo, chupando, mordendo enquanto suas mãos apalpam e apertam meu corpo. Uma delas agarra os cabelos de minha nuca, puxando-os e obrigando-me a encontrar seu olhar com o meu.
Palavras não são necessárias, a imensidão azul contida por baixo de suas pálpebras me diz tudo o que eu preciso saber, brincamos depois. Sou arremessado no colchão macio, e o peso do seu corpo sobre o meu é tão delicioso quanto nada nesse mundo nunca foi. Ofego com sua boca grudada a minha, João Pedro se remexe, levanta o quadril e, logo eu sinto seu pau duro, encaixando-se em meu buraco, gemo antes mesmo de qualquer coisa acontecer, apenas pela expectativa.
Meu peito, já ofegante, sobe e desce, colado ao de João, assim como nossas testas, narizes e bocas. Com os olhos completamente abertos, João me penetra em um único impulso e eu grito, invadido, preenchido, completo. Ele sai de dentro de mim e, outra vez, investe com potência, arrancando mais um grito do fundo da minha garganta, antes de começar a se mover devagar.
Lentamente, entra e sai de mim várias vezes, gostoso, agora, preenchendo-me de novo e de novo, não permitindo sequer que eu tenha a sensação de estar vazio.
− Que delícia amor, que delícia... -Gemo em sua boca, incapaz de me impedir, e seus olhos, que me invadem a alma enquanto seu corpo toma conta do meu, jamais se fecham, jamais deixam os meus se fecharem.
− Casa comigo mês que vem? - pergunta e, de repente, mete fundo e forte, me tirando da cama e arremessando no espaço. Grito seu nome, pelo choque, pelo prazer, por tudo.
− Casa comigo mês que vem? - a perguntar, e reestabelece o ritmo lento e contido, mergulhando-me em uma agonia ímpar. Eu sou só gemidos, desesperados, agoniados, pedintes e implorados. Suas investidas nunca param, João mete em meu cuzinho em um ritmo inconstante que me faz delirar, seu pau desliza por ele, se lambuzando e me enlouquecendo.
Os sons do nosso sexo inundam
o quarto, nossas respirações ofegantes, seu pau sendo recebido pela minha excitação, nossos quadris se chocando... No fundo da minha mente, seu pedido flutua, mas envolta por tanto prazer, sou incapaz de formular qualquer resposta.
− Casa comigo mês que vem, Eduardo? -Pede outra vez, e, agora, para.
Para de se mover, deixando-me pendurado por um finíssimo fio de prazer. Minha consciência, longe de mim, me alerta sobre a loucura que a palavra ansiosa para saltar de minha boca traduz, mas os olhos, aqueles olhos.
Azuis. Azuis e limpos como o céu claro no fim de uma tarde de verão. Azuis. Azuis e tempestuosos como as águas translúcidas dos mares mais bonitos. Azuis. Azuis e brilhantes como as estrelas, que reluzem no céu noturno, absorvendo a escuridão e iluminando-a ao mesmo tempo. Azuis. Azuis e devoradores como o fogo, que extingue gás, incendiando-o e consumindo-o.
São eles que me dizem que eu não preciso ter medo de nada. Porque como um dia me disseram que me queimariam de desejo, hoje, me garantem que me queimarão de amor.
− Caso. -Ele me beija, me invade, grunhe, e eu gozo.
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DEUS, O QUE HÁ entre espelhos e eu?
Outra vez, meu próprio reflexo me assusta. Até mesmo a minha pele, sempre pálida, parece ter ganhado um brilho que eu nunca vi antes, talvez tenha sido o dia no spa, ou, talvez, seja apenas felicidade.
O terno branco é simplesmente perfeito. Mal posso acreditar que o encontrei em tão pouco tempo. Em duas semanas, para dizer a verdade. Sorrio, tudo isso é uma loucura, uma absoluta e completa loucura. Eu vou me casar. Em cinco minutos, eu vou me casar, com João Pedro Govêa. Pai do céu!
Diante dos meus olhos, as cenas de tudo o que nos trouxe até aqui se desenrolam. Uma conversa boba ao celular, um e-mail idiota enviado pela internet roubada do meu antigo vizinho, a entrevista na Govêa, meu primeiro encontro com João, meu desespero ao constatar a razão de eu estar ali, minha fuga, João me encontrando, nosso primeiro beijo, tudo o que vi em seus olhos ainda naquele segundo dia, seu toque, e então, o que mudou tudo. Seu Josias, meu despejo, a mudança, e aqui estamos nós.
Braços envolvem minha cintura, despertando-me dos meus próprios pensamentos. Foco meu olhar no espelho e encontro minha mãe, ela está tão bonita. Seus cabelos longos e escuros estão soltos em cachos pelos ombros, o rosto tem uma maquiagem leve, e seu vestido azul realça a cor dos seus olhos. Sorrio para ela, e seu queixo é apoiado em meu ombro.
− Você é o noivo mais lindo que
eu já vi na vida...
− Isso é porque você é minha mãe...
− Não, isso é a verdade. -Inclino a cabeça, encostando-a na dela.
− Tem certeza de que quer fazer
isso? -pergunta, e eu sorrio.
− Tanto quanto tenho de que me chamo Eduardo. -Seus braços se apertam ao meu redor e ela espelha o sorriso em meu rosto.
− Tudo bem, eu sabia, mas precisava perguntar. Você parece tão feliz, meu filho...
− E eu sou mãe... Eu sou... -Uma lágrima intrometida se oferece para ser derramada, mas eu a seco antes que isso aconteça, e minha mãe faz o mesmo com as suas, impedindo-as de cair também. Nós dois rimos, e Joana entra no quarto, avisando que está na hora.
Minha mãe me solta e eu respiro fundo. Puxo o ar com força pelo nariz e solto-o pela boca enquanto meus olhos vagam sem destino pelo quarto do hotel. A suíte presidencial, é claro.
E não porque eu quis, mas porque João Pedro se recusou que ficasse em qualquer outro quarto. “Para o seu amor, somente o melhor!” Disse definitivamente e tudo o que fiz foi revirar os olhos, mas, no meu íntimo, aquele cuidado sacramentou ainda mais meu amor por ele.
Não é pelo custo, ou pelo dinheiro, que ele insiste em dizer que é nosso. É pelo desejo de cuidar de mim, expresso em cada palavra que sai da sua boca, em cada toque, gesto ou vontade minha que ele faz, e, para mim, isso é tudo.
Há um mês atrás, se alguém me dissesse que hoje eu estaria aqui, eu gritaria louco bem alto. Gargalharia, debocharia, faria de tudo para deixar claro o quanto essa ideia soava absurda. Mas, agora, não há nenhum outro lugar em que eu queira estar, mesmo que isso seja apavorante. Deus! Eu vou fazer isso! Eu vou me casar.
Espio pela janela o gramado, lindamente decorado com flores lilases e brancas. Cadeiras ornamentadas estão organizadas em um círculo, de maneira que todos os nossos poucos convidados ficaram ao nosso redor, e não atrás de nós. No centro do círculo, há um pequeno altar onde o Juiz de paz já aguarda.
Procuro João com os olhos, mas não o encontro, deve estar a postos para fazer a sua entrada. Meus olhos encontram seus amigos, aqueles amigos, daquela que fez de tudo para se tornar a pior noite da minha vida, mas acabou com a melhor e mais bonita delas, porque foi quando eu disse sim para uma vida inteira de felicidade ao lado do homem da minha vida.
Leonardo e Gabriel estão em uma roda de outros homens, alguns eu conheço, outros não. Mas é o rosto de Marcos que chama a minha atenção. Arrasado. Ele parece arrasado. E não é por causa do nosso casamento. No fim de tudo, ele não é uma má pessoa.
Depois de muito insistir, João finalmente deixou que ele falasse comigo, me pedisse desculpas e se explicasse.
Ele realmente havia bebido demais naquela noite, e pior, bebeu para esquecer dos próprios problemas, o que só o deixou mais alterado e propício a fazer besteiras. Não acho que ele seja meu maior e fã, e ele também não disse isso. Mas acreditei quando ele disse o quanto sentia por toda a situação a que tinha exposto João e eu.
Perdoei. Mágoa faz mal para a pele e para o coração. João Pedro já não mostrou tanta disposição. Foi preciso muita insistência da minha parte para que ele entendesse que agora não era hora para birra, porque eu sei que ele se arrependeria pelo resto da vida se não tivesse o melhor amigo ao seu lado justo no nosso dia.
Se ele quisesse castigar Marcos, que o fizesse depois do casamento e da lua de mel, mas, eu, sinceramente, acho que toda a situação que ele está vivendo, para alguém como ele, é castigo para os pecados de uma vida inteira. Mas bem, isso é uma história para outro momento, não agora. Essa é a minha história, esse é o meu dia.
Jo aperta a minha mão, antes de se virar e sair do quarto. Minha mãe prende uma flor, juntos, caminhamos até o elevador, e, finalmente, chegamos à porta atrás da qual João me espera.
O casamento é muito maior do que eu achei que seria, tendo sido planejado em tão pouco tempo. Julia quase surtou quando anunciamos, de felicidade, e de ansiedade, afirmando que não daria tempo de fazer tudo, mas, de alguma forma, deu. O hotel na região serrana de São Paulo é lindo, perfeito, e, o gramado onde a cerimônia e festa serão realizados, parecem ter saído dos meus sonhos.
Uma última vez, meus olhos encontram os da minha mãe, que segura minha mão, e que me entregará a João.
Aceno com a cabeça para a cerimonialista, ela sorri para mim, a música soa, as portas se abrem, e então, eu o vejo.
Tudo some, menos ele.
Eu não vejo o gramado, não vejo os convidados, não vejo as cadeiras, as flores ou a decoração que escolhi, só vejo seus olhos. Aqueles mares, aquelas chamas, aqueles céus. Tempestuosos, quentes, limpos e claros. Azuis. Azuis como hoje é o meu coração, todo e completamente seu.
Uma voz melodiosa canta a música que escolhi assim que ouvi, porque soube que nenhuma outra traduziria tão bem a realidade desse amor. A música que conta a nossa história, porque no momento em que o vi tudo mudou e eu tive certeza, certeza de que era ele.
Ele, arrogante, mandão, cheio de vontades e que com seus infinitos termos inegociáveis me trouxe paz. Ele, que mesmo quando eu duvidei, me achou capaz. Ele, que me fez querer não apenas não estar sozinho, mas me fez querer amar e ser amado. E foi esse amor, que no meio de tanta gente que não sabia para onde ia, quando nós dois estávamos perdidos, ignorantes do verdadeiro significado da palavra paz, ainda que a buscássemos todo dia, nos resgatou.
Foi esse amor, que em um mundo caótico, cheio de pessoas, problemas, besteiras, medos e coisas grandes e pequenas que podem impedir nossa felicidade, impedir que a gente descubra e agarre a imensidão que é a vida, ainda assim, fez a gente se encontrar por causa de um e-mail estúpido, e então, finalmente, respirar.
Ao olhar para o homem que me espera no fim do corredor, ao ser tragado pelos seus olhos e, ao invés se me sentir menor, me sentir maior, inteiro, incrível, entregue, as mesmas certezas que eu tive da primeira vez que os vi, me inundam. A certeza de que é ele que me fará queimar. De amor e de muitas outras coisas.