Oi, pessoal. Passando pra desejar um ótimo domingo e tenham uma boa leitura.
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JIMMY
Eu não estou bem. Meu estômago está doendo há alguns dias. Além disso, o Ethan age como se eu não existisse. Que merda de vida. Mas eu não posso me deixar abater pelos problemas — o jogo de abertura da temporada está chegando e não há espaço para erros.
A aula de química parece interminável. O Trevor é meu parceiro de laboratório — é a única matéria que temos juntos. Nunca vou entender esse sistema que nos coloca com pessoas aleatórias todo ano.
— Cara, você está bem? Parece que viu um fantasma. — Comenta Trevor, tirando uma foto minha e mostrando.
— Estou cansado, mas estou bem. — Minto, algo que virou minha especialidade.
— Qual é, Jimmy. Eu sou seu melhor amigo. Você está sentindo de tudo, menos bem. — Ele segura meu ombro, e meu corpo estremece.
Apesar de próximos, Trevor e eu nunca tivemos conversas profundas. No máximo, eu o apoiei quando os pais dele se divorciaram ou no dia em que aquele filho da puta quebrou o braço direito. Eu desenhei um pinto no gesso.
A dor é aguda e me faz suar bastante. Eu preciso ser forte para o jogo. O time conta comigo, e a partida inicial vai ditar o tom da temporada. No ano passado, fizemos uma bela campanha, mas perdemos para o time da Escola Craven. Bastardos.
No treino, dei o meu melhor. Acertei todos os passes e não peguei leve com a equipe. Mas fiquei tonto duas vezes e quase desmaiei. Quando cheguei em casa, fui direto para o quarto e dormi sem nem tomar banho.
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ETHAN
Que missão difícil. Estou longe do Jimmy há alguns dias. Ele aparece em todos os lugares onde eu vou, mas sempre dou um jeito de evitá-lo. Desde aquele dia na escada, meu coração tem tido dificuldade para se concentrar.
Passei a ajudar meu pai nos cultos. Fiquei responsável por limpar a igreja antes da chegada dos fiéis. Aproveito para fazer uma renda extra e, quem sabe, conseguir pagar o passeio para a Yellow Groove, que vai acontecer no próximo mês.
Para evitar cruzar com o Jimmy, comecei a seguir um caminho alternativo — justamente onde os alunos mais descolados costumam ficar, bebendo e fumando, diga-se de passagem. No meio de tantos rostos, vi a Bettany, tragando um cigarro diferente.
— Ei, nerd! — Ela grita, chamando a atenção de todos. — Você fez o dever de biologia?
— Eu?
— Tem outro nerd aqui? — Ela retruca, antes de jogar o cigarro no chão e pisar nele.
— Vou para a biblioteca. Quer vir comigo? — convido. Ela pode ser a desculpa perfeita para evitar o Jimmy.
No corredor, todos nos encaram. Essa sensação é horrível. O nerd e a rebelde sem causa — pelo menos, acho que é sem causa. Esbarramos com o Jimmy na entrada da biblioteca, mas, graças a Deus, a Bettany o afugenta.
A relação com meus pais não melhorou, mas, pelo menos, eles pararam com o assunto "garotas". Eu não aguentava mais a mamãe tentando me arrumar possíveis namoradas. Esse não é o meu foco no momento, e, aparentemente, ela entendeu.
As sessões com a psicóloga da escola também estão seguindo com regularidade. Será que ela conta tudo para o meu pai? Até onde sei, existe um código de ética entre paciente e terapeuta. De qualquer forma, não mencionei nada sobre o que aconteceu entre mim e o Jimmy. Esse erro não vai se repetir. Nunca mais.
Não vou ser hipócrita: de vez em quando, ainda o observo no campo de futebol. Meu colega é imparável. Todo o time se une para protegê-lo, permitindo que ele tenha um bom desempenho nas partidas. Ele é um cara grande, mas, ao mesmo tempo, tão calmo e pacífico.
Tá bom, Ethan. Esses pensamentos não vão te levar a lugar nenhum. Preciso focar nas coisas que realmente importam — como o trabalho na igreja ou a missão de juntar dinheiro para a viagem à Yellow Groove.
A rotina escolar é tranquila. A qualidade da educação nem se compara à da minha antiga escola. Se tem algo de que meus pais não podem reclamar, é da minha vida acadêmica. Fiz alguns colegas, mas prefiro manter certa distância. Não quero me envolver em dramas adolescentes no meu último ano.
— Livro bacana? — Pergunta uma voz familiar.
— Algo que deve passar longe da sua estante — Comento, num tom mais ríspido do que eu gostaria.
— Uau. Ele tá violento. — Brinca Jimmy, abrindo um sorriso.
— Olha, Jimmy... — Eu ia pedir um tempo para ler, mas percebo que ele está com uma expressão horrível. — Você está bem?
— Só treino. Vida de atleta — Responde ele.
— Tá mais pra um fantasma. Tem certeza de que está bem? — Insisto, embora não queira me envolver.
— Eu tô ótimo. — Ele garante, antes de desmaiar na minha frente.
— Jimmy! — Deixo o livro de lado e me abaixo. — Para com isso, cara. Jimmy — Toco em seu rosto, que está pegando fogo.
A biblioteca está vazia, então corro até a enfermaria para avisar o que aconteceu. Com a minha ajuda, o Sr. Collin leva Jimmy até lá. A enfermeira se impressiona com os 39 graus de febre do meu colega.
Não há outra opção. Ela chama uma ambulância e, quando percebo, estou a caminho do hospital da cidade. Jimmy parece um morto-vivo, e há um hematoma enorme em seu abdômen. Ao chegarmos, uma equipe o coloca em uma maca, e ele desaparece de vista.
Para um atleta, Jimmy é muito descuidado com a saúde. Como ele deixou os sintomas piorarem tanto? Não faz sentido. A enfermeira Collin está ao meu lado, mantendo a direção da escola informada sobre a situação.
Não demora muito e o treinador entra feito um foguete. É um homem corpulento, quase causa uma confusão na recepção. Nós três — eu, o treinador e a enfermeira — nos sentamos lado a lado, esperando por notícias.
Vou até a máquina de salgadinhos e pego qualquer coisa só para enganar a fome. Quando volto, o médico está conversando com o treinador e a enfermeira. Jimmy sofreu uma laceração no baço. Todos ficam surpresos. O treinador se culpa e pede para falar com meu colega.
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JIMMY
Eu perdi meu baço? Puta merda. Fiz várias perguntas ao médico, que até foi paciente comigo. Estou deitado em uma cama, vestindo apenas uma bermuda. O frio começa a tomar conta do meu corpo. A equipe do hospital tentou entrar em contato com o "pai do ano", mas não conseguiu. O treinador Stuart ficou comigo o resto da noite.
— Com licença...
— Ethan? — Pergunto ao ver meu colega parado à porta.
— Eu... eu só queria saber se está tudo bem. A enfermeira Collin já foi e...
— Entra. O treinador Stuart foi em casa e já volta. Pode me fazer companhia nesse meio-tempo, que tal? — Convido. — Ah, a enfermeira disse que você me salvou. Obrigado.
— Só retribui o favor. — Afirma Ethan, sentando-se em uma cadeira ao lado da cama. — O que aconteceu?
— Baço. Virou uma omelete. — Brinco, mas, ao tentar rir, sinto uma fisgada no estômago.
— Isso não tem graça, James. O médico disse que você teve sorte. — Diz Ethan, lembrando das palavras do médico.
— Tá preocupado comigo — Brinco, e Ethan revira os olhos. — Que bom. Não foi nada, Ethan — Falo, mas ele não acredita.
— E esses hematomas aí? Não são de treinamento. Fala logo o que está acontecendo...
— Tá tudo bem? — Pergunta meu pai ao entrar no quarto.
— Pai! — Exclamo, me ajeitando na cama. — O que está fazendo aqui?
***
ETHAN
Problemas com o pai? Aqui temos. O Jimmy muda de postura ao ver o pai. Ele meio que se encolhe todo. Na época da escola, quando descobriram que eu era gay, um grupo de meninos passou a me agredir. Os hematomas permaneciam no meu corpo por dias. Eu sei reconhecer um hematoma de agressão quando vejo um.
Além disso, não senti uma energia positiva vindo do Sr. Robinson. Ele é um homem estranho e não me transmite nenhuma confiança. Eu prometi que não ia me envolver nessa história, mas ao ver a feição do Jimmy — assustado e amedrontado — algo muda dentro de mim. Só não sei se é a coisa certa. Bem, isso só o tempo dirá.
Estou lendo uma obra que retrata um adolescente detetive. Eu sou um ótimo observador, então tenho certeza de que posso ajudar o Jimmy. Meus pais podem me prender de diversas maneiras, mas nunca encostaram um dedo em mim. Inclusive, preferiram se mudar de cidade a me fazer mal de alguma forma. Eu sei que uma coisa não anula a outra — eles continuam sendo preconceituosos.
As sessões de terapia são um saco, porém, decidi viver um personagem e espero que o psicólogo do colégio caia na armadilha. O Jimmy continua de molho em casa, por isso, passo na frente da casa dele. As luzes estão sempre apagadas à noite.
Se eu me aproximar, ninguém vai perceber, né? Acho que sim. Vou me esgueirando. Um verdadeiro detetive. Caminho lentamente na direção da janela da sala, porém meu pé pisa em um graveto seco, e o barulho desperta os cachorros da vizinhança.
— Misericórdia. — Digo, correndo na direção da casa ao lado da do Jimmy. No desespero, me jogo no arbusto. — Será que alguém me viu?! —Questiono, ofegante.
— Com essa delicadeza de um elefante? O bairro todo te viu. — Comenta uma mulher asiática, que segura uma xícara de café e me observa com atenção.
— Desculpa, senhora, eu...
— Sem desculpas, garoto. Já liguei para a polícia. Sabia que bisbilhotar a casa dos outros é crime? — Ela pergunta, e meu coração acelera de nervoso.