Não lembro como ou quando isso tudo começou. Esse sentimento estranho, errado...
O amor que muitos rejeitam e enxergam como doentio, mais uma dos muitos tabus hipócritas da nossa sociedade doente.
Mas quem sou eu para julgar? Posso ser facilmente considerado um maldito doente, um completo psicopata, isso tudo apenas por amar uma pessoa indevida.
O sentimento começou com amor inocente incondicional, passou para admiração, paixão sonhadora, até que cheguei ao ponto de tocar meu corpo ao imaginar seus músculos me cercando, sua voz sussurrada em meu ouvido. Sei que nunca terei isso, já que é doentio:
— Terra, chamando Gael! — meu melhor amigo, Hélio me chama estralando seus dedos em frente ao meu rosto. — Nossa, estou tem um "tempão" aqui te chamando e você não me deu bola...
— Foi mal, Hélio. Estava falando de qual garoto do time? — Faço um movimento com a cabeça indicando a quadra de futebol da nossa escola.
— O Tadeu, aquele gostoso! — afirmou com os olhos brilhando de paixão, afinal, ele sempre foi apaixonado pelo Tadeu. — Ontem ele ficou me encarando, no intervalo.
— Tenho quase certeza, de que ele fez isso por causa daquela sua calça esquisita que você usou ontem. A forma como você ataca a moda, chega a ser visualmente gratificante.
Ele revirou os olhos:
— Sem um pingo de paciência para seus comentários sobre meus modelitos — ele mordeu o lábio inferior. — Olha o corpo daquele safado! Estou louquinho para sentar nele. Esse ano, ele não me escapa.
Até por quê, estamos no último ano da escola. O ensino médio foi degradante, tirou nosso sono e paz. Ah, mas é o ensino médio... Falam isso por quê não estudam em uma merda de escola particular que cobra uma média oito para passar nas matérias.
Estou passando sérias dificuldades em filosofia e ética. Não por que eu sou burro ao ponto de não saber nada, mas sim por que me dá preguiça só de me imaginar fazendo tal atividade. Aquelas perguntas ridículas, muitas das vezes retóricas, óbvias ou quais as respostas são tão desnecessariamente vagas, que me deixam sem graça.
— Gaelzinho, aquela com sua irmã, não é a sua mãe?
— Por todos os deuses quais eu não acredito, espero que não seja! Puta que me pariu, é ela mesmo!
Minha mãe é uma vagabunda. Digo isso sem medo de ser grosso, pecar ou estar caluniando. Hoje, ela vive se atracando com os drogados do bairro dela, não por necessidade... Na verdade, por necessidade de trair o marido dela. Lembro de quando a pegaram fazendo um boquete em um mendigo, foi o maior barraco.
E agora ela está ali, vestindo suas roupas cafonas e falando animadamente com minha irmã, que tem um sorriso muito forçado no rosto. Odiamos ela, isso nós temos em comum.
Resolvo ir até às duas, minha mãe está falando e falando, sorriso, gritando e contando coisas idiotas.
— Voltou cedo do ponto, mãe... — Sussurrei e ela ouviu.
— GAEL! Meu filho favorito, vem aqui dar um abraço na mãe!
Antes que ela se aproxime, dou um passo para a direita, ela tropeça e quase cai no chão:
— Tenho alergia ao tecido da sua roupa, então os abraços ficam para mais tarde... — aproveito a distância e sussurro. — ou talvez, nunca.
Minha mãe não se dá por vencida, pois pega a mim e minha irmã pelo braço e nos puxa para um abraço. O que eu sinto é um fedor insuportável de fumo, naftalina e mofo de suas roupas.
Fomos embora com ela, que nos levou até em casa. Ela não tem carro, então andamos da escola até a nossa casa, onde ela nos deixou na porta e disse que em breve viria nos visitar. Espero que não.
— Essa mulher fica mais louca a cada dia que passa.
Minha irmã, Mirela, diz. Apenas aceno com a cabeça em positivo, ela me fita, sentido meu silêncio e depois adentra o nosso apartamento.
Moramos no sétimo andar de um condomínio de luxo. Meu pai é um CEO de uma empresa pequena, mas que rendeu bastante lucro para ele. Vivemos em uma situação confortável, graças aos deuses que não acredito.
Coloco uma música no rádio, qual ela muda para um pop insuportável. Mudo novamente para o meu heavy metal, mas ela vai novamente e muda para o pop. A voz da Beyoncé inunda meus ouvidos e só quero estourar meus próprios tímpanos:
— Que eu saiba, liguei esse caralho, primeiro!
Ela simplesmente dá de ombros, e me dou por vencido. Discutir com ela é inútil levando em consideração que ela sempre leva a melhor.
Pego meu celular e resolvo abrir a conversa com o Tadeu. Sim, aquele Tadeu. Me culpo um pouco por ter ficado várias vezes com o crush do meu melhor amigo, só que eles não tem nada. O que posso fazer se surgiu a oportunidade de levar um pouco de rola, de uma cara gostoso?
Hélio me mataria se soubesse.
Mas eu não consegui resistir ao Tadeu, ele me lembra um pouco uma pessoa em sua postura e forma de falar. O homem que sempre amei e busquei quando transei com o Tadeu apenas para aliviar meu fogo.
A mensagem do Tadeu é uma foto do próprio pau. Depois ele enviou uma mensagem de texto, humilhando o Hélio.
T - Que desgraça de blusa é aquela o idiota do seu amigo, estava usando?
Eu - O Hélio é meio sem noção, mas é gente boa. Falando nisso, quero saber quando você vai dar uma chance para meu amigo.
T - Prefiro morrer do que enfiar meu pau naquela boca nojenta.
Leio a mensagem várias vezes, sinto um pouco de pena do meu amigo por gostar de um idiota. E mais uma vez, me sinto culpado por transar com o Tadeu... Fazer o quê? Ele é um gostoso...
A voz da Mirela me tira da situação em questão:
— Pegando o crush do amiguinho, de novo? Você está virando uma vagabunda, igual a como você chama nossa mãe. A diferença é que ela não se faz de santa igual a você, Gael....
— Mirela, se você não quiser ser acordada com água quente sendo derramada na sua cara, é melhor me deixar em paz.
Começo a andar em direção ao meu quarto, quando a porta da frente se abre e o perfume DELE, adentra minhas narinas.
O homem que sempre amei.