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- Que cara é essa? - ele me perguntou e eu já apertei o botão que levava ao térreo.
- DIEGO, PORRA! - era o Rodrigo vindo atrás. O Murilo ainda estava dentro do elevador.
- Gente, vim visitar meu Cadu, mas alguém pode me explicar o que está acontecendo aqui? - Murilo perguntou desesperado.
- Se você descer agora Diego, nós não seremos mais nada. - Rodrigo disse me olhando sério. Eu não gostei disso, então para ele é fácil assim terminar comigo?
- Não sabia que você desistiria de tudo tão fácil. Foi bom enquanto durou. - falei e as portas de fecharam.
Que raiva! Que ódio! Já é dia primeiro de maio, comemoraríamos quatro meses e... E acontece isso. Quer saber, que SE FODA!
Pelo menos eu posso voltar a ser o Diego que eu era, que não amava ninguém e era centrado, não se descontrolava assim que nem um adolescente em crise.
QUE RAIVA!
- Diego, você podia ter me deixado sair do elevador, né? - Murilo perguntou em tom de brincadeira. Nem percebi que ele não havia saído.
- Ah, malz cara, nem te vi aí. - respondi me escorando num canto.
- Cara... O que aconteceu? Pode se abrir comigo. - ele falou deixando de lado aquela voz meio irritante que ele fazia para falar.
- Nada Murilo. Fica de boa que não aconteceu nada.
Eu queria é logo sair dali. Fitei a paisagem que era aquela selva de prédios. Estávamos no alto ainda. E... E comecei a perceber que o elevador não descia. De repente sentimos um tranco.
- Ah Meu Deus! O que aconteceu? - Murilo perguntou assustado. Percebi que o elevador estava parado. Estava anoitecendo já.
- PORRA! Era só o que me faltava! Interfona aí para alguém! - falei irritado e Murilo me obedeceu.
Ficou ali por um tempo e eu mais irritado do que estava. Não... Eu mereço, de fato eu devo ter atirado pedra na cruz! Primeiro a briga com o Rodrigo, daí esse imbecil termina assim comigo do nada e agora fico preso num elevador... Eu... Eu mereço!
- Diego, parece que a energia acabou no bairro inteiro! Não há previsão de volta. - Ele falou olhando-me desanimado.
- CU! - falei batendo nas paredes do elevador. E chutando também. Tenho que descontar minha raiva em algo.
- Diego, se acalma bofe!
Eu bufei e olhei para ele. Ficamos em silêncio um tempo e eu acabei me sentando encostado no vidro. Pude notar que lá fora não havia uma luz acesa, senão as dos faróis dos carros.
- Sério cara, se abra comigo.
- Murilo, eu não quero falar disso!
- Mas você e o meu primo terminaram! E vocês se amam! - ele falou sentando-se ao meu lado.
- Fala isso pra ele!
- O que aconteceu? Você veio fazer uma visita surpresa?
- Sim... Eu... Faz quatro meses que estamos namorando e eu comprei anéis e...
- Que doce, Diego! Não sabia que você era assim.
- E eu não era. O Rodrigo me deixou assim. Agora sou um idiota e não tenho mais Rodrigo. Mas quer saber? Ele que se foda, ele que quis terminar! Ele que vá correndo para o Danielzinho estuprá-lo de novo e...
- Como assim? Como assim? - ele perguntou espantado.
- Ah, nada cara. Falei merda, falei demais.
Por que me descontrolar assim? Não controlo mais nem a minha boca?
- Diego... Eu guardo segredo, nem comentarei com o Rodrigo. O Daniel fez alguma cosia com o meu primo? Eu já percebi que ele tinha raiva dele e que você não o suportava, mas...
- Quando seu primo era novo ele se declarou para o Daniel e esse filho da puta fingiu que gostava dele, amarrou-o na cama falando que o amava, mas daí o humilhou. Bateu nele, estuprou e ainda cuspiu na cara dele. Por isso que o Rodrigo começou a fazer musculação, praticar artes marciais e mudando o jeito. - Acabei falando.
O Murilo não pararia de me encher se eu não falasse.
- Verdade! Lembro que todo mundo da família tinha comentado de como o Rodrigo tinha mudado, mas... JESUS, não podia imaginar isso! QUE CHOQUE! Agora eu entendo porque você não gosta do Daniel!
- Você acha que fui muito idiota explodindo, Murilo? - estava me acalmando um pouco e voltando a pensar racionalmente.
- Honestamente?
- Sim.
- Não. Eu entendo o lado de vocês dois. Eu sabia do Daniel já, Diego, quero dizer, sabia que ele estava trabalhando com os meninos. Ele é um cara legal, se ele foi isso que você me falou um dia ele está mudado! O que o Rodrigo não entende é que ele teve anos para digerir isso que aconteceu com ele e aceitar que o Daniel pode ter mudado, mas para você é tudo muito recente. De repente você começa a namorar o Rodrigo, descobre isso no passado dele e logo em seguida conhece o Daniel, por que foi assim que aconteceu, não foi?
- Exato.
- Então é óbvio que você vai ficar irritado. Mas meu primo não entende isso. Mas você também não entende que o Daniel pode ter se tornado uma pessoa melhor.
- Ah Murilo... Eu estou muito irritado.
- Você não vai levar a sério o término do namoro, né? Vocês dois são o casal mais lindo que eu já conheci!
- Acho que se não terminássemos hoje terminaríamos outro dia. Sabe... Somos muito diferentes Murilo. Melhor deixar tudo como está.
- Não senhor! Diego! Vocês já são bem crescidinhos pra terem uma briga e terminarem. Conversem que nem adultos, poxa! Você tem vinte e dois anos nas costas, o Rodrigo já tem dezenove. Não são mais adolescentes!
- Tenho certeza que se formos conversar acabaremos brigando de novo!
- Mas não vai AGORA. Deixe a poeira baixar, né Diego? Espere ele se acalmar, acalme-se você também!
- Talvez você esteja certo... Mas, ah. Nem quero mais falar disso.
- Sabe o que você faz? - Murilo me perguntou, mas antes que pudesse me falar meu celular tocou. - Atende aí, depois eu te falo.
- Certo.
Falei tateando meus bolsos até achar meu celular. Logo reconheci o número no visor e era o meu pai. E olha... Tinha um tempo que ele não ligava.
- Filho... Tenho novidades! - disse-me ele do outro lado da linha. - Mas não sei se posso contar pelo celular. Está no seu apartam...
- Estou preso num elevador por causa do blecaute, pai. - falei seco. Ele deu um leve gemido de surpresa.
- Sinto muito filho.
- Mas o que é que tem que me contar?
- É algo muito importante para a sua relação com o Rodrigo!
- Eu e ele brigamos, pai.
- Como assim? - ele perguntou surpreso e um pouco irritado.
- Eu quero saber! Coloca no viva-voz! - Murilo falou.
Eu ponderei, mas não iria querer gastar saliva depois contando para ele o que meu pai me contaria, por isso o obedeci.
- É pai... Brigamos e ele disse que se eu fosse embora nós não seríamos mais namorados. Eu acabei indo embora, porque óbvio que fiquei irritado por ele ter dito isso!
- Nossa filho... Que... Que choque! Vocês pareciam se gostar tanto! Estavam até morando juntos!
- Tá, velho, não quero mais falar disso.
- Bom, mas mesmo assim tenho algo para te contar.
- Tem que ser agora?
- Ah filho... - Murilo me repreendia, pedia para eu perguntar o que era.
- Tá... Fale logo, pai. Ficarei preso aqui por um bom tempo mesmo.
- O Betão me chamou para desabafar. Falou que ainda amava o filho e não sei mais o quê. Dei um pouco de bebida para ele e acabei descobrindo mais coisas.
- Ah é... E que coisas?
- Que ele só rejeita os homossexuais assim porque o pai dele, avô do Rodrigo, foi morto por... Como vou explicar? O pai do Beto traía a mãe dele, avó do Rodrigo, com um homem! A mulher desse homem descobriu e mandou dar um fim nos dois. Daí a mãe do Beto que era pequeno encheu a cabeça dele de linguiça!
- Nossa, eu não podia imaginar!
Realmente fiquei surpreso com isso. É muita história trágica! O filho que é estuprado, o outro que perde o pai porque o pai era gay!
- Pois é, daí no final ele chorou e confessou que talvez fosse que nem o filho e que nem o pai!
- MENTIRA! O TIO BETO?
- MURILO? O que está fazendo aí? - meu pai perguntou rindo.
- Estou preso no elevador com o Dieguinho!
- Pois é Murilo! Teu tio macho tem... Como é que você fala?
- Um pé no arco-íris! - falei imitando a voz do Murilo.
- Daí ele disse que perdoaria o Rodrigo, que cometeu o pior erro da vida dele, que apoiaria o namoro de vocês dois.
- Mas o que o fez mudar de ideia desse jeito? - Murilo perguntou.
- Hehehehe.
- PAI! EU NÃO ACREDITO! - agora eu realmente fiquei surpreso.
- MENTIIIIIIIIIRA! JESUS! MY GOD! Sr. Adriano, mas que bafooooooo!
Murilo estava fazendo um escândalo dentro do elevador.
- Ah, se me dão licença tenho que desligar agora. Sabem como é...
- Poupe-me dos detalhes, pai.
- Ah, vai me contar tudinho depois Adriano! Arrasou! - Murilo falou e eu desliguei o telefone.
- Eu não acredito nisso. Eu realmente não acredito nisso! - eu estava besta com tudo isso.
- Viu? É o destino! Vocês dois e seus pais, olha que coisa mais linda! - Murilo falou e lancei um olhar mortal a ele.
- Murilo... A situação é séria. Eu e o Rodrigo terminamos e...
- Você acha que ele vale a pena? Seja sincero!
- O Rodrigo? Eu já não falei que eu o amo?
- Mas ele vale a pena? Você acha que podem dar certo?
- O Rodrigo vale a pena, mas nós vamos acabar brigando de novo, somos bem diferentes como eu já disse.
- Ah Diego... Você está sendo um menino mau. Sabe o que você faz? Vi isso num filme uma vezfilme, Murilo? E você acha que com coisas baseadas NUM FILME você pode me ajudar?
- Se você não quer a minha ajuda fique logo sem o Rodrigo! - ele falou irritado. Não tinha visto o Murilo irritado antes!
- Ok Murilo... Fale.
- Escreva!
- Ahn? Como assim?
- Escreva Diego!
- Mas escrever o que, porra?
- Tudo! Como você conheceu o Rodrigo, quando começou a se interessar por ele, tudo o que vocês viveram juntos e... E depois que você terminar de escrever você vai saber se ele vale à pena. E se você vir que ele vale à pena Diego... Mova céus e terras, mas volte a ficar com ele!
- Mas não sei como começar... Não sei onde escrever...
- Nem que seja em papel higiênico Diego, mas escreva! Você vai começar a se lembrar de tudo que passou com o Rodrigo, vai começar a se lembrar de tudo o que você sentiu. Narre uma história da sua vida! E depois leia, vá lendo até chegar à conclusão!
- É... Eu... Eu acho que vou fazer isso, me parece idiota, mas... Por que não tentar?
- Não é idiota Diego! Confie em mim!
- Tudo bem... Assim que sair desse elevador eu começarei a escrever...
- Certo.
Passados alguns minutos pude ver as luzes do bairro se acendendo e logo o elevador voltou a funcionar. Pensei em ir ver o Rodrigo, mas acabaríamos brigando de novo. Afinal eu ainda estava irritado! Quem sabe eu deva seguir o conselho do louco do Murilo. Descemos juntos e assim que cheguei ao meu carro nos despedimos. Antes de chegar ao meu apartamento desci num pequeno bazar e resolvi comprar um caderno.