Desembarcando no Brasil, Virna estava determinada a dar uma virada 360 graus no seu convívio afetivo com Dagoberto. Tiveram uma noite bem mais ou menos, meia boca, após 10 dias afastados. Dagoberto estava estudando para tentar ocupar a gerência de recursos do banco.
- Que bom, querido! Se der certo, vamos trabalhar separados e acho que seria uma boa, pois teria grandes chances de evolução.
- Exato. Por isso, estou meio cansado, toma muito tempo ficar assistindo as aulas. As coisas vão melhorar...
- Sim, sim, inclusive tenho uma surpresinha que vai dar um grande impulso.
No dia seguinte, Virna levou seu companheiro para visitar um apartamento de luxo, em uma área nobre da cidade. Quatro quartos, duas garagens, mais de 100 metros quadrados.
- E aí? O que achou?
- Uau! Fabuloso. Que vista! Mas você pretende comprá-lo? Será que temos condições pra isso já?
- Tchan-tchan-tchan-tchaaaaaaaaaaaaannn... Já adquiri! É nosso! Arrematei antes da viagem ao Oriente!
Abraçando forte seu namorido, ela era só alegria. Porém, Dagoberto estava impressionado.
- Nossa... parabéns! Mas me diga... quanto valeu isso????
- 1 milhão e 200 mil. As bonificações das altas do mercado e meus ganhos na diretoria, renderam um bom saldo. Com essa grana da conferência, deu pra concluir a compra. Não precisei gastar um puto do salário de conselheira, nem precisou!
Dagoberto estava pasmo. Ele perdeu totalmente a noção dos valores arrecadados por uma diretoria de investimentos. “Ela deve estar ganhando quase dez vezes mais que eu! Meu Deus, estou descolando dela cada vez mais”, pensou ele. Virna segurou nas mãos dele:
- Olha... agora podemos pensar no nosso futuro com mais afinco. Filhos, aplicações, compra de títulos, rentabilidade... Com tudo caminhando como está, podemos realizar o sonho de mandar todo mundo pro inferno e dependermos só de nós!
Virna estava com a cabeça voltada para uma realização a dois, todavia, só passava na mente dele que aquilo o impelia a estudar mais e mais a fim de tentar ao menos diminuir o abismo financeiro que estava se criando entre eles profissionalmente.
- Querido, na segunda-feira assino seu retorno à consultoria, mas você que deve entregar o relatório com os balanços do mês, ok?
- Claro... cla... claro! Estou ciente. E o que faremos com nosso apartamentinho financiado?
- Pensei nisso... vou “mexer os pauzinhos” e quitar logo o apartamento assim que...
- Não, Virna, não! Não faça isso! Quero alugar e eu mesmo pagar essa dívida. Seria uma honra.
- Ok, querido, tudo bem...só queria ajudar, deixar isso pra trás, mas lhe entendo. Tudo nem.
Dagoberto passou a estudar e estudar, virando noites pra conseguir dar um salto qualitativo na carreira. Virna o motivava, mas por outro lado, também se preocupava em modelar seu corpo. Fez outra surpresa: colocou silicone nos seios. Não chegou a ficar muito demasiado, ficaram mais redondos e bonitos. Suas pernas iam ficando mais grossas e torneadas e seu cabelo mais cheio. A intenção era toda voltada para o marido. Ela ia cada vez menos aos happy hours e assim que saia do trabalho ia logo pra casa, estava até chegando mais cedo que o companheiro. Aquela produção toda deixou Dagoberto com maior intuição de cobrança sexual. Ele até tentava, mas na hora do rala e rola ele estava com a cabeça cheia de dúvidas. “Tenho que me esforçar mais... tenho que corresponder a meus anseios... esse salário de gerente de recursos dá pra fazer muita coisa? Será?” . Numa noite, estava tão ansioso que brochou feio.
- Querido, o que está havendo? Você anda distante quando a gente transa.
- Opa... não é isso. É que estou muito cansado, tentando melhorar...
- Peraí, escuta... você está se cobrando. Você tem seu tempo, e temos que ter o nosso. Vamos valorizar nossos momentos, por favor!
Desde que se mudaram, as coisas estavam até indo bem, mas essa parte sexual, Dagoberto estava devendo. E muito! E Virna estava fazendo esforço a cada pregão, a cada alta, a cada cartada de mestre, a cada negócio lucrativo, manter as atenções para o sexo doméstico... E olhe que Dagoberto já tinha retornado à consultoria, não tinha por que ele estar tão emocionalmente distanciado.
No mês seguinte, a auditoria entra em contato com ela.
- Diretora, tivemos um problema na análise de crédito. Um dos analistas não lançou o balancete no sistema.
- Como é que é????
- Estão faltando dados do balanço do mês.
Virna enfureceu-se. Nem fez chamada, levantou-se, abriu a porta e chamou o responsável.
- Consultor Dagoberto Banzonol, já na minha sala!!
Dagoberto não entendeu direito e todos ao seu redor ficaram com cara de surpresos. Ao adentrar a diretoria, ouviu uma senhora bronca.
- A auditoria acaba de me informar que o senhor não lançou o balanço no sistema!! Pode me explicar isso????
Dagoberto ficou boquiaberto.
- Co...co...como a...assim???
- Como assim? Venha aqui!!
E mostrou a ele que realmente ele não tinha enviado o relatório final. Ele tinha feito tudo, porém, não encaminhou o parecer para o financeiro. Deixou no departamento contábil, um erro grave.
- Não sei como isso foi acontecer, Virna!
- Não sabe? Pois bem... isso deixou um rombo de 350 mil reais nos fundos do banco!!! Você tem noção disso??? 350 mil porque um caralho de um balanço de merda não entrou no sistema do financeiro!!! A auditoria detectou a desgraça!!! Onde você estava com a cabeça, homem!!!!???
Dagoberto estava em pânico. Aquilo foi grave. Ele estava tão confiante no seu retorno como consultor e focado na mudança de direcionamento na carreira que praticamente deixou pra última hora o fechamento e terminou por nem consumá-lo.
- Olha aqui, seu merda... Não há a mínima condição – a mínima!!! – de você ser consultor, analista, ou qualquer caralho nessa empresa!!! Você fudeu com qualquer possibilidade de dar um passo além de onde está! E digo mais: seu passo aqui só vai pra trás!!! Portanto, tenha um pouco de lucidez e tenha consciência de que as portas do Impact Bank estão totalmente fechadas pra você!!!
Virma estava espumando. Com razão. Ela teria que cobrir com recursos próprios aquela bolada. Dagoberto estava arrasado. Aquilo foi tão infantil que ele nem acreditava que jogou uma vida inteira de esperanças pela janela em função de um vacilo intergaláctico.
- Dagoberto... só há lugar aqui pra você fazer cafezinho! E mesmo assim, corre o risco de nem coar o pó do café você consiga!
Nooooooooooooossa... aquilo acabou com ele. Sua própria companheira, sua parceira há quase dez anos, aniquilava de vez o seu ser naquele local que ele tanto lutou, tanto almejou em ocupar um dia.
- Ok, Virna. Reconheço minhas limitações. Pode assinar minha rescisão.
- Acho bom... Não haveria outro caminho, porque juro a você... eu ia lhe colocar no call center, pra você atender office boy de cartório!!
Dagoberto saiu dali remoído. Terminava uma jornada que começou na faculdade, passou por todos os setores até ser o queridinho da CEO. Até sua namoradinha míope e caipira tomar o seu lugar.
Ao sair desolado e sob vistas de todo o setor, ele ergueu a cabeça. Sairia dali, mas tinha que desovar um monte praquela que ele considera ter deixado sua carreira ali ir minguando até tomar esse feedback estonteante. Dirigiu-se à sala de Helen, no andar de cima.
Lá chegando, foi determinado a invadir a sala. Foi barrado pela secretária.
- Que é isso??? O senhor não pode ir entrando assim, está louco??
- Nem tente me parar!!! Eu tô na rua, portanto, nem venha!! Se afaste, que eu não estou bem!!!
- Senhora Helen está em reunião!!
- Reunião, minha pica!!!! São 14:00, essa hora ela está tirando uma soneca de merda que eu sei!!
E quase arrancou a porta. Helen comia tranquilamente um pedaço de torta. Nem arregalou os olhos ao ver Dagoberto ali. Ela já sabia do trágico erro dele e se estava lá, era pra falar alguma merda.
- Olha aqui, Helen... Você brincou comigo. Ficou de paparico, dizia que eu era seu pupilo, você me viu crescendo aqui, dei o sangue pros investimentos desse banco aumentarem. Você me destruiu e quer destruir meu relacionamento. Elegeu minha mulher só pra ver a gente se engalfinhar. E conseguiu!! Você deve ter espalhado ai que escolheu Virna por sororidade, feminismo, essa bobajada de gênero, e eu tô ne aí pra isso, mas lhe digo uma coisa... a mim você não vai destruir. Lhe vejo adiante, Helen. Enquanto isso, pegue essa torta, sua arrogância, seu nariz empinado, e meta no rabo!!!
Dagoberto falou isso a plenos pulmões e com certeza o setor inferior todo ouviu aqueles berros. Helen estava calmamente deglutindo aquela iguaria, pegou um lenço pra limpar a boca e respondeu.
- Já acabou com seu showzinho? Deve ter acabado, porque se calou. Olha só... essa torta é de maçã com cobertura de um creme feito com côco verde e limão. Hummmmmmmmmmmmm, uma delícia! É uma receita que me passaram quando eu administrava uma delicatessen. Bom, não dá pra enfiar uma preciosidade dessas no rabo, mas quando se tem sucesso, você enfia coisas muito mais prazerosas. E posso falar: dá prazer, viu? Por isso, vou lhe dar duas sugestões sobre o que estou dizendo, pra você entender melhor. Conheço vários donos de padaria, trabalhei nesse ramo por anos. Posso arrumar uma vaga de padeiro pra você. Não tem perigo de esquecer de entregar um balancete em meio a uma mesa com quilos de trigo espalhados, vá por mim. Agora tem que acordar cedo, e aí não sei se você acostuma. A outra dica é você relaxar um pouco. Vá na feira e compre cenoura, pepino, nabo, beringela, qualquer legume desses aí enfie no seu cú. Caso você não aceite ser padeiro, é bom ir alargando esse fiofó pra começar a dar a bunda pra pagar esse rombo que deixou nas contas do banco. Ah, sim...Eu tenho homens e objetos sexuais pra curtir uma boa introdução anal. Mas você? Vai ter que se virar sozinho, pois duvido que você consiga introduzir alguma coisa no cu de alguém, ah, isso eu tenho quase certeza!
E riu de uma forma tão debochada que Dagoberto se desarmou. Ele se viu no ridículo de peitar aquela mulher poderosa, que se saiu bem daquele despejo insano que ele cometera.
Ao chegar em casa, não sabia o que fazer. Sua cabeça estava vazia. E agora? Como seria dali pra frente? Passou-se cerca de meia hora e Virna chegou, bem mais cedo, não eram nem 17 horas. Ela não tinha cabeça pra focar em nada no trabalho e saiu antes do horário. Não falou nada. Passou por ele, bebeu água e foi se trocar. À noite, continuou aquele silencio sepulcral. Coube a ele iniciar uma conversa.
- Ok, Virna... vamos lá... cometi um grave erro e reconheço. Mas procure entender. Eu estava em uma sequência vitoriosa e de repente fui ultrapassado. Demorei a processar isso e fui me afundando, eu sei. Deveria estar atento e reagir, foi o que pretendia, mas espero que compreenda que eu estava tentando ser útil. Eu estava quase preparado pra assumir um outro rumo, eu queria melhorar, queria ser digno de alguém que chegou onde chegou, como você.
- Dago... desde que assumi essa diretoria, sua preocupação foi só no intuito de querer mostrar serviço, que era capaz mesmo, que poderia estar onde estou, mas não nota que estava se perdendo? A única coisa que fez esse tempo todo foi demonstrar sentimentos de competição, de concorrer comigo, de rivalidade! Poxa, acha que sou burra de não ter percebido isso? Tentei a todo custo melhorar as coisas aqui em casa, pois no trabalho tava indo tudo bem! E você tentando provar que deveria ser o escolhido? Você não tem ideia do ridículo que passou hoje. Além de ter esquecido...
- Combinamos de não conversarmos sobre trabalho em casa...
- Nem vem com essa! Passou dos limites hoje! Tinha uma função boba e não correspondeu! E ainda invadiu a sala de Helen e falou um monte de asneiras! Acha que eu não soube o que houve lá???
- Tá bom, tá bom!! Errei! Errei feio. Mas sabe o que me transtornou, Virna??? É que a vaga na diretoria era minha! Minha!! Minha vida se transformou num inferno quando você aceitou o que estava destinado a mim e passou a ocupar o lugar que era meu!!! E você, pra me passar raiva, tem andado pra cima e pra baixo com aquele verme do Galo, fechando parcerias com o banco dele, e eu tendo que ouvir gracinhas pelos cantos porque minha esposa fica de qui-qui-qui, cá-cá-cá com ele nos eventos noites afora!!!
Virna não acreditava. Ela sabia que Dagoberto tornou-se um funcionário cada vez mais relapso e errático após sua indicação. Mas ouvir aquilo do próprio companheiro era demais. Ela não merecia. Ela demorou um pouco a fitar-lhe e com os olhos marejados, retrucou.
- Seu lugar né? Você havia conquistado é? Tinha pago já? Quanto? Porque você não me mostrou nenhuma escritura de sua posse naquela cadeira que ocupo! Olha aqui, Dagoberto... eu estou ali por méritos! Méritos! Enquanto você sonhava com a vaga eu estava muito acordada e fincada na realidade que eu tinha que fazer meu melhor, e não aguardar que qualquer promoção caísse do céu como você acha que se consegue as coisas por ser o pupilinho da chefe! Você estava tão absorto esses tempos, tão absorto, que não conferia os números que eu ajudei a inflar com as minhas ideias de investimentos e comigo naquela cadeira é que aquele banco finalmente vai pras cabeças. Sabe por que não enxerga? Porque dói em você pensar que sua companheira, sua mulher, sua parceira, está conquistando, está vivenciando, está experimentando todos os desfrutes que uma representante financeira com posto de autoridade tem acesso e você queria usufruir!! Bote uma coisa na sua cabeça: eu que vou chegar até a liderança máxima daquela instituição porque você? Você não é mais nada!!! Querendo ou não, você vai ter que me engolir!!
Aquele foi o pior dia da vida de Dagoberto. Era um festival de bola fora, cada uma pior que a outra. Virna olhou feio pra ele, dirigiu-se até a porta e bateu com força, saindo para a rua. Um furacão passava na cabeça dele. Não tinha onde enfiar a cara. Foi à janela e só viu um BMW conversível saindo da garagem em alta velocidade, cantando pneu pelas ruas, dirigido por uma morena de cabelos esvoaçantes.
(continua)