Bernardo [69] ~ Reunião familiar

Um conto erótico de Bernardo
Categoria: Gay
Contém 2896 palavras
Data: 05/12/2023 20:18:02
Assuntos: Gay, Início, Sexo, Traição

O clima em casa não estava bom. Certo, não houve briga, mas também não houve um entendimento. Ficou tudo muito estranho.

Minha mãe estava me evitando e não estava disfarçando isso. Ela dirigia a mim apenas frases automáticas e rotineiras, como “bom dia” ou “a janta tá pronta”, e quase sempre sem me olhar. Era uma coisa que me doía e me constrangia, pois todos em casa percebiam o quão ruim estava a situação. Eu queria falar alguma coisa, sacudir ela e mandar ela reagir, mas meu pai me pedia paciência, dizia que eu deveria dar tempo a ela. Mas quanto tempo seria preciso? A vida toda?

Contribuía para o clima ruim o fato de Laura andar muito quieta em virtude da interrupção da sua gravidez e de Caio ainda não ter voltado a falar comigo. Meus pais acharam que o que acontecia com Laura era devido à minha revelação e à reação da minha mãe, eles nunca descobriram a verdade. Quanto a Caio, eu não estava com cabeça para lidar com ele. Talvez ele até já estivesse aceitando a ideia toda, só não queria dar o braço a torcer e bater no meu quarto pedindo desculpas. Eu não estava no clima para abaixar a cabeça para ele como se eu fosse o errado da história. Já tinha passado da hora dele perder esse orgulho todo que tinha.

Com meu pai sempre trabalhando e tentando colocar panos quentes em casa quando estava entre nós, só me sobrou Tiago de companhia dentro de casa. Não era necessariamente uma coisa ruim. Ficamos muito próximos naqueles dias. Numa cena que tinha se tornado comum, Tiago revisava alguma coisa de trabalho sobre a escrivaninha enquanto eu jantava sentado no chão do seu quarto. Às vezes conversávamos, às vezes ficávamos em silêncio.

Você vai pra Porto Alegre este ano?_ ele perguntou.

_Sim, faltei ano passado. Tô em falta com a vovó. Sem falar que não preciso recusar e criar mais uma situação com a mamãe.

_É, pensando por esse lado...

_E você, vai?

_Sim, mas só vou passar o fim de semana. Eu e o papai voltamos antes, estamos trabalhando num processo grande.

_Você devia ficar mais, vai ser divertido._ falei rindo.

_Por que?_ perguntou sem me dar muita atenção.

_Porque vamos ter companhia lá este ano.

_É? Quem?

_Tio Aurélio e família.

Tiago me olhou com os olhos assustados. Eu me comunicava pela internet sempre que possível com meus primos alemães, e eles me disseram que tinham chegado a Porto Alegre no início daquela semana e estavam hospedados na casa da nossa avó, junto com Tio Aurélio e o marido. Não sei como estava a situação por lá, mas não devia ser nada muito preocupante, pois os gêmeos estavam adorando o Brasil e nossa avó. Engraçado porque ela nunca se comportou como avó comigo e com meus irmãos, mas enfim...

_Como?!

_O que você ouviu. Aliás, eles já estão lá.

_Como você sabe?

_Mantenho contato com nossos primos.

_Mamãe sabe?

_Duvido muito. Se soubesse já teria desistido de ir, ainda mais depois de tudo o que aconteceu aqui em casa.

_Você não deveria contar pra ela então? Evitar problemas?

_Eu? Mas ela não está nem falando comigo!_ falei em tom de brincadeira, apesar da mágoa ser verdadeira _Aliás, tio Aurélio e vovó são os principais interessados, e se eles não contaram, não sou que vou.

Partimos num sábado cedo rumo a Porto Alegre. Vovó já estaria nos esperando para almoçar. Só que não seríamos só nós desta vez. Eu estava inseguro de passar uma semana inteira com minha mãe me tratando daquele jeito e Laura e Caio muito pouco dispostos a conversar, uma vez que Tiago e meu pai iriam voltar pra casa no dia seguinte. O que me manteria lá era a companhia de tio Aurélio e família.

A manhã já ia terminando quando os dois táxis (pois é, família grande tinha desse problema) pararam na porta da casa da minha avó. Não sei se fui só eu que notei um clima diferente na casa, mesmo por fora. Estava mais iluminada, as janelas estavam todas abertas, o vento circulando forte dava um aspecto de frescor. Será que todo aquele tempo o grande fantasma daquela casa era meu avô?

Mamãe bateu campainha, vovó atendeu e ouvimos seus passos do lado dentro vindo nos receber. Tiago me olhou nervoso e eu sorri. Que começassem os jogos!

_Teresa! Que bom te ver minha filha!_ disse minha avó dando um abraço apertado na minha mãe, que se espantou com a reação.

Como eu já disse aqui, vovó sempre foi uma mulher de aparência triste e resignada, sempre tratando a todos com uma certa frieza. O que nós víamos ali era uma mulher solta, sorridente e calorosa. Seus cabelos, antes sempre presos, agora ela exibia soltos e grisalhos, sem vergonha alguma deles.

Ela se apressou a abraçar eu, meus irmãos e até meu pai, perguntando se tínhamos feito boa viagem. Todos nós nos olhamos confusos, mas ela não reparou ou não quis ver, e foi nos empurrando portão adentro. Eu gostaria de ter coragem de perguntar se aquilo era efeito da volta de tio Aurélio ou da morte do meu avô...

_Berrrnardo!_ gritou Lea na porta da casa ao me ver.

Ela veio correndo e me deu um abraço apertado. Não tinha mudado nada desde a última vez que nos vimos a poucos meses atrás, mas agora tínhamos mais intimidade um com o outro devido a muitas horas de conversa no MSN. Lukas chegou perto e me cumprimentou menos calorosamente, mas também tinha me aproximado dele naqueles meses. Quando olhei para minha família, estavam todos confusos se perguntando quem eram aqueles estranhos na casa da nossa avó. Como eles me conheciam? Como eu conhecia eles? Tiago, o único tão bem informado quanto eu, riu discretamente e nervoso, prevendo a tempestade.

_Venham cá, meninos._ chamou minha avó e os gêmeos a abraçaram um de cada lado _Esses são seus tios Teresa e Olavo, os pais do Bernardo. E esses são seus primos: Laura, Caio e Tiago.

Lea e Lukas os cumprimentaram muito cordialmente como bons alemães que eram. Até porque, a cara de surpresa da minha família não lhes permitia nada mais caloroso que isso.

_Tios? Como assim, mãe?_ perguntou minha mãe confusa.

Antes que minha avó pudesse responder, nossos olhares se voltaram para a figura que apareceu na porta: tio Aurélio. Estava tão bem quanto a última vez que o vira, mas agora ele trazia um sorriso aberto em vez da habitual expressão calma. Eu não sei se era felicidade de voltar para casa ou se era apenas para enfrentar a minha mãe. Caso fosse a segunda opção, tinha dado certo: minha mãe parecei ter perdido toda a cor do rosto. Pela expressão do meu pai, vi que ele desconfiou de quem se tratava. Caio e Laura continuam tão perdidos quanto antes.

_Olá!_ tio Aurélio falou descendo os degraus da varanda vindo em nossa direção.

Ele parou quase em frente à minha mãe, a encarando, mas se virou para mim:

_Guten Tag, Bernardo. Wie geht es dir?

_Sehr gut, danke.

_Estamos esperando uma nova visita em Berlim.

_Vontade não me falta!_ respondi rindo.

Pela primeira vez em dias, minha mãe me olhou nos olhos. Não sei o que ela estava sentindo, se era raiva, indignação, confusão... Acho até que ela estava muito atordoada para conseguir sentir qualquer coisa. Meu pai me recriminou com o olhar, como se eu tivesse armado tudo aquilo para atingir minha mãe. Desviei o olhar envergonhado. Eu não tinha armado nada, mas poderia ter deixado eles de sobreaviso...

_Crianças, esse é seu tio Aurélio. Veio passar o mês comigo no Brasil._ falou minha avó apresentando ele aos meus irmãos.

Eu já tinha contado a história dele para meus irmãos, então eles logo reconheceram o nome. Ainda estavam todos meio atordoados quando ele pegou na mão de cada um. Meu pai foi mais diplomático que meus irmãos, soltando um “muito prazer”.

Venha, vamos entrar, gente!_ falou minha avó _Depois arrumamos as malas. Se preparem para almoçar. O meu pernil eu garanto, mas só Deus sabe o que aquele alemão doido está preparando de acompanhamento.

Eu ri ao perceber que ela falava de Klaus, o marido do meu tio. Aparentemente, estava tudo bem, apesar dela estar bem séria quando se referiu a ele como “alemão doido”. Sem mais demoras, pegamos nossas malas e entramos na casa. Mamãe ficou para trás com tio Aurélio ainda atordoada. Ninguém ousou apressá-la, nem mesmo meu pai. Eu gostaria de saber como aquela conversa correu, mas eu teria que conviver com minha curiosidade.

_Você sabia disso?_ perguntou meu pai sério para mim, me fazendo tremer.

_Eu sabia que ele estava aqui... Conheci ele quando estava em Paris e mantive contato com meus primos.

Meu pai me olhou como se eu tivesse feito alguma grande travessura.

_Você deveria ter avisado.

_Vovó devia ter avisado. Se ela não fez, é por medo da mamãe não vir. Eu é que não ia me meter.

Ele me olhou como se não tivesse resposta, apenas fez sinal para que saísse de perto dele. Ele ficou vigiando minha mãe e tio Aurélio de longe na porta, com medo daquilo acabar mal. Minha vó nos levou para a sala de jantar, onde a mesa estava posta a nossa espera. Cumprimentei Klaus que continuava a simpatia em pessoa. Meus irmãos ficarem claramente sem graça com o jeito afeminado dele, e eu me envergonhei por eles, mas eu menti para mim mesmo que era só a surpresa do encontro. Todos nos sentamos e ficamos conversando sobre amenidades enquanto meus pais e tio Aurélio não apareciam.

Foram alguns minutos até os três apareceram na sala de jantar. Todos estavam muito sérios, tio Aurélio é o que tinha a expressão mais calma, ainda que tivesse perdido o sorriso de instantes atrás. Meus pais também estranharam Klaus, mas tentei ignorar o incômodo deles. Durante o almoço, os mais falantes eram eu, Klaus, minha avó, Lea e Lukas. Tiago foi entrando no papo aos poucos. Caio e Laura ainda estavam desconcertados com a surpresa, mas tentavam ser cordiais. Meu pai e tio Aurélio faziam alguns comentários pontuais. Minha mãe ficou calada durante todo o tempo, o que eu sabia que não era um bom sinal.

Ao fim do almoço, era hora de irmos para os quartos, e ali se deu o primeiro conflito daquele fim de semana.

_A gente vai para um hotel, mãe._ falou minha mãe _A casa está cheia, vai ficar todo mundo muito apertado.

_Mas a ideia é ter a casa cheia!_ ela respondeu.

_Vai ser melhor assim.

_Não precisa._ falou tio Aurélio interferindo _Eu e Klaus estamos hospedados numa pensão aqui perto, só os meninos estão dormindo aqui com a mamãe. Tem quarto de sobra para todos vocês.

Minha mãe evitou olhá-lo, e continuou encarando minha vó como se não tivesse sido interrompida.

_Viu?_ falou minha avó _Sem aperto. Laura pode dividir o quarto com Lea e Tiago pode dividir com Lukas. Caio e Bernardo dormem no outro quarto, e você e Olavo podem ficar no seu, como sempre. Alguém tem algum problema com isso?

Todos nós respondemos que não, e minha mãe não teve argumento contra, sendo forçada a ficar. Depois de instalados, nós descemos e ficamos conversando na sala. Menos a minha mãe. Ela não desceu do quarto por toda a tarde. Meu pai ficava indo e voltando, provavelmente em missão diplomática. Todos percebíamos o clima estranho, mas ninguém falava nada. Eu queria conversar a sós com tio Aurélio, mas eu entendia que não era hora ainda. Ele queria conviver um pouco mais com meus irmãos, saber sobre eles. Deixei que ele aproveitasse. Todos nós, até mesmo Laura e Caio (dentro dos limites da sua personalidade) nos divertimos jogando jogos de tabuleiros com os gêmeos.

À noite, minha mãe desceu arrumada e avisou que sairia com meu pai para jantar fora. Minha avó, não gostou, insistiu para que ela ficasse, mas eles saíram mesmo assim. Novamente, tentamos ignorar o clima ruim e continuamos nos divertindo. Já estavam todos até bem entrosados. Klaus, Lea e Lukas tinham personalidades muito cativantes.

No café da manhã no domingo, a bomba:

_Mãe,_ falou a minha mãe _Olavo está com muito trabalho em Belo Horizonte. Nós conversamos e achamos melhor irmos embora hoje à noite.

Era para ficarmos até quinta-feira. Lógico que não era problema com o trabalho do meu pai. Ele realmente voltaria no domingo com Tiago, mas eu ficaria com minha mãe, Laura e Caio. Ela não queria ficar lá com tio Aurélio. A presença dele incomodava ela. Mais: a presença da família feliz dele incomodava ela. Penso que se não fosse por mim, ela talvez ficaria para manter as aparências com a minha avó. Mas os acontecimentos dos últimos dias tornava a permanência dela naquela casa uma coisa impraticável.

_O que é isso, minha filha?_ falou minha avó séria _Vocês vão passar a semana.

_Realmente não podemos, mãe. Foi só uma visita rápida. Prometo compensar vindo em setembro ou outubro.

_Isso é por minha causa?_ perguntou tio Aurélio enquanto encarava com firmeza minha mãe.

Ela desviou o olhar do dele, mas antes eu vi mais do que incômodo neles. Eu vi raiva.

_Não, não é você. Nós realmente temos que ir.

O clima estava tenso. Ninguém ousava falar nada. Mas eu não era ninguém:

_Posso ficar até quinta-feira?

Meu pai me olhou severo. E pela segunda vez nos últimos dias, minha mãe me dirigiu um olhar. Desta vez estava muito claro que ela estava com raiva.

Não, não falei isso apenas para desafiá-la ou irritá-la. Eu realmente queria ficar. Não só pela presença dos meus primos, mas eu tinha muito o que conversar com tio Aurélio. Eu precisava me abrir com ele e pedir conselhos. Sem contar que seria muito bem vinda uma semana longe para refletir sobre a minha situação com Rafael.

_Temos que ir, Bernardo._ falou meu pai como se me desse um aviso.

_Mas eu quero ficar. Eu estou de férias e a minha passagem é pra quinta-feira mesmo, qual o problema?

_Nenhum, você é muito bem vindo aqui._ falou minha avó.

_Não me provoque!_ falou minha mãe entre os dentes me olhando com raiva.

Não me intimidei. Lógico que vê-la falando comigo daquele jeito me afetava, me feria profundamente. Mas eu estava cansado de abaixar a cabeça para a sua mente pequena. Eu não estava fazendo nada de errado, oras! Não era eu o errado da história, então por que deveria ser o que mais estava sendo penalizado?

_Não é provocação._ respondi devolvendo-lhe um olhar firme _É que aqui pelo menos eu vou ter alguém para conversar em casa.

Meus irmãos coçaram a cabeça, incomodados. Lea, Lukas e Klaus estavam envergonhados. Me senti mal por eles, mas eles teriam que se acostumar, afinal, era a família deles agora.

_Você que sabe. Fique._ respondeu minha mãe grosseiramente se levantando da mesa.

Mais uma vez, ela passou o dia no quarto, só descendo na hora de ir embora. Nós tentamos ignorar a sua cena mais cedo e nos divertir. Lógico que tive que ouvir broncas de Tiago e do meu pai, as quais ouvi calado, sem argumentar contra, mas não voltei atrás da minha decisão. Não era eu o errado da história!

À noite, eu ajudei a levar a mala dos meus irmãos para o táxi. Eles se acomodaram esperando meus pais, que foram se despedir da minha avó na cozinha, enquanto ela preparava o jantar. Lea e Lukas deviam estar tomando banho. Em frente à porta, observando a noite de inverno em Porto Alegre, senti uma mão sobre meu ombro. Era tio Aurélio.

Precisa conversar?

_Sim, mas não hoje._ falei cansado _Amanhã.

_Ok, vou estar aqui.

Nessa hora, meus pais e minha avó apareceram na sala onde estávamos. Minha mãe nem se preocupou em disfarçar seu desgosto em me ver conversando com tio Aurélio com sua mão em meu ombro.

_Pena que você não vai ficar mais, temos muito o que conversar._ falou tio Aurélio para minha mãe quando ela passou apressada por nós.

Ela se virou raivosa para ele. Estava bem claro para mim que ela segurava uma explosão na garganta.

_Eu estou indo embora porque não aguento ver isso mais._ ela falou apontando para ele e minha avó com o queixo _Vocês envergonhando a casa e a memória do meu pai.

_Teresa!_ falou meu pai brigando com ela _Tenha senso de ridículo!

Ela nem pareceu lhe dar ouvido, se virou e saiu. Minha avó e meu tio engoliram seco, mas deixaram passar. Eles já tinham passado por muita coisa na vida, ouvido muita coisa na vida, para deixar que a “memória” do meu avô os deixasse envergonhados por alguma coisa. Meu avô estava morto, e junto com ele os tempos mais sombrios daquela casa. Eu, no entanto, me envergonhei profundamente, mas pelo comportamento da minha mãe. Era estranhamente doloroso vê-la se prestado àquele papel tão bobo e pequeno. Era quase como seu eu nem a reconhecesse mais.

_Me desculpem, vocês conhecem..._ falou meu pai, que depois se virou para mim _Se cuide e não apronte, viu?

Balancei a cabeça afirmativamente. Não tinha intenção nenhuma de aprontar, muito pelo contrário. Finalmente, paz.

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Comentários

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Bernardo realmente amadureceu.

Agora vamos aguardar os próximos capítulos.

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Não fiz outra coisa nas últimas 48 horas: ler esse romance maravilhoso. Quantos Bernardos existem em cada um de nós???? Parabéns é pouco, não tenho palavra de agradecimento para elogiar e expressar meu sentimento pelo que li até agora.

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