Julho de 2010 trouxe para mim um sentimento de agonia. Iria começar meu último semestre na faculdade. Mais seis meses e eu estaria solto no mundo, pronto pra começar a minha vida longe do ninho. Por mais que o meu curso me desse boas perspectivas de emprego, terminar a faculdade é sempre pular no escuro. Nunca se sabe qual é o próximo passo.
Eu decidi deixar esse sentimento em standy by para comemorar meu aniversário de namoro com Rafael. Para comemoramos nossos dois anos de namoro (não contávamos a primeira vez que namoramos), resolvemos utilizar o recesso dos estágios e as férias da faculdade para viajarmos para Gramado. Eu já conhecia de outra vezes que escapei para lá com minha família quando visitávamos meus avós, mas Rafael ficou verdadeiramente encantado.
_Que cidade linda!
_Gostou da sugestão de passeio?
_Adorei!
Era o começo da noite e andávamos lado a lado pela avenida principal da cidade. Fazia muito frio, mas isso só contribua para o charme do lugar.
_Você não gostaria de morar num lugar assim?_ ele me perguntou.
_Como Gramado? Acho que não...
_Por que não?
_Não nasci pra viver cidade pequena.
_Mas você mora em Belo Horizonte, a maior cidade pequena do mundo!_ ele comentou brincando.
_Eu sei, eu sei. Mas acho que não gostaria.
_Não necessariamente uma cidade pequena. Eu tô falando desse clima, essa coisa meio europeia.
_Então, você está me perguntando se eu gostaria de morar na Europa?
_É._ ele falou rindo.
_Não. Acho muito legal de visitar, mas não sei se conseguiria morar. Eu sou muito apegado à minha terra e à minha gente, Rafa. Não sei se eu conseguiria deixar tudo para trás.
_Nem mesmo Paris?_ perguntou provocando.
_Nem mesmo Paris. Por melhor que tenha sido, eu sabia que uma hora voltaria para casa, não era uma estadia por tempo indeterminado. Paris para mim foram férias estendidas.
Não era a primeira vez que Rafa jogava no meio de uma conversa a sua vontade de morar fora do país. Ele tinha esse sonho louco de viajar o mundo todo, morando um tempo em cada lugar e então escolher um lugar para se fixar. Eu não compartilhava dessa ideia. Apesar de tudo, eu gostava do meu país, eu gostava da minha cidade. Seria legal viajar pelo mundo, mas por períodos curtos. Eu sou uma daquelas pessoas que gosta viajar, mas ama voltar para casa. Essa era uma das questões que denunciava o modo como eu e Rafa sempre pensávamos diferentes.
A irmã do Rafa tinha uma diferença grande de idade para ele e logo após o ensino médio foi morar fora do país. Os meus sogros sempre foram o maior exemplo do que seria liberdade paterna sem exageros. Eles criaram Rafa livre, pronto para descobrir o mundo. Ou seja, toda a criação de Rafa o levava para aquele ponto, viajar e descobrir novos lugares e culturas.
Eu, por outro lado, cresci numa família numerosa e que está sempre se visitando. Eu posso não falar muito dos meus tios e primos aqui, mas eu tenho muito contato com eles, pelo menos os da família do meu pai. E tinha os meus irmãos: por mais que ainda não fossemos os melhores amigos do mundo, já tínhamos nos aproximado muito nos últimos dois anos, e eu não queria partir esse elo agora.
Por isso, me agoniava quando Rafael começava esse assunto. Eu sabia que assim que terminássemos a faculdade, ele me viria com algum convite. E eu ainda não tinha uma resposta para dar para ele. Não era falta de ambição da minha parte, de jeito nenhum. Eu fazia estágio numa grande empreiteira, enquanto Rafael trabalhava numa mineradora numa cidade vizinha a Belo Horizonte. Eram empresas enormes, com grandes possibilidades para nós dois crescermos, sem nos distanciarmos muito de casa. Mas era o que Rafa queria?
_Vamos ficar por aqui?_ ele perguntou me indicando um restaurante de comida italiana.
_Vamos.
Entramos e fomos muito bem atendidos. Éramos dois caras sozinhos num restaurante requintado numa das cidades mais românticas do país, não precisa de muito mais informação extra para entenderem que nós éramos um casal gay. Ainda sim, fomos atendidos como qualquer outro casal que entrasse ali. Não era nem uma questão de que aquelas pessoas não tivessem preconceito, talvez até tivessem, a questão era que eles foram bem treinados para atender qualquer tipo de cliente, até mesmo os que eles não gostassem.
_Viu?_ falou Rafa quando o garçom deixou a mesa depois de anotar nossos pedidos _É disso que eu estou falando. Em Belo Horizonte, estariam todos olhando pra gente agora.
_É uma ilusão, Rafa. Nós somos bem tratados por sermos turistas numa cidade onde todos são treinados para tratar o turista como rei. Se morássemos aqui, talvez fossemos tratados pior do que em BH, por essa ser uma cidade pequena e conservadora.
_É, talvez... Mas você não nega que na Europa seríamos bem tratados mesmo se não fossemos turistas.
_Possivelmente.
E tinha esse complicador: o preconceito. Quando assumimos nosso namoro, Rafa viu todos os seus amigos virarem as costas para ele. Ele sentiu na próprio pele o peso dos olhares maldosos e do silêncio quando ele passava por uma roda de conversa. Por mais que ele não tivesse realmente desabado com aquilo, a situação toda o marcou muito. E inúmeras vezes durante esses nossos dois anos de namoro também fomos vítimas desses olhares, apesar de nunca ter passado disso. Ele ansiava por um lugar onde ele pudesse deixar essas visões no passado.
Então, dois anos, seu Bernardo._ ele falou batendo com o dedo na minha aliança _Quem diria?
_Quem diria... Você botava tanta fé assim?_ perguntei brincando.
_Não. Eu tinha até uma aposta interna: quem ia pular fora antes, eu ou você._ respondeu rindo também.
_Mas contra todas as possibilidades e todas as torcidas, estamos aqui.
_Estamos aqui.
_Para sempre agora.
_Para sempre._ falei brindando com sua taça de vinho.
O garçom nos serviu com alguma massa italiana que nos deixou inchados de tanto que comemos. Como é uma cidade pequena, voltamos a pé para o hotel conversando. Não é uma comparação que se deve ser feita, mas me lembrei das minhas caminhadas noturnas com Ricardo em Paris.
_Sabe, eu ia esperar uma ocasião certa para te perguntar isso, mas acho que não existe ocasião mais perfeita do que esta agora._ Rafael falou.
Temi um pouco que ele fosse me pedir pra fugir do país com ele, mas tentei relaxar e não pensar nessa possibilidade.
_Sim?_ falei parando de frente para ele.
_Eu quero dar um passo além no nosso namoro.
_Do que você está falando exatamente?
_Bernardo, você quer morar comigo?_ ele perguntou sorrindo.
Minha primeira reação foi ficar paralisado. Não que eu tivesse alguma dúvida que ele fosse me pedir isso um dia, ele só não deu sinais. Mas não foi o que eu sempre sonhei? Me casar com Rafael e viver junto com ele? O que mais eu poderia dizer?
_Claro que eu quero morar com você, amor!_ respondi o puxando num beijo.
Até esquecemos que estávamos no meio do rua, apesar do horário já ter deixado a noite vazia.
_Sério?_ ele perguntou em êxtase.
_Sério!
Mandamos o decoro às favas, nos demos a mãos e fomos caminhando para o nosso hotel de mãos dadas.
_E como vamos fazer isso?_ perguntei.
_Estava demorando..._ ele falou revirando os olhos e sorrindo.
_O que?
_Você e toda a sua praticidade.
_É uma pergunta justa, não?
_Sei lá, Bê. Depois de formarmos e sermos efetivados, a gente começa a fazer as contas e acha um lugarzinho para alugar._ ele olhou para longe e continuou _Ou a gente vai morar em outra cidade, sei lá.
Eu não sei se ele vazia essas coisas realmente achando que eu não pegava as indiretas, ou se estava esperando eu tocar no assunto para discutir seriamente seus planos de morar longe de Belo Horizonte. Eu não mordi aquela isca.
_Ok, então, senhor sonhador._ falei _A gente vai se resolvendo durante o semestre. Por enquanto, você tem o meu “sim”.
_E é tudo o que eu preciso agora.
É uma coisa que você aprende depois de algum tempo de namoro, evitar brigas. Para que começar mais uma briga sobre o mesmo assunto, nas quais nunca chegávamos a lugar nenhum, e estragar o momento? Como dizem, o que não pode ser remediado, remediado está.
Entrei no nosso quarto já com Rafa beijando a minha nuca. Apesar de não ter grandes extravagâncias, era um quarto especial com uma cama enorme e convidativa. Resolvemos gastar um pouquinho por conta da ocasião.
Rafael sabia como me deixar louco com sua barba roçando na minha nuca enquanto ele me beijava e nas suas mãos firmes segurando a minha cintura. Do mesmo jeito, eu sabia que o deixava louco quando eu assumia o controle da transa. Por isso, me virei e comecei a despi-lo lentamente, peça por peça. Rafael estava pegando mais pesado na malhação, o que não o deixou muito musculoso, mas firme e definido. E como um bom ex-gordinho que era, ele adorava seu novo corpo, mas nada exagerado. Ele não era do tipo que transava olhando pro espelho, mas ele gostava que o admirasse com cuidado, passando a mão e apertando suas pernas, seus braços, seu peito... E era exatamente o que eu fazia.
_Vem aqui, vem._ ele falou me puxando para a cama.
Ele foi tirando minhas roupas com o mesmo cuidado com que tirei as suas. Ele subiu beijando meu corpo até chegar na minha boca e trocar um beijo ardente. Ele virou na cama e ficamos de lado fazendo um 69. Enquanto eu chupava seu pau, com o dedo eu brincava na entrada do seu cu, o que sabia que eu ele adorava. Do mesmo modo, ele sabia como eu pirava quando ele engolia meu pau inteiro numa garganta profunda.
_Deixa eu te fuder, vai..._ ele falou ofegante.
_Sou todo seu!
Ele me virou na cama e me deixou de bunda para cima. Ele lubrificou minha bunda e seu pau e foi penetrando com cuidado. Ele sabia que aquela posição era dolorosa para mim, então ele me esperou pelo tempo que foi preciso. Quando eu comecei a gemer baixinho e movimentar meu corpo lentamente embaixo do dele, ele entendeu o sinal e começou a bombar. Primeiro devagar, depois acelerando até nós gozarmos um no outro.
Esse era um dos frutos de um relacionamento: nós dois passamos a conhecer bem demais o corpo e os desejos um do outro, nos tornando capaz de ir direto ao ponto no quesito tesão. Nosso relacionamento estava em outro nível.
_Vem._ ele falou me puxando para o banheiro.
Ele sabia que eu praticamente desmaiava depois de gozar, então virou um ritual todo nosso ele quase me carregar pro banho depois do sexo. E o safado ainda colocava me colocava na água fria para eu despertar mais rápido
Rafa...
_O que?_ ele perguntou enquanto se lavava.
_Já percebeu que nós estamos em paz?
_Como assim?
_Conseguimos superar ou pelo menos seguir em frente com nossos problemas com nossos colegas e nossas famílias. Não há mais terceiros correndo por fora. Às vezes a gente briga, ok, mas percebeu como é muito menos frequente?
_Eu já tinha percebido. Acho que nós crescemos.
_E estamos indo pro próximo passo._ falei o abraçando embaixo do chuveiro.
_Não vejo a hora de poder dormir e acordar com vocês pelo resto da minha vida._ falou me beijando.
Era isso, estávamos em paz. Nós amadurecemos. Não éramos mais um casal de adolescentes que era só fogo e paixão desenfreada. Estávamos mais conscientes dos nossos papéis no relacionamento, dos nossos próprios defeitos e dos nossos próprios desejos. Chegamos ao ponto de conseguirmos entender o outro tão bem quanto a nós mesmos, sendo capazes de evitar brigas ou acelerar o gozo. Agora, mais do que nunca, eu nos via como um casal de namorados propriamente ditos. Morar juntos era o próximo e inevitável passo.
Não me entendem mal, por ser pacífico, não era monótono. Por mais que não houvesse mais aquela magia inicial do namoro, atravessávamos um momento também muito gostoso do nosso relacionamento. Hoje eu sei que ali em Gramado, vivíamos a calmaria que antecede uma tempestade. Para o bem e para o mal, os próximos seis meses seriam a prova de fogo do nosso relacionamento.