Ele se levantou e entrou no salão. Ainda fiquei alguns minutos sentado ali, pensando e me recompondo. Depois decidi entrar novamente. Lucinha estava sentada à mesa, junto do Roger e da Alícia, parecendo lamentar alguma coisa. Fui em sua direção, mas nem precisava, pois, ao me ver, ela própria se levantou e veio ao meu encontro, abraçando-me como se não me visse há séculos. Eu não a recusei, mas também não tive prazer algum naquele contato. Era chegada a hora e ela não teria mais como fugir.
(CONTINUANDO)
Sua respiração estava acelerada, mas ela não parecia disposta a ter aquela conversa na frente deles, apesar deles saberem de tudo, talvez até de mais detalhes do que eu próprio, afinal, o corno é sempre o último a saber. Então, ela me puxou para o meio do salão, onde voltamos a “dançar”:
- Certo, explique. - Falei.
- Eu… Eu não sei o que falar, amor. Eu… - Respirou profundamente: - Eu nunca quis te magoar e…
- Errou feio! - A interrompi.
- Eu sei… Desculpa! - Falou e se calou em seguida.
- É só isso que tem para falar? Sua justificativa é essa “não sei o que falar”!? Se é só isso, já estou de saída e...
- Não, não! Olha… - Parou e me olhou nos olhos, naturalmente pensativa: - Foi tudo muito rápido: o interesse dele por mim, a atenção que me dispensou, os elogios, a sedução… Que mulher não gosta disso, hein? Qual? Sei lá, quando dei por mim, estávamos dançando colados e eu comecei a sentir algo crescendo e… Tá, era o pau dele e parecia uma rocha na minha barriga! E... E quando eu olhava para você… Ora, eu estava sendo paquerada bem ali na sua frente e você não fazia nada, às vezes até sorria para mim! Não sei bem, mas lembrei das nossas brincadeiras na cama, daquelas historinhas de ménage e pensei que você estivesse, sei lá, curtindo, se realizando, de acordo com tudo. Juro que…
- Com uma transa!? - A interrompi novamente: - Você acha mesmo que eu estava de acordo com você transar com ele e aqui, em plena recepção!?
- Com tudo! Aqui mesmo também, talvez, não sei... Aliás, eu não pensei que iria transar. Quando ele me convidou para irmos para um local mais tranquilo, eu sabia apenas que ele queria um beijo para “quitar” o colar que me deu de presente, mas lá alguma coisa aconteceu e eu… bem, eu… eu perdi o controle e… só aconteceu.
Respirei fundo novamente, mas agora quem parecia disposto a falar era ela, doesse o que doesse e a quem doesse, no caso eu:
- Lembra dos nossos teatrinhos na cama? Eu me via em uma delas, a atriz principal, e… - Vendo a minha cara de decepção, ela mudou o rumo da conversa: - Desculpa, amor! Poxa, só aconteceu. Eu te amo, nunca deixei de te amar. Juro por Deus!
- Poxa digo eu, Lucinha! Se você estava com tanta vontade assim, por que não me falou ou me pediu, sei lá!?
- Porque eu pensei que não seria nada além do beijo e tive medo de você negar até isso! Mas, você está certo, está sim... Somos um casal e eu não poderia ter tomado uma decisão sem considerar a sua opinião. Eu nunca poderia ter feito o que fiz, sem sua concordância. Disso realmente, eu me arrependo. Desculpa, amor! Desculpa, de coração mesmo. Eu nunca quis te magoar, nunca mesmo! Você acredita em mim, né?
- Olha, eu… eu posso até... entender… mas, sei lá… aceitar, não vai ser fácil...
Eu engasgava com as palavras, não querendo aceitar aquilo. Eu olhava para o nada, sem coragem de encarar a Lucinha nos olhos. Ela continuou:
- Eu sei que deveria me arrepender de ter transado com ele, mas simplesmente não consigo. Foi incrível! Ele soube exatamente como quebrar a minha resistência e, de repente, quem queria demais aquilo tudo era eu! E desculpa se estou com um pouco do cheiro daquele momento, mas do beijo, ali mesmo, na salinha, me entreguei para ele, encostada na parede. Ele só teve o trabalho de levantar o meu vestido e bem… aconteceu! Depois acabei chupando o pau dele e… e… - Ela gaguejou sem coração de terminar a frase: - Eu… Eu não conseguia pensar em mais nada naquele momento que não fosse aproveitar, nem em você. Desculpa, amor! Poxa...
Eu estava gelado e possivelmente pálido a cada novo detalhe confessado, mas ela agora não parecia disposta a parar:
- Agora mesmo, ele está lá com a minha calcinha e eu estou aqui me segurando para não voltar ao banheiro, porque ainda tenho um resto da porra dele aqui dentro de mim e digo resto porque já fui lá no banheiro para me limpar do excesso. Era tanta que começou a escorrer e…
Talvez entendendo que havia extrapolado nos detalhes, Lucinha olhou para mim com um olhar preocupado, esperando uma reação minha que veio rápido:
- Vocês não usaram camisinha, caralho!?
Agora, eu estava ainda mais inconformado, balançando negativamente minha cabeça outra vez e a ponto de explodir de vez, mandando toda aquela simulação de uma sociedade perfeita para os quintos dos infernos. Ela somente levou a mão sobre sua boca, talvez realizando naquele momento que tivesse cometido um erro ainda mais grave do que somente transar e falou em seguida:
- Eu... Eu pedi para ele colocar, juro! Mas ele disse que só transa com casadas pele com pele, justamente por saber que são limpas e sadias. - Ela então deixou escapar um sorriso maroto, mas que eu acabei vendo: - E você acredita que o safado ainda brincou, dizendo que não estava nem aí se eu iria engravidar ou não!?
- E você está orgulhosa disso!? Acha que foi correto transar com um estranho e ainda sem camisinha?
- Olha, calma, amor, eu posso explicar. Eu acho… - Respirou, pensando no que falar por um instante e continuou: - Foi tudo tão intenso, tão rápido, que eu não raciocinei direito. Quando notei já estávamos transando e como eu tomo anticoncepcional, nem me preocupei... Ah, e foi incrível! Ele é um homem realmente muito diferente de você, não que seja melhor, não é isso, mas é diferente na pegada, na intensidade, sei lá... Para você ter uma ideia, eu gozei duas vezes em menos de quinze minutos!
- Bom pra você… - Resmunguei, sem conseguir esconder a minha chateação.
- Amor, nada mudou! Continuo sendo a sua esposa que te ama mais do que tudo nesse mundo e peço para Deus que você possa realmente lidar com o que aconteceu. Eu... Eu errei em não ter te falado desde o início, mas... Poxa! - Falou, olhando para mim com olhos tristes: - Só me diz uma coisa: você me ama?
- E você ainda duvida!? Acha que eu estaria aqui se não te amasse?
- Ótimo, ótimo… Obrigada! Eu também te amo demais. Mesmo! Nada mudou mesmo, nadica de nada. Só que… - Suspirou fundo e baixou os olhos, sem coragem de me encarar: - Eu… Eu tenho uma pergunta meio complicada para te fazer.
- Complicada!? E o que poderia ser pior do que já aconteceu? Você transou... com um estranho... sem proteção! Não dá para ficar pior, dá?
- É. Talvez não seja nada demais mesmo…
- Fala logo, Lucinha! Caramba…
- Eu… Ai, meu Deus! - Respirou profundamente com os olhos fechados, buscando ganhar coragem e falou: - Eu queria transar com o Roger novamente esta noite, com calma, só eu e ele, a noite toda se possível...
- Isso não é uma pergunta!
- Não, não é! É que... Eu quero mesmo, é uma vontade minha, mas, desta vez, estou sendo sincera e abrindo o meu coração para você, sem esconder nada, sendo totalmente transparente e… - Pigarreou antes de prosseguir: - Além da sua permissão, eu vou precisar da sua compreensão também...
Lucinha hesitou, respirando profundamente e mordendo o lábio inferior, soltou a bomba:
- Quando eu falei para o Roger que ainda estava louca de vontade, ele disse que também queria ficar comigo novamente, mas somente se fosse com a sua permissão e no nosso quarto de hotel, onde dormimos ontem, porque ele disse que gosta de transar com casadas na cama do casal. Parece que é um fetiche dele…
- Como é que é!? - Perguntei inconformado, mas eu próprio já me respondi: - Ah, que palhaçada! Tá, acho que já entendi: Na cama do corno, não é?
Ela negou com a cabeça a minha pergunta, olhando-me surpresa, como se fosse melhorar o meu estado e falou:
- Não! Não é corno, amor, você não é! Por favor, eu não estou te traindo, eu... Eu te amo! Nunca deixei de te amar, mas é que, poxa, é minha primeira vez com outro, talvez a única. Eu queria só aproveitar um pouco mais... - Falou me olhando e notei uma "quê" de piedade em seu olhar: - E fica calmo, porque você não vai ficar na rua não! Roger disse que vai reservar uma outra suíte para você, ainda melhor que a nossa.
- Poxa, Lucinha, olha só o que…
- Amor, amor, por favor... - Ela me interrompeu, colocando um dedo sobre a minha boca e me olhando preocupada: - Eu te amo! Amo muito mesmo, mais do que tudo na minha vida, mas eu preciso daquele homem... Só hoje, prometo! Eu preciso matar essa vontade que está dentro de mim. Eu só... Por favor! Depois eu te prometo que volto a ser somente sua e farei de tudo para te fazer o homem mais feliz desse mundo. Eu nunca, nunca vou esquecer dessa sua generosidade e vou dar a minha vida para te realizar. É uma promessa!
Eu fiquei sem palavras após esse pedido. Ela estava ansiosa e aparentemente pouco se importando com os meus sentimentos ou talvez avaliando pessimamente mal os efeitos que suas atitudes tiveram e ainda teriam sobre mim. Infelizmente, ali, eu conheci uma face da minha esposa que nunca imaginei que ela tivesse e não gostei nada. Eu já estava tão para baixo, deprimido, triste e sem saber o que fazer, então não me opus. Falando num volume quase inaudível:
- Tá, Lucinha... Faça o que quiser. Depois a gente resolve a nossa vida…
- Obrigada… Obrigada… Obrigada, amor! Eu te amo muito… muito… muito… - Disse entrecortando seu agradecimento com selinhos na minha boca, mas se calou de repente e me encarou: - Como assim “resolve a nossa vida”?
- Nada não! Vai aproveitar a sua noite com o seu comedor...
- Gervásio!? Não faz assim! Eu... Eu não estou gostando do seu tom.
- Oras... Não sei porque está preocupada comigo. Você fez o que quis, tomou uma decisão, pouco se fodendo se eu estaria de acordo ou não. Tudo bem, eu não sou o seu dono, nunca quis ser e te peço desculpas se passei essa impressão. Eu só pensava que a gente, como um casal, tomasse as decisões juntas. - Falei e suspirei fundo: - Ah, quer saber, faça o que você tem vontade e a gente vê o que faz depois.
- Você está terminando comigo, é isso!?
- Eu só esperava algo diferente de você, só isso! Acho que não me sinto confortável com esse tipo de situação... - Falei, tentando despistar meu inconformismo: - Olha... Vamos parar por aqui, ok? Nossa conversa já acabou e aqui também não é o melhor lugar para decidirmos nada.
Ela me encarava perplexa e baixou seu olhar, encostando a cabeça no meu peito, talvez calculando os ônus e bônus que uma decisão sua causaria. Por fim, respirou fundo e me convidou para retornarmos à mesa. Sentamo-nos lado a lado um para o outro e permanecemos em silêncio. Roger apareceu com a Alícia pouco depois, como se nada tivesse acontecido e se sentou ao lado da Lucinha, enquanto Alícia se sentou ao meu, pousando discretamente sua mão sobre a minha coxa e me olhando curiosa. Eu permanecia triste, fechado, introspectivo, calado mesmo, olhando apenas para uma taça de champanhe à minha frente. De soslaio, notei que Lucinha cochichou algo no ouvido do Roger, provavelmente dizendo alguma coisa sobre o que havíamos conversado ou pedindo alguma opinião. Ele também cochichou em seu ouvido alguma coisa e ela ficou pensativa por um momento, mas, aparentemente dando de ombros e concordando, sorriu para ele logo depois. Ele pigarreou então, dando um leve tapinha no meu ombro para chamar minha atenção e quando olhei, abriu um sorriso amigável. Levantou-se em seguida, ofereceu a mão para a Lucinha que a aceitou, olhando-me um pouco consternada e saíram. Ainda fiquei olhando os dois deixando o salão de mãos dadas na frente de todos, tendo a impressão de que todos ali já sabiam que ele iria comer a minha mulher:
- Você está bem, querido? - Perguntou-me Alícia.
- Não, não estou! Essa situação é absurda, Alícia. Juro que não imaginava que ela faria isso comigo, juro! - Confidenciei, sem encará-la: - Mas, não é nada que um bom advogado não resolva.
- Querido, não tome decisões precipitadas! - Ela me interrompeu e, sorrindo, tirou sua mão de minha coxa e a colocou sobre a minha antes de continuar: - Respire fundo, pense com calma e não termine o seu relacionamento somente por ela ter se deixado levar por um momento de excitação e prazer. Ela é sua esposa, te ama, é visível isso, e nada mudará.
- Já mudou, Alícia. Infelizmente, já mudou e acho que não dá para voltar atrás.
Na minha concepção, as palavras dela, por mais encorajadoras e pacificadoras que fossem, eram demonstração de pura piedade e eu odiava isso! Pouco depois, recebi algumas mensagens da Lucinha no meu celular:
“Quarto oitocentos e quinze, amor, com tudo liberado.
É só pegar a chave na recepção e aproveitar.
Parece que tem até hidromassagem e piscina privativa.
Fiquei até com inveja…
Fica bem!
Eu te amo e nada vai mudar isso.
Beijos da sua e sempre sua, Lú.”
Olhei aquelas mensagens e respirei fundo, decepcionado ao máximo com a situação em que me deixei envolver. Não notei sequer uma lágrima que desceu pela minha face, só tomando conhecimento dela quando foi colhida pela maciez da mão de Alícia que me olhava entristecida com o rumo dos acontecimentos. Aliás, ela, aparentemente tomada pela minha tristeza e sem mais saber o que dizer, se despediu:
- Bom, querido, eu tenho que ir. Você foi um verdadeiro cavalheiro hoje. Não fique se culpando. Pelo que vi, era questão de tempo acontecer e já que aconteceu com o Roger, colha os melhores frutos que conseguir alcançar. No que depender de mim, farei questão de ajudá-lo. - Deu então um beijo no meu rosto, saindo do salão com a mesma elegância com que entrou.
Fiquei perdido e comecei a ter a impressão de que todos me olhavam e falavam sobre mim. Depois de uns cinco, dez minutos no máximo, em que fiquei imaginando o que eles já poderiam estar fazendo em meu quarto de hotel, dessa vez sem ter me excitado nada, levantei e saí do salão, indo até a recepção, pegando a chave e seguindo até minha nova suíte. Não tive ânimo para aproveitar nada, a não ser um belo uísque escocês que estava no barzinho privativo. Era quase uma da madrugada, quando recebi uma mensagem da Lucinha, dizendo para não me preocupar que ela estava se divertindo bastante e torcendo para que eu estivesse fazendo o mesmo. Ela ainda me perguntou se eu estava bem, mas a ignorei, da mesma forma como fiz com outras cinco mensagens que chegaram depois, praticamente de cinco em cinco minutos, insistindo que eu respondesse. Ela ainda tentou me fazer uma vídeo chamada, mas foi recusada. Depois disso, ativei o modo avião de meu celular, pois não queria falar com ninguém, principalmente com ela. Tentei dormir, mas não tive sucesso, rolando na cama durante toda a madrugada, esvaziando a garrafa de uísque e só conseguindo apagar de manhãzinha, "trêbado".
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