T– Renan
Estamos já em maio e o escritório está funcionando há um mês. Artur quis vender o apartamento para ajudar a equipar e mobiliar tudo, só fez uma exigência, um armário para barista na nossa copa, é a nova paixão de Artur. Estamos trabalhando quase todos aqui, exceto os dois médicos e Vitor que agora está imerso na clínica geriátrica, mas ele traz todos os B.O.s para cá, diz que gosta dos velhinhos e calma de lá e da agitação daqui, diz que é mais fácil pensar aqui.
Vitor vem todo dia com uma cor de camisa diferente, camisas de manga curta, já avisamos que executivos não andam assim, ele não se acha um executivo, Mauro o beija e pergunta quem controla folha de pagamentos e toma as decisões sobre compra de insumos e paga os boletos de uma empresa sem perguntar nada ao dono, Vitor fica em silêncio, “Meu lindo, você é o CEO de lá, meu irmão não poderia estar três dias por semana aqui se você não fosse um executivo competente, mas poderia se vestir melhor.”
Vitor não esperava por aquilo, ele dorme desempregado e acorda CEO, não foi assim, ele participou dos gritos que dávamos uns nos outros até formarmos o banco de investimentos para pequenos investidores, classe média baixa e proletariado, esse era o foco, ensinar (Artur) a como investir, e investir (Mauro) com segurança; Jaime e eu estamos na parte jurídica e controlando os números, tem muito mais gente (óbvio). Jaime adorou ter dado esse reboot na carreira, colocamos uma fração de nosso capital para levantar isso, era o sonho de meu tio mais velho.
Temos um time imponente na TI, Paulo está a frente disso, não gosto da presença nele, menos ainda quando a mulher dele mudou-se para a Catalunha para tocar a confeitaria da ex de meu tio mais novo. Eu que sou ciumento, sei, não nego, trabalho separado por uma parede de vidro de meu marido, ele é assistente de Artur no contato com os clientes, eles são uns calhordas que passam horas explicando a pessoas que só tem duzentos reais para investir, é um trabalho sem retorno algum, sem retorno financeiro, esse tipo de cliente traz dúzias de outros investidores, saem sabendo muito sobre mercado financeiro, eles se divertem mostrando esse um real e cinquenta que rendeu em vinte dias, fazem contas para o décimo terceiro e Artur manda trazer uma apostila para dar ao cliente, ele fica sabendo que ficamos com cinquenta centavos, o cliente diz que isso não paga o cafezinho, Vitor disse que na hora surgiu a coisa certa a dizer, disse que não somos uma empresa comercial, somos uma empresa que quer se sustentar, mas antes tem um propósito social, promover educação financeira.
Eles fecham a conta do cliente e devolvem o dinheiro, dizem que sabem que eles vão querer voltar e reinvestir o capital novamente, sabem agora que podem dispor do dinheiro imediatamente, sem pegadinha, eu observo meu marido fazer isso e me distraio.
Mauro diz que está tudo organizado, vai comunicar a reunião no fim do expediente. Todos os dias abrimos ao público às duas e fechamos às seis, o último sai às sete, é uma rotina feliz, chegamos às nove da manhã, é uma rotina puxada. Reunião marcada, meu marido está ali com Artur, vejo ele com a lábia dele, foi chamando meu nome com febre que ele me fez ficar enfeitiçado, hoje ele veio como um executivo. Olavo diz que eu preciso me concentrar, pergunta se sei algo sobre a reunião, Olavo é um amigo, contador e auditor de contas, me dá um arquivo de quase duzentas páginas para eu corrigir em dois dias, ele pergunta se eu quero que ele imprima as cinquenta primeiras páginas, quero, ele sorri; chega, estou exausto e eu preciso de um café, o sol se põe lá fora e o tom laranja toma conta do escritório, exceto pelos banheiros, todas as poucas paredes são de vidro, há persianas, claro, mas adoramos ver o dia passando por nós, as luzes da manhã, as luzes elétricas de quando desligamos tudo antes de ir embora.
Hora da reunião, chega um bolo para comemorar a primeira semana que não operamos no vermelho, Olavo chega a chorar, tinha medo de ser demitido como aconteceu duas vezes em um ano, brindamos com champanhe mais comum mesmo, Mauro manda fechar as persianas, queria que ficássemos à vontade, convida todos mundo a tirar os sapatos, os trinta homens e vinte mulheres, do auxiliar de serviços gerais até Jaime, o sócio que mais investiu, ele agradece nominalmente a cada um, e dá uma frase explicando um momento onde isso não seria o que é se não fosse a vontade de cada um fazer o melhor, “Seu Tiago e dona Geane, casados, se demitiram da construtora para vir embarcar nessa aventura minha, com filhos e trocam a segurança por essa aventura, não há uma poeira que não se sinta grata por eles serem os primeiros funcionários daqui, eles que vão ter a honra de cortar a primeira fatia, e detalhe, cada um que corte seu pedaço de bolo, trabalhamos juntos e dividimos o bolo juntos.” Aplaudido, claro, ovacionado.
Sexta feliz, música, em duas horas todos estão se despedindo. Paulo diz que é champanhe de verdade, nunca havia experimentado até... ele olha pra mim e vê que estava falando comigo, se desculpa pra sair e eu o seguro pelo braço, pergunto se foi até a festa no ano passado lá em casa, ele concorda e diz que sabe que não gosto dele, estava na hora de ir embora, eu digo que meu marido sente a falta dele, que eles eram amigos antes de eu surgir, eu não queria tirar nada que fosse de Roger. Olho ao redor e estamos apenas nós oito, Olavo e ele, Olavo se aproxima de mim para me avisar do relatório ao lado de minha mochila e se despedir, eu peço para os dois esperarem, Artur, e os outros faziam uma rodinha de conversa, só Jaime e Dário em outro lugar, abraço meu marido por trás e ele se afasta para me dar espaço no círculo, pergunto se posso fazer uma merda do caralho, Artur pergunta sobre o que era essa merda, digo que é um pedido de desculpas ao meu marido e... Mauro diz que adora problemas.
Seguro a mão de Roger e o puxo comigo, eu mando Roger beijar Paulo, ele me pergunta como e eu digo que era daquela maneira, então eu beijo Olavo que leva uns instantes pra me beijar de volta, vejo meu marido agarrando seu melhor amigo, esfrego meu pau em Olavo e digo que quero comer ele na frente de meu tios e meu marido, ele me beija o pescoço com aquele bigode branco, diz que sim, pergunta se eu tenho camisinha.
Artur se aproxima, todos vão se aproximando e tirando as roupas, digo para Paulo não se esquecer de apagar as câmeras de vigilância daquela noite antes de irmos embora. Roger se afasta de Paulo e diz que não dá.
Paulo apaga os registros de segurança desde a hora do almoço até pouco antes de irmos embora.
Em casa tenho uma discussão com Roger, apenas ele e eu, mas Jaime estava lá de fones de ouvido, meio como um garantidor. Eu mandei ele ir embora e ele foi fazer a mala. Jaime pulou de onde estava e disse que ia passar aquela noite com meu marido, levou ele pra o outro quarto, assim que a porta fechou eu senti, senti que um segundo atrás eu poderia ter retrocedido, mas ele bateu a porta e eu soube, que eu nunca mais seria tão feliz como no dia anterior. Eu o mandei ir embora, e ele nunca mais iria voltar.