Vizinhança. capítulo 1 - Um barulho de madrugada

Da série Vizinhança
Um conto erótico de Alvo, o aventureiro
Categoria: Gay
Contém 2761 palavras
Data: 18/08/2024 01:33:47

Tá-tá-tá… Meu quarto se recheia de sons surdos. Tá-tá-tá… intensos e ritmados, no meio da madrugada. Eu já devia estar dormindo, mas perdi o sono; fiquei o tempo todo rolando de um lado para o outro da cama, na esperança de reencontrá-lo. O celular ligado; a luz azul em minha cara. Todos dormiam, menos eu. Menos eu e essa coisa batendo em minha parede. Tá-tá-tá… Era barulho de bicho? De vento? De gente? Fantasiei comigo mesmo que aquele barulho vinha todos os dias e eu só não ouvia. Mas por quê? Tá-tá-tá… era rítmico, com certeza, mas o ritmo era errante, ora se acelerava, ora se reduzia. A minha gata Doralice se agitou; meteu os dois bracinhos sobre o pé da cama e miou. Decidi abrir a janela do quarto. Imediatamente, o som cessou. Não havia vento nenhum e tudo o que eu podia ver era o breu da noite. Eu não conseguia colocar a cabeça para fora, por conta das grades na janela. Me contentei em assumir: “é um gato, ou gatos, e por isso Doralice está tão incomodada”; gata velha se incomoda com qualquer coisa.

Fechei a janela, deitei de volta, fechei os olhos. Não deve ter demorado um minuto para o barulho recomeçar: tá-tá-ta… Deixei minha curiosidade em alto: eu só queria dormir. Botei dois fones de ouvido e deixei um álbum a tocar: um som chill, para me deixar dormir. Se houve mais tá-tá-tá depois disso, desconheço, pois não ouvi.

No outro dia, acordei cedo. Também ouvia barulhos, mas esses eram diferentes: habituais, eu sabia de onde vinham. Sons metálicos, batidas contundentes, barulho de máquina - meu vizinho, Agenor, estava construindo uma piscina. Fiquei sabendo, por fofoca contada por sua própria esposa, Isadora, que a ideia da piscina nem era tanto de Agenor, mas sim de seu filho mais velho, Luís. Ela contou à minha mãe que o garoto e o pai estavam trabalhando na casa de um médico da cidade, Luís como servente de pedreiro, e lá também se construía uma piscina. Agenor era um pedreiro muito experiente, mas já era de idade, e por isso precisava de Luís para o grosso do trabalho braçal. Luís era muito esperto, e propôs construir a tal piscina na casa de seus pais - copiava o que aprendia no serviço e repetia em casa. E é por isso que ele trabalhava tão cedo, porque de tarde ia para a casa do médico. Pelo que contava Isadora, a piscina estava quase pronta.

Esses vizinhos eram uma família que raramente nos incomodava. Antes das obras, mal faziam barulho. Minha mãe, Carla, havia feito certa amizade com Isadora; Isadora era uma mulher magra e baixa, e devia ter uns quarenta e poucos anos. Parecia sempre nervosa, mas era uma pessoa cordial; trazia, vez ou outra, alguma quitanda quando nos visitava. Seu Agenor, por outro lado, era de fato um cara cheio de nervos; vivia com um cigarro aceso na boca; às vezes nem esperava que apagasse: acendia um na bituca do outro. Minha mãe me dizia que por trás da sua face carrancuda, Agenor era um homem bom e direito. Quando criança, me lembro de ele ficar bravo de eu brincar na porta de sua casa; um dia mesmo eu estava sentado no banco em frente à sua janela, e ele veio por trás e me deu um piparote na cabeça. Sempre que me via lá na frente dizia: “Ah moleque, o dia que eu te pegar de pau você vai ver”.

Na minha infância, ouvir o senhor Agenor falar assim sempre me estremecia; eu tinha medo de onde sua brutalidade pudesse chegar. Não era muito alto, mas era um homem troncudo, de braços fortes e pernas grossas, aquele corpo construído pelo trabalho de peso. Não era jovem, e já cultivava cabelos acinzentados e uma barriga saliente. Sua pele, assim como a de seus filhos, era de um tom moreno claro; eu me perguntava se era daquela cor mesmo ou se era queimado do sol. As ameaças que ele me fazia quando eu era menino eram sempre do mesmo tipo: “vou te arrebentar, moleque”, “vou te pegar”, “vou acabar contigo”. E sinceramente, eu não estava acostumado com aquele linguajar, aquele tipo de violência. Fui criado somente por minha mãe, meu pai eu nem conheci. Eu sabia dos afagos de mãe e conhecia também a braveza dela; mas aquilo era diferente. O bradar de seu Agenor era diferente, era masculino. E aquela masculinidade era como uma peça que me faltava: eu não sabia como ser bruto, eu não sabia como ser forte, eu não sabia como ser másculo, pois eu não tinha ninguém para me espelhar. E eu queria aquele mundo para mim, vorazmente. Quando criança, eu fechava os olhos bem forte, aterrorizado pelo medo de aquele homem me fazer algum mal. Eu me lembro que uma vez apanhei de minha mãe: ela me deitou em seu colo e me deu sucessivas palmadas na minha bunda. Doeu muito, é certo, mas eu só conseguia imaginar que se o seu Agenor fosse o meu pai, teria doído muito mais. Os braços da minha mãe eram finos; ele tinha os braços grandes; sua mão devia ser pesada; ele não me bateria com pena; eu teria que aguentar. Imaginar essas coisas era uma faca de dois gumes, porque apesar do terror, eu ainda queria um pai. Queria que um homem me amasse, me protegesse e me corrigisse quando necessário.

Nesse dia, tomei café com a minha mãe, como de hábito, antes de ela partir para o trabalho. Eu só pegaria o ônibus para a faculdade no finzinho da tarde. Assim que ela saiu, decidi ir atrás da casa investigar melhor o barulho que eu havia ouvido à noite; ora, podiam ser gatos, mas e se fosse outra coisa? Não me custava nadinha dar uma volta por trás da casa. Saio pela porta, sinto o cheiro de cigarro, mas não era seu Agenor. Uma mulher que devia ter uns trinta e poucos anos, loira, maquiada, segurando um cigarro aceso com os lábios cor de carmim, estava em frente à casa de Agenor. Vestia shorts e camisola, como se tivesse acabado de acordar. Quem era ela? Não me parecia nada familiar. Não pude fazer nada além de ignorar.

Contorno minha própria casa, na esperança de encontrar algo que eu nem sabia o quê. O dia estava tão ameno, dava pra ver o azul do céu, mas o Sol estava tampado pelas ralas e alvas nuvens. O único distúrbio era o barulho das obras na casa do vizinho; a essa hora, só Luís estaria em casa, trabalhando na piscina - e ele não incomodava ninguém além de mim. Aos fundos da minha casa havia um quintal, mas esse quintal não era murado; qualquer pessoa da rua conseguia passar para lá, e por isso nem tínhamos porta dos fundos; uma das poucas vantagens de morar em cidade pequena, do interior. Não havia lá nada de muito valor: um limoeiro, algumas hortaliças e um minúsculo mandiocal. Quando eu era criança, eu me escondia entre os pés de mandioca, me sentindo o explorador; era o muito que eu podia me aventurar sem sair de casa. Olho o entorno próximo à janela do meu quarto: nada de inabitual; plantas, concreto rachado, uma linha de formigas, a parede. É, devia ser um gato mesmo, por isso Doralice estava tão irritadiça. Pronto, posso voltar para dentro. Continuei contornando e um reflexo me chamou a atenção, de relance. Látex, ora pois. Me pus de cócoras intrigado, para minuciar.

Uma, duas… duas camisinhas usadas, os envelopes metálicos rasgados e o corpo de látex; por dentro, o líquido espesso. Estavam amarelados; pareciam velhas, mas não muito velhas; não estavam destruídas. Alguém estava transando alí, e isso me deixava um tanto excitado. Peguei um delas na mão, estava amarrada na ponta. O líquido dançava de um lado pro outro, era esperma passado. Três! Encontrei uma terceira mais adiante, e essa parecia mais nova. Nesse ponto, o meu pau já fazia pressão dentro da minha calça? Quem está fodendo atrás da minha casa? Eu só ouvi ontem, mas já havia acontecido antes. Podia ser Luís, o filho mais velho de seu Agenor. Duvido muito que fosse Gabriel, o filho mais novo; é novo demais, nem deve ter namorada ainda. Mas Luís? Luís nunca arruma mulher nenhuma… Podia ser o seu Agenor. Mas ele trairia a sua esposa tão assim… do lado de casa?!

Dei a volta em minha casa para a porta de entrada. A dama misteriosa fumava outro cigarro. Quem era essa mulher? Será que o Luís finalmente arrumou uma namorada? Tanto faz, segui para dentro de casa, o que eu preciso, hum, o que eu preciso? Peguei uma sacola de plástico e voltei para atrás da casa, com a sacola no bolso. Catei os três preservativos, ainda encantado com o baile dos fluidos dentro do invólucro de borracha, e amarrei-os bem dentro da sacola. De volta para o bolso, bem fechadinha. Entrei em casa respirando fundo. Parecia que eu havia cometido um crime. Coloquei a sacola, toda embolada, lá no fundo-fundo da lixeira da cozinha. Ninguém vai mexer ali. Sentei no sofá e refleti de novo: quem? E esse quem me fazia sentido saber, porque eu queria mais.

Eu queria mais. Sou inevitavelmente aficionado por homens, desde muito cedo. Hoje culpo a ausência do meu pai, mas nem sei se eu deveria culpar algo (ou alguém); não existe culpa se não há crime. No começo eu sentia falta de um guia, um cara que me ensinasse o que é ser homem. Não reclamo de minha mãe, mas ela não podia me ensinar o que ela nunca viveu: cresci um menino meigo, educado, de hábitos tímidos e sempre disposto a ouvir, a acalentar. Conforme cresci, vi que nenhum pai me faria homem feito; e durante minha adolescência, fantasias afloraram. Essas agora eram distintas, nessas agora eu era o receptáculo: aberta como flor, os homens depositavam o seu pólen dentro de mim. Assim eu me sentia, de algum modo, excelente em alguma coisa. O meu toque era delicado, meus lábios macios, o meu corpo delgado. Afeminado, pelas línguas de alguns. E de fato eu podia me enquadrar nisso, la femme, eu adorava me sentir submisso a um homem. Homens têm seu jeito de dominar o mundo, eles sabem que comandam as cenas. E entre os homens, ser “mais homem” é uma questão de orgulho – e é aí que entram os homens como eu. Eu subverto minha masculinidade, quero ser feito de fêmea, para homem que gosta de fêmea; quero dar prazer e me sentir desejado, a flor que exala. Eu quero ser seio que nutre, e também quero tomar do caldo. O caldo que escorre branco de sua pelve – em impulso, me inunde, em pulso – eu quero! Eu preciso tomar!

Eu queria beber o esperma daquelas camisinhas. Não bebi, não sabia qual delas era a mais fresca; não iria tomar porra velha. E foi por isso, e somente por isso, que eu fiz um “limpa” no quintal. Juntei todas as camisinhas na sacola e me livrei delas, porque o amanhã é sempre um outro dia. Eu ficaria depois da faculdade, à noite, esperando o momento fatídico? E depois, o que eu faria? Beberia do néctar ainda quente? Minhas calças ficaram apertadas de novo, eu mal podia esperar.

Às onze, minha mãe voltou para casa. Trouxe duas marmitas, abrimos um refrigerante, ela ouvindo algum podcast, quando eu perguntei:

— Mãe... — Ela me olhou, tirando os fones do ouvido — você viu uma mulher diferente que tá aí na rua, na frente da casa do seu Agenor?

Ela sorriu, agora colocando os fones sobre a mesa.

— Sim, meu bem, é a irmã da Isadora. — Disse, enquanto colocava um pedaço de frango na boca. — Ela é uma pessoa diferente, né? Cheguei a conversar não. Chama Marta.

— Marta. Ela é bonita. — Reparei.

— É, tem quem curta.

— Faz tempo que ela está por aqui, você sabe?

— Bem, eu acho que tem uns quatro dias... não sei.

Minha mãe ficava feliz quando conversávamos durante o almoço, mas era sempre um diálogo difícil. Ela é uma mulher solitária, mas que se acostumou em ser assim, e eu sempre fui sua maior companhia. E por mais que ela diga que eu sou a coisa mais importante em sua vida, às vezes eu sinto como se ela não me quisesse ali, como se eu fosse uma lembrança viva do meu pai. E isso transparecia por sutilezas: o fone de ouvido, o assunto que esgota rápido. Não é falta de amor, é falta de costume.

Ela partiu antes das uma, eu peguei o ônibus para a cidade do lado às três. A faculdade foi mais do mesmo. Voltei para casa já eram mais de uma da madrugada. Do ponto de ônibus até a minha casa não era longe. Na frente de casa, mais uma vez, subia o cheiro de cigarro. Estavam de fora senhor Agenor e a tal da Marta fumando juntos, conversando aos risos. Ele sorria e piscava, maroto. Cumprimentei ambos com o olhar, seu Agenor acenou com a mão e a mulher sorriu. Passei para dentro de casa.

Tomei um banho, deitei em minha cama. Eu estava esperando. A qualquer momento podia ser. E se não houvesse, eu esperaria a noite toda? Não, definitivamente não, mas eu decidi esperar mais um pouco. Afinal, a qualquer momento, a qualquer momento... e então, antes mesmo das duas, eu ouvi a primeira estocada. E agora eu distinguia os sons: não era batida, não era seco, não era contundente. Era o som de pele batendo em pele, a frequência em crescendo. Imediatamente desci minha mão para tocar em meu pênis. Eu queria assistir o que estava acontecendo. Seu Agenor, só podia ser seu Agenor, xavecando a cunhada na minha frente, no meio da rua; com certeza eles terminaram de fumar e foram foder no meu quintal. Ele socava com vigor, o ritmo era intenso. Eu conseguia imaginar ela se segurando em seus ombros largos, enquanto ele tira e põe a pica; eu podia imaginar cada centímetro daquele homem: o seu peitoral peludo, seus braços fortes, sua virilha desenhada, seu sovaco cabeludo, sua cara de cafajeste. Um barulho ou outro destoavam, eram tapas? Só pude imaginar. E como eu queria que ele me batesse, me desse uma surra. Como eu queria ser disciplinado por ele. Como eu queria sentir sua pele batendo na minha, fazendo os mesmos barulhos. Como eu queria que ele me tratasse como uma fêmea e me fodesse escondido, como ele fode essa puta em minha janela. Tantas coisas eu queria, ó, mulher.

Fez silêncio quando parou.

E o silêncio demorou mais alguns minutos. Esperei, era o tempo do cigarro. Não podia flagrá-los, aquele era um lugar sagrado. Deixei que eles se recuperassem em paz. Ah, como minha pica estava dura como pedra. Que sortuda essa Marta! Que safado, cafajeste esse seu Agenor, comendo a irmã da mulher atrás da casa do vizinho. Putão demais! Sortudas as mulheres que esse homem já comeu, toda mulher precisa de um homem forte. Depois de uns vinte minutos, os quais o calado perdurou, julguei seguro sair de casa. Devagar, passo atrás de passo, saio pela porta das frentes sorrateiro, tentando não acordar minha mãe. Eu estava trêmulo. Estava um pouco frio até, mas eu tremia de outras causas. O quão excitante era isso, meu Deus! Olhei por todos os cantos da rua: ninguém, ninguém, nenhuma alma viva. Sim, eu estava próximo do meu triunfo. Com a lanterna do celular ligada, dei a volta na casa, cheguei ao quintal: ninguém, ninguém. Então eu caminho, devagar, iluminando o piso, fazendo ave de rapina, até que reluziu. O brilho bateu de volta, que maravilha! Aquela embalagem de metal, e o látex. O preservativo estava amarrado com um nó frouxo, e estava cheio: o líquido branco, leitoso, ocupava uns dois dedos de altura, e estava tão quentinho. Estava tão quentinho, recém saído, uma pena a quem o desperdiçou. Eu poderia fazer justiça àquele leite. Meu pau estava estourando contra o tecido dos meus jeans. Aproximei a minha boca do nó e senti o cheiro de borracha misturado com cheiro de pica. E ainda tinha o caldinho, sim, o caldinho, saindo para fora do nó, viscoso e hialino. O gosto era salgado e era amargo, percorria a minha língua como balé, era o mais próximo que eu chegaria da rola de seu Agenor. O seu caldo grosso, que eu poderia logo tomar. Eu seria um pouquinho dele, ele estaria dentro de mim.

E então eu ouvi o som de um graveto sendo pisado.

Siga a Casa dos Contos no Instagram!

Este conto recebeu 6 estrelas.
Incentive Alvo, o aventureiro a escrever mais dando estrelas.
Cadastre-se gratuitamente ou faça login para prestigiar e incentivar o autor dando estrelas.
Foto de perfil genéricaAlvo, o aventureiroContos: 1Seguidores: 6Seguindo: 0Mensagem Apenas um contista, novelista. Conto histórias na perspectiva de um homem gay submisso

Comentários

Foto de perfil de Passivo 10

Delícia!! Vontade de ser uma fêmea pra um macho e experimentar a porra de uma camisinha..

0 0