A energia antes vibrante se esvaía, substituída por uma fraqueza que tornava cada movimento um esforço quase insuportável. Os músculos, antes firmes, pareciam se dissolver, e uma exaustão profunda se instalava, tornando a mente nebulosa e distante. A mente, antes clara e cheia de esperanças, agora lutava para manter o foco. Pensamentos se tornavam confusos, como se um nevoeiro espesso obscurecesse a realidade. Um peso invisível se acomodava no peito, dificultando a respiração e fazendo com que o coração disparasse, mesmo em momentos de calma. A tristeza se infiltrava lentamente, transformando a luz em sombras, e o desejo de se conectar com o mundo se dissipava. A sensação era de estar preso em um ciclo vicioso, onde cada respiração se tornava um lembrete da fragilidade do bem-estar, enquanto o corpo clamava por uma renovação que parecia distante.
Durante o final de semana soube da morte de Guilherme, queria ir atrás de Nicolly e a abraçar, mas imaginei que precisaria de espaço para processar todos os sentimentos naquele momento. Tomei a decisão de ficar em casa, e como prometi a Paulinha me organizei novamente, para fazer minhas corridas e ter minha rotina, e após o acidente eu decidi que queria aprender mais sobre primeiros socorros eu já sabia o básico mas queria saber um pouco mais.
Na segunda-feira, para minha surpresa, lá estava Nicolly, seu semblante carregava a marca profunda da tristeza, com os olhos envoltos em uma névoa de melancolia. As sobrancelhas estavam levemente franzidas, como se um peso invisível se alojasse entre elas. O olhar, que antes brilhava com vivacidade, agora se perdia em algum lugar distante, refletindo uma dor silenciosa que parecia ecoar em cada linha do rosto. Mas, havia algo mais, o brilho residual nos olhos denunciava uma faísca de esperança, um desejo de que dias melhores chegassem. Ela se aproximou de mim para conversar.
Nicolly: Oi Maya, bem? Queria conversar contigo antes do treino. Descobri pouco antes da morte de Guilherme que eu estou grávida de 6 semanas e quero prosseguir com os treinos. Será algum problema?
Maya: Oi Nicolly, meus pêsames pelo Guilherme. Parabéns pela gravidez. Bom o treino deverá ser adaptado para evitar problemas na placenta,a sua alimentação deve ser prioridade nesse período.
Nicolly: Certo. Vamos treinar então?
Maya: Claro, só vou pegar sua ficha.
Naquele momento senti o mundo ao meu redor se tornar um borrão, e cada som parecia amplificado, como se eu estivesse presa em um eco interminável. Ela estava grávida, com certeza, mesmo que o luto passasse eu não teria a menor chance com ela. A angústia se instalou em mim como uma sombra pesada, um aperto constante no peito que me deixava sem ar. Era como se um nó invisível se formasse em meu estômago, fazendo com que cada respiração se tornasse um esforço. Precisei respirar profundamente e colocar a minha melhor face para terminar meu dia de trabalho, organizei um treino para Nicolly e fiquei ao seu lado para explicar cada movimento que favorecia o bebe e quais poderiam resultar em algum problema e as adaptações necessárias.
Maya: Além disso seria interessante você praticar alguma atividade ou exercício para o fortalecimento do assoalho pélvico. Nicolly durante a gravidez você passará por mudanças no corpo. Músculos pélvicos fortes podem ajudar a prevenir problemas como incontinência urinária, aliviar dores nas costas e facilitar o trabalho de parto. Pilates e Yoga são excelentes para isso, se você tiver um horário recomendaria fazer.
Nicolly: Você realmente é muito inteligente, obrigada pela ajuda, agora que estou sozinha toda ajuda que eu conseguir será excelente.
Maya: Você ainda fará a prova da PM?
Nicolly: Sim, agora mais do que nunca. Eu preciso assegurar o futuro dessa criança.
Maya: Então, além do Yoga e pilates, você irá fazer na sua casa os exercícios de Kegel e de respiração profunda.
Nicolly: Obrigada de verdade, não sei o que faria sem você.
Ela me abraçou e eu fiquei sem reação, como eu queria beijá-la ali, mas sabia que não era o momento nem o lugar, espero que o futuro nos reserve algo melhor. Nicolly foi embora com os olhos lacrimejando. Nos dias que se seguiram estava sempre conversando com Nicolly sobre os exercícios e sobre o concurso. Eu na minha vida pessoal decidi focar em mim, queria ter um shape de respeito e voltar a praticar boxe. Em 50 dias eu estava com o mesmo corpo que tinha antes de me descuidar, graças a dieta e muito treino, sem a dedicação e Paulinha eu não teria conseguido. Nicolly já havia feito as provas do concurso e estava aguardando os resultados.
Nesse período eu não estive com ninguém, nem com Paulinha. Acho que precisava de um tempo. Sempre ao ver Nicolly meu corpo voltava a reagir, mas agora com seu corpo tendo pequenas mudanças parecia que eu a queria cada vez mais. Uma manhã de domingo recebo uma ligação de Nicolly com gritos e choros, precisei pedir que ela respirasse antes de dizer o que queria.
Nicolly: Eu passei, eu passei, se não fosse sua ajuda e treinos eu não conseguiria chegar até aqui.
Maya: Parabéns, a gente precisa comemorar, vou tomar um banho e estou indo te buscar.
Combinamos o local de encontro e a encontrei lá, brincamos e nos divertimos, Nicolly me disse que estava esperando um menino e pensou em chamá-lo de Nicolas Guilherme, para combinar com seu nome e carregar o nome de seu pai. Achei bonito o nome. Ficamos ali por algumas horas, levei-a para casa e voltei para a minha. E a sensação de querer estar com ela não passava, eu estava cada dia mais envolvida naquele sentimento.
Durante toda a gestação de Nicolly estávamos próximas e conversando, nesse momento ela já estava próxima aos 9 meses, e um dia combinamos de comer algo, ela foi para minha casa e chegou antes de mim, já que nos sábados eu fazia uma corrida e um treino de boxe. Cheguei em casa e a vi deitada em minha cama, era a primeira vez que ela estava no meu quarto, que visão maravilhosa eu tive. Ela estava diante de mim, radiante, como se carregasse uma luz própria. A curva de seu ventre, suave e graciosa, parecia dançar sob a luz suave do entardecer, e o brilho em seus olhos contava histórias de um futuro que já começava a se desenhar. Cada movimento seu era uma expressão de beleza e força, como se o mundo ao seu redor se curvasse em reverência.
Maya: Oi Nicolly, me espera tomar um banho que já saímos. Estava treinando e você chegou cedo.
Nicolly: Sem problemas, eu te espero.
Entrei no banheiro e fechei a porta, como eu desejava ela ali no banho comigo. Liguei o chuveiro e deixei a água cair sobre minha pele. A água escorria pelo meu corpo, morna e reconfortante, quando ouvi a porta se abri e vi uma silhueta se aproximando. O vapor do banheiro criava um cenário etéreo, onde cada gota refletia a luz suave, dando vida àquele momento. O coração acelerou ao reconhecer a figura, que se aproximava lentamente, como se estivesse atravessando um sonho. A água continuava a escorregar, mas a atenção estava completamente voltada para Nicolly despida a minha frente. Havia um calor que não vinha apenas da temperatura, mas da conexão que crescia entre nós. Um sorriso surgiu involuntariamente em meus lábios, e, naquele momento, a simplicidade do que estávamos vivendo se tornava a maior beleza do mundo.
O olhar, intenso e curioso, encontrava o meu com uma profundidade que me deixava sem palavras. Era como se o mundo lá fora tivesse desaparecido, e tudo o que importava era aquele instante compartilhado, envolto em um misto de intimidade e vulnerabilidade. Ela estendeu a mão como em um pedido para me acompanhar, e ao tocá-la, um calor se espalhou por todo o meu corpo, como se a água quente ao nosso redor fosse apenas um reflexo da chama que começava a acender entre nós. O espaço parece encolher, e as paredes do banheiro, agora envolvidas em vapor, se tornaram um santuário onde apenas nós duas existimos. As palavras não eram necessárias; a conexão falava por si. Com um movimento delicado, ela se inclinou, a água cintilando em seu rosto, e pude sentir a proximidade de nossos corpos, como se o mundo exterior tivesse desaparecido. Um riso suave escapou de seus lábios, e, naquele instante, percebi que a vulnerabilidade não era apenas uma fraqueza, mas uma força que nos unia ainda mais.
A proximidade tornou-se irresistível, e cada batida do meu coração parecia ecoar em uníssono com o dela. Com um gesto delicado, ela se aproximou ainda mais, o toque de seus dedos na minha pele era como uma chama suave, e o espaço entre nós se encurtava a cada instante. Os lábios se aproximaram, hesitantes, mas cheios de promessas. Quando finalmente nossos lábios tocaram, foi como se o tempo parasse. O beijo era quente e terno, um suave entrelaçar de sensações, misturando a frescura da água com a intensidade do momento. O sabor dela era doce, e a respiração se tornou um só, um ritmo compartilhado que nos unia ainda mais. Aquele beijo era mais do que um gesto; era uma declaração silenciosa, um compromisso de que tudo o que havia ali era real e profundamente significativo.
Eu sabia que tudo mudaria daquele momento em diante.