Alguns dias se passaram, e eu segui com minha vida normal. As coisas entre mim e Alysson continuavam praticamente iguais. Apesar de outra noite intensa que tivemos, nosso relacionamento permaneceu o mesmo. O fato de ele ser meu tio não mudou nada. Para mim, ele ainda era meu chefe, e essa revelação não influenciava em como eu o via. Não havia um "tio" nas nossas conversas; era como se essa palavra não existisse entre nós.
Chegou o dia em que Caio finalmente viajou. Ele não tinha uma data certa para voltar ao Alto, e isso me deixava com um sentimento de incerteza. Organizamos uma pequena despedida, com alguns amigos mais próximos, mas o que realmente marcou foi nossa festinha a dois. Era estranho pensar que talvez demorasse para vê-lo de novo, e a ideia de sua ausência começava a pesar.
Dias depois, quando tudo parecia estar se acomodando, recebi uma resposta de Bernardo. Depois de todo o silêncio, ele finalmente decidiu falar. Assim que abri a mensagem, senti meu coração apertar. Era um textão, daqueles que você sabe que vai doer ao ler. Respirei fundo e comecei a ler:
"Rafael,
Eu pensei bastante antes de te responder. Sei que você me pediu desculpas pelo que aconteceu com o Luis Ricardo, mas, sinceramente, isso não muda as coisas para mim. A verdade é que não dá para jogar a culpa totalmente nele, porque você também deixou as coisas acontecerem. Acho que, no fundo, nós dois sabemos disso. Se fosse só um erro isolado, talvez eu pudesse relevar, mas sinto que tem algo mais por trás de tudo isso.
A distância entre o Alto e a Capital começou a crescer entre a gente, eu percebi que as coisas já não estavam mais tão claras. Eu estava tentando manter nosso relacionamento, mas não sabia o que você estava sentindo de verdade. E então, quando eu vi que aconteceu com o Luis Ricardo, aquilo foi só a confirmação de algo que já estava se desgastando. Não dá para negar que nós dois somos culpados por isso. Eu errei ao achar que a distância não seria um problema, e você errou ao não me dar a segurança que eu precisava.
O que aconteceu foi como um sinal de que não estamos prontos para algo mais sério. Talvez em outro momento, em outra fase das nossas vidas, as coisas poderiam ter sido diferentes. Mas agora, com toda a distância entre nós e a falta de confiança, não vejo como isso poderia dar certo.
Eu te desculpo, mas acho que o melhor para nós dois é não forçar algo que, claramente, não está funcionando. Quem sabe no futuro, quando a gente tiver mais clareza sobre o que realmente quer, possamos pensar diferente. Mas por enquanto, acho que o melhor é cada um seguir seu caminho. Eu desejo de coração que você encontre o que está buscando. Só não quero mais me magoar ou magoar você nesse processo."
Ao terminar de ler, senti um nó se formar na minha garganta. As palavras de Bernardo me atingiram como um golpe inesperado. Eu sabia que tinha errado, mas não estava preparado para ouvir isso de forma tão direta. Ele não apenas me culpava pelo que aconteceu com Luis Ricardo, mas também jogava luz em todas as falhas e inseguranças que eu vinha ignorando.
Por um momento, fiquei em silêncio, encarando a tela do celular. Era difícil processar tudo aquilo de uma vez. O que mais doía era a sensação de que, por mais que eu quisesse, talvez nunca fosse o suficiente. Bernardo estava me pedindo para seguir em frente, mas não sem antes deixar claro que ambos tínhamos nossa parcela de culpa. E, no fundo, eu sabia que ele estava certo.
Com o Caio viajando e sem nenhum contato com Bernardo, restava-me apenas uma opção: voltar a me dedicar 100% aos estudos. O vestibular estava se aproximando, e qualquer tempo livre que eu tinha era investido nisso. No fundo, era uma boa distração para afastar o turbilhão de emoções que rondavam minha mente, especialmente depois da mensagem de Bernardo. O silêncio entre nós dois só reforçava a sensação de vazio.
No entanto, um evento importante estava à porta: o aniversário do Sr. Alysson. E, com ele, surgiam duas situações que eu não sabia muito bem como lidar. A primeira seria o reencontro com Bernardo, após todo esse tempo de distância e silêncio. O que eu falaria? Como seria a nossa interação? O simples fato de imaginar esse momento já me deixava ansioso.
E, claro, havia a questão do meu pai. Eu sabia que ele estaria lá, como o Alysson havia mencionado. Mas a ideia de conhecê-lo formalmente, com um simples “Oi, esse é o seu pai, prazer, sou seu filho”, não era algo que eu queria. Na verdade, eu nem sabia se estava preparado para conhecê-lo. Pensava em vê-lo à distância, talvez cruzar olhares rapidamente, sem a necessidade de trocar palavras. A possibilidade de fugir desse encontro me parecia tentadora, tanto que considerei seriamente a ideia de não aparecer no aniversário naquele fim de semana.
Mas então veio o outro lado da moeda: Alysson. Eu sabia que ele precisaria de mim para várias coisas, afinal, seriam dois dias de festas. Ele tinha deixado claro que queria muito a minha presença, não só pelo carinho que tínhamos construído ao longo do tempo, mas também porque eu era um dos poucos em quem ele confiava para ajudar com os preparativos. Além disso, por mais confuso que tudo estivesse, eu sentia que devia isso a ele. E, de certo modo, talvez o aniversário fosse o momento perfeito para enfrentar meus medos e tentar colocar um ponto final em tantas questões mal resolvidas.
No fundo, eu sabia que seria um fim de semana complicado, cheio de reencontros, verdades e silêncios ensurdecedores.
Na semana do aniversário do Alysson fizemos uma viagem curta para uma cidade próxima para resolver algumas coisas a estrada que cortava o interior parecia interminável, mas a paisagem ao redor, com seus campos vastos e céu aberto, trazia uma paz que contrastava com as emoções borbulhando dentro de mim. Alysson dirigia em silêncio, o som do motor era o único ruído além do vento que entrava pela janela entreaberta. De repente, ele quebrou o silêncio
— E então, tá preparado pro final de semana? Promete grandes emoções, hein? — falou ele, desviando brevemente os olhos da estrada para me encarar com um sorriso discreto.
Suspirei, sentindo a tensão crescer no peito. — Estou um pouco tenso, na verdade. Por duas coisas: primeiro, o reencontro com o Bernardo, seu filho... Não sei como será. E a outra... Vou conhecer meu pai. — Fiz aspas com os dedos ao falar "pai", deixando clara minha confusão sobre a palavra.
Alysson ficou pensativo por um instante, depois assentiu. — Bom, deixa as coisas acontecerem. Eu conversei com o Silas... — Ele parou de falar por um momento, e antes que eu pudesse perguntar, continuou. — Silas é o nome do seu pai. Acredito que você ainda não sabia.
Senti um leve desconforto no estômago ao ouvir o nome, e antes que pudesse processar, ele continuou:
— Eu falei com ele e expliquei que, a princípio, você não queria nenhum contato. Ele entendeu e vai respeitar isso. Ele vai ficar na dele. Mas, caso você se sinta confortável e queira falar, ele estará esperando.
Fiquei em silêncio, observando a paisagem que passava pela janela. As colinas verdes pareciam refletir o caos dentro de mim. Após alguns minutos, finalmente respondi:
— Sinceramente, não faço muita questão. Como já falei, pra mim não muda muita coisa. Vou seguir minha vida normal, como se ele não existisse.
Alysson assentiu levemente, respeitando meu espaço, mas depois lançou uma pergunta que me fez hesitar.
— Que tal você saber um pouco mais sobre seu pai?
Minha resposta foi automática, quase defensiva. — Não faço muita questão de saber nada da vida dele.
Ele riu suavemente, um riso de quem sabe mais do que está disposto a admitir. — Bom, mas temos tempo até chegarmos ao Alto. Como estamos sem assunto, vou te contar algumas coisas. — Ele ajustou o corpo no banco, como se se preparasse para uma longa conversa. — Você tem duas irmãs. Uma é a Sofia, de 14, e a outra é a Zoe, de 3. Seu pai é dono de um hospital na capital. Não sozinho, tem alguns sócios. Quando nossos pais morreram, ele investiu a herança nesse hospital, o que rende um bom retorno pra ele.
Fiquei surpreso com as informações, especialmente ao ouvir sobre minhas irmãs. O fato de ter irmãs que eu nunca conheci, especialmente tão jovens, trouxe uma sensação agridoce. Enquanto eu assimilava isso, Alysson continuou:
— Como você sabe, eu segui outro caminho. Fiquei com a fazenda, as terras, e a fábrica. Por mais que eu vá à capital de vez em quando, meu lugar é aqui, no interior. Eu amo o campo. Mas, enfim, voltando ao seu pai... Ele é nefrologista, um dos mais respeitados. Já salvou muitos pacientes e tem uma carreira impressionante.
Eu franzi o cenho, confuso. — Nefrologia é o que cuida dos rins, né?
— Sim — respondeu Alysson, com um certo orgulho. — Ele é muito bom no que faz.
— Dizem que é uma das especialidades mais difíceis de entrar — comentei, tentando disfarçar o leve interesse que surgia.
Alysson sorriu de canto. — Sim. Mas, assim como você, seu pai sempre gostou de estudar muito. Tanto que... — Ele hesitou, mas então continuou. — Tanto que abriu mão de “construir uma família” para se dedicar aos estudos e à carreira. Mas não vamos entrar nessa pauta de novo.
Fiquei calado, absorvendo as informações. Alysson falava com uma calma calculada, quase como se estivesse plantando uma semente em mim. Talvez estivesse. A imagem de meu pai, até então uma figura nebulosa e distante, começava a ganhar contornos, e a ideia de ter duas irmãs, especialmente uma de apenas 3, mexeu comigo. Sempre fui só eu e minha mãe, e de repente, havia mais.
A viagem seguiu com Alysson me contando mais curiosidades sobre Silas. Embora eu me mantivesse reticente, uma pequena parte de mim começou a considerar a possibilidade de conhecê-lo. Talvez, apenas talvez, essa conversa estivesse abrindo portas que eu jurava manter fechadas.
Depois que voltei da viagem, Alysson me deixou em casa. Entrei e encontrei minha mãe preparando o almoço. Conversamos sobre coisas do dia a dia, sem muita importância, até que senti a necessidade de falar sobre a presença iminente de Silas.
— O Alysson me contou que o Silas vem esse final de semana. É o aniversário dele, e o Silas vai aparecer por aqui — disse, tentando manter um tom neutro, embora soubesse que o assunto mexeria com ela.
Minha mãe, ao ouvir o nome "Silas", arregalou os olhos, claramente surpresa e, talvez, um pouco desconcertada. Seu olhar se fixou em mim por alguns segundos antes de perguntar:
— E você vai falar com ele?
Balancei a cabeça, mantendo minha decisão firme. — Bom, na verdade, não. Como já falei antes, não faço questão. Pra mim, ele é uma pessoa qualquer, acredito que isso não vá mudar nada.
Ela ficou em silêncio por um momento, como se ponderasse o que eu havia dito, antes de falar, com uma leve tristeza na voz:
— Bom… você sabe o que é melhor pra você, meu filho. Mas, se quiser dar uma chance para o seu pai, talvez possa ser bom pra você.
Notei o peso em suas palavras. Era quase como se ela tivesse medo de me perder de alguma forma, como se a aproximação com Silas pudesse criar uma distância entre nós. Olhei para ela, querendo tranquilizá-la.
— Mãe, não quero isso. E se a senhora está insinuando que "ser bom pra mim" é em relação ao dinheiro dele, pode esquecer. Prefiro trabalhar e conquistar as minhas coisas por mim mesmo.
Ela sorriu, um sorriso cansado mas orgulhoso, e assentiu. — Você está certo. Mas, qualquer decisão que tomar, eu vou te apoiar.
Houve um breve silêncio, e então resolvi compartilhar algo que Alysson me contou durante a viagem. — Descobri hoje que tenho duas irmãs — falei, tentando manter o tom leve. — O Alysson me contou. Uma de 14 e outra de 3. Confesso que fiquei um pouco feliz ao saber disso. Mas sou pé no chão, sei que qualquer contato com elas seria meio que impossível. Afinal, ninguém sabe da minha existência.
Minha mãe permaneceu em silêncio, sem expressar muito, o que na hora me pareceu apenas uma reação neutra. Mal sabia eu que minhas palavras tinham atingido um ponto sensível. Mais tarde, entendi o motivo de sua quietude. Falar sobre as filhas do meu pai causou um incômodo profundo nela, uma dor que ela não externou naquele momento. Ela fez as contas rapidamente na cabeça e percebeu que, se uma das meninas tinha 14, isso significava que, pouco depois de me rejeitar, meu pai já estava formando uma nova família.
A diferença de menos de três anos entre mim e minha irmã mais velha, levando em conta o tempo de gestação, trouxe à tona memórias dolorosas para minha mãe. Ela havia sido descartada por Silas, e saber que ele rapidamente seguiu em frente e construiu uma familia só reforçou essa ferida antiga. Claro, se eu soubesse que essa informação iria machucá-la tanto, teria evitado falar ou, pelo menos, tentado prepará-la para o que viria. Mas foi só anos depois que ela me confidenciou o peso que aquelas palavras carregaram para ela.
Naquele momento, porém, minha mãe apenas sorriu de leve e terminou o almoço, deixando o desconforto guardado para si. Eu não tinha ideia do que se passava em sua cabeça.
Era sexta-feira, e o tão temido final de semana finalmente havia chegado. Eu teria que lidar com uma avalanche de emoções. O Alysson organizaria a comemoração de seu aniversário em dois dias distintos. Na sexta, haveria um jantar apenas com a família, no qual ele insistiu que minha presença era indispensável. Apesar de minha relutância — afinal, para muitos ali, eu era apenas um funcionário —, acabei cedendo. No sábado, a festa seria maior, um churrasco com amigos, familiares, parceiros de trabalho e outras pessoas ligadas aos negócios do Alysson. Eu sabia que aquele seria um fim de semana intenso, tanto pela presença do Bernardo quanto pela chance de ver meu pai pela primeira vez.
Na manhã de sexta, fui encarregado de buscar algumas bebidas na cidade e, ao retornar à fazenda, meu coração começou a acelerar ao ver uma cena inesperada. Enquanto estacionava o carro, vi ao longe o Bernardo galopando em um cavalo, aproximando-se rapidamente. Aquele seria nosso primeiro encontro desde a mensagem, e meu peito apertou só de pensar nisso. Mas ele não estava sozinho. Logo atrás dele, vinha outra pessoa montada — uma garota loira, de cabelos cacheados e olhos verdes. Eu a ouvi gritar:
— Primo, você roubou! Eu estava ganhando a corrida!
Quando eles se aproximaram, Bernardo desceu do cavalo e ajudou a garota, com um sorriso no rosto. Ele então veio até mim, seus olhos brilhando com uma mistura de cordialidade e algo que eu não sabia decifrar. Talvez, assim como eu, ele estivesse feliz com aquele encontro, ainda que não fosse possível expressar tudo o que estava sentindo.
Ficamos em silêncio por alguns segundos, até que Bernardo quebrou a tensão ao me apresentar:
— Essa é a Sofia, minha prima. Sofia, esse é o Rafael, funcionário do meu pai.
Sorri para ela, tentando esconder a montanha-russa de emoções que sentia. Ali, bem diante de mim, estava a minha irmã, que não fazia ideia de que éramos parentes. E Bernardo, é claro, tampouco sabia disso. Sofia, com um sorriso caloroso, me respondeu de forma simpática:
— Prazer, Rafael. Você sabe montar?
— Sim — respondi, tentando manter a calma.
Ela sorriu novamente, claramente animada com a conversa.
— A gente estava apostando corrida, e o Bernardo aqui trapaceou de algum jeito. — Ela riu, e Bernardo deu um sorriso de canto, como se reconhecesse a trapaça com um toque de diversão.
— Eu? Trapacear? — Bernardo brincou, olhando para ela de maneira cúmplice. — Só corri mais rápido. Você que ficou pra trás.
Eu assistia àquela interação, meu coração dividido. De um lado, a dor de saber que eles não tinham ideia da verdadeira conexão entre nós; de outro, a alegria de vê-los tão à vontade, tão próximos. Sofia parecia ser uma pessoa simpática e agradável, e Bernardo... bem, apenas vê-lo já mexia comigo.
A conversa foi breve, mas aqueceu meu coração de uma forma inesperada. Quando eles se afastaram para guardar os cavalos, senti uma mistura de alívio e apreensão. Entrei na casa com as bebidas e, ao chegar à sala, meu coração congelou. Lá estava ele. Silas. Meu pai.
Ele era um pouco mais alto que o Alysson, com os mesmos olhos verdes de Bernardo — algo que notei imediatamente. E a primeira coisa que pensei foi: "Por que eu não herdei esses olhos?". Silas tinha uma presença forte, seu rosto marcado por traços firmes e uma postura que sugeria confiança. Ele me olhou, e por um momento, nossos olhos se encontraram. Havia um breve reconhecimento ali, como se ele soubesse quem eu era. Mas eu não estava pronto para aquilo. Virei o rosto rapidamente e me dirigi a Alysson, como se nada tivesse acontecido.
— Já trouxe as bebidas e o que você pediu. Precisa de mais alguma coisa? — perguntei, tentando manter a voz firme.
Alysson percebeu a tensão no ar, o clima pesado entre eu e Silas. Sem dizer nada, ele apenas assentiu e me chamou para o escritório. Fui na direção indicada, sentindo o olhar de Silas me seguir enquanto atravessava a sala. Apenas nós três estávamos ali, e o peso daquele encontro não poderia ser ignorado.
Alysson me lançou aquele olhar analítico de sempre, como se tentasse medir cada resposta minha.
— Tá tudo bem? — perguntou ele, com uma voz calma.
— Sim — respondi firme, sem querer deixar transparecer a confusão que estava sentindo.
— Bom... desculpa. Eu deveria ter te avisado que o Silas chegou ontem à noite, trouxe o Bernardo com ele. Mas como vocês iam se encontrar de qualquer jeito, resolvi deixar acontecer naturalmente — ele disse, com um sorriso travesso no rosto.
— Não tem o que se desculpar, tá tudo bem. Como eu disse, pra mim nada muda — falei, mantendo a mesma firmeza de antes.
Alysson ficou em silêncio por alguns segundos, como se estivesse ponderando algo.
— E então, o que achou?
— Nada demais... na real — hesitei um pouco, baixando o tom —, quando estava chegando, encontrei o Bernardo e a Sofia. Conheci minha irmã, ela é simpática. — Sorri para ele.
— Sim, a Sofia é um amor. Tenho certeza que vocês vão se dar bem — ele respondeu, com uma expressão mais suave no rosto. Depois de uma pausa, ele falou novamente —: Bom, tenho uma missão para você, mas acho que você não vai topar.
— O que seria? Se envolver sexo entre eu e você, já topo na hora — brinquei, com um sorriso malicioso.
— Para de ser pervertido! Já falei pra deixar esse assunto pra lá — ele retrucou, revirando os olhos. — Na verdade, o Silas precisa ir na cidade comprar um remédio pra Sofia, mas ele não sabe andar por essas estradas de terra. Queria saber se você pode levá-lo. E aproveita pra passar na fábrica e pegar umas caixas que estão separadas. Não estou querendo forçar nada entre você e seu pai, por isso, se não se sentir confortável, posso pedir pra outro funcionário levar.
Minha garganta secou na hora, e um aperto se formou no peito. A ideia de estar a sós com o Silas durante o caminho inteiro me assustava mais do que eu queria admitir, mas tentei manter a calma.
— Por mim, não tem problema — falei, ainda com o coração apertado.
— Tem certeza? — Alysson me encarou com aquele olhar firme, como se quisesse ter certeza da minha decisão.
Olhei para o relógio no meu braço, tentando desviar da intensidade da pergunta, e brinquei:
— Estou no horário de trabalho. O que meu chefe manda, eu faço. — Pisquei para ele, tentando disfarçar a tensão.
— Sendo assim, tudo bem.
Senti um nó na garganta. A viagem para a cidade se tornaria uma prova de fogo. Eu sabia que Silas provavelmente tentaria conversar, e o simples fato de pensar nisso fazia meu estômago revirar. Mas não queria demonstrar fraqueza. Respirei fundo e decidi não sofrer por antecipação. Talvez nada demais acontecesse. Quem sabe?
Saímos do escritório, e eu já estava indo em direção ao carro quando Alysson chamou Silas:
— Rafinha vai te levar na cidade pra comprar o remédio da Sofia. E na volta vocês passam na fábrica pra pegar umas caixas que mandei separar.
Silas olhou surpreso, como quem não esperava aquilo. Ele me seguiu em silêncio até o carro, sem falar nada. O ar ao nosso redor estava pesado, mas eu segui em frente, tentando manter a calma.