CAPÍTULO 01
Henrique chegou a sua casa todo suado depois de uma caminhada de quarenta minutos na calçada ao lado da principal avenida de sua cidade quando já estava escuro e foi direto para o banheiro onde tomou um demorado banho e depois fez a barba. Depois de vestir um conjunto de moletom em virtude da baixa temperatura, se preparou para sair no intuito de jantar fora como era o seu costume e em virtude de ser por natureza um solitário.
Ao pegar seu aparelho celular que havia deixado em cima da cama quando chegou em casa ligou o mesmo e viu que havia notificação de mensagens recebidas. Abriu e viu que recebera três mensagens de um número desconhecido, enviadas enviadas através do SMS e com um intervalo de três minutos entre elas e a última recebida já fazia mais de quinze minutos, indicando que as mesmas chegaram enquanto ele estava no banho:
“Oi. Você ainda está vivo?” – Em virtude do remetente da mensagem não constar em seus contatos, não havia uma identificação.
A segunda mensagem dizia:
”Fala aí amigo. Sou o José Vasconcelos Sobrinho. Servimos junto na Base Aérea em Campo Grande.”
E finalmente a terceira:
“Você não deve mais se lembrar de mim. Ou talvez eu tenha me enganado com relação à pessoa, Por favor, desculpe o incômodo.”
Isso não era verdade. Henrique não só se lembrava como se deixou levar por essas lembranças e da participação do Sobrinho nos fatos que modificaram radicalmente sua vida. Respondeu a mensagem se desculpando por não ter respondido de imediato e mais tarde, ainda naquele dia, os dois tiveram uma conversa através do celular quando lembranças deles naquele tempo foram revividas. Porém, não foi falado nada entre eles a respeito do acontecimento mais importante.
Pelo menos o mais importante para o Henrique, já que a respeito de seu antigo companheiro de farda ele não sabia de nada o que acontecera com ele nos últimos quarenta anos e esse era um assunto sobre o qual ele não queria falar, muito embora tivesse sido o amigo um dos responsáveis para o início da aventura que foi a sua vida.
Quando desligou a televisão naquele dia pronto para dormir, a lembrança da conversa que ele tivera com o Sobrinho foi toda repassada e o que mais martelava em sua mente foi uma das frases que o amigo lhe dissera depois que os números de ambos foram incluídos nos contatos um do outro e o outro viu sua fotografia comentando em mensagem de voz:
– Puta merda rapaz. O que foi que você fez para ficar assim?
– Assim como? – Perguntou o Henrique embora já soubesse ao que o amigo se referia.
– Assim como? Olha pra você cara? Quem nunca te conheceu não vai acreditar que você está chegando na casa dos sessenta anos e, para mim que já te conheci e sei que você tem essa idade fica admirado. Parece que o tempo não passou para você.
Sim, isso era verdade. Não que Henrique tivesse o mesmo rosto de quanto tinha dezenove anos ao completar o tempo do serviço militar, porém, não era possível imaginar que se tratava de um sexagenário. Qualquer pessoa, olhando para ele, diria que ele estava na casa dos quarenta anos ou talvez até menos.
O que ninguém sabia é que havia um motivo para isso e aquele contato vindo de um passado longínquo fez com que Henrique começasse a se recordar de sua vida, vida essa que era rica em histórias, mas de histórias que ele não poderia contar a ninguém, pois se fizesse isso, seria taxado de louco ou, na melhor das hipóteses, um grandessíssimo mentiroso.
Era por isso que ele tinha guardado essas lembranças em um canto de sua mente e nem mesmo a sua falecida esposa sabia do que acontecera com ele antes. Nem mesmo quando ela reclamava do fato de nunca conseguir ficar grávida e não conseguir dar um filho a ele, Henrique comentou algo para aliviar o sentimento de culpa dela, pois ele sabia que a culpa disso era totalmente dele, que não podia ter filhos.
E agora essas lembranças faziam questão de ficarem presentes em sua cabeça impedindo que ele dormisse e, ao acordar no dia seguinte, não foi diferente e elas continuavam lá. No final, decidiu acreditar que só estava se lembrando daquilo porque, embora de uma forma indireta, o sobrinho tinha tido uma participação importante para que tudo começasse e mesmo não havendo nenhuma explicação para que ele ficasse à parte daquela aventura, as lembranças teimavam em permanecer.
Tudo começou com uma ideia que surgiu durante uma noite em que em que ele, o Sobrinho, o Cardoso e o Barcos estavam de folga e, como sempre faziam, enchiam a cara em um bar de frequência duvidosa onde eles já tinham se metido em tantas confusões que era um milagre o proprietário ainda permitir que bebessem ali. O prazo para optarem por se engajarem e continuarem a vida militar, com todos eles decidindo apresentarem seus pedidos de baixa, quando a conversa mudou para o que cada um pretendia fazer quando deixasse a Base Aérea e ninguém tinha uma ideia exata do que faria.
Nessa conversa, o Sobrinho, sempre o mais sonhador dos quatro, começou a falar, não do que ia fazer, mas do que ele gostaria de fazer e seu sonho era repleto de aventuras em uma viagem sem destino pelo mundo, indo para qualquer direção que desejasse, ficando nos locais que gostasse pelo tempo que quisesse.
O que o rapaz falava era de uma vida de aventureiro aonde, ganhando seus sustentos em qualquer lugar que tivesse algo que pudesse fazer a troco de dinheiro, sem nunca assumir o compromisso que o levasse a se fixar em algum lugar. A conversa evoluiu e os outros começaram a enriquecê-la, ora com sugestões, ora com situações que os atirassem em aventuras incríveis, pois de repente se viam os quatro envolvidos na mesma aventura, até que o incentivo do álcool fez com que eles estabelecessem um pacto sobre fazerem com que aqueles sonhos se tornassem realidade.
Mais cerveja acompanhada de rabo de galo, uma mistura de cachaça com um vermute italiano muito popular naquela época e o planejamento foi sendo desenvolvido até que eles já tinham até a data para iniciarem aquela maluquice. Ficou marcado que no dia quinze de julho de 1973, um sábado, eles se encontrariam em frente ao Estádio da Vila Belmiro em Santos. Dali, iriam até o primeiro bar que encontrassem, beberiam até ficarem bêbados e, quando se recuperassem a consciência, dariam início a uma peregrinação em empresas de navegação a procura de uma vaga que lhes permitissem viajar pelo mundo.
Lógico que, no dia seguinte, em meio a ressaca que sobreveio do porre que tomaram, nenhum dos quatro pareciam se lembrar do assunto que só veio a tona dois dias antes da baixa, quando o Henrique perguntou a todos se eles cumpririam a promessa e iriam estar em Santos no dia combinado. Todos disseram que sim, porém, era possível notar em suas expressões que nenhum deles estava a fim de cumprir essa promessa.
Acreditando que realmente faria parte de uma aventura, Henrique foi até sua pequena cidade, permaneceu lá durante dez dias com a família, desfez o namoro de dois anos com a garota que fora sua primeira namorada e depois, fazendo suas malas, despediu-se da mãe e do padrasto e tomou o ônibus com direção a São Paulo dizendo que estava indo para uma grande cidade onde teria maiores chances de conseguir um emprego. Como essa prática era comum em virtude da falta de opções naquela cidade, a mãe dele concordou sem problemas. Quanto ao padrasto, esse nunca intervinha em suas decisões.
Chegou a Santos dois dias antes do combinado, hospedou-se em uma pensão barata e gastou esses dois dias percorrendo a cidade ou parado diante da praia a admirar o mar, algo que nunca tinha visto em sua vida e ficava extasiado com a beleza dele. Sua admiração era tão grande que foi onde ele passou a maior tempo nesses dois dias.
O dia quinze chegou e se foi e nada dos seus amigos aparecerem. Esperou ainda dois dias quando resolveu que ninguém ia aparecer, o que fez com que resolvesse viajar até a cidade de São Paulo e procurar por emprego. Era uma segunda-feira e ele resolveu que viajaria para São Paulo no dia seguinte bem cedo para se apresentar nos locais de recrutamento das empresas ainda na parte da manhã. Com essa decisão tomada, dirigiu ao ponto de ônibus que existia perto de onde estava para esperar pelo ônibus que o levaria até próximo à pensão onde estava hospedado.
Estava aguardando o ônibus quando uma mulher vestida com uma roupa estranha se aproximou dele e lhe entregou um folheto desses que naquela época era comum serem distribuídos aos transeuntes ou fixados em postes e portas de prédios comerciais. Sem muito interesse o pegou e viu que se tratava de um anúncio de uma empresa de navegação recrutando novos funcionários. Sem saber qual o motivo, ele dobrou o folheto e enfiou no bolso.
Mais tarde, deitado em sua cama, ele se lembrou do panfleto e o pegou no bolso da camisa que estava jogada no chão. Leu e releu o mesmo até que, em um ímpeto, decidiu que a existência daquele papel naquele local e justamente no momento que ele estava lá podia ser mais que uma simples coincidência e resolveu deixar a roda da sorte reger sua vida.
Dormiu depois de ler mais uma vez o folheto e decidir que, na manhã seguinte, seria o primeiro a comparecer no endereço mencionado no mesmo e se candidatar a uma das vagas que eram oferecidas.
Não foi isso que aconteceu, pois quando chegou ao escritório onde funcionavam os serviços de Recursos Humanos da Empresa de Navegação já tinham duas pessoas aguardando e ele foi orientado a aguardar porque o atendimento seria em ordem de chegada.
A sala da recepcionista para onde ele fora encaminhado ao chegar na empresa tinha dezesseis metros quadrados e nela haviam duas portas, a primeira foi a que ele entrara e a segunda ficava ao lado da mesa da mulher que aparentava estar na casa dos quarenta anos que tentava se impor através de roupas vistosas e de muito mal gosto. Ela aparentava ter sido bonita algum dia na sua vida, porém, já ia longe o dia que ela poderia ter sido a rainha do baile, pois sua face demonstrava que a vida para ela não fora muito fácil. Nas outras três paredes havia cadeiras ou bancos indicando que os dirigentes estavam bem otimistas quanto ao número de candidatos que compareceriam àquela entrevista.
Henrique ocupou uma cadeira que ficava do lado direito da mesa da mulher que, de onde estava, olhava para ele com o mesmo olhar de uma raposa diante de um galinheiro o que o deixou vermelho, deixando que toda a sua timidez viesse à tona. Se ele soubesse o efeito que essa timidez provocou na mulher teria pelo menos tentado ser mais ousado, pois ele estava a um fio de cabelo de ser atacado em plena sala de recepção.
A mulher, uma loira tingida que tentava disfarçar a idade avançada com uma variedade tamanha de cremes fazendo com que a aparência dela fosse tal qual a de quem estava usando uma máscara, olhava para ele agora como um gato que acabou de arrebantar a porta da gaiola de um passarinho e Henrique já estava se sentindo incomodado, principalmente porque um dos outros dois candidatos às vagas olhava para ele com uma expressão zombeteira, dando a entender que estava percebendo a situação ali.
Tentando disfarçar seu mal estar com aquela situação Henrique olhou para os outros dois concorrentes e ficou impressionado. Melhor dizendo, ele ficou assustado com o que viu na sua frente.
Sentado bem na frente dele estava o maior homem que ele já tinha visto em sua vida. O cara não era apenas grande na altura, mas também era musculoso e ele calculou que aquele homem devia ter o dobro da largura nos ombros do que ele. Virou o rosto e disfarçou quando o homem olhou para ele e deu um sorriso. Se fosse menos tímido teria percebido que o sorriso do grandalhão demonstrava timidez muito maior que a sua.
Olhou então para o lado da parede que ficava do lado oposto da mesa da recepcionista e descobriu que estava sendo encarado por um jovem negro que, ao perceber que aquele a quem examinava estava olhando para ele, deu um sorriso largo e sincero mostrando seus dentes brancos em contraste com sua pele negra e em seguida se levantou e se aproximou de Henrique com a mão direita estendida enquanto falava:
– Muito prazer. Meu nome é Nestor Carpelo Larildo. E o seu?
– Henrique. Henrique Sampaio Carillo. – Respondeu Henrique aceitando o aperto de mão do rapaz.
Nestor tinha um corpo atlético e, embora tivesse dez centímetros a menos que Henrique, era mais encorpado e mais musculoso.
Depois de cumprimentar ao Henrique o Nestor se virou para o homenzarrão que ficou olhando para ele sem entender o que ele queria e só depois que ele, o Henrique, foi até onde ele estava sentado e se aproximou mais dele com a mão estendida ao mesmo tempo em que se apresentava ele entendeu e se levantou para aceitar os cumprimentos.
Se sentado o homem parecia grande, ao ficar em pé ele mostrou que sua estatura, somada a sua massa muscular, era assustadora. Henrique se sentiu um anão perto daquele gigante.
– Oi. – Foi a única coisa que o gigante disse em uma voz grossa e insegura enquanto apertava a mão de Henrique que tentava, em vão, não demonstrar a dor que sentia ao ter os ossos dos dedos esmagados por uma mão que mais parecia uma bigorna no que se refere a pressão que exercia sobrea dele.
Depois de Henrique ter se apresentado o homem aceitou a mão que o Nestor lhe estendia provocando nele o mesmo efeito, só que, dessa vez, o rapaz não conseguiu evitar gemer de dor e depois comentar:
– Tá bom cara. Foi um prazer te conhecer. Mas lembre de que nunca deve me abraçar porque eu vou precisar de minha coluna inteira e no lugar.
O cara olhou para o Henrique sem entender nada, mas ao ver que esse sorria para ele, também tentou sorrir, porém, seu sorriso mais parecia uma careta engraçada do que qualquer outra coisa.
”Tomara que esse cara não seja aprovado, conviver com ele o tempo inteiro vai ser um risco muito grande”.
Logo os três estavam conversando. Melhor dizendo, não os três, pois apenas Nestor e Henrique conversavam enquanto o homenzarrão olhava para eles e só falava quando alguma pergunta lhe era feita diretamente e, assim mesmo, suas respostas eram simples e quase sempre composta de monossílabos, o que tornava a conversa estranha, como por exemplo:
– Qual o seu nome? – Perguntou o Nestor que era, sem dúvida, o mais falante entre os três.
– Bo. – Respondeu o homem.
– Como assim? Bo? Bo não é nome!
– É Bonaparte. – Falou o gigante abaixando a cabeça como se o Nestor estivesse lhe chamando a atenção.
– Tudo bem. A gente vai te chamar de Bo então. OK? – Falou Henrique em uma tentativa de deixar o cara mais a vontade.
O homem apenas balançou a cabeça concordando.
O tempo que permaneceram aguardando para serem chamados para a entrevista foi o suficiente para que começassem a se conhecerem. Henrique falou que era de uma pequena cidade de Mato Grosso do Sul e o Nestor ficou alegre, pois ele era do interior do Estado de São Paulo de uma região não muito distante da cidade natal de Henrique. Nestor era o mais velho dos dois, pois já completaria vinte e três anos, enquanto Henrique completaria vinte anos dentro de dois meses.
Henrique falou a respeito do plano que fizera com seus companheiros de fardas e, quando perguntado, disse não saber o motivo de seus parceiros não aparecerem como o combinado, ao que o Nestor brincou dizendo que tudo o que se combina por trás de uma garrafa de bebida alcoólica perde o efeito assim que o cada um se cura do porre.
De Bo, pouco conseguiram descobrir. Apenas que ele era de uma das cidades que formam a Grande São Paulo, era órfão, tinha vinte e sete anos e até o mês anterior vivia junto com um irmão que cuidava dele, porém, esse irmão foi atropelado e perdeu a vida e a família da viúva, assim que sepultou o corpo do falecido, fez com que ele entendesse que não iriam mais cuidar dele, praticamente o expulsando de sua casa. Ele foi acolhido por uma mulher que ele não conhecia e que lhe pediu para que ele fizesse algumas tarefas na casa que ela morava aonde ele permaneceu por alguns dias e depois sugeriu a ele que fosse até a cidade de Santos onde poderia se empregar em uma empresa que, além de lhe pagar um bom salário, garantiria o seu sustento e a sua segurança. Lógico que ao dar essa sugestão, a mullher estava pensando em uma ocupação de estivador que era o mais indicado para quem tinha músculos demais e cérebro de menos.
O motivo de o Nestor estar ali era o mais grave entre todos. Ele se apaixonara pela garota mais linda de sua escola, porém, a cor de sua pele tornou-se um problema. Como seu amor era correspondido, ele resolveu lutar pelo direito de viver sua vida ao lado dela, o que acabou por levar a um confronto direto com a família. Com isso, as ofensas, insultos e esforços em denegrir a imagem de Nestor junto à população da cidade acabaram evoluindo para algo mais grave, com discussões em públicos e até alguns empurrões com a turma do deixa disso conseguindo evitar uma briga.
A situação foi piorando até o dia em que dois dos irmãos da pretendida de Nestor o emboscaram durante a noite. Dessa vez, eles estavam dispostos a muito mais do que uma simples conversa e mal se aproximaram dele começaram a agredi-lo. Na luta que se seguiu, vendo que estava levando a pior por estar em desvantagem numérica, Nestor recorreu a um pedaço de pau que havia no local.
O resultado foi que um dos irmãos fugiu e o outro só não morreu porque foi salvo por moradores das proximidades que, ouvindo a confusão, intervieram a tempo de evitar que Nestor desse cabo da vida de um de seus agressores.
O resultado disso foi nefando. A namorada de Nestor foi tirada da cidade e enviada para algum lugar que a família não revelava a ninguém. O que todos os membros da família falavam é que se vingariam de Nestor pelos ferimentos que ele infligiu a um deles e passaram da conversa à prática logo depois que o delegado da cidade, um homem justo, negou-se a prender o Nestor por agressão, alegando que ele é que fora atacado, não se empenhando em levar o caso adiante.
Também foi o delegado que, preocupado com o desfecho de uma situação que tinha todos os ingredientes para acabar em tragédia, o procurou e o aconselhou a deixar a cidade. Ele só aceitou porque o delegado prometeu que faria de tudo para proteger sua família. Nestor partiu da cidade vinte e quatro horas depois de o delegado procurar o chefe da família inimiga dele e fazer o discurso que se tornou um marco na cidade, pois todos o sabiam decor. Ele falou ao chefe da família que queria se vingaar de Nestor:
– Eu vim aqui para pôr um fim a toda essa bagunça que vocês começaram. Espera, não precisa falar nada, apenas me ouça. Convenci aquele rapaz a deixar a cidade. Ele está propenso a aceitar ir embora daqui para sempre. Mas tem uma coisa que vocês precisam saber. Essa história morre aqui. Isso acaba aqui e acaba hoje. Ninguém vai sair atrás do rapaz e ninguém vai poder fazer nada contra ninguém da família dele. E não vai fazer mesmo, porque se um membro daquela família sofrer um acidente estranho, for atropelado ou sofrer um assalto em que saia machucado. Aliás, eu vou mais além. Se um deles cair em um buraco por estar andando no escuro ou se um raio cair sobre a casa de um deles, eu vou achar que isso aconteceu por causa da vontade de alguém dessa família aqui.
O delegado olhou a sua volta estudando o semblante de cada um dos presentes procurando saber qual a reação que suas palavras estavam provocando e, ao ver que todos estavam assustados, concluiu:
– E como eu dei a minha palavra ao rapaz de que protegeria a família dele, eu entenderei isso como uma ação pessoal contra mim mesmo e isso eu não vou ser capaz de perdoar.
Todos na região sabiam que aquele Delegado tinha sido nomeado para aquele cargo a pedido de sua família que, por ser muito poderosa, controlava várias atividades ilegais na cidade. Então, aquela ameaça era algo que qualquer pessoa de bom senso levaria a sério.
Assim, o Nestor se sentiu tranquilo para ir embora. Ele sabia que o seu amor pela garota era algo no qual, se ele insistisse, só poderia acabar mal e pensando dessa forma ele arrumou suas coisas e partiu, fazendo com que tudo voltasse à tranquilidade de antes.
Quando ele chegou à cidade de São Paulo para onde se dirigiu na esperança de arrumar um serviço e construir uma vida nova, ainda na rodoviária da cidade, foi visto por um dos irmãos da garota que tinha ido até aquela cidade para acompanhar a mesma. Receoso que, ao vê-lo ali o Nestor ligaria os fatos e começaria a procurar pela irmã naquela cidade, ele foi ameaçá-lo e por pouco eles não entraram em luta corporal. Isso fez com que Nestor entendesse que o episódio poderia voltar a acontecer a qualquer momento e que dificilmente ele teria sossego, entendendo que a única solução seria viajar para muito longe de sua cidade. Mas muito longe mesmo.
E ele estava justamente pensando nisso quando um garoto de rua se aproximou dele e lhe estendeu um folheto. Ao olhar o que continha aquele panfleto ele exclamou:
– Justo o que eu estava precisando. Vamos ver se assim me deixam em paz.
No folheto, uma oferta de emprego em uma companhia de navegação. A mesma em que ele se encontrava naquele momento.
Ao ouvir a narrativa de Nestor o Henrique ficou com uma sensação de que havia algo de estranho ali, mas ele não teve tempo de especular sobre isso porque, logo a seguir, o Nestor que foi o primeiro a chegar foi chamado para a entrevista.
Duas horas depois todos os três haviam sido entrevistados e aprovados. Assim que terminava a entrevista eles eram orientados a fazerem exames médicos e providenciarem os documentos necessários, inclusive, o passaporte. Isso fez com que o Nestor esperasse por Henrique que foi o último a ser entrevistado para combinarem de agirem em conjunto nessa tarefa o que foi visto com bons olhos pelo entrevistador que, depois de encerrar seu trabalho se deparou com os três ainda na recepção, pois o Bonifácio tinha permanecido ali não se sabe por quê.
O homem perguntou a eles se estavam com algum problema e eles responderam que não e revelaram a intenção de fazerem tudo juntos, ao que o homem sugeriu:
– Isso é muito bom. Ótimo mesmo. E aí vocês dois podiam ajudar o grandão aí a conseguir os documentos dele.
Ele se dirigia ao Nestor e Henrique e ao se referir ao grandão ele quis dizer que talvez, se eles ajudassem o Bonifácio, os documentos seriam providenciados em menor tempo e isso deixou claro que os três recém contratados iriam viajar juntos, o que agradou a todos.
Os documentos estavam todos em ordem em menos de uma semana e a sugestão para que Henrique e o Nestor ajudassem o Bonifácio foi um dos motivos de terem conseguido tudo em tão pouco tempo, pois logo os dois novos amigos perceberam que o gigante não teria conseguido nada se não fosse por eles.
O exame médico também foi feito no mesmo dia e o comentário que ocupou os coentários deles durante horas depois que concluíram foi as informações contidas no exame do Bonifácio. O homem tinha uma estatura de dois metros e quatorze centímetros e pesava cento e sessenta e dois quilos, porém, o que mais chamava a atenção era um comentário que o seu peso não era em virtude de excesso de gordura, mas sim de músculos.
A única coisa que ficou sem explicação foi que o jovem grandalhão não tinha dinheiro para nada e quando o Nestor, em uma passagem na empresa para tirar algumas dúvidas fez esse comentário, foi solicitado a ele que aguardasse e logo apareceu um funcionário que ele não conhecia entregando-lhe uma quantia em dinheiro e pedindo para que ele assinasse três recibos, dando a entender que todos os três estavam recebendo uma ajuda de custo para cobrir as despesas efetuadas com a emissão de todos os documentos, vacinas e exames médicos que também eram exigidas. Esse benefício não estava previsto e, quando da primeira entrevista, o homem fez questão de deixar claro isso aos entrevistados. A mudança na posição da empresa ocorreu porque, no ano de 1973 o famigerado Milagre Econômico cantado em prosa e verso durante a ditatura militar estava no auge. Os principais bancos tinham mudado suas matrizes para a cidade de São Paulo e, tantos esses como os que já eram Paulistas desde sua criação, estam em plena expansão e contratavam funcionários quase que a laço. Se o setor financeiro estava encontrando dificuldade em contratar, imagine uma empresa de navegação funcionando em Santos.
A explicação por parte da empresa contratante veio mais tarde quando, pois ao se despedir deles no dia em que embarcaram, o funcionário da empresa confirmou essas informações.
Isso foi dito quando eles estavam sendo conduzidos ao porto para serem incorporados ao quadro de funcionários do navio. Nenhum deles fez nenhum comentário, pois o homem mal acabara de falar e o veículo em que estavam parou ao lado de um navio cargueiro de dimensões consideráveis e os três, ao descerem do carro, ficaram olhando para o que achavam ser um verdadeiro monumento. O homem, ao ver as expressões de admiração em seus rostos, comentou:
– Grande, não é? Mas não se preocupem que só é assim quando você está olhando daqui, quando se está dentro dele fica parecendo normal.
Falando isso para os três jovens que pareciam grudados no cais enquanto admiravam p enorme cargueiro, o homem os encaminhou até uma escada que ia do píer até a amurada do navio e os apresentou a um marinheiro que, depois de um breve aperto de mão, lhes deu um leve empurrão a título de encorajamento o que fez com que os rapazes se começassem a subir os degraus da escada. Naquela hora o Henrique se sentiu grato por ter alguém às suas costas, pois isso impedia que retornasse do meio da escada e desistisse daquela loucura. Sabendo que a largura da escada não permitiria que ele voltasse atrás, seguiu sem parar até chegar à amurada da embarcação onde um funcionário da empresa de navegação fazia a conferência dos que subiam até lá.
Nestor ia à sua frente e foi o primeiro a ser interpelado, logo a seguir foi o Henrique que entregou a eles os documentos que trazia em mãos. Depois de separar algumas vias daquela papelada, retendo algumas com ele e devolvendo outras ao rapaz, perguntou:
– E o seu passaporte?
Henrique não disse nada, apenas abriu o bolso externo da mochila que carregava na mão, tirou de lá o seu passaporte e entregou ao homem que, depois de comparar a foto do documento com o rosto dele, juntou o documento à pilha de papel que tinha ficado em seu poder enquanto dizia:
– O passaporte fica em poder do Capitão do Navio. Quando você resolver se desligar e depois de todos os pagamentos serem efetuados e ficar comprovado que você não tem nenhum débito pendente, ele lhe será restituído.
Henrique já tinha sido informado desse procedimento e não reclamou. Apenas foi se juntar ao Heitor que se mantinha esperando por ele e ambos aguardaram até que o Bonifácio fosse autorizado a entrar no navio. Quando os três estavam prontos, o homem acenou com a cabeça em sinal de confirmação para o outro que até então se mantinha calado ao lado dele e falou:
– Leve os novos membros da tripulação ao alojamento destinado a eles.
– Qual a função deles senhor?
A pergunta se justificava em virtude de existir alojamentos diferentes para os servidores de cada função em um navio e o homem examinou os papéis em sua mão e informou:
– O senhor Heitor e o senhor Henrique se revezarão como auxiliares administrativos e ajudantes de marinheiro de convés. Já o senhor Bonifácio começará como ajudante de serviços gerais.
O homem pediu para que o grandalhão Bonifácio esperasse por ele ali que ele iria conduzir os dois outros até o alojamento deles e depois retornaria para levar a ele até outro alojamento. Porém, quando estava na metade dessa explicação, o homem que parecia ser o chefe ali o interrompeu dizendo:
– Não é isso Cabo Parreira. Há uma recomendação aqui para que esses três fiquem no mesmo alojamento.
O outro marinheiro não perguntou mais nada. Apenas fez um sinal com a mão para que Bonifácio se juntasse a eles e saiu andando sem se preocupar com o fato de que eles tinham que carregar suas bagagens. Carregando suas malas e mochilas, os rapazes saíram tropeçando atrás dele. Depois de descerem três lances de escada, o que indicava que estavam no terceiro deque, percorreram um longo corredor até que o homem parou ao lado de uma porta que já estava aberta e fez sinal para que entrassem enquanto falava para eles:
– As camas que estão arrumadas já têm ocupantes. Escolham qualquer uma das outras.
Henrique olhou para aqueles cinco beliches, três encostados na divisória do lado esquerdo dele e outros dois à sua direita. Dos dez leitos, cinco estavam com os lençóis estendidos, travesseiros e cada uma delas com um cobertor dobrado. Eles entenderam que eles seriam em número de oito no total e se dirigiram para as camas que ficavam mais longe da porta.
Nestor deixou que o Henrique escolhesse entre a cama de cima ou de baixo do beliche que escolheram e isso determinou que ele ocupasse o leito de baixo, pois Henrique se apressou em dizer que queria a de cima. Eles deixaram suas malas ali e foram para o lado de Bo para convencê-lo de que não era uma boa ideia ele usar o leito superior do beliche, pois temiam que, com tamanho dele, o móvel não resistisse e estando ele na parte de baixo pelo menos o tombo seria menor.
Lógico que eles não disseram dessa forma, afinal, uma semana já tinha sido o suficiente para que os dois amigos entendessem que Bo dependeria deles para quase todas as decisões que precisasse tomar. O gigante tinha sim uma ligeira deficiência, porém, logo demonstrou ser a pessoa mais dócil que eles já tinham encontrado. Nascia ali uma amizade alimentada por certa dependência.
Depois de deixarem suas coisas sobre as camas e informados pelo homem que os acompanhara até ali de que não haveria tempo para arrumar suas camas antes de atender a uma convocação por parte do Capitão do Navio, eles foram levados de volta ao convés principal e de lá escalaram algumas escadas até que se viram, pela primeira vez em suas vidas, diante de equipamentos e aparelhos de navegação que existem na ponte de comando de um navio.
O resto daquele dia, embora tudo fosse novo para os marinheiros de primeira viagem, não aconteceu nada que pudesse se tornar destaque em suas vidas. Eles ouviram todas as recomendações do Caplitão e depois receberam uma espécie de manual de instruções contendo todas as regras às quais teriam que se submeter e outras informações úteis, inclusive, uma planta do barco com indicações coloridas que alteravam o tom de vermelho para indicar o grau de perigo em cada uma delas, começando por um tom róseo, quase branco, até um vermelho vivo e brilhante.
Naquela mesma noite o navio zarpou. Em pé, na popa do navio, Henrique olhava as luzes da cidade de Santos irem desaparecendo atrás de uma ligeira cerração enquanto suas lembranças percorriam todo o percurso que fizera até chegar ali. Tentando se desvencilhar da impressão de que ainda se arrependeria muito por ter se atirado naquela aventura, estando sozinho ali, levou a mão ao peito ao sentir que seu coração batia descompassadamente. Só então lhe ocorreu que ele estava se afastando de seu próprio país.
Ali começou a aventura de Henrique. Sem saber o motivo, ele estava profundamente ligado ao Heitor e ao Bonifácio e juntos se completavam, pois cada um tinha uma característica que era usada para preencher uma lacuna nos outros.
Henrique era o cérebro, a cabeça pensante do trio. Todas as decisões passavam por ele que tinha por costume ouvir a opinião do Heitor e discutir com eles todos os detalhes da situação. Ele também consultava o Bo e a resposta era sempre a mesma:
– Sei lá. O que você mandar eu faço.
Apesar disso, ele nunca deixara de consultar o gigante.
Se Henrique era o cérebro, o Heitor era a ação. Todas as coisas que representavam algum risco e tinham que ser feitas era ele o voluntário. Se alguma prostituta em algum porto reclamasse de um deles com seu cafetão no intuito de ameaçá-lo para arrancar mais dinheiro que o combinado, lá ia o Heitor argumentar com o cafetão e se eles resolvessem sair de uma companhia de navegação e excursionarem no interior de algum país, era o Heitor que ficava incumbido de dar essa notícia ao Capitão e depois era o Henrique que conferia os pagamentos dos saldos de salários.
E o Bo era os músculos. Se uma discussão com algum cafetão estivesse se dirigindo para uma situação de confronto, ele era chamado e normalmente bastava sua presença para que a esperteza do larápio mudasse de ‘ambição para ganhar dinheiro fácil’ para ‘melhor manter minha cabeça ligada ao corpo’. Não que algumas vezes não fosse necessário que o gigante fosse usado de forma mais contundente, sempre com resultados desastrosos para quem confrontava o trio. Bo podia ser lento de raciocínio, mas apesar de seu enorme tamanho, era muito ágil e sabia como usar sua força em uma luta corpo a corpo.
Ambientarem-se com os serviços e costumes a bordo não foi difícil. Eram jovens e saudáveis e não reclamavam das tarefas que lhes eram incumbidas. O único problema foi em relação aos relacionamentos sexuais a bordo.
Se existe um assunto sobre o qual não existem grandes pesquisas é aquele que discorre sobre a vida sexual dos marinheiros. Um dos poucos que foram publicados versa sobre o relacionamento entre os marinheiros que trabalham em grandes navios que passam muito tempo em alto mar. A pesquisa cita algo ao qual se refere como “homossexualidade de ocasião”. Há nele uma menção ao fato de que, ao passar muito tempo em uma situação onde a convivência ocorre sempre entre homens, é normal acontecer um relacionamento homossexual entre eles, porém, os envolvidos abandonam essa prática assim que chegam a algum porto. O estudo comenta também que isso ocorre com muita frequência entre presidiários.
Não que essa seja uma prática usada em todos os navios e entre todos os marinheiros. Ocorre com pequena frequência e o único fato que chama a atenção naquele estudo é que os envolvidos voltam a agir normalmente depois que desembarcam e se recusam a comentar sobre o fato.
Henrique, Nestor e Bonaparte ficaram a par disso logo nos primeiros dias da viagem, porém, se recusaram a participar disso e quando surgia algum valentão que, usando a força física, tentava forçar um deles a se submeterem àquele costume, Bo era usado para deixar claro que aquela não era uma política que daria resultado contra eles. Dessa forma, os três ficaram incólumes.
Assim os jovens marinheiros permaneceram viajando durante mais de um ano e com suas juventudes e entusiasmos logo se tornaram marinheiros calejados, conheceram outros quatro continentes e muitos países. Já falavam fluentemente vários idiomas, principalmente o Inglês por ser o mais utilizado quando se está embarcado e também aquele que, sempre e em qualquer lugar, havia alguém que o conhecia. Henrique costumava dizer que não deve haver mais na terra nenhum lugar onde não haja alguém que conheça esse idioma.
Enquanto Henrique e Nestor aprendiam a ser cidadãos do mundo, Bo apenas os seguia. Mas o fato de não conseguir falar outros idiomas não se tornava problema nenhum para ele que dificilmente falava com alguém que não fosse seus dois amigos e isso ele fazia sempre em Português.
Foi depois desse tempo que uma nuvem negra pairou sobre a amizade dos três.
Um ano e dois meses depois de zarpar do Porto de Santos, estavam na Indonésia e o Heitor foi fisgado por uma nativa com quem se encontrou em um bar. Tudo foi muito estranho. Quer dizer, tudo aconteceu de um jeito anormal e muito rápido. Ele estava no bar tomando uma cerveja quando um grupo de garotas barulhentas entrou no local. Ele estava ali justamente aguardando por Henrique que tinha ido a uma entrevista visando serem admitidos em um navio que zarparia para a China daí a três dias. Foi uma das raras ocasiões em que o Henrique fazia isso, pois essa era uma tarefa que normalmente era executada por Nestor.
Heitor já estava na terceira cerveja quando notou que uma das garotas olhava para ele insistentemente. Começou a encarar de volta e se divertiu ao perceber a timidez dela que, pois em todas as vezes que ela o surpreendia olhando em sua direção, o rosto da garota ficava corado, ela desviava o olhar e demonstrava estar incomoda com isso.
Heitor era, entre os três, o mais conquistador e a demonstração de interesse por parte da garota despertou o seu e isso bastou para que ele investisse, começando primeiro a olhar para ela e lhe sorrir o tempo todo e depois, por sinais, pedir para que ela se aproximasse.
As coisas ficaram assim por mais duas cervejas e ele já estava desistindo porque a garota não dava sinais que iria evoluir em seu interesse. Foi aí que uma das amigas dela percebeu aquele joguinho e foi uma farra só. Ela contou para as outras que, a partir daí, passaram a incentivar a moça a ir até a mesa do rapaz e riam dela até que, enchendo-se de coragem, ela se levantou e se aproximou dele.
Aí surgiu o primeiro problema. A garota não falava uma única palavra de inglês e ele não entendia nada do idioma nativo dela. Começaram tentando uma comunicação por sinais que logo mostrou que não ia dar em nada. Então, para a surpresa não só dele, mas também de todas as amigas dela que estavam na outra mesa, ela segurou a mão dele e o levou até o balcão onde, a duras penas, o fez entender que deveria pagar sua conta.
Depois de ele entender e fazer isso, ela voltou a segurar sua mão e o rebocou para fora do bar.
Heitor só reapareceu três dias depois e apenas para se despedir dos amigos. Ele disse que havia se casado em uma cerimônia local e resistiu a todos os protestos de Henrique sem se deixar convencer. No final, Henrique e Bo, que haviam perdido a oportunidade de embarcarem no navio que se destinava à China, foram aceitos em outra companhia e partiram em direção à Europa, fazendo o percurso mais estressante existente, pois já naquela época, navegar próximo à Somália deixavam as embarcações em situação de perigos devido à pirataria que, embora não fosse tão divulgada, já acontecia.
Dessa forma, depois de um ano e dois meses, estava desfeito o trio que durante aquele período era inseparável. Oito meses depois eles voltaram a se reunirem, porém, a amizade não era a mesma e havia uma nova situação que contribuiu para que a amizade se desfizesse de vez.
Ao colocar os olhos pela primeira vez em Cahya, esposa de Nestor, Henrique sentiu seu coração bater descompassado e mal conseguia raciocinar na presença dela. Isso, que em si já era um problema, ficou muito mais grave pelo fato de que a mulher agia da mesma forma.
Nestor, ao ver a mulher que tanto amava e seu amigo parados, com os olhos grudados um no outro e com uma expressão de que, no segundo seguinte, estariam um nos braços do outro com suas bocas coladas em um beijo interminável, sentiu o ciúme lhe corroer as entranhas e se preparou mentalmente para uma batalha com aquele que, durante algum tempo, fora considerado por ele como um irmão.