---
Dava para ver com clareza o pedaço do cabo da arma por dentro da jaqueta da Rayssa. Talvez, se fosse uma pessoa que não está acostumada a ver ou usar armas, poderia até não prestar atenção, mas não era meu caso. Eu tinha que ter notado aquilo. Dei play novamente no vídeo e, no momento em que Rayssa passa a mão na barriga, ela também afasta um pouco a jaqueta e dá para ver de novo o cabo da arma. Nesse momento, eu já comecei a ver a cena totalmente diferente.
Provavelmente, aquele papel não era um exame de gravidez, mas sim um bilhete com as instruções do que Naomi deveria fazer para não morrer. Naomi provavelmente tinha razão; Rayssa sabia da câmera da garagem, mas não sabia que ela não captava áudio e escreveu o bilhete para não ser ouvida. Mas eu ainda não sabia o porquê de Naomi ter ido até a grade; isso só ela poderia me contar. Eu também não sabia se a arma era verdadeira, mas não tinha como Naomi saber também. Se ela tentasse correr de volta para casa, com certeza seria alvejada por Rayssa. Eu não sabia se Rayssa tinha coragem de atirar em alguém naquela época, mas era bem possível. No fim, Naomi fez o certo, fez o que Rayssa pediu e rezou para eu ir ajudá-la. Mas eu não fiz minha parte, não rápido o suficiente para impedir o que houve.
O vídeo corta para a parte já dentro da casa. Ele estava completo e revi tudo o que aconteceu. Nele, eu pude notar algumas coisas. Naomi provavelmente me manda mensagem na hora em que vai à cozinha; era arriscado ela ligar e Rayssa ouvir. Dessa vez eu vi ela acenar para câmera me apontado a porta. Eu não tinha visto isso da outra vez, provavelmente eu estava vendo Rayssa por a droga na bebida da Naomi. Naomi fez o que podia e, se eu não tivesse com a merda do celular no silencioso, eu poderia ter visto a mensagem. Provavelmente, era um pedido de ajuda. Adiantei a parte em que Naomi e Rayssa ficaram conversando no sofá, até o momento em que Naomi começa a sentir os efeitos da droga. Vi até o momento em que eu chego na casa. Ali eu parei; não quis ver eu atirando no Serginho de novo. Preferi evitar essa parte; eu já estava um pouco abalada ao ver o que eu já tinha visto.
Como imaginei, o ciúme ainda me corroeu por dentro, mas eu conseguia enxergar que Naomi não estava com os domínios das suas decisões. Eu já sabia o motivo dela recusar Serginho e querer ficar com Rayssa; eu sabia e entendia. Eu fiquei com ciúmes, mas não com raiva dela. Percebi algo novo: Rayssa, antes de se levantar e tirar a calça, colocou a arma em cima do sofá. Foi rápido e eu não percebi isso da outra vez. Foi a arma que Serginho tentou pegar; talvez, se ela não estivesse ali, ele estaria vivo.
Outra coisa que agora eu entendia era o momento em que Rayssa pega o celular da Naomi. Ela mexe nele por um momento antes de colocá-lo para gravar; provavelmente, ali ela viu que Naomi tinha me pedido ajuda e, como a mensagem não tinha sido entregue, ela deletou-a do aplicativo. Por isso, eu nunca vi a mensagem; eu nem sabia que tinha sido apagada, porque nunca mais entrei na nossa conversa no aplicativo. Eu só excluí tudo; eu não queria nada que me lembrasse Naomi.
Minha visão do que aconteceu naquele vídeo mudou muito em algumas coisas; agora tudo fazia mais sentido. Para mim, mudou muito porque, mesmo eu já tendo perdoado Naomi por tudo que eu achava que ela tinha feito, eu ainda tinha mágoa dela ter deixado Rayssa entrar na nossa casa. Mas agora tudo mudou; na verdade, eu que devia um pedido de desculpas a ela. Mesmo eu entendendo agora o que ela quis dizer quando disse que já tinha me desculpado até por coisas que fiz e não sabia, eu tinha que me desculpar.
Quando terminei de ver o vídeo, eu notei que já fazia tempo que ela tinha ido para o banho e não tinha voltado. O tempo que passei ali daria para ela tomar uns dois banhos bem demorados. Resolvi sair para ver o que tinha acontecido e ela estava sentada na sala vendo TV com uma toalha na cabeça e uma ao redor do corpo. Quando ela me viu, olhou para mim por um instante e, pela primeira vez, notei um pequeno sorriso se formando em seus lábios.
Naomi —Pelo visto, você está bem.
Greta —Sim, não completamente bem; aquilo ainda me deixa muito triste e com raiva da Rayssa. Mas estou bem, sim.
Naomi —Que bom. Eu achei melhor te deixar sozinha; eu, sinceramente, estava um pouco insegura com a sua reação.
Greta —Mesmo se não tivesse nada de novo no vídeo e eu ainda tivesse os mesmos pensamentos que tinha quando você colocou ele para eu ver de novo, eu não reagiria mal com você, Naomi. Eu já conseguia enxergar tudo de outra forma. Minha única mágoa era de você ter deixado Rayssa entrar na casa, mas não era algo que me deixava com raiva de você; talvez, um pouco decepcionada. Mas, na verdade, você que tem motivos para ter ficado decepcionada e com raiva de mim. Eu sinto muito não ter percebido a arma e por ter julgado você tão mal. Espero que me perdoe.
Naomi —Não tem nada para perdoar; ficou no passado. Já te perdoei por tudo que, no meu ponto de vista, foi erro seu e espero que você me perdoe pelos meus erros. Nos duas, erramos e muito. Como eu disse, não foi Rayssa que destruiu nosso namoro; foi a gente mesmo. Se eu não tivesse duvidado do seu amor por mim, nada disso teria acontecido e, se você tivesse confiado no meu amor por você, a gente teria se recuperado juntas e não teríamos terminado da forma que terminamos.
Greta —Você tem razão em pensar assim, mas ainda acho que Rayssa tem culpa, sim. Se ela não se metesse na nossa vida, a gente poderia estar realizando tudo o que sonhamos antes dela aparecer.
Naomi —Pode ser. Mas acho que não adianta ficar procurando culpados agora; no fim, talvez, só não era para ser. Talvez nosso amor não fosse tão forte como a gente achava.
Greta —Não posso falar por você, mas eu discordo totalmente. Tenho meus motivos para isso. Bom, eu vou tomar um banho também e esfriar a cabeça.
Eu saí da sala e fui para meu quarto. Uma pequena lágrima correu pelo meu rosto. Eu tinha certeza de que meu amor por ela era forte, tão forte que, mesmo depois de tudo, ele ainda estava ali me fazendo sofrer por ouvir ela dizer o que disse. Mas eu não podia fazer ela sentir o mesmo. Ela seguiu a vida dela e eu a minha; a diferença é que eu nunca deixei de amá-la, e olha que eu tentei.
Sai dos meus pensamentos com ela me chamando na porta. Limpei o rosto e falei para ela entrar. Ela entrou com duas malas; eu as reconheci, eram do meu pai. Naomi disse que eram minhas coisas que ela tinha pegado na minha casa. Eu a agradeci e ela me olhou nos olhos e perguntou se eu estava bem. Eu disse que sim; ela balançou a cabeça negativamente e saiu do quarto.
Peguei minhas coisas e fui ajeitar no guarda-roupas. Tinha tudo que eu precisava nas duas malas: roupas, produtos de higiene e até quinhentos reais em dinheiro. Provavelmente, era coisa da minha mãe. Demorei um pouco para arrumar tudo, mas quando terminei, fui tomar meu banho. Não demorei muito, mas fui tempo o suficiente para esfriar a cabeça. Mesmo assim, eu sabia que os dias ali naquela casa com a presença da Naomi seriam complicados para mim.
Fui para meu quarto e, assim que vesti uma roupa, ouvi alguém bater na porta. Falei para entrar e era Naomi. Ela disse que precisava encerrar de vez o assunto do vídeo. Ela disse que era importante para ela pôr uma pedra sobre aquilo de vez. Eu falei que tudo bem. Me sentei na cama e ela fez o mesmo.
Naomi —Sei que você ainda não sabe tudo o que aconteceu. Quero te contar para a gente realmente ter esse assunto encerrado.
Greta —Tudo bem; eu iria mesmo perguntar umas coisas que eu ainda não sei. Acho que, para mim, isso encerraria o assunto e, se quiser perguntar algo, eu posso te responder.
Naomi —Eu sei tudo; sei o que aconteceu comigo e com você. Eu li seu depoimento várias vezes. Mas você nunca leu o meu e prefiro te contar do que você ter que ler aquilo; tem muitas coisas ruins que eu disse nele. Não sobre você, mas sobre o que aconteceu comigo dentro daquela casa.
Greta —Eu sinto muito, Naomi.
Naomi —Tudo bem; já superei isso. Mas não é algo que vai te fazer bem, então acho que é mais prático eu te contar o que você quer saber e me desculpar pelo que fiz.
Greta —Se desculpar? Não entendi!
Naomi —Eu cometi vários erros nessa história toda e todos você sabe e disse que me desculpou. Mas o que cometi naquele dia você não sabe, e eu queria me desculpar. Bom, eu imagino que uma das suas perguntas é porque eu fui até a grade falar com a Rayssa e a outra, provavelmente, é o que tinha na mensagem.
Greta —Sim, é exatamente isso. Que eu saiba, são as únicas coisas que eu ainda não sei.
Naomi —Tudo bem; vou te contar. Bom, a mensagem é algo simples. Eu avisei que Rayssa estava armada e que eu tinha destrancado a porta da cozinha para você entrar. Eu imaginei que você estava vendo tudo, então achei que aquelas informações seriam o suficiente para você entrar na casa da Rose, pular o muro e entrar pela porta da cozinha, já surpreendendo Rayssa na sala, sem dar tempo dela fazer algo.
Greta —Meu Deus! Por que eu não vi a mensagem? Seria o suficiente, sim; eu poderia ter evitado tudo isso. Me desculpe, Naomi.
Naomi — Não se desculpe. Como eu disse, já te perdoei por tudo. Então, pare de ficar pedindo desculpas. Vamos só acabar com esse assunto e seguir nossas vidas sem ter que ficar remoendo isso.
Greta —Tudo bem; já entendi.
Naomi —Bom, e tem o meu erro. Na verdade, não foi um erro; fui uma burrice. Quando você repete o mesmo erro, para mim já não é um erro, é burrice mesmo, e foi o que eu fiz. Fui burra demais e caí na conversa da Rayssa de novo.
Greta —Como assim?
{...}
Naomi —Eu caí na conversa da Rayssa de novo. Mesmo depois de você me pedir para eu nunca mais me aproximar dela. Ela me mandou mensagem pedindo para falar com ela e eu disse que não iria e que eu já sabia que ela mentiu para mim todo esse tempo e que você não tinha feito nada contra ela. Falei que eu fui presa por culpa do Serginho e estaria até naquele momento se você não tivesse me ajudado.
Ela disse que eu tinha razão, que era tudo verdade o que eu disse, e ela estava muito arrependida de ter feito aquilo, mas que era algo que ela não conseguia controlar. Que ela estava doente e precisava de ajuda, mas que só percebeu isso depois que me fez mal. Ela disse que estava muito arrependida e iria se internar para se tratar, mas antes queria se desculpar comigo.
Eu disse a ela que eu a desculpava, que estava tudo bem e torcia para ela ficar bem. Ela disse que queria se desculpar pessoalmente e me mostrar que estava mesmo falando a verdade dessa vez. Eu disse que não precisava. Ela pediu, pelo amor de Deus, que eu saísse só no portão; ela falou que estava na frente da minha casa e só queria se desculpar olhando nos meus olhos e me mostrar o seu pedido de internação. Eu acabei aceitando sair na porta e, quando abri, ela realmente estava lá com uma cara muito triste e abatida.
Ela pediu para eu ir no portão, só para ela me mostrar o pedido de internação e se desculpar. Eu fiquei meio na dúvida, mas como eu sabia que o portão da garagem estava trancado e só o pequeno aberto, eu fui. Se ela tentasse algo, era só eu correr e trancar a porta da sala. Não tinha como ela fazer nada que me colocasse em risco. Mas eu estava totalmente enganada e só descobri quando fui até ela e li o papel que era para ser seu pedido de internação.
No papel, ela avisava que estava armada e, se eu tentasse correr, ela me acertaria antes que eu chegasse na porta. Eu tirei os olhos do papel e pude ver a arma na sua cintura. Nessa hora, eu pensei em correr, mas ela tinha razão; daria tempo de sobra para ela pegar a arma e me acertar. Eu tentei me manter calma e li o resto do que tinha no papel. Ela dizia que era para eu abrir o portão pequeno e me levar para dentro. Que ela não iria me fazer nenhum mal; ela só queria ter uma conversa com você e, se tudo desse certo, ninguém se machucaria.
Achei que a melhor saída era fazer o que ela falou. Eu imaginei que você estava vendo tudo e iria me ajudar. Eu devolvi o papel; ela guardou e disse para eu abrir logo o portão e que nem adiantaria dizer que estava trancado, porque ela sabia que não estava. Eu dei uma travada e ela disse para eu abrir logo, que estava morrendo de fome, e passou a mão na barriga; eu pude ver a arma com mais clareza dessa vez. Bom, eu não vi muita saída e abri o portão. Ela me pediu um abraço e já me abraçou. Ela me apertou forte e disse para eu corresponder ou as coisas iriam ficar ruins para o meu lado. Eu obedeci; naquela hora, eu só rezava para você chegar logo.
Quando entramos, ela perguntou se eu tinha algum tira-gosto e eu disse que não, que só tinha pão e bolachas. Ela disse que podia deixar e pediu para eu ir à cozinha pegar um copo para ela. Eu já tinha visto os dois energéticos e dei graças a Deus por não ser nada de álcool. Eu fui logo para a cozinha e achei que era uma chance de eu ajudar. Destranquei a porta e fiz sinal para você na câmera. Depois peguei o copo, mandei a mensagem e voltei para a sala.
O resto você sabe, a não ser o que conversamos até eu perder totalmente os sentidos. Eu não lembro praticamente de nada do que aconteceu; lembro de ficar com o corpo meio estranho. Parecia que meu corpo ficou todo dormente e eu sentia um calor enorme por dentro. No mais, eu só lembro de alguns delírios que eu tive com você. Mas só depois eu descobri que não era você e sim a Rayssa.
Antes da droga fazer efeito, ela me contou da morte do pai dela; porém, ela não falava coisa com coisa. Na mesma hora que era um policial que tinha atirado, ela voltava a história para trás e dizia que era você. Ali eu percebi que ela era totalmente desequilibrada. Ela me contou que a polícia a perseguia a vida toda, mas ela sempre escapava. Que a polícia matou seu filho e a trancou por muito tempo. Ela falava umas coisas que até faziam sentido e outras totalmente sem noção. Só depois eu fiquei sabendo da verdadeira história dela e pelo que ela passou.
Bom, é isso que aconteceu; espero que você me desculpe por isso. Eu sei que errei, sei que você errou e, no fim, deu no que deu. Nós duas saímos perdendo e muito. Se quiser perguntar algo, pode perguntar.
{...}
Greta —Agora entendo algumas coisas da forma correta. Não tenho o que desculpar não; na verdade, só agradecer por você ter me contado tudo o que houve.
Naomi —Acho que encerramos de vez essa história então.
Greta —Na verdade, para mim, ainda não! Eu queria saber o que houve com você depois que saí daquele hospital. Se você puder me contar, claro.
Naomi —Posso sim; vou te contar como foi minha vida depois que você saiu.
Continua…
Criação: Forrest_gump
Revisão: Whisper
( UM FELIZ NATAL PARA TODOS VOCÊS!!! BOAS FESTAS!!! 🥳🎅🎄 🎁 🥳 )