O clima até que estava agradável na pequena cidade de Olho D'água do Casado. Um local tradicionalmente quente, no extremo oeste alagoano, cravado nas entranhas do sertão, dificilmente tinha dias frescos de temperatura amena. É bem verdade que o Rio São Francisco proporciona uma fuga ao calor incessante, mas nem sempre é possível se dar ao luxo de tomar um banho de rio a qualquer hora do dia.
Apesar do mês de férias, as responsabilidades de um professor e coordenador pedagógico eram muitas, e Tiago acordara cedo para dar cabo dos deveres do dia. O relógio já marcava sete da manhã, mas ele já havia feito seu cardio matinal, tinha ido à padaria, e agora preparava o café da manhã, após um banho para tirar o suor do corpo. Não se deu ao trabalho de pôr uma roupa. Estava de toalha na cintura, com as costas à mostra. Não eram largas, nem musculosas, mas estava na média. A correria do dia-a-dia não permitia que ele dedicasse tantas horas assim ao bem estar físico. Fazia o que dava.
O cuscuz já estava hidratando, e os ovos mexidos estavam no fogo baixo. Cortava algumas bananas para fritas, enquanto escutava o apresentador do telejornal passar as principais manchetes do dia, na chamada da edição matinal local. A próxima semana prometia ter recorde de temperatura nos últimos anos. Às vezes ele imaginava que era impossível chegar a ser mais quente do que era habitualmente.
Tiago lembrou de quando chegou na localidade. Recém-formado e aprovado no concurso da secretaria de educação, passou um perrengue nos primeiros meses. Acostumado com a zona litorânea de Maceió, enfrentar o calor causticante sertanejo foi difícil. Agradecia a Deus pelo rio estar perto. Nas primeiras semanas, descia sempre que podia para banhar-se nas águas frias do Velho Chico.
Era moreno, da cor de café com leite. Cabelos curtos escuros e olhos da mesma cor. Uma herança de família proporcionou-lhe lábios volumosos, embora não fosse um negro de carteirinha. Era alto, com seu 1,83 metro. Nada anormal, para falar a verdade.
Um barulho inesperado acordou-o de suas divagações culinárias. A campainha ressoou na pequena casinha. Foi até a porta, encontrando na soleira um pequeno envelope branco, assinado somente com “Para meu moreno”.
Estranhou. Tão cedo, e tão intimista. Abriu a porta, e verificou a sua, de toalha mesmo. Deserta. Retornou ao interior da acomodação, e abriu o envelope. Uma foto recém-revelada, estilo polaroid, expunha suas costas, na cozinha da sua casa, com a cintura envolta numa toalha branca. Assustado, olhou a janela e percebeu a fresta que deixara, ao não puxar a cortina completamente na noite anterior. Fora dali que tiraram a foto. Olhou atrás da fotografia, e tinha assinado “Espero que sinta tantas saudades de mim quanto eu sinto de você.”
Correu ao quarto, e colocou o primeiro shorts que viu, às pressas. Saiu à rua, e contornou o terreno. Nenhum sinal de gente. Nada. Olhou novamente para as outras residências, e todas pareciam calmas, ainda adormecidas.
Tiago morava num condomínio simples, mas fechado. Casas populares, de dois quartos, uma sala, uma cozinha e um banheiro. O terreno destas abria possibilidades de ampliação da construção, porém, por ser recém-lançado, a maioria dos residentes ainda não tinha mexido em nada nas habitações. Ele dera a sorte de conseguir alugar uma das únicas casas restantes assim que chegou à cidade. Já faziam dois anos desde então.
– Bom dia, princesa. E essa surpresa? – falou alegremente ao ter a sua chamada telefônica atendida por sua noiva.
– Bom dia, meu bem. Qual surpresa? – respondeu ela, com voz de sono denunciando que ele havia a acordado.
– Esse envelope. Foi você não? Estou com saudades também. – Tiago respondeu, carinhoso.
A noiva, Carla, respondeu negando, ainda grogue de sono, deixando Tiago ainda mais incomodado. Quem haveria de ser? Teria sido alguma brincadeira de aluno? Ele só sabia de uma, Janaína, que residia no mesmo condomínio, e pelo comportamento dela, não parecia ser de aprontar. Além disso, os pais dela eram seus amigos, acolheram-no quando chegou ao sertão. Ela não faria nada disso sabendo do contato constante com ele.
Decidiu deixar o envelope de lado, e partiu para a cozinha, para finalizar o café da manhã. Certificou-se de fechar a cortina, para evitar mais fotos indesejadas. Porém, uma notificação do WhatsApp ressoou. Abriu, e viu mais uma foto. Dessa vez, de uma coxa feminina, de pele dourada, com pelos delicados e louros. Não mostrava nada mais que isso, mas a foto era altamente provocativa. O remetente não tinha nome, nem tinha foto. Uma mensagem chegou, após alguns segundos “Sua língua passeou muito nessa perna. Em breve passeará de novo.”