Meus amigos não voltaram, Raylan também não me respondeu quando lhe mandei mensagem pedindo desculpa por pedir que ele saísse, ele não vai querer conversar agora então vou lhe dar espaço, Dan nem me deu a chance de me desculpa, o cara me bloqueou, simplesmente sem motivo algum, ele está com Ciço que é um cara incrível e mil vezes melhor do que eu, não acredito que Dan possa ainda ter sentimentos por mim, mas o que me parece é que seja o que for ele escolheu não resolver, apenas fingir que não existo.
Mauro mandou mensagem antes de dormir elogiando o macarrão e dizendo mais uma vez o quanto foi bom, pior é que foi mesmo e ainda acho que hoje seria a primeira vez em que dormiríamos juntos — talvez até rolasse mais sexo durante a madrugada.
Essa noite não consegui pregar o olho direito, de manhã bem cedo levantei para tomar meu banho e preparar algo pro café da manhã, vou fazer café e cuscuz, estou deixando tudo limpo a média de que vou usando, quando escuto o interfone, meu coração dá uma leve palpitada, mas sei que não é o Mauro, ele buzinava, vou até a janela e vejo Téo, abro o portão com o controle para ele entrar e deixo a porta aberta.
— Trouxe nosso pão.
— Eu estou fazendo cuscuz — aponto para a cuscuzeira.
— Ótimo porque estou morrendo de fome.
— Espera, veio até aqui só tomar café da manhã comigo?
— Culpa sua que me acostumou a comer antes de sair pro trabalho, eu estava feliz vivendo minha vida de não comer nada pela manhã, agora preciso de um café coado na hora e de alguma receita de vó para começar meu dia.
— Quer dizer que isso vai virar um hábito? — Digo apontando para gente e para as coisas do café da manhã.
— Culpa sua, então como foi a primeira noite?
— Péssima, quer dizer, começou boa, mas aí os moleques vieram sem avisar.
— Eita o que tem de ruim eles terem vindo?
— O Mauro estava no banho quando eles chegaram — Téo se ilumina com a fofoca.
— Caramba, pegaram o PM com as calças arreadas.
— Não, mas se tivesse vindo um pouquinho antes, de qualquer forma foi um estresse, Raylan ficou puto porque pedi a eles que dessem uma volta até o Mauro ir embora.
— Entendo eles, mas tipo não custava nada né — Téo está pensativo, mas adorando a fofoca — mas olha para alguém que é gay e que passou a maior parte da vida em um armário, isso nunca acaba bem, você tem que deixar o PM ou vai ser arrastado para o armário junto com ele.
— Não estamos namroado — Téo me encarou fazendo uma leitura perfeita de mim.
— Eu sei, eu sei.
— Pois se sabe mesmo se afaste, como seu mentor tenho obrigação de lhe informar que o PM é uma péssima escolha, ele é gostoso e tudo, mas escute bem, ele tem filho e uma ex mulher, fora que é policial, deve ter caso até na casa do caralho.
— Ele não é assim — me pego defendendo ele novamente.
— Arriscaria a vida de alguém que você ama nisso? — Téo pegou pesado.
— Tá posso não conhecê-lo totalmente, mas sei que ele é fiel.
— Não foi você mesmo que disse que o casamento dele acabou por causa de traição? — Téo veio com outro bom argumento agora e me deixou calado.
Terminamos nosso café e ele lavou a louça, depois saímos cada um para o seu trabalho, ele me daria uma carona, mas fica totalmente contra mão para ele, agora que moro mais perto do trabalho posso ir mais tranquilo pelo menos, mesmo de ônibus consigo chegar no horário — Tales me pediu para entrar mais cedo hoje, estou curioso só espero que ele não vá me demitir por causa do Téo, meu amigo bancou o idiota com ele, depois dele pedir para morarem juntos, agora estou com medo que sobre para mim.
Ele treina o time pela tarde, mas pela manhã ele dá aula de educação física, chego no meio de uma de suas aulas, ele me ver e logo percebo que está com uma cara péssima, me manda entrar na quadra, depois fala para os moleques que podem começar a jogar bola, provavelmente estava aquecendo eles ou fazendo alguma dinâmica.
— Oi chefe?
— Temos um jogo complicado sábado, vamos jogar de manhã e vai ser na escola deles, estou com uma ideia pro time quero que veja e me diga sua opinião.
— Você está bem? — Tales lança um olhar matador e me arrependo de ter perguntado.
— Te chamei para trabalhar Ricardo não para ficar de papo — ele está puto com Téo é nítido, melhor focar só no trabalho mesmo e não me meter.
Estou vendo o que ele preparou enquanto ele dá continuidade com a aula, só que ele fez mudanças no time, uma delas foi de tirar o Junior no próximo jogo, deve esta querendo poupá-lo, afinal o moleque brilhou demais nos dois últimos jogos, mas se conheço esse moleque ele não vai receber bem a ideia de ficar no banco.
— Tales, porque vai tirar o Junior, ele é o melhor.
— O restante do time tem que jogar também.
— Isso não faz sentido, não temos que jogar com o melhor que temos? — Realmente não estou entendendo.
— Seria isso se os pais ricos não ficassem enchendo a escola para que seus preciosos filhos tenham uma chance, mesmo que isso custe nossa vitória.
— O que, como assim, os pais estão reclamando dos seus filhos estarem no banco, mas não é assim que o esporte funciona — não posso concordar com isso.
— Acontece que nem tudo é como a gente quer que seja, algumas pessoas acham que podem controlar tudo e viverem a margem de todo o resto — acho que ele não está mais falando só dos pais — e aí quando algo desagrada eles, simplesmente deve mudar, ou permanecer na mesma merda de vida de sempre.
— Tales.
— Olha Ricardo manda quem pode e obedece quem tem juízo, vamos perder o próximo jogo e quando o diretor vier reclamar vou passar sua própria descrição na cara dele e pode apostar que ele vai vir com o rabinho entre as pernas querendo voltar atrás quando perceber a merda que fez.
— Isso é uma merda, mas podemos tentar algumas estratégias, temos uma semana para deixar o time reserva menos desengonçado.
— Já tive seu otimismo, mas aí veio a vida e desgraçou tudo — nesse caso a vida é o Téo — vamos fazer nosso trabalho e torcer pelo menos pior dos cenários.
O dia foi cheio, os moleques ficaram putos com a decisão de colocar o time reserva em campo, mas conseguiu reverter com um discurso motivacional sobre sermos um time e todos serem importantes e necessários, afinal os moleques não tem culpa por terem pais babacas, assim consegui convencer os titulares a ajudarem no treino dos reservas — seja o que Deus quiser — Junior é um garoto impa, foi o único que nem chiou, ele até passou dicas para seu substituto, ele sabe bem o que é espírito de equipe.
O almoço foi estranho porque agora a ex mulher do Mauro meio que me adora, aparentemente me tornei o novo heroi do Junior e de tanto o moleque falar bem de mim cai nas graças dos seus pais, é muito estranho pensar que Raquel já fez coisas com Mauro e pior ainda ela sorrindo e me servindo sem nem imaginar o que rolou, pior é que ela é uma boa pessoa, até me deixou comer de graça, para variar depois do treino Mauro aparece para buscar o Junior, como estou trabalhando — organizando os materiais que foram usados no treino — ele nem chega perto de mim, apenas nos vemos de longe, isso me serve como um lembrete de que se eu ficar com ele terei de ir com ele para dentro do armário, preciso pensar se estou disposto a isso.
Posso ouvir a voz do pai Gustavo me falando para não deixar de ser quem eu sou, pois devo encontrar uma pessoa que me ame exatamente por quem eu sou, mas com Mauro é só sexo, não deveria ser tão dificil assim, será que estou me apaixonado por ele, isso sem contar que ouvi ele me chamar de amor — pelo menos acho que foi amor, mas posso está enganado — que meleca de situação eu fui me meter.
Tales me ajudou a fechar a quadra, mas acredito que ele se arrependeu de não ter ido embora mais cedo porque Téo acabou de chegar, Tales está com uma cara ainda pior agora, estou achando que ele vai bater no meu mentor a qualquer momento, só que não posso ficar no meio desse fogo cruzado.
— O que você quer aqui? — Tales parece bem magoado.
— Tales vamos conversar — Téo está tentando ficar numa boa mesmo depois de ter dito que não iria tentar, estou feliz por ele.
— Não tenho nada para falar com você, queremos coisas diferentes e está tudo bem.
— Melhor eu ir e deixar vocês conversarem — não vou ajudar muito aqui no meio dos dois.
— Não precisa sair, o Téo já está de saída.
— Então vai ser assim, nem vamos conversar, depois eu sou o infantil aqui — Téo está zangado agora também, pelo jeito as coisas não vão se acertar ainda.
— Até amanhã Ricardo — Tales ignora meu amigo e se retira.
— Está vendo aí, depois eu é quem sou babaca — Téo está puto.
— Dá um tempo para ele, vocês vão se entender.
— Não, acabou, se é o que ele quer então vai ser assim — por não ter nada de bom para acrescentar, apenas permaneço calado no caminho até o carro, já que ele veio até aqui, vai me dar uma carona.
— Pode por favor me deixar em um lugar aqui perto, tenho que resolver uma coisa — não gosto de abusar da boa vontade de ninguém, mas preciso esclarecer umas coisas e não é bom ficar adiando.
— Claro.
Téo me deixa em frente ao apartamento onde Raylan está morando, como não sei se ele vai me receber e nem sei quanto tempo isso vai levar digo ao Téo que ele pode ir, mas ele insiste em me esperar, vou até a portaria e peço para interfonar pro apartamento dele e também mando uma mensagem avisando que estou aqui em baixo, o porteiro me deixa entrar, mas me avisa que ele vai descer, tem um jardim na entrada com uns bancos, então me sento em um deles e fico esperando.
Alguns minutos depois vejo Raylan vindo na minha direção, ele parece mais calmo agora, o que é bom, assim esse moleque vai me ouvir, ele senta no meu lado em silencio e ficar com uma cara de birra que conheço bem, respiro fundo e formulo o que quero falar para então dizer o que quero sem brejas para maus entendidos de novo.
— Raylan que palhaçada foi aquela lá em casa ontem moleque? — Ele arregala os olhos, acho que estava esperando um pedido de desculpas e não um sermão — cara eu disse a vocês que o cara queria ser discreto, custava ter dado um pouco de espaço?
— Você está sendo um otario Rick, esse cara é furada.
— Eu sei de tudo isso Raylan, mas acontece que sou um adulto poxa, cursa confiar em mim, sei o que estou fazendo, não vou entrar no armário de ninguém irmão pode ficar tranquilo, só que também não vou passar a mão na sua cabeça moleque, você é um adulto cara, não dá mais para se comportar feito criança — estou tão sério que ele não me olha nos olhos.
— Desculpa, é que me preocupo com você.
— Eu sei que se preocupa, mas não faça mais isso, se quiser me dar um toque tudo bem, mas não faz mais essa cenas que não somos mais moleques beleza?
— Tá, desculpa — bagunço seu cabelo para aliviar um pouco mais o clima.
— Olha o Guilherme já está com ciúmes de mim, como acha que ele interpretou seu comportamento ontem, vocês conversaram? — Ele faz que não com a cabeça — pois você vai consertar com ele, uma conversa de verdade, vai falar para ele como se sente e assim ele vai entender que somos irmãos e que não tem nada haver ele se sentir inseguro.
— Guigo não está inseguro — Raylan está surpreso.
— Olha aí, você está com tanta coisa na cabeça que não está se tocando como seu namorado está se sentindo, mas um bom motivo para vocês conversarem e você vai voltar para terapia e isso não é um conselho e nem um pedido.
— Como você sabe que não estou fazendo terapia — ele me desafia.
— Te conheço moleque, depois do que a tia fez você precisa desabafar Raylan, tudo bem em ficar triste, com raiva, frustrado, tudo isso, todos esses sentimentos são válidos, ninguém espera que você seja forte e leve isso como se não fosse nada — pronto o moleque está desabando finalmente, se permitindo chorar no meu ombro.
— Eu não preciso deles Rick — ele diz entre soluços.
— Não precisa, mas não quer dizer que não seja bom ter um pouco mais de ajuda, Raylan eu não vou embora de novo, estou aqui, Gulherme está aqui também, deixa ele entrar na sua vida moleque, pro bem e pro mal, nos momentos bons e difíceis, vocês escolheram morar juntos isso é um passo muito importante, mas que vai precisar de muito papo entre vocês.
— Eu amo ele Rick, amos mesmo — dá para ver o medo que meu amigo está de ser abandonado de novo é frustrante não poder arrancar esse sentimento dele, mas posso fazê-lo procurar ajuda, mesmo que para isso tenha que bancar o chato, fazer o papel que seus pais não estão aqui para fazer.
— Obrigado — ele enxuga as próprias lágrimas — tenho medo dele se cansar de mim.
— Ele te ama moleque e posso apostar que ele está com o mesmo medo, por isso está se sentindo ameaçado até por mim, tranquiliza seu cara e volta para terapia, tô falando sério Raylan.
— Tá bom pai, vou voltar — ele me lança um sorriso fraco, nesse momento vejo Guilherme entrando no prédio, ele nos ver e percebo sua insatisfação em me ver.
— Oi Guilherme, tudo bem?
— Oi Ricardo, tudo — seus olhos vão do namorado choroso para mim.
— Tenho que ir o Téo está me esperando e vocês tem muito o que conversar, você ouviu o que tem que fazer né moleque?
— Já disse que vou marcar seu chato — o ânimo dele está melhorando, sei que não é meu papel, mas meu amigo precisa muito de um pai agora e é tudo que posso fazer para ajudar.
— Valeu, a gente se fala, tchau Guilherme.
— Falou Ricardo — ele responde de forma seca.
Me despeço do meu amigo com um abraço e saiu nos deixando sozinhos, só espero que o Raylan finalmente se permita desmoronar na frente do namorado como ele sempre faz comigo, assim Guilherme vai entender como ele se sente e superar essa insegurança. No carro vejo Téo reflexivo me esperando no mesmo lugar em que o deixei.
— Pra onde? — Ele me pergunta.
— Pra casa, meu trabalho aqui já acabou.
— Tá certo — Téo liga o rádio e coloca uma de suas playlists para tocar — ele vai esfriar a cabeça e falar comigo, Tales é assim mesmo emotivo ao extremo.
— Você deu um grande passo indo atrás dele hoje, isso deve contar quando ele esfriar a cabeça — estou tentando animá-lo.
— E as coisas com o PM?
— Não faço ideia — sou sincero com Téo, por que se mentir para ele vou está a um passo mais perto de começar a mentir para mim mesmo.
Em casa depois de um dia bem cansativo finalmente posso relaxar, estou sem fome, só quero deitar e dormir, tomo um banho, visto uma roupa folgada e dou uma última olhada no celular antes de por para carregar e ir dormir, vejo que Mauro me enviou uma foto de visualização única e uma mensagem, na foto ele está sem camisa no sofá com Júnior deitado na perna dele.
— Ele tava chorando aqui por causa do jogo, ele me explicou que o diretor mandou vocês trocarem a escalação.
— Pois é, os pais reclamam que os filhos não estão jogando, dá para acreditar? — Respondo — O Júnior reagiu bem na quadra até ajudou os amigos.
— Pois é, a gente sempre falou para ele não fazer birra na rua, foi só entrar no carro que ele ficou triste, mas ele está bem, só acho foda a escola agir dessa forma.
— Pois é, tentei argumentar com o Tales, mas não teve jeito.
— Vou falar com a Raquel, para ela ver com a escola, ela normalmente tem mais tempo que eu para resolver isso, mas mudando um pouco de assunto, você está bem? — Penso um pouco no que responder.
— Estou sim, falei com meu amigo já está tudo certo.
— Contou sobre a gente? — o ruim da mensagem é que não consigo saber qual entonação ele deu para essa mensagem.
— Não, seu segredo está bem guardado — deixo claro na mensagem que o segredo é dele e não nosso.
— Tudo bem confio em você.
— Está tudo certo, vou indo aqui, preciso dormir, boa noite — o efeito que ele tem sobre mim não me deixa sair disso, mas posso pelo menos colocar limites.
— Tudo bem, dorme bem, bom descanso e Ricardo — ele está digitando — estou com saudades.
— Também estou — me trai dentro dos meus próprios limites.
— Essa semana o Junior vai passar comigo, não vou poder ir essa semana ai.
— Tudo bem, tenho muito trabalho, indo, boa noite.
— Boa noite, até amanhã — ele encerra com um até amanhã para deixar claro que mesmo não vindo ele ainda sim vai manter o contato, não sei o que pensar sobre isso então apenas deixo o telefone no carregador e vou dormir, pois não menti, essa semana estou atolado de trabalho, preciso saber com vamos vencer um jogo extremamente difícil sem nosso time titular.