Meu príncipe, meu irmão - Capítulo 29: Tudo de novo

Um conto erótico de Th1ago-
Categoria: Gay
Contém 2401 palavras
Data: 08/02/2025 17:49:03

Eu não faço ideia de como começar isso.

Estou com o caderno aberto à minha frente, a caneta entre os dedos, e ainda assim, minha mente parece um emaranhado de pensamentos desconexos. Não sei se quem vai ler isso é você, Léo, ou se será sua psicóloga… ou talvez os dois. Mas, independente de quem leia, eu só quero que isso faça sentido.

Antes de qualquer coisa, quero dizer que li tudo o que você escreveu. Cada palavra. Cada sentimento que você derramou nessas páginas. E agora, acho justo que você conheça um pouco do meu ponto de vista também.

Desde que éramos pequenos, eu sempre gostei muito da sua companhia. Você foi, de certa forma, a primeira pessoa que realmente importou para mim. Mas eu lembro bem que, no começo, você não gostava muito de mim. Me olhava torto, sempre desconfiado, como se eu fosse um invasor na sua vida, uma ameaça àquilo que você conhecia como família. Talvez porque, de alguma forma, você achasse que eu ia roubar sua mãe, ou tirar alguma parte do espaço que você tinha com ela.

E eu lembro como você era próximo do Eduardo.

Aquilo me consumia.

Eu via vocês dois juntos, compartilhando segredos, dividindo risadas, e me pegava desejando ter algo assim. Eu nunca tive um irmão de verdade, alguém que estivesse ao meu lado, que me protegesse, que se importasse comigo. E Eduardo… bom, ele era tudo isso para você.

Por mais que eu não goste muito dele – e você sabe bem disso – preciso admitir que ele sempre cuidou de você. Sempre esteve ali quando você precisava.

Talvez seja por isso que eu odiei tanto Miguel no dia em que vi ele implicando com você, não foi só raiva. Foi algo mais profundo. Algo que eu nem entendia direito naquela época, eu queria estar no lugar do Eduardo, queria que você confiasse em mim da mesma forma que confiava nele.

E talvez seja por isso que aquele dia mexeu tanto comigo. Porque, quando vi Miguel te atormentando, senti algo crescer dentro de mim, algo que misturava raiva, ciúmes e um desejo absurdo de te proteger. Não apenas porque eu queria ver você bem, mas porque queria que, de alguma forma, você olhasse para mim.

Que me visse do mesmo jeito que via Eduardo, que me deixasse ser alguém importante para você.

Porque, Léo… desde que eu me entendo por gente, eu sempre fui sozinho, e você foi a primeira pessoa que eu quis ter ao meu lado de verdade.

Eu nasci no mesmo dia em que minha mãe morreu. Nunca cheguei a conhecê-la. Nunca ouvi sua voz, nunca senti o seu toque. Cresci sem saber o que era o amor de mãe, sem ter aquele colo quente para me abrigar quando algo dava errado. Sempre me perguntei como seria se ela estivesse aqui. Será que ela teria sido carinhosa? Será que teria me abraçado quando eu estivesse triste? Será que eu teria me sentido amado de um jeito que nunca me senti?

Apesar de tudo, eu tive meu pai. Isso eu não posso negar. Ele cuidou de mim, me deu tudo o que eu precisava—pelo menos no sentido material. Mas ele não era uma pessoa carinhosa. Não era o tipo de pai que demonstrava afeto com palavras ou gestos. Seu jeito de demonstrar amor era diferente. Era silencioso, discreto, frio.

Eu sei que, no fundo, ele me amava, mas será que era da maneira que eu queria? Será que era o suficiente?

Eu cresci vendo você, Léo, sendo tratado com carinho pela sua mãe. Sua mãe te abraçava, te beijava, fazia questão de mostrar o quanto você era amado. Eu via tudo aquilo e, por mais que tentasse não demonstrar, sentia um buraco dentro de mim.

O que mais me doía era que, enquanto eu era criança, ela também foi muito boa comigo. Sempre me tratou bem, com gentileza, com paciência, como se eu fosse parte da família. Eu nunca poderia negar isso.

Mas não era a mesma coisa.

Eu olhava para você e para Eduardo e via tudo o que eu não tive. Via o amor de mãe, via um irmão protetor, via uma família unida, cheia de cuidado um pelo outro. Eu não queria sentir inveja, mas sentia. E, ao mesmo tempo, queria tanto fazer parte daquilo. Queria tanto ser visto do jeito que você era.

Foi por isso que a sua família se tornou a minha. Foi por isso que eu me agarrei a vocês, principalmente à sua avó.

Ah, a vózinha…

Ela sempre foi a única pessoa que nunca me fez sentir como se eu fosse de fora. Desde pequeno, me acolheu com aquele jeitinho dela, com as palavras certas, os abraços apertados, os doces que ela fazia e me dava sem nem eu precisar pedir. Para ela, eu nunca fui só o "filho do homem que casou com a sua filha". Para ela, eu era Gustavo.

E quando tudo desabou… Quando meu mundo virou de cabeça para baixo… Ela foi uma das poucas pessoas que ficaram ao meu lado, lembrar disso me dá um arrepio.

Porque eu sei o que aconteceu depois. Sei o que falar sobre isso significa, mas também não quero falar, não agora. Ainda tem muita coisa que eu preciso contar antes de chegar nesse ponto.

Sabe aquele dia que você foi tomar um sorvete com o Eduardo?, Eu lembro daquele dia como se fosse ontem.

Você e Eduardo apenas saíram para tomar sorvete. Era algo simples, mas que mexeu comigo de uma maneira absurda. O ciúme que eu senti naquela tarde foi tão forte que me consumiu por dentro. E o pior de tudo é que eu sabia que não fazia sentido. Você e Eduardo sempre foram próximos, sempre tiveram essa relação de irmãos inseparáveis. Não havia motivo para eu me sentir assim.

Mas eu me senti.

Talvez porque, no fundo, eu soubesse que, por mais que você tivesse me convidado para ir junto, aquilo nunca seria algo completamente natural para o Eduardo. Ele me tolerava, mas nunca me aceitou da forma que eu queria. E talvez por isso eu tenha recusado. Ou talvez eu só não suportasse a ideia de ver vocês dois tão felizes juntos, sabendo que eu queria tanto estar naquele lugar.

E eu queria.

Eu queria te chamar para sair há muito tempo. Queria dar uma volta com você, fazer alguma coisa, qualquer coisa. Mas eu nunca tive coragem. Sempre tive medo de você recusar, de achar estranho, de não querer aquilo da mesma forma que eu queria.

Medo de me expor, medo de que fosse só eu.

Só que, no dia seguinte, quando fomos ao cinema ver Harry Potter… Tudo mudou.

Foi ali que eu percebi que talvez não fosse coisa da minha cabeça.

Dentro do carro, nossos braços encostando sem querer, nossas mãos tocando uma na outra de leve, sem que ninguém percebesse. Aquilo me deixou tão ansioso quanto eufórico. Eu sabia que poderia ser apenas coincidência, mas também poderia ser um sinal.

Pela primeira vez, eu pensei que talvez houvesse algo ali.

E essa ideia começou a me encher de felicidade.

Na escola, eu queria passar o tempo todo perto de você. Eu te procurava nos corredores, tentava me aproximar sempre que possível. Mas tinha aquela garota, aquela que vivia agarrada no meu pescoço. E eu me arrependi tanto de ter ficado com ela.

Não porque ela era ruim ou algo do tipo, mas porque, no fundo, aquilo não significava nada para mim. Foi só um momento, um impulso. Uma distração para tentar afastar o que eu sentia de verdade. Mas era diferente com você. Com você, eu queria tudo. Queria passar o dia inteiro ao seu lado, queria estar perto o tempo todo.

E eu sei que sou ciumento. Sempre fui, mas também… o que mais se poderia esperar de alguém que passou a vida inteira invejando o amor dos outros? De alguém que cresceu sem saber o que era ser amado de verdade?

Eu achei que as coisas estavam caminhando bem, sabe?

A gente estava cada vez mais próximos, e pela primeira vez, eu comecei a pensar que talvez eu pudesse ter coragem de te contar o que eu sentia. Talvez eu pudesse dizer, de alguma forma, que você era muito mais do que um amigo para mim.

Só que, do nada, você apareceu com o Miguel. E foi aí que tudo desmoronou, eu odiei o Miguel.

Não porque ele era insuportável, embora fosse. Não porque ele era arrogante, embora também fosse. Mas porque ele teve coragem de fazer aquilo que eu nunca fiz.

Ele se aproximou de você, se jogou na sua vida sem medo, sem hesitação. Ele fez exatamente o que eu queria ter feito há anos.

E eu odiei ele por isso.

Eu odiei porque, naquele momento, eu percebi que poderia ter te perdido.

Que alguém poderia ter ocupado o lugar que eu sempre quis, mas que nunca tive coragem de reivindicar.

O Miguel pensou e agiu antes de mim.

E isso me consumiu.

Eu me senti um covarde.

Meu pai sempre me disse que um homem de verdade não hesita. Que ser "homem suficiente" significava tomar o que se quer, trabalhar duro, ganhar dinheiro, ter uma mulher ao lado.

Desde cedo, ele colocou isso na minha cabeça.

Mas ali estava eu, prestes a completar 17 anos, quase terminando o ensino médio, e incapaz de fazer qualquer coisa além de assistir, em silêncio, enquanto outro cara fazia o que eu sempre quis fazer.

Eu não sabia o que fazer com essa raiva, eu não sabia o que fazer comigo mesmo, eu me senti esmagado.

Quando descobri que você estava com o Miguel, foi como se o chão tivesse sumido debaixo dos meus pés. Um buraco abriu dentro de mim, e eu fiquei perdido lá dentro, sem saber como sair.

E o pior de tudo? Eu não podia falar isso para ninguém.

Você sempre teve o Eduardo, alguém que te entendia, alguém com quem você podia contar. Mas eu? Eu não tinha ninguém.

Se eu contasse para o meu pai… bom, eu sabia exatamente o que aconteceria. Ele ia me bater, ia me chamar de bichinha. Ele riria da minha cara. Diria que eu era um fraco, que eu deveria "ser homem", que isso era só "bobagem de moleque". Tanto que, no futuro, quando ele descobriu… eu vi o que aconteceu.

Então eu fiquei sozinho com aquilo, eu guardava tudo para mim. A raiva, o ciúme, o medo de te perder. Fiquei morando nesse sentimento por muito tempo.

E foi por isso que, naquela época, quando a gente se afastou, quando ficamos tristes um com o outro, aquilo me destruiu. Você nem sabe, Léo, mas eu não dormia direito. Eu ficava acordado, olhando para o teto, pensando no que eu poderia ter feito diferente.

Mas graças a Deus… Graças a Deus, logo depois, você voltou para mim, e eu nunca vou esquecer daquele dia.

O primeiro dia entre nós dois. O dia em que tudo finalmente aconteceu, aquele foi o melhor dia da minha vida. Foi quando eu entendi que, um dia, eu deveria fugir, que eu deveria sair daquela casa, que eu deveria construir minha própria vida, mas não sozinho.

Com você.

Eu comecei a sonhar com o nosso futuro, não um futuro como o que meu pai queria para mim.

Não um futuro onde "ser homem" significava simplesmente ganhar dinheiro, ter uma mulher, construir um nome.

Não.

Eu ia sim ganhar dinheiro, mas não para ser o que ele queria, eu ia ganhar dinheiro para construir o nosso lar. Eu ia sim ter filhos, mas com você.

E eu ia fazer de tudo para que você fosse a pessoa mais feliz do mundo inteiro, porque você merece isso, Léo. Você merece tudo, e eu vou passar o resto da minha vida provando isso para você.

Eu sei que não fiz o combinado.

Peguei esse caderno para escrever sobre aquele dia — o dia em que fomos expulsos de casa, o dia em que tudo desmoronou de vez. Mas antes disso, antes de chegar nesse ponto, eu me sinto na obrigação de fazer um relato sobre tudo o que me trouxe até aqui.

Minhas mãos tremem enquanto eu escrevo. Minha respiração está pesada. Parte de mim quer fechar esse caderno agora e fingir que nunca comecei isso. Parte de mim quer rasgar essas páginas antes que você as leia. Mas eu não posso mais fugir, né, Léo?

Porque agora o que eu vou contar é um pouco mais sério, e você precisa saber. Você precisa entender como tudo aquilo me afetou.

A surra que levei do meu pai não foi só física. Não foi só dor de pele rasgada, de ossos moídos. Foi algo que entrou em mim e nunca saiu. Algo que ainda me faz acordar no meio da noite com a respiração falhando.

A morte dele… Eu achei que seria uma libertação. Mas foi só um buraco maior.

Eu perdi tudo, Léo.

Eu perdi o chão, eu perdi a esperança, eu perdi o que restava de mim.

E foi aí que vieram as drogas.

Eu não sei se você vai entender o que eu vou dizer agora, mas eu preciso tentar explicar. Quando você sente uma dor que parece insuportável, qualquer coisa que prometa um alívio, nem que seja por um segundo, parece uma saída. E eu precisava dessa saída.

Eu vivi na rua, eu passei fome, eu passei frio.

Eu dormi onde dava, me escondi de quem precisava, fugi de quem podia me machucar ainda mais.

Mas eu nunca cobrei nada de ninguém, nunca vendi meu corpo. Nunca me entreguei pra ninguém.

Eu caí, Léo. Eu caí feio. Mas eu levantei, e isso tudo porque eu sempre pensava em você nos meus piores momentos, e aquilo me dava força.

E antes de você virar essa página e continuar lendo, eu quero que saiba de uma coisa:

Eu não quero pena.

Eu não quero que me trate diferente depois disso, eu sou o mesmo Gustavo. O mesmo que sempre amou você, o mesmo que sempre quis te proteger.

Eu só precisei contar isso antes de seguir em frente. Porque agora, finalmente, eu estou pronto para falar sobre aquele dia.

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Tá aí nossa maratona do conto hein, e ainda está de pé a meta. Batendo 27 estrelas sai outro capítulo ainda hoje a noite ou amanhã de manhã.

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Comentários

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Tá chegando o momento de colocar umas peças no quebra cabeça! Uhu! Hahah

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esses dois já sofreram muito, merecem sim um pouco de felicidade. Ansioso pelo próximo.

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Depois de certo tempo não consigo mais sentir simpatia pelo Gustavo,apesar dele precisar ser acolhido,sobre tudo que ele já sofreu,tem algo ali que não bate,nesse capítulo ficou mais explícito certa inveja que ele sempre teve de vc,talvez seja mais vontade ser vc do que gostar de você .

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Verdades expostas sem filtros, realidades íntimas reveladas de forma intensa. É impressionante como seus escritos sempre superam as expectativas. O coração humano é um oceano profundo de experiências e sentimentos, e você tem o dom de nos conduzir nesse mergulho, buscando compreender cada personagem em sua essência. Gustavo carrega cicatrizes e memórias guardadas, como se cada palavra fosse abrir um baú do passado, revirar gavetas esquecidas pelo tempo e trazer à tona vivências e momentos marcantes. Estou ansioso para descobrir o que mais Gustavo tem a nos revelar!

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Excelente. Precisamente a lacuna que se sentia há alguns capítulos atrás e que só agora começa a dar sentido conferindo ao conto a dimensão consistente que merece.

Em certa medida vem ao encontro das minhas suposições sobre o Gustavo que já tinha registado em comentários anteriores.

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