Entre Grades 2 - Julgamento

Um conto erótico de César Júnior
Categoria: Homossexual
Contém 2425 palavras
Data: 14/02/2025 17:28:26
Última revisão: 14/02/2025 20:46:32

Entre grades: Capítulo 1 - Temporada 2

A liberdade é um conceito que nos permite escolher nosso próprio caminho, tomar decisões e viver de acordo com nossas crenças e valores. No entanto, a liberdade também pode ser um peso, pois nos obriga a assumir responsabilidades e lidar com as consequências de nossas escolhas.

É irônico estar em um julgamento! O que sempre me chama a atenção é a estética da sala em que estou; é bem mais simples das quais eu já vi em filmes hollywoodianos. Sem falar de tudo que permeia um julgamento. Você coloca uma roupa social, fala só quando solicitado; você não pode se defender porque tudo, absolutamente tudo, pode ser usado contra você.

Olho para minha direita e vejo minha família. Minha mãe com os olhos carregados de esperança; ela usava um fio de conta de Xangô. Xangô é o orixá da justiça; e será que, depois de tudo o que eu fiz, a justiça de Xangô me guardava algo? Eu só podia pedir por misericórdia.

Olho para o relógio, são quase 17:00h, já estava ali há quase 4 horas, e a cada minuto que passava eu me perguntava pra que essa palhaçada; todo esse tempo que eu pedi na minha vida eu não iria recuperar, todas as vidas impactadas por eu segurar essa mochila continuariam prejudicadas e toda dor, vergonha e constrangimento pra minha família já foi vivido.

O juiz pede para que todos se levantem, pois ele vai anunciar sua decisão. Levanto e alinho minha camisa, quando passo a mão no meu abdômen sinto os contornos das minhas costelas e minha cicatriz em alto relevo. Essa era a mais recente no meu corpo, mas em todos esses anos era mais uma para a coleção.

Eu sei o que você deve estar pensando, onde a história está e como ela chegou aqui? Vamos voltar no tempo e entender tudo?

5 meses antes

Depois de ser apunhalado na minha sala, fui encontrado desmaiado em uma poça do meu próprio sangue, fui encontrado e arrastado pelo Manel, o vigia, que tomava café na minha cela toda manhã. Fui levado para o hospital às pressas, fiquei sabendo pelo médico da enfermaria que ele não acreditava que eu chegaria com vida no hospital.

Eu tive diversas lesões, hemorragia interna, intestino perfurado e um dos meus rins foi retirado. Foram horas a fio de cirurgia, muitas bolsas de sangue.

Acordo em uma enfermaria de hospital. Olho para os lados, é diferente da escuridão que me assolava em minha última lembrança, lá era claro. Segundos depois vem a dor, meu abdômen doía muito, com certeza mexeram em alguma coisa dentro de mim.

Tento tirar o cobertor de cima de mim, mas minha tentativa foi frustrada quando tentei esticar a minha mão e ela foi impedida por grandes correntes que me prendiam à maca.

Lá eu fiquei, sozinho e sem nada para fazer. Diferente de filmes americanos que a pessoa sempre que acorda tem alguém esperando ou as enfermeiras chegam assim que você acorda… lá eu fiquei até a enfermeira passar a vista e ver que eu acordei.

O médico foi horas depois, falou tudo o que tiraram de dentro de mim. Pra ser sincero, não ligava pra o que tinham tirado de dentro de mim, mas sim pra quanto tempo levaria para me recuperar.

Eu ficava algemado a maior parte do tempo, só ficava com as mãos livres na hora de comer, mas nesse momento meus pés que ficavam presos. Quando você é presidiário, o tratamento é diferente; as pessoas te tratam como se você não fosse humano. Até olhar nos olhos era uma coisa que era evitada. Minha família não podia me visitar, os policiais militares ficavam do lado de fora da enfermaria. Não tinha TV, filmes ou livros para me distrair; tudo o que eu tinha era a janela, pela qual eu conseguia olhar o céu.

Sabe, eu era muito grato por estar vivo, mas estar naquela enfermaria me lembrava o buraco, só que dessa vez iluminado e com paredes bege, que já foram brancas um dia. Foram quase dois meses até eu poder receber alta. Antes disso, passei por alimentação líquida, infecção hospitalar, bolsa de colostomia, banho de leito e muita solidão.

A solidão era uma companhia ingrata; ela estava sempre lá, depositando doses de saudade em cima do meu peito, como se fossem pequenas pedras. Aos poucos, essas pedrinhas eram milhares e cada vez mais pesadas. A saudade que a solidão me trazia era tão pesada no meu peito que mal podia respirar.

Vez ou outra, havia um inquilino naquele quarto, sempre um presidiário que sofria um ferimento. Nesses momentos, eu tinha alguém para conversar, saber o que rolava. Uma vez, na madrugada, recebi um colega de quarto que foi embora logo pela manhã. Ele disse que era do mesmo presídio, mesmo pavilhão, e que me conhecia. Falou do Carlos e dos meninos para mim. Meu peito ficou mais leve e quente. Pedi para que, se ele saísse, falasse que estou bem e que ia voltar em breve.

Passei a noite conversando com esse presidiário; contei para ele todos os meus medos e tudo o que estava sentindo desde que acordei pela primeira vez naquele hospital. Mesmo depois de ter conversado horas com ele, não lembro seu nome. Esse cara foi embora de manhã, assim que o sol nasceu; quando acordei, não tinha mais ninguém na enfermaria comigo. Até hoje me questiono se aquilo foi real.

Volto para a penitenciária, mas necessitava de cuidados com medicação intravenosa para minha infecção hospitalar. Ainda tinha uma alimentação mais restrita, e por isso me mantiveram na enfermaria. Eu estava em casa novamente; fui recebido com uma pessoa novamente. As pessoas me olhavam nos olhos, respondiam minhas perguntas; eu era respeitado.

Me acomodei por coincidência no leito em frente ao de Rogério, de frente ao lugar onde cometi meu primeiro assassinato.

A notícia da minha chegada se espalhou rapidamente, e em questão de uma hora, ele estava lá. Alto, pardo, parrudo, cabelo cortado em asa delta, barba por fazer, vestindo uma regata, short de malha e chinelo. Meu macho veio me visitar.

Como visitas não eram permitidas, Carlos cortou a própria mão com um caco de vidro para ir parar na enfermaria; isso ia custar uns pontos na mão, mas valeu o sacrifício. Quando a gente se viu, nós abraçamos, e todas as pedras depositadas no meu peito sumiram em questões de segundos.

Carlos me carregava com sua energia, e eu não queria soltar ele de jeito nenhum. Eu sentia seu cheiro novamente, a textura da sua barba no meu rosto, meus braços fortes me segurando firme, mas sem me apertar; eu finalmente estava seguro.

Com certeza, para o agente penitenciário que trouxe o Carlos até mim, foi meio constrangedor; ele saiu da ala e fechou a porta. Finalmente, pude beijar meu homem, meu amante, meu companheiro. Eu estava completo novamente aos braços dele.

Carlos senta no meu leito, ainda com a mão aberta, porém enrolada em um pano. Entre os beijos e abraços, Carlos me pede perdão por não ter cuidado de mim. E achou que jamais poderia contar que um dos meus alunos poderia ter feito o que fez comigo, mas que ele estava pagando por isso até hoje.

Carlos me falou que o cara estava seguindo as ordens de uma pessoa específica… Valéria, a mulher de Rogério, tentou me matar.

- Quando essa família vai me deixar em paz?

- Quando eu matar todos eles - diz Carlos, olhando nos meus olhos, em seguida baixando a cabeça.

- Esse ciclo não vai parar nunca se continuar um matando o outro! A gente tem que ir embora!

- Você mais uma vez com isso, depois que entra não dá para sair assim; essa vida não é um clube, César. Nem todo mundo tem lugar pra ir depois que sai daqui!

- Você pode vir comigo, além disso, temos grana, podemos ir pra onde quiser…

- Você acha que é fácil assim. Queria ter sua inocência. Além disso, você vai estar lá fora anos antes de mim; é óbvio que sua vida vai andar, e eu vou ser só mais uma lembrança horrível desse lugar.

- Você é a melhor coisa, e eu vou te esperar o tempo que for necessário. Porque eu te amo e vou te amar todos os dias da minha vida.

Carlos me beijou, ficamos em silêncio, porém grudados, até o médico chegar e dar uns pontos na mão de Carlos. Enquanto isso, conversávamos sobre negócios, e Carlos repassava o dinheiro da obra semanalmente para minha mãe, conforme ela o visitava.

Passei mais uma semana no presídio e estava de alta, quase 90% recuperado. Eu ainda mantinha uns cuidados, mas podia retomar minha vida. Volto ao meu pavilhão. Quando entro, sou recebido por todos aqueles homens, com muitos apertos de mão, sinais de valeu e tapinhas nas costas.

Vou entrando para meu bloco e vou te falar uma coisa: nossas obras e reformas colocaram o pavilhão da Universal no chinelo. Entrei na minha cela e gritei:

- Voltei pra por ordem nessa porra aqui!

Todo mundo levou um susto, e após isso, uns vinham a mim e até me deram abraços.

Carlos, no fundo da cela, acompanhava tudo a distância com o olhar. Marcelo veio na minha direção e me abraçou com carinho.

- Meu irmão!

- Meu amigo! Tô de volta! Desculpa pelo susto.

- Pra ser seu amigo, tem que ter coração forte!

Abraço Fernando e Jorge, os dois ao mesmo tempo. Ítalo não só me abraça, ele me suspende do chão, como se eu não fosse nada; mais uma vez.

- Vaso ruim não quebra! - disse Ítalo

- Eu envergo, mas não quebro.

Fui de encontro aos braços do meu macho, e os braços de Carlos são o melhor lugar para estar no mundo. Fui situado de tudo o que estava rolando no presídio após minha saída.

Descobri que o cara que me apunhalou estava dentro do poço desde então. Carlos praticamente pagava diariamente para ele não sair de lá; além disso, o cara comia as sobras uma vez na semana, mas depois que eu voltei, ele passou a comer três vezes.

- Se o pior tivesse acontecido, ele nunca mais ia ver a luz do sol.

- Amor, tira ele de lá!

- Como? Você está maluco!

- Tô bem! Deixa esse coitado viver, não quero ter mais isso na minha consciência.

Carlos concordou e deu a ordem a Saldanha, mas mesmo com a ordem de Carlos, o cara ficou mais uma semana, por ordem do diretor, o mesmo fez isso como símbolo de boas vindas.

Ao longo desses anos, eu e o diretor Adriano criamos uma boa relação. Ter um ao outro como aliado foi fundamental para o sucesso de tudo.

Pelas minhas contas, faltava dois meses pra eu sair quando sofri meu atentado; com o tempo que eu passei no hospital me recuperando, já era para eu estar fora da prisão. Mas como a vida é engraçada.

Após anos minha família tentando recorrer da decisão do primeiro juiz que me sentenciou, eu teria uma nova audiência e dessa vez Lucas seria uma das testemunhas. Isso ia acontecer em breve, e durante todo esse tempo, eu usaria o meu tempo para curtir o Carlos, finalizar todas as reformas, apagar todas as notas fiscais frias e deixar nas mãos de Carlos as atividades de manutenção.

Para essa quantidade de dinheiro, eu só confiava nele. Quando parei para me organizar, vi que tinha feito um bom dinheiro, dinheiro pra não precisar trabalhar mais. Isso só contando minha parte das reformas.

Eu não podia deixar esse caminho de ouro pra ninguém; precisava acabar com tudo relacionado a isso e sair da prisão com minha imagem forte e respeitada.

Após dois meses, chegaria o dia da minha audiência, mas o que estava em jogo nessa audiência era a redução da pena ou absolvição total, inclusive a remoção do meu nome do sistema penitenciário. O tempo eu já tinha cumprido. O que estava em jogo mesmo era se meu nome ia sair limpo ou não.

Quando chego no tribunal, não posso falar com minha família, sou orientado a ficar em silêncio e falar somente o necessário, quando solicitado. Já tinha passado por isso uma vez, não queria estar ali novamente.

Quando fui interrogado, só respondia com "sim" e "não". Eu acreditava que nada poderia me surpreender naquela situação até o testemunho do Lucas.

Entre inúmeras perguntas que Lucas respondeu, houve uma que ele demorou e foi aí que voltei minha atenção a ele:

- Sr. Lucas Duarte Santos, você conhecia o acusado César Ferreira antes de entrar no ônibus 315 - Recreio x Centro?

- Não!

Lucas fala com voz embargada e cabeça baixa.

- Poderia repetir?

- Eu não conhecia o César!

- Sr. Lucas, a mochila que continha as drogas , pertencia ao meu cliente César?

- Não!

- Então a mochila era do senhor?

Lucas ficou em silêncio, e o meu advogado reforçou a pergunta. Nessa hora, o defensor público de Lucas já não falava mais nada; ele não se importava.

- Então a mochila era do senhor?

- Eu nunca vi o César na minha vida. Quando eu entrei no ônibus lotado, ele se ofereceu para segurar a mochila porque estava batendo na cabeça dele. Quando a polícia parou o ônibus, eu deixei a mochila com ele e dividi a culpa. O César segurou essa mochila, e isso destruiu a vida dele e a minha.

Recebi essa fala de Lucas como um soco. Essa sensação ambígua de finalmente ter chances de ser considerado inocente e ver o sofrimento que ele também passava me deixou muito confuso, com um gosto agridoce.

Após pedir misericórdia a Xangô, ficamos todos em pé para a decisão do juiz:

Considerando as provas apresentadas neste processo e a análise cuidadosa das mesmas, esta Corte declara que o réu César Ferreira é INOCENTE das acusações que lhe foram imputadas.

Por conseguinte, ordeno que:

1. O réu seja imediatamente libertado de qualquer restrição ou detenção;

2. Seu nome seja removido do sistema prisional e de qualquer outro registro de antecedentes criminais;

3. Todas as acusações contra o réu sejam canceladas e consideradas nulas;

4. O réu seja reabilitado e tenha seus direitos civis e políticos restaurados.

Esta decisão é fundamentada na Constituição e nas leis do nosso país, que garantem o direito à liberdade e à presunção de inocência.

Ouço meus pais comemorando, os gritos de felicidade de minha mãe me arrepiam; as lágrimas escorrem dos meus olhos; é um misto de emoções tão forte que, por minutos, não sabia nem o que estava acontecendo.

Eu estava livre de novo e era inocente novamente!

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