36 - Problemas e progresso. Vida que segue.

Um conto erótico de Nassau
Categoria: Heterossexual
Contém 5439 palavras
Data: 01/03/2025 20:12:37

CAPÍTULO 36

Milena acordou com o sol banhando seu corpo e, antes mesmo de abrir os olhos, tateou a areia ao seu lado procurando um contato com o corpo de Margie e não a encontrou ali. Assustada, levantou o corpo e ficou sentada olhando ao redor.

A primeira coisa que viu foi Furação e a Ventania. Os dois animais pastavam ali perto, o que a deixou tranquila, pois se os dois cavalos estavam ali é porque a Margie também estava por ali. Como se a confirmar essa conclusão, ouviu um grito vindo do mar e olhou naquela direção.

Com o corpo submerso da cintura para baixo, lá estava Margie com a brancura de sua pele refletindo o sol e os cabelos ruivos molhados caindo sobre seus ombros e ocultando um de seus seios. Ao ver que Milena olhava para ela, ela gritou:

– Levanta preguiçosa. A água está uma delícia.

Milena obedeceu de imediato, correu para a água e nadou até se aproximar de Margie. Como a profundidade do mar permitia que elas ficassem em pé, abraçou a garota e a beijou demonstrando estar com uma saudade de meses e não parecia que tinham transado naquela noite. Logo a ruivinha foi arrastada para a areia onde, embalada pelas ondas que avançavam até elas, se amaram mais uma vez. Depois de gozarem ao mesmo tempo, Margie falou:

– Hum! Que delícia! Fiquei até com fome. Sobrou alguma coisa de ontem?

– Se sua fome estiver muito grande não. Só tem um pedaço de carne seca.

– Vixi! E agora? Com a fome que estou, sou capaz de comer um boi inteiro.

– Então vamos voltar para o lago. Lá tem comida de sobra.

Ao ouvir a sugestão de Milena, o semblante de Margie se alterou imediatamente e passou da alegria e jovialidade de sempre para um de tristeza e preocupação, fazendo Milena se lembrar daquela Margie que, durante dois anos, perambulava pela Enseada sem que ninguém entendesse o motivo de sua tristeza. A loira, ao notar isso, não conseguiu ficar sem falar sobre a fuga dela:

– O que está acontecendo, Margie? Você fugiu de mim e agora, quando falo em voltar para a “nossa casa”, fica desse jeito. – Milena fez questão de frisar bem quando se referiu ao lar delas.

– Não é nada não. Eu estou bem. Só fiquei assim porque aqui está tão legal que eu queria ficar aqui para sempre.

Milena ficou olhando para Margie que não conseguiu sustentar seu olhar inquisidor e baixou a cabeça, o que fez que ela insistisse no assunto:

– Sem essa, Marguerithe. Você pensa que me engana? Pois está muito errada. Eu te conheço muito bem e sei que tem alguma coisa de errado. Então, desembuche.

Ninguém nunca mais se dirigia à Margie falando o seu nome de batismo, exceto Milena. Porém, a loira só fazia isso quando estava brava com ela ou no caso de ser um assunto sério. Margie percebeu isso, mas mesmo assim continuou disfarçando e falou de forma carinhosa:

– Já te falei, Mi. Não é nada. Só que gosto muito de ficar aqui.

Conhecendo bem a sua amada, Milena teve certeza que ela estava escondendo alguma coisa e não tentou esconder que isso a irritava. Segurou o queixo de Margie e forçou para que pudesse olhar em seus olhos e a reação da garota lhe deu mais certeza ainda que tinha alguma coisa errada, pois ela não só fechou os olhos para desviar do olhar de Milena, assim como apertou os lábios um contra o outro como sempre fazia quando queria comunicar que não falaria nada. Isso sempre dava certo, porém, desta vez Milena estava decidida e não cedeu, fazendo uma pergunta direta:

– Porra Margie. Qual é? Você pensa que pode me enganar? Se pensa, está errada. Eu te conheço muito bem. A gente prometeu nunca esconder nada uma da outra. Então, por favor, me fale logo o que está acontecendo.

– Eu não posso, Mi. Você vai brigar comigo e eu não sei se vou suportar uma discussão com você agora.

– Vou brigar muito mais se você não começar a falar logo.

Novamente seus olhares se encontraram e, como Margie abrira os olhos que ficaram presos ao azul intenso dos olhos de sua companheira, mas não se atreveu a falar nada. Milena, suspirando para demonstrar seu desespero, soltou o queixo dela, deu um passo para trás e passou ao ataque:

– Já sei. Não precisa falar mais nada que eu já entendi muito bem. Você transou com o Nestor e descobriu que está apaixonada por ele. Você vai voltar com ele para a Enseada?

Aquilo, para Margie, era a coisa mais ridícula que ela poderia ouvir. Ela não percebeu que era um truque de Milena, pois embora tivesse certeza de que não havia nada de sério entre a ruivinha e o Nestor, usou esse argumento por saber que Margie iria se irritar e iria atacar de volta. Ela só não sabia que esse ataque seria tão violento. Margie se aproximou de Milena agitando a mão direita fechada em punho diante do rosto dela e começou a gritar:

– SUA IMBECIL! EU ME APAIXONAR POR NESTOR? VOCÊ ESTÁ FICANDO LOUCA OU VIROU UMA COMPLETA IDIOTA PARA FALAR UM ABSURDO DESSES?

Milena não podia deixar transparecer em seu rosto o gosto da vitória que a invadiu, pois sabia que atrás daquela explosão viria a explicação que ela esperava. Ela conhecia sua amante muito bem e não estava enganada, pois não demorou em que Margie continuasse, dessa vez falando normalmente:

– Quem está apaixonado aqui não sou eu.

Milena arregalou os olhos. Aquilo que ouviu foi entendido por ela como se estivesse sendo acusada de estar interessada em Nestor. Porém, Não foi necessário que contestasse a acusação de Margie, pois antes que abrisse a boca, a ouviu falando com uma voz magoada:

– É ele que está apaixonado Milena. E não é por mim. É por você. O Nestor quer roubar você de mim.

Suspirando de alívio, Milena explicou, não sem antes censurar Margie pelo absurdo que acabara de ouvir:

– Que besteira é essa, Margie? O que te faz acreditar nisso? Nunca dei motivos para ele pensar que a gente podia se relacionar e, além disso, ele vive na Enseada e você já provou que lá esse tipo de sentimento não acontece. Quer dizer. Não para ele.

Milena se referia ao fato da magia da Enseada não produzir mais efeitos em Margie, porém, a ruivinha parecia conhecer esse assunto muito melhor que ela, pois rebateu o argumento dela:

– Não acontece lá, Milena. Apenas lá. Qualquer um de vocês que se afaste da Enseada fica livre dessa maldita magia e se apaixona. Ou não foi isso que aconteceu com você?

Não havia como rebater esse argumento e Milena sentiu um tremor no corpo ao perceber que tinha um sério problema pela frente. Problema porque ela não nutria nenhum sentimento com relação ao Nestor que não fosse o de amizade. Para ela, ele era apenas o pau amigo que servia para aplacar o seu tesão. E agora ela ia ter que lidar com o sentimento dele, o que seria difícil de fazer sem que isso causasse algum tipo de ressentimento. Mas ela era filha de Ernesto e aprendera com ele que certas decisões, por mais difícil que seja, têm que ser tomadas. Então falou com voz resoluta:

– Tudo bem, Margie. Agora pare de fazer drama e vamos voltar para casa. – Margie tentou falar, mas foi interrompida por Milena que continuou: – Não. Espere. Deixe-me acabar de falar. Vamos voltar para casa e resolver isso hoje ainda. Eu vou pedir para que o Nestor vá embora. Nós duas vamos conseguir acabar a construção da casa. Falta pouco para cobrir e tenho certeza de que daremos conta.

Embora a sugestão de Milena não agradasse à Margie, ela sabia que aquilo seria necessário. Ela não tinha mais nenhuma dúvida do amor de Milena, pois se tivesse essa dúvida, seria a primeira a se afastar dela. Como já tinha feito quando pensou que Nestor poderia ter alguma chance. Então falou:

– Tudo bem. Eu topo. Mas vê se dá um jeito de fazer com que ele entenda que não deve mais retornar. Eu não quero ele aqui.

– Não posso prometer que ele nunca mais volte. Mas posso tentar.

Ao regressarem, Milena cumpriu sua palavra conversando com o Nestor e pedindo para que ele retornasse naquele mesmo dia para a Enseada. Como ela não usou nenhuma desculpa, falando exatamente o motivo desse pedido e explicando para ele que, a partir daquele dia, não haveria mais nada entre eles, o rapaz não teve alternativa senão a de obedecer.

Com o coração aos pedaços, Nestor partiu na manhã seguinte e os quatro dias que gastou para chegar à enseada foi o suficiente para fazer com que o amor que sentia por Milena se transformasse em raiva. Uma raiva que, enquanto ele estava na Enseada, desaparecia, porém, bastava ele se afastar para que ela voltasse.

Menos de um mês depois, Milena e Margie foram surpreendidas pela visita da carroça que, conduzida por Henrique e Na-Hi, transportava os filhos das duas.

Na-Hi fizera questão de fazer aquela viagem porque queria inspecionar o local. Além de conversar com as moradoras sobre a sua intenção, ela vistoriou tudo e fez um levantamento sobre o potencial daquele lugar, descobrindo que, se não havia ali nenhum minério a ser extraído, a fertilidade da terra era muito melhor do que a da Enseada e as aconselhou a se dedicarem apenas à agricultura. Milena aceitou a sugestão dela, porém, deixou mais claro que nunca deixaria de criar gado e que, parte da área cultivável, seria usada com esse propósito.

Com muito custo, Na-Hi convenceu a ela que poderia deslocar o gado para além das colinas e que enviaria ajuda para que elas desmatassem parte da floresta para ser usada como pastagem. Sabendo que isso não afetaria o meio ambiente, pois o pasto não ocuparia um por cento da área verde, Milena acabou concordando e aceitou que a área cultivável fosse utilizada para o plantio de arroz e trigo. Com o feijão que já estava sendo produzido na Enseada, a dieta alimentar deles se aproximaria mais daquela que eles conheciam antes de chegarem à ilha.

O problema foi com relação à construção de um moinho para beneficiar esse trigo e o arroz. A ideia de Na-Hi era a de desviar a água do riacho mais próximo, porém, como esse era justamente o tobogã, não houve como convencer à Margie de aceitar que sua diversão preferida fosse destruída em nome desse progresso. Não houve argumentos que a convencesse. A discussão só chegou ao fim quando a própria Margie sugeriu que construíssem o Moinho na outra margem do Lago, aproveitando a água da cachoeira que caía em queda livre e que, pelo volume de água muito maior que a do tobogã, poderia ser desviado apenas em parte, o que não prejudicaria em nada a paisagem.

Percebendo que Margie estava irredutível, Na-Hi aceitou e ficou de pensar em uma forma de fazer o transporte dos grãos e do produto final de um lado para outro do lago. Mas quando ela mesma atravessou o lago para poder fazer um projeto, descobriu que, do outro lado do lago, a terra era tão fértil quanto a que vira antes e que, se a usasse para a plantação do trigo e do arroz, a área fértil que existia do lado de casa poderia ser usado na plantação de milho e cana, além da horta e do pomar que já estavam programados.

Quando Henrique e Na-Hi foram embora, a coreana levava com ela a certeza de estar trabalhando não apenas para a sobrevivência dos que chegaram naquela ilha e de seus filhos, como de muitas e muitas gerações futuras.

No terceiro dia depois da partida de Na-Hi, Milena começou a apresentar os primeiros sintomas de gravidez e no quinto o mesmo aconteceu com Margie. Talvez pela primeira vez desde que chegaram à ilha, nasceriam crianças e todos teriam a certeza de quem era realmente o pai delas.

Durante o período de gravidez a cooperação das pessoas que continuavam na Enseada com as duas garotas que se transferiram para o lago foi constante. Na-Hi fez com que construíssem uma balsa para atravessar o lago usando o sistema de cordas e roldanas onde, o próprio ocupante da balsa a impulsionava para o lado desejado puxando uma corda, sendo necessária mais de uma no caso da balsa estar carregada. Alguém se lembrou de que, no caso do Nestor se mudar para o Lago, isso não seria necessário, pois, com a força que tinha, conseguiria fazer isso sozinho. Porém, Milena recusou a oferta da coreana, lembrando a ela que a presença dele no Lago estava proibida. Sem querer se estender no assunto, Na-Hi aceitou a decisão sem discutir.

Mais por costume, do que de causa pensada, o lago recebeu o nome de Lago da Noiva, por causa da principal cachoeira que o abastecia.

Em uma das viagens até o Lago, Pâmela, que também estava grávida, veio junto e informou, assim que chegou, que permaneceria ali para ajudar nos partos que se aproximavam. Isso emocionou Milena que sabia o sacrifício que estava incluído nesse gesto, pois estando na Enseada, Pâmela não teria grande problema ao dar à luz uma criança, porém, no lago, ela estaria sujeita às dores e risco de um trabalho de parto.

Por sorte, ou talvez por influência da natureza que trabalhou a favor delas, o filho de Pâmela nasceu quinze dias antes do de Milena e dezoito do de Margie, permitindo que estivesse apta para ajudá-las quando do nascimento dos filhos delas. Muito trabalho e dores aconteceram, porém, as garotas já estavam acostumadas à vida rude daquela ilha e cooperaram da melhor forma possível.

Milena pariu uma menina e Margie um menino. A pele negra de ambos era a prova de que eram filhos de Nestor e os olhos azuis da menina e os verdes do menino daria a qualquer um que não os tivesse visto nascer, quem eram suas mães.

E Pâmela, apesar de ser o oitavo filho de Milena, foi invadida pela primeira vez pelo sentimento de avó. Ela não era a mãe de Milena, porém, antes mesmo de chegarem àquela ilha, ela aprendera a amar a garota e se sentia como se assim fosse. Então, a Samantha, que logo ganhou o apelido de Sam, era vista por ela como uma neta e, quando Margie reclamou de que a bebê recebia mais cuidados do que o seu filho, o Juliano, Pâmela a repreendeu dizendo que ela estava sendo injusta. Não era bem isso que acontecia. Ela tinha sim uma predileção por Samantha, porém, com os esforços que fez para dar a mesma atenção ao filho de Margie, acabou se afeiçoando a ele também e, quando foi embora, não se cansava de dizer que tinha dois netos.

Três meses depois das crianças terem nascido, em uma visita ao Lago onde Henrique permaneceu por três dias, ele se envolveu com as duas sexualmente. Isso aconteceu na noite anterior à partida dele e ele transou com as duas em um ménage delicioso. Como gozou dentro de suas bucetinhas, quinze dias depois elas descobriram que estavam grávidas novamente.

Os nove meses de gravidez passaram sem que elas sentissem. Envolvidas na lavoura, que durante esse período passou pela segunda colheita, quando receberam a visita do pessoal da Enseada para trabalharem no sistema de mutirão. Apenas Nestor e Cahya não estavam entre os visitantes. Ela porque alguém tinha que permanecer na Enseada cuidando das crianças e o Nestor por ter sido desaconselhado por Pâmela que, com palavras calmas e amigáveis, fez com que ele entendesse que sua presença no Lago da Noiva não era vista com bons olhos.

Depois da colheita, Na-Hi decidiu usar a palha do trigo para melhorar a qualidade dos tijolos, transportando o máximo que conseguiu para a Enseada.

Três semanas depois do pessoal da Enseada deixar o Lago da Noiva e voltar para casa, as duas entraram em trabalho de parto no mesmo dia e tiveram que auxiliar uma à outra, no trabalho de parto. Mais uma vez Milena e a novidade foi Margie, cujo bebê também era do sexo feminino. As duas tiveram uma discussão sobre que nome dar às crianças, pois ambas tinham intenção de homenagear Pâmela. Foi Margie que recuou e deixou que a filha de Milena recebesse esse nome, batizando a sua com o nome de Perla.

O tempo foi passando e a vida na ilha continuava sem problemas, mas também não houve grandes avanços. As mulheres geravam novos filhos a razão de um por ano. Os casos de gêmeos deixaram de ocorrer e o crescimento da população passou a ser mais lento. A vida continuava sem problemas e a troca de mercadorias entre os moradores da Enseada e do Lago da Noiva eram constantes, fazendo com que ninguém passasse por dificuldade causada pela escassez de algum produto primordial para a sobrevivência deles.

Mas havia um problema. Um não, mas dois problemas representados nas figuras de duas crianças que pareciam ter vindo ao mundo para causar provocar agitação. Samantha e Juliano, na medida em que cresciam, mostravam cada vez mais que eram indomáveis.

Os dois não se desgrudavam. Onde estava um, estava outro e o maior castigo que suas mãos podiam dar a eles era proibi-los de ficar juntos, proibição essa que não resultava em nada, pois eles sempre davam um jeito de burlar o castigo.

Os dois eram tão destemidos que, antes de completarem cinco anos, conseguiram escalar as pedras sozinhos e, para o susto de suas mães, desceram pelo tobogã juntos e de mãos dadas. Enquanto suas mães se desmanchavam em preocupações, os dois nadavam alegremente em direção à margem.

Depois de gritarem muito com eles, Milena ameaçou Samantha de que, se aquilo voltasse a acontecer, ela nunca mais ia poder brincar com o Juliano e, como Margie que normalmente era a mãe que protegia aos dois, confirmou a sentença, eles ficassem mais calmos por muito tempo. Mas não por muito, pois quando suas mães se afastaram para cuidar da plantação ou do gado, eles voltavam a repetir a proeza.

Além disso, eles davam um jeito de montarem Furacão e Ventania e galopavam aos gritos pela planície, muitas vezes sobre a terra cultivada, o que fazia com que muitas plantas fossem arrancadas. Mas isso foi fácil de resolver. Bastou Milena ordenar ao Furacão e à Ventania para não se permitirem ser montados que as travessura pararam.

Se resolveu o problema com relação ao Furacão e à Ventania, piorou em outros sentidos. Os peraltas tentaram substituir os dois cavalos que ainda mantinham uma interação estreita com a Milena e tentaram montar os outros que, assustados com os gritos que eles davam, além do fato de alguns deles nunca terem sido montados, pulavam e os derrubaram. Mas o que era para ser algo perigoso e grave, para os dois era apenas uma diversão.

Milena ainda tentava descobrir o motivo de aqueles dois estarem sempre com alguma parte do corpo arranhada, outras vezes inchadas, mas por mais que os interrogassem, nunca conseguia tirar deles nenhuma informação.

Para suas mães, as duas crianças pareciam que as crianças estavam finalmente sob controle. Mas elas estavam enganadas e a prova disso foi o fatídico dia em que, retornando para casa antes do horário, Milena viu os dois sendo ejetados do tobogã e caírem no meio do lago. Aquilo foi demais para ela, que resolveu radicalizar e, naquela noite, chamou Ângela e Marta, suas duas filhas mais velhas que estavam com onze anos nessa época e fez com que elas prometessem cuidar da irmã. Cuidar, segundo ela explicou, significava impedir que ela se afastasse de casa e jamais permitir que ela se aproximasse do Juliano.

Quando Margie soube disso, convocou o Al e o Neto e lhes deu as mesmas ordens com relação ao Juliano.

Sob a vigilância dos irmãos mais velhos, as duas crianças peraltas passaram algum tempo sem dar problemas. Mas não durou muito. Menos de um mês depois, os dois burlaram a vigilância de seus irmãos e simplesmente desapareceram.

Durante toda a noite, montando Furacão e Ventania, Milena e Margie vasculharam as matas próximas e, quando o dia raiou, desesperadas e temendo o pior, vasculharam o fundo do lago procurando pelo corpo deles. Não encontraram nada.

Já sem saber o que fazer, Margie se lembrou da pena de águia que um dia Diana lhes presenteara. Milena, que a guardara e até já se esquecera dela, foi buscá-la. Bastou tocar na pena e aguardar que, meia hora depois, Áquila sobrevoava a região do lago. Margie teve a ideia e, pegando uma enxada, começou a fazer um sulco em uma área que estava desocupada por ter passado por uma recente colheita. Demorou um pouco para que Milena percebesse o que ela pretendia com aquilo, mas quando percebeu que ela fazia os sulcos em formato de letras, se juntou a ela e logo formaram a frase: “Sam e Juliano fugiram”.

Nem tinham concluído a frase quando Áquila parou de sobrevoar sobre elas e se deslocou para a mata. Meia hora depois outras três águias se juntaram a ele e começaram a vasculhar o lugar. Milena felicitou Margie:

– Que bom que você pensou nisso, Margie. Logo as águias vão encontrá-los.

– Não se eles entraram na floresta. As árvores impedem que elas tenham uma visão completa do que acontece embaixo das árvores. – Respondeu Margie desanimada.

– Então por que você pediu ajuda delas?

– Não foi a ajuda delas que eu pedi. A intenção era avisar aos nossos amigos da Enseada para que eles nos ajudassem nas buscas.

Durante dois dias inteiros elas foram ampliando a área de buscas sem resultados, até que Henrique, Na-Hi, Diana e Nestor chegaram ao local. Ao ver o Nestor, Milena foi lhe agradecer, mas seu gesto não foi bem recebido por ele que apenas respondeu:

– Eu não estou aqui por sua causa. Eu vim ajudar a achar meus filhos. Duas crianças cujas mães não dão conta de cuidar.

Milena não estava em condições de responder e Margie, que se aproximava naquele momento e ouviu o que Nestor disse, retrucou:

– Para um pai que nunca se preocupou em receber notícias dos filhos, suas acusações são totalmente infundadas.

O olhar que Nestor dirigiu a Margie foi uma prova de que o seu ódio não era endereçado apenas à Milena, mas também a ela. Mas o momento não permitia que eles se perdessem em discussões sobre o amor e cuidados que dedicavam aos seus filhos. Já fazia três dias completos que as crianças tinham desaparecido e a preocupação agora ia além da segurança deles, mas também sobre a fome, a sede e o medo que eles deviam estar sentindo.

Mais um dia de busca e nenhum sinal dos dois fujões.

No quinto dia, uma descoberta importante aconteceu. Foi o Henrique que, ao lado de Milena, estava fazendo um percurso que ladeava a montanha, quando olhou para cima e comentou com a garota:

– Você reparou nessas árvores à nossa frente, Milena?

– Não. O que tem? Algum sinal das crianças?

– Infelizmente não, Não é isso. Mas olha bem. Repare que tem uma faixa onde os arbustos são menores. Parece que eles não têm a mesma idade das outras.

– É verdade. O que você acha que é?

– Não sei. É apenas um palpite. Vamos verificar.

Apearam de seus cavalos e se aproximaram do local. Henrique, depois de examinar, voltou até seu cavalo e, segurando um machado, retornou para o lado de Milena que não se movera. Começou então a cortar alguns arbustos que eram derrubados com facilidade. Não precisou ir muito longe, pois ainda não tinha avançado um metro quando se abaixou, pegou algo no chão e quando se levantou, mostrou uma pedra pequena para Milena enquanto explicava:

– Isso é seixo. O chão está totalmente coberto por eles. É por isso que as árvores não crescem como as outras.

– Tá. E daí? O que isso significa e de que forma vai ajudar a encontrar as crianças.

– Infelizmente isso não tem nada a ver com as crianças, porém, é algo que quero explorar melhor depois de encontrá-las.

Milena nem se preocupou em perguntar o que Henrique pretendia encontrar promovendo uma expedição ali. Montaram em seus cavalos e seguiram em frente.

Regressaram da busca naquele dia sem nenhuma notícia que pudesse dar esperanças às mães sobre o paradeiro de seus filhos. Juntaram-se a Margie que, a cada dia que passava, estava mais inconformada. Ela se afastou da casa em direção ao sopé da montanha, mas longe do caminho que dava acesso ao tobogã. Ela viu Henrique e Nestor subirem por ali depois de se banharem no lago e sabia que eles iam se divertir um pouco, o que achou ser justo. Ela foi até convidada, mas não estava em condições de aceitar e saiu andando no sentido oposto, sempre ladeando a montanha, até parar diante de uma vegetação fechada que cobria a encosta da mesma. Na-Hi e Diana permaneciam no interior da casa junto com as demais crianças que, depois de ficarem o dia todo aos cuidados dos irmãos mais velhos, reclamavam por atenção.

Estava distraída quando Milena se juntou a ela e a abraçou. Margie não teve reação nenhuma. Apenas aceitou aquele abraço enquanto deixava suas lágrimas correrem livres pelo seu rosto.

De repente, em meio à névoa provocada em seus olhos lacrimejantes, ela teve a impressão de ver um vulto. Era totalmente negro e descia a montanha, mas, antes que ela tivesse tempo de identificar o que era, o vulto ficou oculto atrás da vegetação. Mais cautelosa do que com medo, ela avisou à Milena:

– Cuidado Mi. Tem alguma coisa vindo na nossa direção. Se prepare.

Se preparar para que? Elas não traziam consigo nenhuma arma e Margie já tinha experiência, por sua convivência com panteras, que correr não era uma opção quando se tratava do ataque de um animal. Sentiu seu corpo tremer e sua mente foi povoada pelas cenas das lutas contra Sétan. Então se colocou em guarda e ficou preparada para reagir da melhor forma que pudesse.

Então, diante dela, apareceu algo. Mas não podia ser o vulto que ela vira, pois aquele era negro como uma noite sem lua e esse era totalmente branco. Tão branco que chegava a ferir seus olhos. Mas não foi a surpresa de ver aquele vulto se aproximando que causou a reação das duas que gritaram ao mesmo tempo:

– SAMANTHA! – Gritou Milena.

– NEVE! – Gritou Margie.

Diante delas, Samantha estava pendurada nas presas de Neve que a sustentava através do vestido de couro que usava e a mantinha suspensa no ar, quase que de cabeça para baixo. A menina não demonstrava medo, em vez disso, ela esbravejava contra o animal se debatendo e gritando:

– Me coloca no chão seu gato idiota.

E antes que Milena e Margie pudessem fazer ou dizer qualquer coisa, Chantal surgia atrás de Neve conduzindo Juliano do mesmo jeito que Neve fazia com Sam. Ele, porém, não reclamava. Em vez disso, olhou para Margie e falou:

– Mamãe. Olha o que eu achei? Uma onça. Eu vou ficar com ela. Posso?

Enquanto Margie tentava decidir se ria ou se espancava seu filho, Milena corria em direção à sua filha que Neve, com delicadeza, depositou no chão. Quando chegou até ela a abraçou enquanto Margie ia em direção à Chantal e Juliano, tendo uma reação totalmente diferente. Passou pelo garoto e abraçou a pantera. Neve, vendo isso, não se limitou a assistir e se aproximou dela e também foi abraçado. Com cada um de seus braços envolvendo os pescoços das onças, ela virava a cabeça para um lado e o outro dando beijos nas cabeças delas, só parando quando Neve lambeu as lágrimas de uma de suas faces, fazendo com que ela reclamasse:

– Pare com isso, Neve. – Ao ver que a pantera albina parou e a olhou com seus olhos verdes, ela sorriu um sorriso molhado e disse: – Estou brincando. Pode lamber, morder. Você pode tudo meu amor.

Como se fosse uma ordem, Neve voltou a enxugar suas lágrimas de um lado enquanto Chantal começou a fazer o mesmo na outra face. Milena ria e chorava ao mesmo tempo. Logo os outros se juntassem a eles, pois os gritos das duas foram ouvidos por Na-Hi e Diana e os rapazes, quando as viram correndo naquela direção, foram atrás delas.

A alegria do reencontro com as panteras foi tão intensa que os dois fujões se livraram de um castigo severo. Apenas a vigilância sobre eles passou a ser mais constante.

As panteras permaneceram no lago por dois dias e depois desapareceram. Foi uma despedida emocionada de Margie. Não demorou em que os quatro moradores da Enseada que foram ajudar retornassem aos seus lares, não sem antes Henrique levar Na-Hi e Nestor até onde descobrira aquela vegetação estranha e confirmou que se tratava de uma antiga estrada que, depois de tanto tempo sem uso, fora coberta pela vegetação. Mas o que mais preocupou aos moradores da ilha foi se depararem, pela primeira vez, com alguma coisa construída por mãos humanas.

A partir dessa descoberta, a principal atividade de Henrique e Nestor foi reabrir a estrada que subia até o topo da montanha onde cruzava o riacho que deságua no lago da Enseada e depois descia atingindo o vale que existia sobre as duas montanhas. Chegando à Enseada pelo lado oeste.

Foram meses de trabalho, porém, valeu a pena porque, quando pronta, a estrada reduziu o tempo de jornada em um dia quando as carroças eram usadas. O problema foi que havia alguns trechos em aclives acentuados e os cavalos não davam conta de subir quando as carroças estavam carregadas. Quem resolveu esse problema foi Milena que, separando dezesseis bois, os transformou em bois carreiros através de um treinamento eficaz. Isso fez com que a jornada voltasse a ser de quatro dias, pois os bois se deslocam a uma velocidade inferior àquela desenvolvida pelos cavalos. Por outro lado, permitiu que carroças maiores fossem construídas, otimizando o transporte de víveres e equipamentos entre a Enseada e o Lago da Noiva.

Isso fez com que os locais de parada para passarem a noite fossem sempre o mesmo e logo Na-Hi construiu uma casa em dois deles que tinham condições para tanto. O terceiro era apenas uma cabana, pois era a mais próxima da Enseada e as paradas nela eram muito breves.

Com o uso da estrada que passou a ser usada com bastante frequência, a distância entre os dois locais habitados parece ter ficado mais curta e a convivência entre eles passou a ser mais constante. As crianças da Enseada eram levadas até o lago e adoravam as diversões que eram oferecidas e o tobogã era a principal delas e, no que se refere ao relacionamento, pelo menos uma vez por ano Milena e Margie seduziam Henrique que, embora nunca tomasse a iniciativa, não recusava o assédio delas e, todas as vezes que isso acontecia as duas ficavam grávidas.

As crianças do lago também tinham seus períodos de férias quando eram levados à Enseada e Ruta e seus golfinhos ficavam sobrecarregados para dar a eles todas as diversões que eles queriam. Os únicos que não participavam dessas viagens eram a Sam e o Juliano que só eram aceitos lá quando iam juntos com suas mães. A primeira vez que foram, criaram tanta confusão que Na-Hi proibiu que eles visitassem a Enseada sem que elas estivessem juntas.

O tempo foi passando e os primeiros filhos atingiram a maturidade sexual e não houve nenhuma restrição por parte dos adultos para que eles começassem a se relacionar e logo o número de nascimentos a cada ano começou a aumentar. Porém, diferente de seus pais, eles iam formando pares e mantinham uma relação monogâmica.

Quando os mais velhos completaram dezenove anos, a Enseada já tinha a aparência de uma pequena vila, com várias casas menores servindo de moradia para os casais que se formavam nos últimos anos. Sam e Juliano, seis anos mais novos que eles, provocaram então a maior confusão. Eles resolveram se unir e morar juntos. Milena e Margie não estavam de acordo com isso porque achavam que eles eram muitos novos e pretendiam fazer com que eles se relacionassem com os jovens que viviam na Enseada. Elas acreditavam que a separação deles seria benéfica para todos.

Pressionados por suas mães, Samantha e Juliano fugiram durante uma noite. Preocupadas, menos com o sumiço deles e mais com o que eles iam fazer, Milena e Margie pediram ajuda para o pessoal da Enseada e uma expedição de busca foi formada, com a participação dos membros da segunda geração que já eram considerados adultos, inclusive, já carregando nos ombros a responsabilidade de serem pais.

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