A FORÇA QUE ENCONTRO EM TI - CAPÍTULO 11: VIVA

Um conto erótico de Escrevo Amor
Categoria: Gay
Contém 2778 palavras
Data: 25/04/2025 02:14:43

Eu estou namorando.

O pedido foi meio inesperado, mas acabei aceitando. Não sei exatamente o que me levou a dizer sim, mas a verdade é que estar com Emmett tem sido bom. Melhor do que imaginei. Na terapia, tenho trabalhado o perdão interno. Não é fácil ficar nesta dualidade entre amor e mágoa, mas aos poucos, estou abrindo mais meu coração para ele, que tem se mostrado nada além de um bom namorado.

Nossa rotina tem sido tranquila. Passamos muito tempo juntos, seja estudando na biblioteca, caminhando pelo parque ou indo ao cinema. Ele sempre encontra um jeito de tocar minha mão, de entrelaçar nossos dedos, de beijar minha testa quando acha que ninguém está olhando. E eu gosto. Gosto mais do que deveria admitir. E, apesar de não querermos apressar nada, nossos beijos e carícias estão cada vez mais urgentes. Eu queria deixar as coisas fluírem naturalmente, mas há um turbilhão de pensamentos dentro de mim.

E foi por isso que, sem planejar, trouxe esse assunto para a terapia.

— E você está preparado para transar? — Dra. Moore perguntou enquanto fazia anotações.

Senti meu rosto esquentar. A pergunta me pegou desprevenido.

— Não sei — respondi, desviando o olhar. — Eu gosto do Emmett, de verdade, mas tenho muitas dúvidas.

— Isso é normal, George. Ainda mais com o passado que vocês têm. De algoz a namorado. O importante é manter um diálogo saudável com o Emmett, afinal, um relacionamento não se constrói sozinho. — Ela me olhou com atenção e continuou: — Você é um rapaz muito forte. Conseguiu se manter são depois de perder tanto. Lembre que o sexo é algo bonito, que representa amor e união.

— Entendi.

— E você tem preservativo e lubrificante?

Me engasguei com a própria saliva.

— O quê?!

Dra. Moore manteve a expressão séria enquanto se levantava e ia até uma gaveta.

— Como médica, preciso te lembrar sobre o uso de preservativo. — Ela voltou com um pequeno pacote e me entregou. — Sexo seguro é tudo.

Fiquei encarando aquilo na minha mão como se fosse uma bomba prestes a explodir. Murmurei um agradecimento e enfiei os preservativos no bolso do casaco, sentindo um pequeno "Gay Panic" me dominar.

Eu nunca tinha parado para pensar em sexo. Nunca foi algo que considerei antes. Mas agora... Agora era algo que martelava na minha cabeça.

O corpo de Emmett. A mão firme em minha cintura. O jeito como ele me segura, como se eu fosse algo precioso. O calor da pele dele, os músculos bem definidos. O cheiro. Meu Deus, o cheiro. Eu gosto de ficar perto dele. Gosto da maneira como me faz sentir seguro, desejado. E, de repente, percebo que quero mais. Mas será que estou pronto?

Saio da terapia decidido. Se tem alguém com quem devo falar sobre isso, é com o próprio Emmett.

***

O vento soprava suavemente, balançando as folhas da árvore que nos servia de abrigo. Eu rabiscava números e equações no caderno, tentando resolver um exercício de álgebra, mas minha mente divagava. Do meu lado, Emmett assistia a uma competição de natação pelo celular, os olhos fixos na tela como se estivesse torcendo silenciosamente por algum competidor. Já os gêmeos, Nathan e Sofia, conversavam animadamente sobre o festival do solstício de Litha.

— É uma celebração antiga. — explicava Sofia, os olhos brilhando de empolgação. — As pessoas dançavam em volta de fogueiras e agradeciam pela fertilidade da terra.

Nathan riu, jogando uma pedra pequena para o alto. — Se eu fosse naquela época, certeza que seria o rei do festival.

Revirei os olhos e fechei meu caderno. Apesar da algazarra dos gêmeos, havia algo reconfortante naquela cena. Pela primeira vez em meses, eu me sentia em paz.

Então, o alarme soou.

Um som estridente, sufocante. O mesmo alarme que ecoou há seis meses, quando o Furacão Fernandes destruiu Jacksonville.

Meu corpo gelou. Meu coração disparou como se tentasse fugir do meu peito. Minhas mãos tremiam, a visão ficou turva, e o ar ficou pesado nos meus pulmões. O tempo se desfez. Eu não estava mais no jardim da escola.

Eu estava lá. De novo.

O vento feroz uivando, a chuva cortando como lâminas, os gritos desesperados. O teto desabando, placas de madeira voando. Alunos e professores correndo para se proteger, o chão coberto de destroços. A escola desmoronando ao meu redor. Eu sentia o cheiro de poeira e fumaça, ouvia os lamentos e choros.

— Cuidado! — gritei, me encolhendo no chão, esperando o impacto de uma placa que não estava lá.

— Amigo. — A voz de Nathan ecoava longe. — É só um treino de segurança.

— Precisamos ir para o porão da escola. — Explicou Sofia, mas eu não conseguia entender.

— George, calma, por favor. — A voz de Emmett cortou o caos, me puxando de volta.

Mas eu não podia voltar. Ainda não.

— A gente precisa sair daqui, Emmett! Precisamos avisar a Rachel e o Zeek! — Meu peito queimava, meus músculos estavam tensos, prontos para correr.

— Ei, eu estou aqui. — Emmett me envolveu em um abraço firme. — Vai ficar tudo bem.

Eu queria acreditar nele. Mas o mundo girava, meu corpo não respondia, e tudo ficou escuro.

Quando abri os olhos, não estava mais na escola Cleverfield.

Estava na minha antiga escola.

Levantei devagar, ainda zonzo. Os corredores estavam vazios e escuros, como se o tempo tivesse parado. Tudo parecia assustadoramente intacto, diferente da última vez que vi esse lugar, em ruínas. Meu coração batia forte contra o peito enquanto caminhava hesitante pelo corredor.

Uma sombra se moveu na sala de química. Alguém estava lá.

— Olá? — minha voz ecoou, fraca e trêmula.

Ninguém respondeu. Com um nó no estômago, segui até a porta e entrei.

Foi quando o vi.

Zeek.

Ele estava ali, como se nunca tivesse partido. O mesmo sorriso tranquilo, o cabelo bagunçado, as roupas desleixadas. Meu melhor amigo. Meu coração parou por um segundo, incapaz de compreender o que estava vendo.

— E aí, George. Quanto tempo. — Ele sorriu, como se tudo estivesse normal.

Meus olhos se encheram de lágrimas. Corri até ele e o abracei com força, soluçando descontroladamente. Eu queria segurá-lo para sempre, nunca mais soltá-lo.

— Eu sinto sua falta, Zeek. — Minha voz saiu entrecortada, o peso da saudade esmagando meu peito.

Ele apenas me apertou mais forte.

— Eu sei, cara. Eu sei.

Estou morto?

É isso. Eu morri de susto e agora estou na outra vida. O Zeek, que está à minha frente, parece tão real e vivo. Toquei no rosto do meu melhor amigo, que sorriu.

— Estou morto? — Questionei.

— Não, amigo. Ainda não. Você tem muitas experiências para vivenciar.

— E onde estou?

— Aqui. — Ele se aproximou e tocou na minha testa. — Eu sou um mecanismo de defesa do teu cérebro. — Zeek andou até a frente da sala e sentou em cima da mesa.

Cruzei os braços e o encarei, tentando entender o que estava acontecendo. Se ele era fruto da minha mente, por que parecia tão real? Até o jeito dele se mover, inclinar a cabeça ao falar e dar aquele sorriso de lado... Tudo era tão Zeek.

Tudo era tão dolorosamente familiar. Os cabelos laranjas sempre bagunçados, as sardas salpicadas pelo rosto como pequenas constelações na pele e o rosto… imponente, forte, inconfundível. Mas o que me destruiu mesmo foi o sorriso — aquele sorriso lindo, largo, que sempre parecia esconder um segredo.

— Você sempre foi o cara mais teimoso que eu conheci. — ele riu. — Lembra do dia em que você me contou que era gay?

Assenti, sentindo um aperto no peito. Como esquecer?

— Você estava tremendo, gaguejando, quase chorando. Eu só te olhei e disse: "Beleza, mano. Vamos comer pizza?" — Zeek riu. — Você ficou tão frustrado porque eu não fiz um grande espetáculo disso.

— Eu passei semanas ensaiando esse momento — Revirei os olhos, mas um sorriso triste surgiu em meus lábios. — E você só... seguiu em frente como se nada tivesse mudado.

— Porque nada mudou, George. Você era meu melhor amigo antes, e continuou sendo depois. A gente viveu uma amizade incrível, intensa, e eu tenho um orgulho enorme de ter feito parte da sua vida. Mas agora... agora você precisa seguir em frente.

Meus olhos encheram de lágrimas, e eu balancei a cabeça, negando.

— E o que eu faço? Você ainda vive dentro de mim.

Zeek se inclinou para frente, os olhos cheios de ternura.

— Lembra da nossa viagem? — Perguntou ele. — A gente ia comemorar sua saída do armário. Íamos acampar e celebrar com muito álcool.

Soltei uma risada trêmula, enxugando as lágrimas.

— Você falava como se eu tivesse ganhado um prêmio.

— E não foi? Você venceu o medo, se libertou. Isso era uma coisa pra se comemorar, mano. E eu ia estar lá, do seu lado, pra qualquer coisa. Sempre ia estar.

O silêncio caiu entre nós. Meu peito doía. Minha cabeça pesava.

— Mas agora, George, você precisa seguir sem mim. Eu sempre vou ser parte de você, mas não pode me deixar te prender no passado. Você ainda tem muito pra viver.

As lágrimas voltaram com força, e eu fechei os olhos, tentando absorver aquelas palavras.

Quando os abri novamente, Zeek não estava mais ali.

Eu não conseguia entender direito onde estava. Tudo doía, e a minha cabeça parecia estar cheia de algodão. A luz branca do teto da enfermaria me cegava, e eu fechei os olhos por um segundo, tentando me lembrar do que tinha acontecido.

— Você está bem? — A voz de Emmett chegou até mim, preocupada.

Abri os olhos de novo e o vi ao meu lado, junto com Nathan e Sofia. A enfermeira da escola estava ali também, ajustando algo no aparelho de pressão ao meu lado.

— Onde estou? — Minha voz saiu rouca, como se eu tivesse gritado por horas. Tentei me sentar, mas uma onda de tontura me derrubou de volta no travesseiro.

— Você está na enfermaria da escola.— Sofia explicou, segurando minha mochila com cuidado, como se fosse quebrar.

E então, de repente, tudo voltou.

O corredor escuro. O cheiro de mofo. Aquele vulto no fim do hall.

— Eu vi o Zeek. — As palavras saíram antes que eu pudesse pará-las, e meu peito apertou como se alguém estivesse esmagando meus pulmões. — Eu vi o Zeek.

Não consegui me controlar. As lágrimas queimavam meus olhos, e eu me joguei contra Emmett, agarrando ele como se fosse a única coisa que me mantinha no chão.

Ele não hesitou. Me abraçou com força, como sempre fazia quando eu estava assustado.

— Tá tudo bem, George. Você vai ficar bem.

Após o espetáculo que dei no campus do colégio, fui acompanhado para casa. Como o Emmett tinha um treino importante e a Sophia aula de violino, coube ao Nathan a missão de me levar. O carro dele era antigo, um Ford Escort XR3, que ele contou ter sido comprado pelo pai em uma promoção. O motor roncava alto, destoando da tranquilidade das ruas naquele horário.

Quando chegamos, a casa estava vazia. Fomos recebidos pela Cachorra, que instantaneamente correu para Nathan, abanando o rabo com entusiasmo. Ele se abaixou e começou a acariciá-la, sussurrando palavras carinhosas que a fizeram se jogar no chão de barriga para cima. Era engraçado como os dois tinham uma conexão natural. Nathan sempre brincava que era um bruxo, e eu às vezes acreditava nisso.

Subimos para o meu quarto, e a primeira coisa que fiz foi me jogar na cama. O dia tinha sido longo e caótico, e tudo o que eu queria era ficar ali, imóvel, sem precisar lidar com nada. Nathan tirou as botas e também se deitou, mas no sentido contrário, com a cabeça perto dos meus pés e os pés perto da minha cabeça.

— E o que ele falou? — Nathan perguntou depois de um tempo, sua voz quebrando o silêncio confortável.

— Quem? — Respondi, ainda olhando para o teto.

— O seu amigo. O que ele te falou?

Pensei por um momento antes de responder. As palavras de Zeek ainda ecoavam na minha mente, me desafiando de um jeito que eu não sabia se estava pronto para encarar.

— Que eu precisava viver. Ter experiências e aproveitar. — Expliquei, sem tirar os olhos do teto.

Nathan ficou em silêncio por alguns segundos, como se estivesse digerindo a informação. Então, murmurou algo que me pegou de surpresa.

— Eu tenho inveja de vocês.

Virei o rosto na direção dele, confuso.

— Inveja? Por quê?

Nathan suspirou antes de responder, e quando falou, sua voz tinha um tom de tristeza que raramente se deixava mostrar.

— Eu nunca tive uma amizade como a de vocês. — Ele revelou, ainda encarando o teto. — Quando eu comecei a transição, por exemplo, todos os meus amigos se afastaram. Eu sei que parte da culpa não era deles. Os pais ficavam assustados com a situação, talvez achando que eu teria influência sobre eles. Eu era apenas uma criança.

Ele riu, mas havia um ressentimento evidente em sua voz. Um riso que não era de felicidade, mas de resignação. Fiquei em silêncio, absorvendo aquilo. Eu sempre soube que Nathan tinha passado por muita coisa, mas era diferente ouvir da boca dele, saber como ele realmente se sentia sobre tudo.

— Sinto muito. — Foi tudo o que consegui dizer. Parecia insuficiente, mas era sincero.

— Não precisa sentir. — Ele respondeu, finalmente virando o rosto para me encarar. — Só estou dizendo que... às vezes, eu olho para vocês e fico me perguntando como teria sido se eu tivesse alguém assim quando era mais novo. Se eu tivesse um George ou um Zeek.

As palavras dele me atingiram de um jeito estranho. Eu nunca tinha parado para pensar sobre o que eu significava para Nathan. Sempre o via como alguém forte, independente, alguém que parecia não precisar de ninguém. Mas ali, naquele momento, ele parecia tão vulnerável quanto eu me sentia na maior parte do tempo.

O silêncio preencheu o quarto. O único som era o farfalhar das folhas das árvores lá fora, embaladas por uma brisa suave que entrava pela janela entreaberta. Nathan estava chorando, mas não disse mais nada. Ele apenas respirava fundo, como se estivesse reunindo forças para manter as lágrimas sob controle.

Observei meu amigo e senti algo diferente dentro de mim. Durante meses, meu mundo girou em torno do meu próprio sofrimento. O furacão, a perda do meu olho, as crises de ansiedade que me engoliam quando eu menos esperava. Era fácil pensar que minha dor era a única que importava, que ninguém poderia entender o que eu estava passando. Mas ali, deitado ao lado de Nathan, percebi o quão cego eu tinha sido.

Nathan sempre foi forte. Sempre foi sarcástico, inteligente, dono de uma presença tão marcante que fazia parecer que nada poderia derrubá-lo. Mas agora, com os olhos avermelhados e a voz embargada, ele parecia tão humano quanto eu. Tão frágil quanto qualquer um que já precisou se levantar sozinho depois de ser jogado no chão.

Pessoas como o Nathan carregam um peso que eu nunca precisei carregar. Ele teve que lutar para ser quem é, em um mundo que tantas vezes tentou apagá-lo. As pessoas o viram como um problema, quando tudo o que ele queria era existir em paz. Eu pensei no que ele disse sobre perder amigos na infância. Sobre os pais que afastaram seus filhos dele, como se ele fosse um perigo. Como se ser trans fosse algo contagioso.

O preconceito é como uma sombra que se espalha sobre tudo. Ele molda a forma como as pessoas veem o mundo, como reagem ao que não compreendem. E, no fim, quem sofre são aqueles que só querem viver, que só querem ser vistos como qualquer outra pessoa.

Nathan me olhou de relance e deu um meio sorriso.

— Você tá muito pensativo. — comentou, limpando o rosto com a manga da blusa.

— Eu só... eu nunca tinha parado pra pensar no quanto as coisas foram difíceis pra você. — admiti. — Acho que eu estava tão focado em mim mesmo que não vi que você também tem cicatrizes.

— Todo mundo tem. — Ele deu de ombros. — Algumas só são mais invisíveis que outras.

Aquelas palavras ficaram ressoando na minha cabeça. Meu trauma era visível. As pessoas olhavam para o meu rosto e viam o que eu passei. Mas Nathan, e tantos outros como ele, carregavam marcas que o mundo fingia não enxergar.

Me virei e olhei para o teto. O mundo podia ser cruel. Ele foi cruel com Nathan, foi cruel comigo, foi cruel com tantas pessoas que só queriam um espaço para existir sem medo. Mas talvez, se tivermos uns aos outros, possamos tornar esse peso um pouco mais leve.

— Você nunca mais vai estar sozinho. — prometi, olhando para ele. — Eu estou aqui, sempre.

Nathan sorriu, dessa vez um sorriso verdadeiro, e fechou os olhos por um momento. Eu também fechei os meus, sentindo que, pela primeira vez em muito tempo, eu estava vendo além da minha própria dor.

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