O ar na cozinha daquele apartamento pequeno em Bento Gonçalves estava pesado naquela manhã de terça-feira. Olivia vestia-se em frente ao espelho do quarto, ajustando o decote discreto - mas calculado - de seu vestido preto de alfaiataria, aquele que realçava cada curva de seu corpo. O tecido macio deslizava sobre suas coxas como um segundo pele, e ela sabia exatamente o efeito que causava.
Do outro lado da casa, Charlie mexia em seu café com uma expressão distante. O cheiro amargo da bebida forte se misturava ao aroma do pão fresco que ele mal tocara. Seus olhos castanhos, antes tão vívidos, agora pareciam desfocados enquanto observava a esposa se arrumar através do reflexo na janela da cozinha.
"Evento especial hoje?" Charlie perguntou enquanto Olivia terminava o café.
Ela evitou seu olhar, ajustando o relógio de pulso — presente de aniversário de três anos atrás. "Só um casamento grande na serra. O buffet vai fechar sozinho."
Quando se virou para pegar as chaves, uma notificação iluminou a tela do seu celular. Olivia mordeu o lábio inferior ao ler, os dedos hesitando sobre o teclado antes de digitar uma resposta rápida. O rubor subiu do pescoço até suas bochechas, tão rápido que ela precisou fingir um acesso de tosse para disfarçar.
Era Ricardo, seu chefe.
Nos últimos meses, os "bom dia" no grupo de trabalho haviam se transformado em mensagens diretas — primeiro sobre horários, depois elogios disfarçados de profissionalismo. "Esse vestido novo é tão elegante quanto você", ele escrevera na semana passada. Olivia respondera com um simples "Obrigada", mas seu coração batera mais forte.
Na última sexta-feira, porém, algo mudara. Quando ele mandou "Preciso da sua opinião sobre o cardápio. Só a sua.", ela não resistira ao trocadilho: "E se minha opinião for que você pede muita coisa só pra me ver ficar até tarde?"
Ricardo respondera em segundos: "Bingo."
Agora, a nova mensagem piscava na tela:
Ricardo: "Vou deixar uma taça de vinho no meu escritório pra você.
Aquele espumante que você gosta. Dizem que combina com mulheres que trabalham demais... e sorriem de menos."
Olivia digitou, apagou, e digitou de novo antes de enviar: "Cuidado. Um dia eu aceito."
O celular vibrou quase imediatamente.
Ricardo: "Prometo me arrepender depois."
Ela desligou a tela rápido demais, mas não antes que um sorriso escapasse. O relógio na parede marcava 8:47 — ainda faltavam treze minutos até sair. Treze minutos para imaginar como seria entrar no escritório dele e encontrar não apenas o vinho, mas Ricardo esperando, aquele olhar que ultimamente a fazia esquecer o que ia dizer.
"Tô indo", anunciou a Charlie.
Charlie respondeu no automático, com a cabeça pensando no conto.
Até a noite, meu amor.
O "Sabores da Serra" estava particularmente vazio naquela tarde. Olivia circulava entre as mesas de prova, seus saltos altos ecoando no salão vazio enquanto revisava a lista de fornecedores pela décima vez. Seus dedos tremiam levemente ao virar as páginas.
Ricardo, o dono do buffet, observava tudo de seu escritório de vidro. Aos 45 anos, o homem mantinha um físico atlético que seus ternos caros mal conseguiam disfarçar. Seus olhos escuros percorreram o corpo de Olivia com a familiaridade de quem já imaginou cada centímetro daquela pele sob seus dedos.
"Precisamos conversar sobre o evento de sábado." Sua voz fez Olivia erguer a cabeça bruscamente. Ele estava mais perto do que imaginava, seu perfume amadeirado invadindo seu espaço pessoal. "No meu escritório. Agora."
O ar condicionado parecia ter parado de funcionar. Olivia seguiu-o, consciente de cada olhar que os funcionários trocavam. A porta de vidro fechou-se com um clique suave.
O escritório cheirava a couro caro e café expresso. Ricardo fechou as cortinas com um movimento fluido antes de se apoiar na mesa, bloqueando sua saída.
"Você está linda hoje." Ele disse simplesmente, os olhos escuros queimando-a viva. "Aquele vestido... eu sempre imaginei como seria tirá-lo de você."
Olivia sentiu as pernas amolecerem. O conto que lera na noite anterior – “A Executiva Infiel – Capítulo 3”, sobre a mulher que traía o marido - ecoou em sua mente. Cada palavra parecia ter sido escrita para este momento.
"Ricardo, nós não..."
"Você vem aqui toda manhã com esses vestidos que me deixam louco."
Ele interrompeu, fechando a distância entre eles. "Risadas mais fáceis, olhares mais longos... você sabe o que está fazendo comigo. Estou ficando louco aqui, olhou para baixo, mostrando o volume nas calças"
Seu dedo traçou a linha de seu decote, e Olivia descobriu que não conseguia se mover. O calor daquela simples carícia a fez arder por dentro.
"Encontro-me no bar da esquina após o expediente." Ele sussurrou, os lábios quase tocando sua orelha. "Se aparecer, saberemos que é isso que você realmente quer."
Quando Olivia saiu do escritório, seu pulso estava acelerado demais e sua pele estava mais corada que o normal.
Enquanto isso, na sala vazia da escola onde Charlie lecionava, seus dedos voavam sobre o teclado. O novo capítulo de "A Executiva Infiel" tomava forma com uma intensidade que o surpreendia:
"Ela sabia que era errado. Cada toque, cada olhar trocado no escritório vazio era uma facada nas costas do homem que jurara amar. Mas quando seus lábios finalmente se encontraram, nada mais importava - apenas o gosto proibido da traição, a excitação de ser desejada de um jeito que há muito não sentia..."
Charlie parou, olhando para a tela com uma estranha sensação de desconforto. As palavras fluíam com uma facilidade perturbadora, como se viessem de algum lugar profundo que ele não queria explorar.
Seu celular vibrou. Uma mensagem de Olivia:
"Ficarei até tarde hoje. Reunião importante com o cliente do casamento."
Ele respondeu automaticamente que estava tudo bem, pois isso acontecia com uma certa frequência, o que fez seus olhos voltarem para a tela do computador, pensando nos próximos trechos do seu conto.
A personagem principal de sua história acabara de enviar exatamente a mesma mensagem para o marido prestes a ser traído pela primeira vez.
O bar "Gran Reserva" estava quase vazio quando Olivia chegou. Seus dedos tamborilavam nervosamente no balcão de mármore enquanto esperava seu drink. O vestido preto que antes a fazia sentir poderosa agora parecia uma segunda pele quente demais.
Ricardo apareceu como uma sombra atrás dela. "Eu sabia que você viria." Seu sopro quente no pescoço a fez estremecer.
Quando suas mãos desceram para seus quadris, puxando-a contra seu corpo, Olivia sentiu algo estranho: não era apenas desejo. Era poder. Aquele mesmo poder que a personagem do conto sentira - o poder de ser desejada, de controlar a situação, de ser mais do que apenas a esposa esquecida por muito tempo de Charlie.
Seus lábios se encontraram com uma urgência que a surpreendeu. O gosto de uísque e menta de Ricardo invadiu sua boca enquanto suas mãos exploravam territórios proibidos ali mesmo, no canto escuro do bar.
"Vamos para algum lugar mais privado." Ele rosnou contra seus lábios.
Olivia hesitou por um segundo, pensou em Charlie e logo o esqueceu. Um segundo onde poderia ter dito não. Onde poderia ter voltado para casa, para o marido que agora escrevia furiosamente sobre uma traição que não sabia estar acontecendo na vida real.
Mas então ela pensou no conto. Na protagonista que finalmente se permitiu sentir prazer, um calor e tesão que há anos não afloravam em sua pele. A rotina do casamento de anos, a indiferença e o sexo robótico que faziam as vezes, estavam consumindo seu desejo de mulher.
"Sim." Ela respondeu, e naquele momento, uma linha foi cruzada.
Enquanto seguiam para o motel mais próximo, o celular de Olivia vibrou. Seu coração disparou e viu que era seu marido, Charlie:
"Tudo bem por aí? Estou terminando alguns textos aqui em casa."
Ela não respondeu. Não imediatamente.
Porque pela primeira vez em anos, Olivia estava se sentindo viva - e isso, ela descobriu, valia mais do que qualquer sentimento de culpa, por um momento era a protagonista de sua própria história. Era Camila.
Enquanto isso, em casa, Charlie olhou para a tela do computador, para a última frase que escrevera sem nem mesmo perceber:
"E quando ela finalmente deu esse passo, nada mais seria como antes."
Ele fechou o laptop com força, sem entender por que seu coração batia tão rápido.
Continua...
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