HOUVE UM PROBLEMA NA PUBLICAÇÃO, ENTAO LEIAM O CAPITULO "UM PASSEIO POR MINHAS LEMBRANÇAS" PRIMEIRO QUE ESTE.
O salão da Casa Petra exalava luxo: trilhos de LED marcavam o perímetro, lustres de cristal projetavam brilhos prateados, e tapete vermelho abraçava cada passo. Homens de black tie e mulheres em vestidos de alta-costura se misturavam a flashes de fotógrafos e cocktails cintilantes. Entre eles, Freitas gesticulava com Alexandre, seu sobrinho de doze anos, ensinando-o a sorrir para a câmera. Gerominho todo sorridente conversando com Pedro Moraes o concorrente de Aldo. Bom foi o que consegui absorver do que Marcia me contou.
Pia , Camila e Aldo discutiam num canto do salão, Olga, a ex- mulher de Freitas desfilava com seu vestido vermelho justo ao corpo, procurando por alguém .
Camila, que é filha de Aldo, saiu de perto dos pais e foi interagir com Alexandre.
Eu, Leônidas Maia, cheguei bem depois do início: vento no cabelo, terninho preto impecável, a gravata levemente solta no colarinho. O buffet de champanhe me atraiu como um ímã. Pedi um copo duplo e me afastei para o bar, longe dos olhares curiosos.
— Você demorou — Aldo apareceu ao meu lado, elegante em um smoking azul-marinho. O olhar dele era macio. — Pensei que tivesse desistido.
— Minha memória… — respondi, tocando o copo — está voltando em partes.
— Sei que não deve estar sendo fácil. Mas vamos esquecer os problemas e ter uma noite maravilhosa— Ele estendeu a mão.
O quarteto mudou para Stay, de Rihanna. Aldo me guiou para a pista, e começamos a dançar. Ele sussurrou:
— Lembra dessa música? Você me ensinava a dançar... Lembra momentos ...
Minhas mãos envolveram sua cintura enquanto ele deslizava pelos meus ombros. Um arrepio correu pela coluna, despertando recordações de toques furtivos e sorrisos roubados.
- Lembro de nossos beijos e carinhos... Deitei em seu ombro e disse sem pensar : - Como me sinto seguro com você.
Porém esse momento foi interrompido por Marcelo.
- Leônidas! Poderia vir comigo ? Disse ele segurando meu braço.
- O que houve pai ?
Já não basta chegar atrasado e gerar fofoca de que nossa família não é unida, ainda tem que se esfregar com seu macho na frente de todos? — disse, o sarcasmo lustrando a voz.
— Seja mais respeitoso comigo !!! Porque me trata assim ?
- Para de drama moleque e vem tirar uma foto comigo e sua madrasta. Por isso preferi a Luiza, com ela não tem esse sentimentalismo barato.
— Você tem certeza disso. Até onde eu sei, o fruto não cai longe do pé, papai. Somos iguais a você. E se acha que Luiza não é sentimental , então porque ela escondeu sobre o evento de hoje ? — respondi, firme. — Parece que ela quer me excluir de tudo, e ela ainda me rebaixou a estagiário.
Marcelo suspirou, acomodando a gravata:
—Sua irmã é a líder. Se quiser algo, resolva com ela.
Eu deixava o espaço das fotos com Marcelo e Renata com o maxilar travado, engolindo em seco o perfume doce e mentiroso da madrasta que ainda colava na minha lapela. Andei por entre os convidados, desviando de taças, de risadas afetadas, tentando escapar da teia de sorrisos plásticos e tapinhas nas costas. Foi então que virei uma das colunas do salão e esbarrei com força em alguém.
Champanhe gelada escorreu pelo meu peito, manchando o veludo preto do meu paletó. Praguejei baixo.
— Merda!
Levantei os olhos. Felipe.
Ele segurava uma taça torta na mão, o líquido dourado ainda vibrando na borda. Me encarava como se tivesse visto um fantasma.
— Leônidas...? — balbuciou, puxando um guardanapo branco de uma bandeja próxima, tentando limpar meu peito como se isso apagasse a vergonha que escorria entre nós.
Segurei o pulso dele antes que tocasse em mim.
— Tira a mão de mim.
Ele congelou. Eu podia sentir o desconforto brotando no suor da testa dele.
— Desculpa — disse, desviando o olhar. — Eu tava procurando... Eu não te vi.
Revirei os olhos, respirei fundo. Odiava quando ele fingia não saber exatamente onde eu estaria.
— Sua habilidade pra derramar merda continua impressionante — rosnei, olhando o estrago no meu terno.
Ele parecia nem me ouvir mais. Estava inquieto, os olhos varrendo o salão como se procurassem um abrigo. Até que ele a viu.
Uma garota morena, de cabelos longos e lisos, passava apressada pelo meio do salão. Jovem, muito jovem. O rosto me despertava uma lembrança embaçada — traços familiares demais para um estranho. Mas Felipe já estava correndo atrás dela antes que eu conseguisse ligar os pontos.
Fiquei alguns segundos parado, observando Felipe desaparecer por entre os convidados como um cão farejando a própria culpa. A garota tinha um quê familiar, mas não consegui identificar. E francamente? Eu estava mais interessado em me livrar daquela sensação pegajosa do champanhe secando no meu peito do que em correr atrás de mais um mistério com a assinatura dele.
Peguei a escada lateral que levava ao segundo andar da Casa Petra. Era uma área reservada para a família anfitriã — ou seja, território inimigo. Mas eu precisava de silêncio e de um espelho. E talvez, quem sabe, de um pouco de distância daquela versão luxuosa do inferno.
Empurrei a porta do lavabo com o ombro. A luz suave e o cheiro de lavanda me acolheram melhor que qualquer pessoa ali embaixo. Comecei a secar a camisa com papel toalha, olhando minha própria expressão no espelho. Meus olhos estavam injetados, minha boca numa linha fina. Como se eu tivesse engolido cacos de vidro durante o jantar.
Foi então que ouvi.
— Você precisa confiar em mim, Freitas — dizia a voz da minha irmã, atravessando a porta entreaberta de uma das salas de estar.
Parei.
— Já passou da hora de resolvermos isso. Eu não vou esperar mais. — A voz do velho veio como um trovão. — Esse moleque precisa ser tirado do caminho, Luiza. Ele está rondando meu sobrinho. Ele sabe algumas coisa...
— Calma, ele não sabe de nada, esta desmemoriado. E Outra eu já dei um jeito antes, lembra? — ela sussurrou. — Ele só voltou porque é tinhoso, pior que o próprio diabo.. Mas não vai durar.
Meu sangue gelou.
Me aproximei devagar, como se meus passos pudessem acordar o diabo. Peguei o celular e comecei a gravar, escondido na lateral da porta. Luiza estava de costas, o cabelo preso num coque impecável, encostada na estante de livros falsos da sala. Freitas, de terno azul escuro, segurava um copo de uísque como se segurasse uma arma.
— O Marcelo pode até ser cego, mas a Fama é minha agora. A gente só precisa manter as aparências por mais alguns dias — ela continuava. — Depois disso, o Leônidas não vai mais ser um problema.
— Você me promete isso? — Freitas perguntou, aproximando-se.
Luiza respondeu com um beijo.
Um beijo na boca.
Meus dedos tremeram. Eu parei de gravar, engoli seco e voltei pelo corredor com o coração trovejando no peito. Fingir normalidade era quase uma arte no meu caso, mas naquele momento, foi a atuação da minha vida. Caminhei escada abaixo, sorrindo para desconhecidos, como se não tivesse acabado de assistir a minha irmã selar um pacto de destruição com um homem corrupto — e talvez, só talvez, um assassino.
Sentei de novo no bar. Pedi outra dose.
Por dentro, eu tremia. E só uma certeza me acompanhava: Luiza poderia ser tudo. Menos inocente.
A música diminuiu gradativamente, e as luzes do salão focaram no centro do palco. Marcelo subiu ao microfone com aquele sorriso que ele reservava para os colunistas sociais e para os momentos em que precisava fingir que era um pai amoroso. O paletó de alfaiataria fina realçava sua pose de patriarca da elite, e ao seu lado, Renata fazia o papel de esposa troféu com perfeição quase teatral.
— Boa noite — ele disse, a voz amplificada soando limpa, poderosa. — Hoje é uma noite histórica. Não apenas celebramos os quarenta anos da Fama, mas também o futuro da empresa. Um futuro brilhante, guiado por alguém que sempre demonstrou coragem, inteligência e pulso firme.
Meu estômago revirou.
— Estou falando de Luiza Sampaio — ele sorriu com orgulho. — Minha filha. Minha sucessora. A nova CEO da Fama.
Aplausos. Muitos. Todos forçados.
Senti os olhares cortando como facas, mas continuei ereto, parado próximo ao bar. Queria ver até onde o teatro ia. Luiza subiu ao palco com passos calculados, a barriga da gravidez ainda discreta sob o vestido justo. Ela acenou, sorriu, pegou o microfone.
— Obrigada, pai. Obrigada a todos que acreditam em mim. Eu prometo honrar o legado da Fama com todo o meu...
A tela de LED atrás dela, até então exibindo imagens da festa, mudou.
E o inferno começou.
Felipe. Nu. Em uma cama.
Mariana Figueredo por cima dele, gemendo. Rindo. Ele segurando o celular e dizendo, em alto e bom som:
— Eu vou me livrar da Luiza. Ela que se iluda com essa gravidez. Quando tudo isso acabar, você e eu, Mari. A gente vai viver nossa vida. Com a grana da Fama no nosso bolso.
Um silêncio fúnebre tomou o salão antes da gritaria explodir. Mariana estava próxima da escadaria, e Luiza desceu correndo, os olhos injetados de fúria. As duas se encontraram no meio do salão.
— Sua VADIA! — gritou Luiza, empurrando Mariana.
Mariana revidou com um tapa.
Convidados tentaram apartar. Marcelo gritou por segurança. Gerominho interveio, puxando a filha pelos braços. Luiza chorava e berrava que ia matar aquela “traidora de merda”.
E eu… eu só queria desaparecer.
— Me tira daqui — sussurrei para Aldo, que apareceu do meu lado com um olhar tenso. — Por favor. Eu não aguento mais.
Ele me puxou pela mão e me levou para o estacionamento, sem fazer perguntas. Dentro do carro, a respiração dele estava pesada. A minha, irregular.
— Você tá bem? — ele perguntou, com a voz baixa.
— Eu só… lembrei da gente. — Olhei pra ele e deslizei minha mão pela coxa firme, coberta pelo tecido tenso da calça de alfaiataria. — Do teu corpo. Do teu cheiro. Do teu jeito bronco e maldito de ser.
Na rádio tocava “ Lose Control de Teddy Swims.” - Hora perfeita ...
Aldo me encarou por um instante, tenso, e murmurou:
— Eu... não posso. Tô tentando voltar com a Pia.
— Não importa. Eu preciso de você agora. — Minha voz saiu rouca, urgente. — Só essa noite.
Ele engatou a marcha e me levou pro apartamento dele.
Assim que a porta se fechou atrás de nós, fui eu quem tomou a iniciativa. Puxei-o pela camisa, beijei sua boca com fome. A camisa dele voou pro chão. Ele me ergueu com os braços fortes e me levou direto pra banheira. Enchemos de água morna enquanto nos beijávamos sem pausa.
Ali, dentro da banheira, nossos corpos se procuraram com desespero. Me sentei no colo dele, os quadris se encaixando com naturalidade violenta. Ele mordia meu pescoço enquanto eu gemia baixo, me movendo com ritmo lento, profundo. A água espirrava, nossos corpos colavam, escorregavam.
— Eu senti tanto sua falta, Leo — ele sussurrou entre os dentes, enfiando os dedos no meu cabelo. — Eu tô tentando... mas você me fode inteiro.
— Então me fode direito — murmurei, cravando as unhas nos ombros dele.
Ele atendeu ao pedido com força, me fazendo perder o ar. Cada estocada era uma lembrança, uma promessa maldita, um vício que nem o tempo tinha conseguido curar.
No final, ficamos ali, dentro da água morna e suja, respirando como se tivéssemos voltado de um naufrágio.
O silêncio que se seguiu foi confortável. Quase inédito entre nós dois.
Aldo estava com os olhos fechados, encostado na borda da banheira, a respiração ainda pesada. Eu observava as gotas escorrendo pelos músculos dele, marcados pelo tempo, pela luta, pela vida dura que ele insistia em carregar nas costas como um fardo heróico.
Mas ali, ele era só meu. Sem Pia. Sem Camila. Sem o passado.
— Isso não muda nada, né? — perguntei, com a voz baixa, quase como se estivesse falando comigo mesmo.
Ele abriu os olhos lentamente.
— Muda pra caralho, Leo. — Sua voz era um sussurro rouco. — Só que não resolve.
Assenti. Eu sabia. Talvez o problema fosse esse: eu queria que resolvesse.
Levantei da água, peguei uma toalha e comecei a me secar devagar. Ele me olhava. Sempre me olhava. Mesmo quando dizia que não podia, mesmo quando fingia que era só sexo.
— Você ainda vai me deixar sozinho de novo? — perguntei, sem encará-lo.
— Não sei — ele respondeu, honesto. Dolorosamente honesto.
Vesti uma camiseta dele, larga, com cheiro de cigarro velho e amaciante barato. Me sentei no sofá da sala enquanto ele ia até a cozinha pegar uma cerveja. O apartamento estava no escuro, iluminado apenas pela cidade lá fora, pelas luzes que vazavam das janelas dos prédios. Tão perto da festa decrépita da Fama, e ao mesmo tempo tão distante.
Peguei o celular e revi o vídeo que tinha gravado da conversa de Luiza com Freitas.
"Eu já dei um jeito no meu irmão uma vez. E vou tirar ele do caminho de novo."
A frase ecoava na minha cabeça como uma sentença de morte. Aquilo não era só metáfora, nem ameaça vazia. Não depois do que eu passei. Não depois do coma. Do esquecimento. Da constante sensação de que alguém queria me apagar da história — ou da vida.
Aldo voltou e jogou a cerveja na minha mão. Sentei ao lado dele no sofá, encostei a cabeça no ombro dele.
CASA PETRA, Moema , São Paulo 23:30 h.
A sala de segurança da Casa Petra era fria e mal iluminada, com o zumbido constante dos monitores e o cheiro de café requentado no ar. Marcelo Sampaio cruzou os braços diante da tela principal, onde o vídeo rodava em câmera lenta. Os seguranças ao redor mantinham a cabeça baixa, receosos de olhar diretamente para o patriarca dos Sampaio naquele estado. Ele não gritava — o que tornava tudo ainda mais assustador.
Na gravação, o corredor técnico do salão de festas. Uma mulher caminhava com passos firmes, rebolando num ritmo quase hipnótico. A calça de alfaiataria bege moldava suas pernas como uma segunda pele. O salto agulha tilintava no piso cerâmico, equilibrando o andar confiante. A bolsa da Yves Saint Laurent pendia do ombro com descuido calculado, e um lenço Hermès envolvia seus cabelos sob os óculos escuros enormes que escondiam metade do rosto.
Era visível que ela conhecia o caminho. Não hesitava, não olhava para os lados. Parou diante da aparelhagem de audiovisual, olhou ao redor rapidamente e se abaixou. A câmera de cima registrava o momento em que ela abriu um painel lateral, conectou um pequeno dispositivo prateado via USB e digitou algo no teclado do sistema. Em menos de dois minutos, saiu pela mesma porta, sem deixar vestígios — exceto pela confiança obscena de quem sabia que não seria pega.
Marcelo franziu o cenho. Não precisava ver o rosto.
— Eu conheço esse andar — murmurou.
As imagens congelaram, e ele se inclinou. O lenço, a bolsa, os gestos calculados, o jeito como segurava o quadril. Aquilo era puro veneno disfarçado de elegância.
— Filha da puta... — sussurrou.
Os olhos dele se fecharam por um segundo, e o maxilar se contraiu. Quando os reabriu, estavam vermelhos de raiva, mas secos. Marcelo era da velha guarda: odiava escândalos, mas odiava ainda mais ser feito de idiota.
Ele girou nos calcanhares e saiu da sala sem dizer uma palavra. Os seguranças se entreolharam, tensos. O som do salto do sapato de couro dele ecoou pelo corredor. A guerra havia deixado de ser velada. Agora era pessoal. E ele não perdoava traição.