O dia mais feliz de nossas vidas - Cap 18

Um conto erótico de Ju
Categoria: Trans
Contém 2787 palavras
Data: 30/05/2025 23:18:02
Assuntos: Trans

O sábado amanheceu como o prenúncio de um sonho — mas para mim, parecia o prenúncio de um tornado. Acordei cedo, com o coração disparado, as mãos trêmulas e uma angústia doce no peito. Era o grande dia. O dia do meu casamento. O dia que eu esperei, idealizei, desejei e, ainda assim, sentia como se não estivesse pronta. A ansiedade me consumia por dentro. Eu estava assustada, tensa, parecia que tudo em mim pulsava com intensidade. Cada batida do coração era como um lembrete de que o momento estava se aproximando.

Meus pais foram os primeiros a perceber meu estado. Minha mãe veio até meu quarto, me abraçou, beijou minha testa e disse, com a calma que só o tempo dá:

— Filha… você está linda só por estar vivendo esse momento. Respira. Está tudo certo.

Meu pai entrou em seguida, sorrindo com aquele orgulho contido e os olhos marejados. Me chamou de princesa e me apertou num abraço firme, que me deu um pouco de chão.

Algumas horas depois, Melissa chegou. Linda, radiante, com uma energia contagiante. Ela era minha madrinha, minha amiga, meu amparo naquele dia. Estava produzida, com um vestido deslumbrante, maquiagem impecável, cabelo ondulado caindo pelas costas — simplesmente divina.

— Amiga, olha pra mim… você vai casar! — disse ela, me segurando pelos ombros. — Vai viver o dia mais lindo da sua vida. Respira comigo. Uma, duas, três vezes… isso!

Me acalmei, respirei e fomos para as os ultimos preparos. Enquanto o quarto se transformava em um mundo de cores, espelhos, escovas e perfumes, nós duas nos sentávamos lado a lado diante dos maquiadores. Eu com o coração na garganta, Melissa sorrindo, tentando me distrair com piadas e histórias. Mas a tensão era demais. As mãos suavam. O batom tremia nos lábios. O penteado precisou ser pausado quando minha visão começou a escurecer. Tive uma queda de pressão.

— Ai meu Deus, ela tá passando mal! — alguém gritou.

— Calma, gente, calma! — Melissa tomou a frente. — Deitem ela aqui, respira fundo, Ju… olha pra mim. Tô contigo, viu? Até o fim.

Foram minutos de desespero que pareceram horas. Melissa segurava minha mão com força, e minha mãe me abanava com uma toalha. Aos poucos, fui voltando. Meu pai entrou novamente no quarto, me trouxe um chá doce, me deu um beijo na testa.

— Nada vai dar errado, minha filha. Você é forte. E tá linda. O Léo vai chorar quando te ver.

Melissa sorriu e completou:

— Vai chorar e vai se apaixonar de novo. Porque você vai ser a noiva mais incrível que esse mundo já viu.

Eu respirei fundo, ainda frágil, mas me sentindo amada, protegida, acolhida. A maquiagem seguiu, o cabelo também. E entre suspiros e nervosismo, o sábado ia se desenhando como o início da eternidade que me aguardava no altar.

Embora eu estivesse um pouco melhor depois daquele susto, o nervosismo ainda me dominava por completo. Continuava com medo, ansiosa, inquieta. Era como se meu corpo estivesse vibrando numa frequência diferente, como se tudo ao meu redor estivesse acelerado. Cada pequena tarefa — um detalhe do cabelo, um ajuste no vestido, uma decisão sobre a maquiagem — parecia ganhar o peso de uma eternidade.

Já estava toda pronta quando o carro chegou. Meu vestido de noiva era exatamente como eu sempre sonhei: um modelo sereia que abraçava meu corpo com elegância, desenhando cada curva com sofisticação. A cauda longa e ondulante se arrastava suavemente atrás de mim, como se tivesse vida própria. As costas nuas deixavam meu visual ainda mais marcante, revelando com delicadeza minha feminilidade. Nos pés, um escarpin branco de salto altíssimo me dava ainda mais postura e imponência. Meus longos cabelos loiros estavam soltos em ondas perfeitamente trabalhadas no salão, chamando atenção por onde passavam. E, claro, meu inseparável batom vermelho marcava meu sorriso com paixão, como um lembrete da mulher poderosa que eu era.

Minha mãe, percebendo minha inquietação, foi para a cozinha e voltou pouco depois com uma bandeja cheia de afeto: um café passado na hora e uma generosa fatia da cuca de doce de leite que ela sabia que eu amava. Sentou-se ao meu lado, me entregou a xícara e passou a mão no meu cabelo com carinho.

— Vai dar tudo certo, filha. Você sempre foi muito forte. Hoje é só mais um passo bonito na tua história.

Melissa, por sua vez, não deixava o clima pesar. Olhava para mim com aquele sorriso de madrinha apaixonada, e fazia piadas com as situações, imitando meu desespero diante do espelho ou dizendo que, se eu fugisse, ela casava com o Léo no meu lugar.

— Imagina só, Ju… tu correndo pela cidade com o vestido esvoaçando, e eu dizendo: “então tá, Leonardo, aceita ou não?” — ela ria, tentando me distrair.

— Vai sonhando, Melissa — respondi, tentando sorrir, ainda tremendo por dentro.

— É isso, Ju. Ri. Respira. Tu vai ser a noiva mais linda que Porto Alegre já viu!

Pouco depois, o carro finalmente chegou para nos buscar. Minha mãe, Melissa e eu entramos, e partimos para o local da cerimônia. Mas a cidade resolveu conspirar com o meu nervosismo: pegamos um trânsito absolutamente infernal. Um trajeto que levaria no máximo quinze minutos virou quase uma hora de agonia.

— Ai meu Deus… eu vou desmaiar — murmurei, com a mão no peito, tentando controlar a respiração.

— Ju, calma! — disse minha mãe. — Toda noiva se atrasa, é tradição!

— Exato! — completou Melissa. — Tu vai fazer uma entrada triunfal. Ninguém vai nem perceber o atraso, só vão estar esperando tua beleza.

Elas tentavam me acalmar com palavras doces, com brincadeiras, com mãos apertando as minhas com força. Mesmo assim, eu sentia as mãos suando, o estômago revirando, as pernas bambas. Olhava pela janela e via a cidade parada, os carros à frente como um obstáculo entre mim e o altar. Mas fui firme. Mesmo com vontade de sumir, de me esconder, de fugir… eu respirei fundo e fui.

Era o dia do meu casamento. E nada — nem o trânsito, nem o medo, nem o suor frio escorrendo pelas minhas costas — ia me impedir de viver esse momento.

O momento havia chegado.

O carro estacionou em frente ao local da cerimônia e, mesmo com as pernas trêmulas e o coração disparado, eu senti uma paz que só quem está prestes a realizar um grande sonho conhece. Era como se o mundo inteiro parasse por alguns segundos, respirando comigo. Melissa desceu primeiro, vestida como uma verdadeira deusa. O vestido dela era um tom de lavanda suave, com um corte impecável que marcava sua cintura fina, decote delicado, caimento fluido e uma fenda discreta que revelava sua perna a cada passo. Seu rosto estava iluminado, seus cabelos presos com elegância, e os olhos maquiados realçavam toda a feminilidade que ela conquistava a cada dia com orgulho. Ela sorriu para mim e disse:

— Vai ser lindo, Ju. Vai ser tudo perfeito.

Ela segurou minha mão por um instante, a apertou com carinho, e depois seguiu para o altar, ocupando com graça e honra o lugar de madrinha. Em seguida, minha mãe me deu um último beijo na testa e foi para o seu assento, me lançando um olhar cheio de orgulho e emoção, como se dissesse “minha menina virou rainha”.

Eu respirei fundo, sentindo o vestido ajustar-se ao meu corpo a cada movimento. A cauda de sereia se arrastava pelo chão com elegância, os brilhos delicados refletindo a luz ao meu redor. O escarpin branco de salto altíssimo me deixava ainda mais altiva, e o batom vermelho contrastava com meu tom de pele, como uma assinatura da mulher que eu me tornei. Meus longos cabelos loiros, ondulados com perfeição, desciam como uma cascata dourada pelos ombros. Eu era a noiva. “A noiva”. Aquela que por tanto tempo sonhou com esse momento, e agora estava prestes a viver cada segundo dele.

Foi então que meu pai se aproximou. Ele me olhou por um tempo que pareceu uma eternidade. Os olhos marejados, os lábios tremendo, e a emoção transbordando sem vergonha alguma. Com passos lentos, ele veio até mim, me envolveu em um abraço forte, protetor, cheio de amor — um amor que por tanto tempo ficou represado, e agora jorrava sem freios.

— Minha filha… — disse ele, com a voz embargada. — Obrigado. Obrigado por ser quem você é. Obrigado por ser minha filha. Me perdoa por todo tempo que eu perdi longe de ti, por cada silêncio, por cada ausência. Eu te amo, Juliana. Eu sempre amei… só demorei pra entender.

As lágrimas escaparam dos meus olhos sem que eu pudesse evitar. A emoção tomou conta de mim, e tudo o que consegui fazer foi segurar o rosto dele com carinho e beijar sua bochecha com ternura.

— Eu te amo, pai. E obrigada por estar aqui. Isso já vale tudo.

A valsa começou a tocar. A classica valsa de casamento que flutuava no ar como se fosse feita para aquele momento. A cerimônia estava prestes a começar.

Meu pai me ofereceu o braço e eu aceitei, firme, mesmo com as pernas bambas. O salão estava lotado, todos de pé, com os olhares voltados para a entrada. Mas os meus olhos buscaram apenas um rosto: o do homem que esperava por mim no altar.

Leonardo estava deslumbrante. Vestia um terno azul marinho sob medida, com corte italiano que abraçava seu corpo atlético com perfeição. A gravata em tom bordô destacava o branco da camisa impecável e combinava com o pequeno lenço de seda dobrado no bolso do paletó. O cabelo bem penteado, a barba feita com precisão, e aquele sorriso… ah, aquele sorriso. Quando ele me viu, seus olhos brilharam como se o tempo tivesse parado. Ele parecia encantado, como se estivesse vendo uma visão. Era o homem da minha vida, o amor que transformou tudo em mim, esperando para me receber como esposa.

Caminhar até ele foi como atravessar um sonho. Cada passo era um eco de tudo o que vivi, das dores, das conquistas, da minha transição, do nosso amor. Cada passo dizia: “eu cheguei”.

E quando enfim cheguei até ele, com o coração batendo no ritmo da valsa, meu pai me entregou para o Léo com um olhar emocionado e um aperto de mão que selava mais do que um gesto tradicional. Selava o acolhimento. A aceitação. A certeza de que, naquele momento, eu era amada e honrada como merecia ser.

E então, de mãos dadas com o homem da minha vida, eu sorri. Sorri com o coração, com a alma, com cada pedaço da mulher que eu era.

Estava pronta. Que viesse o “sim”.

A cerimônia seguia com uma aura quase mística. O sol se derramava em feixes dourados pelo salão decorado com flores brancas e tons pastel, criando um brilho suave e etéreo. Tudo era luz, beleza e silêncio atento. O cerimonialista, com voz firme e calorosa, conduzia cada etapa com sensibilidade, respeitando o tempo e a emoção de cada momento.

Leonardo estava com os olhos fixos em mim. E eu, nele. Ninguém mais existia ali. Só nós dois.

— Juliana, Leonardo… agora é o momento mais esperado. Os votos — anunciou o cerimonialista. — Este é o instante em que vocês escolhem, com suas palavras, selar o amor que construíram. Juliana, você gostaria de começar?

Respirei fundo. A mão de Léo apertava a minha com suavidade, como um lembrete de que eu não estava sozinha. Então, ergui o rosto, olhei nos olhos dele, e comecei:

— Leonardo, Léo… Meu amor. Meu melhor amigo. Meu parceiro de vida. Eu me lembro do dia em que você entrou na minha vida, como um furacão calmo e avassalador. Você viu quem eu sou de verdade, mesmo antes que eu mesma soubesse por completo. E nunca hesitou em me amar. Em me cuidar. Em me respeitar. Você me ajudou a florescer, a crescer, a confiar em mim mesma, a me tornar a mulher que eu sempre fui.

Prometo rir com você nos dias bons e segurar sua mão nos dias difíceis. Prometo te apoiar nos teus sonhos, mesmo quando forem maiores do que nós. Prometo continuar te chamando de “meu Léo”, mesmo quando formos velhinhos.

Prometo ser tua esposa, tua advogata, tua parceira, tua sócia, tua amante, tua melhor amiga. E, acima de tudo, prometo te amar com tudo que eu sou, todos os dias, até o fim da vida — e além, se for possível.

A voz saiu embargada, as lágrimas começaram a escorrer discretamente, mas eu sorri. E ele sorriu de volta, emocionado. O cerimonialista respirou fundo e disse:

— Leonardo, é a sua vez.

Léo deu um passo à frente, segurando ainda minhas mãos. Ele olhou nos meus olhos e começou, com aquela voz que me fazia tremer por dentro:

— Juliana, Ju… Minha linda, minha mulher, minha noiva, minha advogata maravilhosa. Desde o dia em que você vi na sala de reunião , na minha chegada ao escritório, com aquele salto alto e aquele batom vermelho, eu soube que minha vida nunca mais seria a mesma.

Você me ensina todos os dias sobre força, coragem, beleza e verdade. Você é meu orgulho. Você é meu lar.

Prometo continuar te provocando só pra ver aquele teu olhar fatal. Prometo cozinhar pra você nas noites frias, te cobrir quando dormir no sofá, te beijar quando menos esperar.

Prometo nunca esquecer da sorte que eu tenho por ter te encontrado, por você ser você.

E acima de tudo, eu prometo te amar, Ju. Com tudo o que eu tenho. Com tudo o que eu sou. Até o último segundo da minha vida.

Meus olhos já estavam inundados. E os dele também. Não havia quem não estivesse emocionado. O cerimonialista, sorrindo, se voltou a nós:

— Agora, é chegada a hora da troca das alianças. Que estes anéis sejam o símbolo eterno da união entre vocês. Um círculo sem fim, como o amor que hoje selam diante de todos.

Heitor se aproximou, entregando as alianças com as mãos ligeiramente trêmulas e um sorriso orgulhoso. Léo pegou a minha aliança e, com os olhos mergulhados nos meus, disse:

— Com este anel, eu te recebo como minha esposa, te prometo fidelidade, amor e cumplicidade por toda a vida.

Ele deslizou a aliança pelo meu dedo anelar, e meu coração quase explodiu. Eu fiz o mesmo, segurando a mão dele com carinho:

— Com este anel, eu te recebo como meu esposo, te prometo fidelidade, amor e cumplicidade por toda a vida.

A aliança se ajustou perfeitamente ao dedo dele. Estávamos selados. Unidos.

O cerimonialista retomou:

— Juliana, você aceita Leonardo como seu legítimo esposo, para amá-lo e respeitá-lo, na alegria e na tristeza, na saúde e na doença, por todos os dias da sua vida?

— Sim. — respondi firme, com a voz tomada pela emoção, e um sorriso que parecia iluminar tudo ao redor.

— Leonardo, você aceita Juliana como sua legítima esposa, para amá-la e respeitá-la, na alegria e na tristeza, na saúde e na doença, por todos os dias da sua vida?

— Sim. Mil vezes sim — respondeu ele, com a voz firme e os olhos brilhando.

O cerimonialista sorriu mais uma vez, e anunciou:

— Então, diante de todos os presentes, e pelo poder que me foi conferido, eu os declaro oficialmente casados. Leonardo, você pode beijar a sua esposa.

E foi ali.

Ali, naquele instante mágico, que os nossos lábios se encontraram. Um beijo profundo, apaixonado, cheio de história, de dor superada, de amor, de promessa, de eternidade. Eu senti o mundo desaparecer por alguns segundos. Era só ele. Era só eu. Era o nosso amor selado para sempre.

E quando nos afastamos, o salão veio abaixo em aplausos, assovios, gritos e lágrimas. Era o nosso beijo de casamento. O nosso “sim”. O nosso momento eterno.

Eu era a esposa do Leonardo. E ele, o meu marido.

A gente tinha vencido. E vencido juntos.

Com o som dos aplausos ainda ecoando no salão, com o gosto doce do beijo trocado no altar e as alianças selando um amor imenso, eu respirei fundo… e naquele instante, soube.

Soube que aquele momento era mais do que o meu casamento.

Era o símbolo de tudo que eu lutei para viver.

Porque ser mulher trans nunca foi fácil.

Foi sobreviver aos olhares tortos, aos silêncios dolorosos, às portas fechadas.

Foi ter que me construir mil vezes, me defender mil vezes, me provar mil vezes.

Foi carregar na pele e no peito o peso de preconceitos que tentaram me calar, me apagar, me impedir.

Mas eu resisti. Eu acreditei. Eu cresci.

Com força, com foco, com fé.

Me fiz mulher com dignidade. Me fiz advogada com coragem.

Me fiz amada com doçura.

Me fiz noiva, com orgulho.

E ali, no altar, de mãos dadas com o homem da minha vida, diante da minha família, diante da vida,

eu me fiz esposa.

Inteira. Plena. Feliz.

Porque eu sou mulher. E mereço tudo isso.

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