Terceiro Capítulo da Série "Entre Dois Silêncios"
O silêncio no quarto do hotel era uma entidade física. Pesado, denso, preenchido apenas pelo som distante de uma chuva fina que batia contra o vidro da janela. As luzes da cidade, lá embaixo, pareciam um borrão de aquarela.
Christian estava sentado na beira da cama, a camisa de linho aberta revelando o peito, os olhos fixos na esposa. Havia nele uma calma nova, uma autoridade que não precisava de voz. Era a quietude de um predador que sabe que a presa já está na armadilha.
Do outro lado do quarto, encostado na parede como uma sombra, estava Ethan. Mãos nos bolsos da calça de alfaiataria, o rosto uma máscara de neutralidade polida. O olhar dele pousava em Fran, mas não a devorava. Não havia fome ali, nem sequer interesse. Era o olhar de um espectador em uma galeria, avaliando uma obra de arte cuja história ele já conhecia. E essa indiferença queimava nela mais do que qualquer toque ardente.
Fran parou no meio do caminho entre os dois homens. O reencontro que ela tanto fantasiara nos últimos meses era aquilo: uma triangulação de poder onde ela era o centro vulnerável. Ela queria Ethan. Queria a brutalidade controlada, a novidade, a permissão que sentiu em Bali. Mas ele não se movia. E Christian, seu marido, percebia tudo. Ele sempre percebia.
Com um gesto lento, ele a chamou. Fran obedeceu, aproximando-se da cama. Christian a puxou pelo quadril, fazendo-a sentar de lado em seu colo. O beijo que ele lhe deu foi de posse, lento e profundo, mas seus olhos não deixaram os de Ethan. Era uma demonstração. Um aviso.
— Ele não vai se mexer — Christian sussurrou contra o ouvido dela, a voz um veludo áspero. — Não até eu mandar.
Um arrepio percorreu a espinha de Fran. Era medo e, para seu horror, excitação.
As mãos de Christian encontraram o zíper do vestido dela. O som do tecido deslizando por sua pele pareceu ecoar no silêncio sepulcral. Ele a despiu com a calma de um ritual, cada centímetro de pele exposta sob o olhar impassível de Ethan. O contraste entre o toque quente e possessivo de seu marido e a imobilidade fria do outro homem era uma tortura calculada.
— Você quer que ele venha até aqui, não quer? — Christian perguntou, a mão subindo pela coxa dela.
Fran engoliu em seco, incapaz de mentir.
— Responde.
— Quero… — a confissão saiu como um sopro, carregada de vergonha e desejo.
Christian sorriu. Não era um sorriso de ternura. Era o sorriso de quem segura as rédeas do universo.
— Então olha pra ele. Olha pra ele enquanto eu faço você gozar.
Ele a empurrou gentilmente de costas sobre a cama, o corpo dela afundando no colchão macio. Ele se posicionou entre suas pernas e a penetrou com um único movimento, firme e profundo. A respiração de Fran ficou presa na garganta. O choque do prazer, da invasão, sob aquele olhar distante.
— Olha. Pra. Ele. — Christian repetiu, segurando o queixo dela, forçando-a a encarar seu carrasco silencioso.
Ethan não se moveu. Fran buscou em seus olhos um sinal, uma faísca de desejo, qualquer coisa. Encontrou apenas um vazio calmo, quase entediado. Aquilo a quebrou. A rejeição, a humilhação… a necessidade crua de provocá-lo, de arrancá-lo daquela fortaleza de indiferença.
No primeiro movimento de Christian dentro dela, o nome escapou de seus lábios num gemido fraco.
— Ethan…
O olhar de Ethan finalmente vacilou. Não com desejo, mas com algo que parecia desprezo. Ele inclinou a cabeça, a voz saindo fria e cortante, atravessando o quarto.
— Você parece desesperada, Fran.
Aquelas palavras, em vez de silenciá-la, abriram as comportas. O ritmo de Christian aumentava, cada estocada um ponto final na sua antiga vida. Ela não era mais a mulher contida. Era puro instinto, uma ferida aberta.
— Meu Ethan… — ela ofegou, as palavras tropeçando umas nas outras, os olhos fixos nele, suplicantes. — Penso em você todos os dias… Te desejo até a última célula. Eu sou dele… — ela olhou para Christian, que se movia sobre ela com uma precisão implacável — …mas eu sou tua.
Christian fechou os olhos por um instante. Um turbilhão o atingiu. Ali estava. A fantasia em sua forma mais pura e brutal. As palavras que ele sempre sonhou em ouvir sua esposa dizer para outro. Era triunfo. Um poder absoluto, divino. Ele era o arquiteto daquele caos, o deus daquela pequena e profana trindade.
— Me faça mulher como você já fez uma vez… — Fran implorou, o corpo se arqueando. — Mais forte, Ethan… eu sou tua… cem por cento tua!
E então, junto com o triunfo, veio o veneno. Uma pontada gelada de ciúme, tão real que o fez perder o fôlego. Eram apenas palavras, um roteiro que ele mesmo escrevera, mas a entrega na voz dela… era real demais. A dor era real. E, por baixo de tudo, um orgulho sombrio e perverso. Ele a havia quebrado. Ele a havia libertado. Aquela mulher, que se desfazia em súplicas por outro, era uma criação sua.
O orgasmo a atingiu como um raio, um grito rasgando o silêncio. O corpo dela se contraiu sob o dele, entregue, aniquilado.
Christian saiu de dentro dela, a respiração pesada. Não a cobriu. Deixou-a ali, exposta na sua vulnerabilidade. Ele se levantou, caminhou até Ethan e disse algo baixo, inaudível. Ethan deu um sorriso mínimo, quase imperceptível, e sem um último olhar para Fran, virou-se e saiu do quarto, fechando a porta suavemente atrás de si.
Fran ficou deitada, nua, o eco do próprio prazer ainda vibrando em sua pele. Christian voltou para a beira da cama, inclinou-se e sussurrou, a voz desprovida de qualquer emoção.
— Essa foi sua primeira lição.
…
Seis meses depois. Um bar em Toronto, abarrotado de gente e do cheiro de cerveja e madeira molhada. A neve caía lá fora. Ethan girava o copo de uísque na mão, o gelo tilintando.
— Eu não entendo, cara — disse Mark, seu amigo, balançando a cabeça em desaprovação. — Quer dizer, o cara te paga um voo pra isso? Pra te ver… assistir? Isso é doentio. A mulher, coitada, deve ser toda ferrada da cabeça.
Ethan deu um gole na bebida, o líquido âmbar descendo suave. Ele olhou para o amigo, um sorriso enigmático nos lábios. Um sorriso que guardava segredos que Mark jamais entenderia.
— Não fale do que você não sabe.
— Ah, qual é? É bizarro!
— Não é bizarro — Ethan disse, a voz baixa, mas firme, cortando o barulho do bar. Ele se inclinou para a frente, o olhar subitamente intenso. — Você vê doença. Eu vi arte. Eu vi um homem que ama tanto a esposa que estava disposto a incendiar o mundo dela só para lhe dar o calor que ela precisava. E vi uma mulher tão entregue a ele que caminhou pelo fogo de olhos fechados.
Ele terminou o uísque num gole só, colocando o copo vazio sobre a mesa com um baque surdo.
— Eles não são um casal doente, Mark. Eles são, talvez, o casal mais feliz e único que eu já conheci.