Entre o presente e o passado e o declínio da casada. 4/4

Um conto erótico de Camila
Categoria: Heterossexual
Contém 4902 palavras
Data: 13/09/2025 13:09:39

Era pega de surpresa com aquele repentino pedido de separação. Cristian não sabia de nada, ainda. Eu ainda iria contar tudo a ele, mas mesmo assim, antes de qualquer coisa, ele já veio com um pedido de divórcio.

Eu olhava para aquele papel em minhas mãos como se fosse um pedaço de fogo prestes a me consumir. Meus dedos tremiam, e por um instante, pensei que não conseguiria nem segurar firme. Levantei os olhos para o Cristian, buscando alguma rachadura naquela expressão fria, algum sinal de que aquilo era apenas um surto momentâneo. Mas não havia nada. Apenas frieza e determinação.

— Por quê? — minha voz saiu rouca, quase falhando. — Por que você quer isso?

Ele não desviou o olhar.

— Não existe um porquê. Eu só quero o divórcio, Camila.

— Só isso? — dei uma risada amarga, tentando entender. — Você aparece depois de dias, quando você estendeu seu tempo de viagem, joga esse papel na minha cara e diz que só quer o divórcio? Me diz o motivo, Cristian. Você me deve isso.

Ele suspirou, como se eu fosse a chata da história.

— As coisas mudaram. Eu mudei. Agora eu só quero me separar e pronto.

— Mudaram? — meu tom subiu. — Você prometeu, Cristian! Você disse que depois de tudo que a gente passou, as coisas seriam diferentes. Que ia passar mais tempo em casa, que íamos viajar, que... que você seria presente. Onde foi parar tudo isso?

Ele balançou a cabeça.

— Eu achei que queria. Mas eu não quero mais.

— Então é isso? Você joga fora cinco anos da minha vida porque simplesmente não quer mais? — minha voz já se partia, e senti as lágrimas queimando os olhos.

— Separar de você era algo já inevitável, Camila. Você sabe disso.

Eu engoli seco aquelas palavras, acreditando que aquele que estava na minha frente não era o meu verdadeiro Cristian. Eu fui até ele, e de frente a ele, segurei seu rosto com as minhas mãos, olhando bem em seus olhos, com os olhos ali marejados. Respirei fundo, enquanto me colocava junto a ele:

— Amor, por favor, você não pode me deixar! Eu já tinha decidido que eu iria aceitar você, independente de tudo, eu já... Olha, eu até já estou buscando uma ocupação, irei começar a trabalhar!

Ele respirou fundo e soltou de uma vez:

— Eu vou ser direto, Camila. Eu tô dormindo com a minha chefe.

Senti meu coração parar. Por alguns segundos, o mundo inteiro pareceu em silêncio, só o som daquelas palavras ecoando dentro da minha cabeça. Minhas mãos iam, aos poucos, se afastando de seu rosto, enquanto eu fui sentindo o peso das pernas, me puxando pra baixo, para um abismo ao qual a minha vida estava se mergulhando.

— O quê...? — balbuciei, com a garganta seca.

— Eu não posso mais esconder — ele disse, firme, quase com orgulho. — Eu tô apaixonado por ela. A Cristina é melhor que você em muitos pontos. Ela não fica esperando de mim coisas que eu não quero mais dar. Ela me satisfaz na cama, me entende, me faz rir... Essa viagem que eu fiz? Foi com ela. E... — ele respirou fundo — ela me pediu em casamento.

Minhas pernas fraquejaram, e eu simplesmente desabei no chão, de joelhos, chorando como nunca chorei na vida. Eu não conseguia acreditar no que ouvia.

— Quanto... quanto tempo isso vem acontecendo? — perguntei entre soluços.

Ele cruzou os braços.

— Uns seis meses. Eu tentei resistir, mas a Cristina é muito mais interessante que você.

Aquelas palavras me atravessaram como facas. Segurei o papel com tanta força que ele quase amassou entre meus dedos. Eu me levantei cambaleando e, num impulso, estalei a mão no rosto dele.

— Você é um desgraçado! — gritei. — Eu passei semanas me corroendo de remorso por ter te traído nessa sua viagem... enquanto você já me traía há meses!

Ele tocou o rosto, mas nem parecia abalado. Apenas me olhou com desprezo.

— Eu já sabia da sua traição.

— O quê...? — meu corpo inteiro congelou.

— As câmeras da casa. Eu vi tudo. — ele disse seco. — E quer saber? Eu fiquei feliz. Assim você também teria alguém, achei que estava equilibrado.

Eu levei as mãos à boca, sentindo meu estômago revirar.

— Você... você sabia? — minha voz tremia. — E ficou calado?

Ele deu de ombros.

— Você parecia feliz. Eu também estava. Estava tudo bem. Você encontrou o seu roqueiro de cabelos longos, desleixado com a vida e que te faz mulher. Não era isso que você queria?

— Tudo bem?! — gritei. — Você tá louco? Não era isso que eu queria! Eu não tenho ninguém, Cristian! Eu dispensei ele! Ele voltou pra ex! Eu fiquei sozinha, destruída, e você... você estava rindo disso?

Meu peito doía, a raiva e a tristeza brigando dentro de mim. Eu não conseguia mais reconhecê-lo.

— Eu tentei salvar nosso casamento, durante os meses, mas você sempre me falou o quanto sentia saudades de antes. Eu não sinto saudades de antes, Camila, antes eu era só um sonhador, hoje eu sou um homem que tem ganho muito dinheiro.

— Então é isso que importa pra você, não é? — Disparei. — Cristian, eu errei com você e eu sei disso. Mas tudo aconteceu porque eu buscava você ali, é você e sempre você que eu desejo.

Ele passou a mão no cabelo e falou, sem emoção:

— Isso não importa. Agora é simples, Camila. Você vai assinar amigavelmente ou prefere que eu recorra à justiça?

Olhei para ele com os olhos marejados, a respiração pesada, e pela primeira vez, senti que o homem que eu amava tinha morrido. Na minha frente estava apenas um estranho.

— Eu só queria saber... por quê. — minha voz saiu fraca. — E agora eu sei.

Ele não respondeu. Apenas ficou ali, firme, como se nada tivesse acontecido, enquanto eu, aos pedaços, ainda lutava para me manter de pé.

Eu ainda segurava o papel do divórcio entre os dedos, como se aquilo fosse um veneno que eu não queria engolir. Cristian estava sentado à minha frente, frio, impassível, cobrando mais uma vez a minha assinatura.

— Camila, não vamos prolongar. Assina logo.

Olhei para ele, e de repente, um riso nervoso escapou da minha boca. Não consegui evitar. Ri de dor, de incredulidade, de raiva.

— Agora eu entendi... — falei, enxugando as lágrimas que ainda escorriam. — Claro. Você inventou essa história toda, não é? Tá tentando inverter a culpa. É isso. Você ficou sabendo da minha traição e decidiu se colocar como o vilão, né? Para que eu não me sentisse tão culpada e jogasse essa carga em você. É isso.

Ele franziu a testa.

— Essa é boa, você realmente acha que se eu fosse o único corno aqui eu iria poupar você? Eu estou sendo aberto, eu realmente tenho um caso com a minha chefe e quero ela, não você.

— É mentira, Cristian! — interrompi, quase gritando. — Você nunca faria isso comigo. Eu sei que você nunca faria! Eu vivi cinco anos da minha vida ao seu lado, eu conheço você!

Cristian suspirou, encostando no sofá.

— Talvez então você não me conhecesse o suficiente, não é? As pessoas mudam... Eu mudei.

Balancei a cabeça, rindo de novo, mas dessa vez com desespero.

— Não... não, Cristian... você não pode...

Ele então olhou para o relógio na parede e falou como se fosse a coisa mais natural do mundo:

— Daqui a três minutos a Cristina vai chegar pra me buscar. Vai te provar que eu não tô mentindo.

— Para... — pedi, com a voz embargada. — Para com esse teatro, Cristian. Você não precisa disso.

Ele apenas levantou uma sobrancelha e apontou com o dedo para o relógio.

— Você vai assinar, ou não, Camila? Eu preciso ir embora.

Eu fiquei em silêncio, com o coração martelando no peito, cada segundo passando como se fosse uma tortura. Não queria acreditar. Eu rezava para que fosse só uma encenação ridícula dele.

E então, o som da buzina ecoou do lado de fora. Um único toque, seco, impaciente.

Cristian se levantou e veio até mim.

— Vem. Vou te mostrar que não é mentira.

— Não... — recuei um passo, mas ele segurou meu braço firme, me guiando até a janela.

Olhei pela cortina, e meu estômago despencou. Lá estava ela. A chefe dele. A tal Cristina. Dentro de uma BMW brilhante, com óculos escuros, o cabelo impecável, como se tivesse saído de uma propaganda. Ela tinha cabelos castanhos, era elegante, maquiagem bem feita, um batom bem arrumado em seus lábios carnudos. Ela estava realmente ali, esperando ele... esperando o homem que eu amava.

Meu corpo todo ficou gelado. Era como se tudo que eu tivesse e acreditasse em todos esses anos estivesse sendo retirado de minhas mãos e eu não podia acreditar no que estava acontecendo.

— Viu? — ele sussurrou. — Eu não menti.

Afastei-me da janela, sentindo o chão se abrir sob meus pés.

— Então é verdade... — falei, com a voz quase inaudível. — É tudo verdade.

— É. — ele respondeu baixo. — Eu sinto muito, Camila. Mas algumas coisas não temos como controlar.

Levei as mãos ao rosto, chorando como uma criança.

— Então eu mereço isso... mereço passar por isso.

Cristian se aproximou, e pela primeira vez naquela noite sua expressão pareceu menos dura. Ele se aproximava enquanto tocou meu rosto pálido, com carinho.

— Você não merece nada de ruim, Camila. Eu sinto muito. De verdade. Fomos casados por cinco anos, eu realmente sinto muito, mas eu desejo apenas o melhor pra você.

Olhei para ele com raiva e dor ao mesmo tempo.

— Sente muito? — cuspi as palavras. — Isso é o que você chama de sentir muito? Destruir a minha vida?

Ele abaixou os olhos, calado.

— Você ainda vai me agradecer por isso.

Peguei a caneta que estava sobre a mesa com as mãos trêmulas. O papel do divórcio ainda me encarava, como se fosse um abismo. Respirei fundo, e sem pensar mais, assinei.

— Pronto... Como você queria.

O silêncio após o risco da caneta foi ensurdecedor.

Cristian pegou a folha, dobrou com cuidado e guardou.

— Meu advogado vai entrar em contato com você nos próximos dias. Eu não quero que você passe necessidade. Não vou desamparar você.

Eu virei o rosto, sem encará-lo.

— Vai logo.

Ele deu um passo em minha direção, hesitou, e então apenas disse:

— Adeus, Camila.

Não respondi. Mantive os olhos fixos no chão, fingindo que ele não estava ali. O som da mala sendo arrastada ecoou pela casa, seguido da porta se abrindo, depois fechando com firmeza.

Quando o silêncio tomou conta, minhas pernas fraquejaram. Caí de joelhos, o rosto enterrado nas mãos, e chorei até perder o fôlego.

— Por que, meu Deus...? — sussurrei entre soluços. — Por que eu tô passando por isso?

As paredes da casa pareciam me apertar, o vazio ecoava mais alto que qualquer grito. Eu estava sozinha. Completamente sozinha.

Naquela primeira noite sozinha, depois que Cristian foi embora, eu achei que não ia aguentar. Rolei na cama, abracei o travesseiro como se fosse ele e fiquei me perguntando mil vezes se tudo aquilo era mesmo real. Será que ele realmente tinha terminado comigo? Será que não passava de algum castigo, de uma pegadinha cruel? A cada vez que eu olhava para minha mão, a aliança ainda brilhava no meu dedo. Eu não tinha coragem de tirar.

A via do divórcio estava ali, dentro de uma gaveta. Várias vezes pensei em rasgar aquele papel, como se assim pudesse apagar a verdade. Mas os dias passaram... e ele não voltou. Foi quando percebi que todas aquelas palavras dele eram reais.

Eventualmente eu acabei descobrindo as câmeras na casa, e eu fui arrancando cada uma delas, pois não quis que ele tivesse uma visão de meu sofrimento e meu fundo do poço. Tudo naquela casa me lembrava ele, lembrava a nós, e aos momentos em que passamos juntos.

Quando passei pela cozinha, me lembrei de quando ele me ensinou a fazer fondue, eu era um desastre com essa receita. No quarto, me lembrei dos momentos mais fogosos nossos, lá no início, quando nos mudamos e nossa relação tinha melhorado junto. Mas agora, eu estava realmente sozinha, e até mesmo os amigos tinham se distanciado de mim.

Foi nesse mesmo tempo que procurei Jade. Eu não pude esconder dela a verdade, então sentamos em sua fala e eu fui o mais franca possível. Contei a ela que Bruno tinha aparecido na minha porta e me seduzido, e claro, eu caí e que nós acabamos cedendo duas vezes. Que ele dizia que estava apaixonado, que eu era dele, e que bastou eu dizer que não o queria mais, que ele voltou com ela. Jade não suportou ouvir aquilo. Nossa amizade acabou ali, junto com o namoro dela com o Bruno.

Com a separação, a casa ficou no meu nome. Vendi sem olhar para trás e usei o dinheiro para comprar um apartamento em outra cidade. Era meu jeito de recomeçar. Entrei em um curso preparatório e, pouco depois, consegui um emprego em uma creche. Achei que, enfim, minha vida estava se ajeitando. Mas o destino ainda tinha outra surpresa.

Um dia, no meio do expediente, comecei a me sentir mal. Tontura, enjoo, até que não deu mais para segurar e vomitei. Foi ali que desconfiei. Dias depois, a confirmação: eu estava grávida.

Senti tudo ao mesmo tempo. Medo, alegria, desespero, esperança. Mas dentro de mim eu sabia a verdade. Só havia uma possibilidade. Eu tinha usado preservativo nas duas vezes com Bruno. O pai só podia ser Cristian.

Tentei contato com Cristian, mandei mensagens no WhatsApp, mas ele sumiu depois da venda da casa. Nenhuma resposta, nenhum sinal. Voltei pra cidade, mas eu não sabia onde procura-lo. Não tinha contato de nenhum amigo dele, não sabia onde era a corretora onde ele trabalhava. Ele havia desaparecido.

Eu nunca pensei que conseguiria, mas consegui. Tive meu filho, era um menino lindo, e assim eu coloquei o nome de Cristian, pois foi o que me restou dele. Do grande amor da minha vida, uma sementinha que deu fruto e gerou a coisa mais linda e importante da minha vida, e ali, agora como mãe, eu decidi recomeçar.

Criar o Cristian foi o maior desafio da minha vida. Eu me lembro das noites mal dormidas, do choro que parecia não ter fim, da solidão que às vezes esmagava. Mas eu também lembro do sorriso dele, dos primeiros passos, do jeitinho como ele me chamava de “mamãe” pela primeira vez. Foi isso que me manteve em pé.

Minha mãe foi meu braço direito.

— Camila, você não está sozinha, — ela dizia, sempre firme. Ela sempre me ajudou, a cuidar dele quando o trabalho me chamou, quando eu precisei assumir responsabilidades no mundo.

E eu realmente não estava sozinha. Ela me ajudou em tudo, desde dar banho até ficar com ele para que eu pudesse estudar, trabalhar, ou descansar um pouco.

Os anos passaram rápido demais. Quando percebi, aquele bebê que eu embalava no colo já corria pela casa. E eu, que antes mal sabia o que queria da vida, agora estava na direção da creche onde comecei como funcionária.

Assumir a direção não foi fácil. Mais responsabilidades, mais cobranças, mais noites virando para organizar relatórios. Mas também foi um orgulho. Era um lugar que eu amava, que tinha me dado tantas oportunidades.

Além disso, um sonho antigo voltou a bater no peito. Escrever. Eu sempre quis, mas deixei enterrado por medo e insegurança. Um dia, resolvi tirar os cadernos da gaveta e comecei a organizar minhas anotações. Virou um livro. Um livro com a minha história, onde eu contei tudo o que eu vivi, com superação, com romance, com tudo o que me aconteceu, de forma nua e crua, nas perspectivas dos personagens que criei. E esse livro fez sucesso, até para um programa eu fui convidada.

Foi justamente quando fiquei sozinha que descobri quem eu realmente era. Cresci, amadureci, deixei de lado a menina sonhadora que esperava que a vida fosse um show de rock sem fim. Eu agora fazia parte da construção do futuro, cuidando de crianças, apoiando pais. Eu estava, de fato, ajudando a mudar o mundo.

Foi então que o telefone tocou.

Olhei o visor e congelei. Um número conhecido, que nunca mais tinha aparecido. Eu nunca troquei aquele número, confesso, porque no fundo alimentava uma esperança boba de que um dia seria o Cristian quem ligaria. Mas não era ele. Era a Jade.

Atendi devagar.

— Alô?

Do outro lado, silêncio por um instante, até que uma voz vacilante respondeu:

— Camila… sou eu. Jade.

Meu coração disparou. Eu não ouvia aquela voz há anos.

— Jade… nossa, quanto tempo.

— Eu sei. — Ela respirou fundo. — Camila, eu… queria saber se a gente pode conversar.

Fechei os olhos. Quanta coisa me veio à cabeça.

— Claro. Porque acha que eu não teria tempo pra você? Pode falar.

— Eu queria pedir desculpas, — ela disse. — Por tudo. Por ter cortado você da minha vida daquele jeito. Eu fiquei magoada, mas pensando bem… você não me traiu. Eu e o Bruno já tínhamos terminado. Eu não tinha direito de cobrar nada.

— Não fala assim, Jade. — suspirei. — Eu acho que, de certa forma, te traí sim. Não com ele, mas com a nossa amizade. Você confiava em mim, e eu quebrei isso. Fui imatura, mas eu quero que saiba que nunca deixei de pensar em você, e em nossa amizade.

Silêncio. Depois ouvi o som da respiração dela, embargada.

— Eu senti muito a sua falta.

— Eu também, Jade. Você me perdoa?

— Claro que perdoo Camila! Você sempre foi a minha confidente, e minha amiga.

— Muito obrigada... — Disse, suspirando aliviada, como se um peso do passado tivesse sido tirado da minha vida.

— Então… será que a gente pode deixar isso no passado? — ela perguntou, com a voz suave. — Eu queria ter minha amiga de volta.

Sorri, e meus olhos se encheram de lágrimas.

— Eu também quero. Se você estiver disposta, eu estou.

— Então está combinado. — Ela riu baixinho. — Vamos nos ver no fim de semana?

— Vamos, sim. — confirmei. — Eu levo o Cristian comigo, quero que você conheça ele.

— Seu ex marido? Vocês voltaram?

— Não. — dei alguns risos. — O meu xodózinho. Meu filho. Quero que conheça ele.

— Vou adorar! Que alegria, minha amiga. Traga ele sim.

— Você continua com o Bruno?

— Não. — Ela disse. — Ele me traiu várias vezes e terminamos. Ele não está mais aqui, fugiu com uma ricaça que deu um golpe por aqui.

— Que triste, amiga. Mas enfim, me conta mais quando eu estiver ai. Beijos!

Desligamos. Fiquei olhando o telefone nas mãos, sem acreditar que aquilo tinha acontecido. Era como se um pedaço de mim tivesse voltado ao lugar.

No fim de semana, peguei a estrada com meu pequeno Cristian. Ele estava animado, pulando no banco de trás.

— Mamãe, onde a gente vai tem parquinho?

— Tem sim meu amor, vamos visitar um parquinho lá bem bonito. — sorri pelo retrovisor. — Vamos visitar a cidade onde a mamãe morava antes de você nascer.

Ele arregalou os olhos.

— Eu vou conhecer a sua casa antiga?

— Não mais, filhote. A casa não é mais nossa. Mas você vai conhecer pessoas importantes pra mim.

A viagem foi tranquila, até que finalmente chegamos, na cidade que eu tinha deixado tudo pra trás. Nisso, precisei parar num posto para abastecer. Enquanto o frentista cuidava do carro, desci para esticar as pernas. Cristian correu até mim e me abraçou na cintura.

— Mamãe, olha, aqui tem um monte de vrum vrum né?

Eu simplesmente soltei uma risada, tamanha era a fofura dele. Foi então que ouvi uma voz atrás de mim, uma voz que me fez gelar por dentro.

— Camila? Não pode ser, é você?

Virei devagar. E lá estava ele.

Eu não sabia se respirava, se corria ou se chorava. O mundo parou por um instante.

— Cristian… — sussurrei.

O pequeno ao meu lado olhou para mim, confuso.

— Mamãe, ele tem o mesmo nome que eu!

Ele estava atrás do balcão, com um uniforme simples, atendendo como caixa. O coração me deu um baque.

Ele fez um sinal para um colega , e logo foi substituido ali, e logo veio em minha direção.

— Camila… meu Deus… olha só você… — a voz dele saiu embargada. — Você está diferente. Parece outra pessoa. Está… muito bem.

Sorri de leve, tentando manter a compostura.

— A vida foi generosa comigo nos últimos anos. Eu cresci muito, Cristian. Aprendi a ser quem eu precisava ser.

Ele assentiu, olhando fundo nos meus olhos, como se tentasse recuperar um pedaço do passado.

— Eu estou vendo mesmo. Você está maravilhosa, até mesmo mais linda. E eu? Bom… você está vendo. Trabalhando como caixa de posto. Mas não reclamo.

Aquela imagem me doeu. Cristian sempre foi ambicioso, sempre correu atrás de seus sonhos. Eu sabia que tinha algo errado.

— O que aconteceu? — perguntei. — Da última vez que ouvi falar de você, estava para ser promovido na corretora. Até… até ia se casar com a dona.

Ele suspirou pesado, desviando o olhar.

— Aconteceu que eu me dei mal, como você está vendo. — disse seco. — Eu fiquei noivo de Cristina, e nesse tempo, ela fechou contrato com uma construtora que iria entregar 5 predios com mais de 500 apartamentos. Eles fecharam um negócio milionário. Cristina queria que eu fosse sócio, eu assinei papeis, achando que estava me dando bem, mas fui laranja. Era só um esquema para dar golpe em quem comprou, eles nunca entregaram nada. Resumindo, fiquei pobre, sem emprego, fui preso.

Levei a mão à boca, incrédula.

— Meu Deus, Cristian… Eu nunca imaginaria isso.

— Mas um amigo advogado conseguiu me tirar da cadeia. Provei que fui enganado, as dívidas foram perdoadas, mas… perdi tudo. Agora trabalho aqui, pago minhas contas. É o que dá pra fazer.

Olhei para ele, e um nó subiu na garganta.

— Eu sinto muito. De verdade. Você não merecia passar por isso.

— Eu acho que mereci sim, Camila. Você errou, mas eu errei também e nunca fui compreensivo com você. Cobrei uma coisa de você, mas nunca fui capaz de me modelar para te agradar, também. Invés disso, fui movido por ganância e vontade de me dar bem.

Ele então desviou o olhar para meu lado, reparando no pequeno Cristian, que me segurava pela mão.

— E quem é essa criança? — perguntou. — Você se casou?

Respirei fundo. A hora tinha chegado.

— Não, Cristian. Nunca me casei depois de você. Dediquei minha vida ao meu filho… e à minha carreira.

Ele arqueou a sobrancelha, confuso.

— Então esse ai é seu filho? Se não se casou, quem é o pai? Algum namorado...?

Abaixei-me, acariciei os cabelos do meu menino e depois encarei meu ex-marido.

— Ele é seu filho, Cristian.

Por um instante, ele congelou.

— Como assim? Você está dizendo que… esse menino é meu filho?

— Sim. — respondi firme. — Eu sei que parece surreal, mas é verdade.

Ele balançou a cabeça, incrédulo.

— Não… não pode ser. E o Bruno? Tem certeza que não é dele? Afinal, vocês...

— Não, Cristian. — interrompi. — Com Bruno eu usei preservativo. Mas naquela noite, antes da sua viagem, nós dois… você lembra. E foi aí.

Cristian passou as mãos pelo rosto, atônito.

— Então eu tenho um filho e… nunca soube? Por quê, Camila? Por que você nunca me contou? Era tanto ódio assim de mim?

Olhei fundo nos olhos dele.

— Eu nunca te odiei. Nunca. Muito pelo contrário… eu sempre te amei. Eu tentei, Cristian. Eu te procurei. Mas você me bloqueou das redes, nunca disse onde estava, cortou todos os laços. Eu não conhecia seus amigos, não tinha como chegar até você. Você desapareceu. E eu só tinha uma opção: criar o nosso filho sozinha.

Ele abaixou a cabeça, visivelmente abalado.

— Eu… eu realmente fiz isso. Cortei tudo. A Cristina… não queria você perto. Eu me deixei levar, me afundei. Fui um covarde.

— Foi. — disse sem rodeios. — Mas eu segui em frente. Mas isso não importa, o que importa é que agora você vai poder ser um pai pra ele. Eu voltei pra cá justamente pra tentar te procurar, de novo.

Ele respirou fundo, então olhou para o menino.

— E ele sabe?

Ajoelhei-me diante do meu filho.

— Filho, lembra que eu disse que seu pai estava em viagem? Pois é… ele voltou. Está aqui. É esse homem.

O pequeno arregalou os olhos, depois me olhou sério.

— Mamãe… é verdade mesmo?

— É sim, meu amor. Esse é o seu pai. Vai lá dar um abraço nele.

Ele cruzou os braços, magoado.

— Então por que ele me deixou sozinho todo esse tempo?

Cristian se abaixou também, na altura dele.

— Você é um garoto muito esperto. E está certo de perguntar isso. Eu errei. Estive ausente, e não tem desculpa. Só posso pedir perdão.

O menino ficou em silêncio, pensativo. Depois disse:

— Eu vou pensar.

E, para surpresa de todos, avançou devagar e deu um abraço no pai.

Cristian o envolveu forte, com lágrimas nos olhos.

— Obrigado, filho… obrigado.

— Vê se não some de novo, papai. Senão eu te dou um cascudo.

— hahahaha! Nunca mais, meu filho. — Dizia Cristian, com lágrimas nos olhos. Depois, respirou fundo, me encarou e pediu licença.

— Camila, será que eu posso ter um tempo com vocês hoje?

Meu coração bateu forte. O patrão dele, que assistia de longe, apenas assentiu e o liberou. Entramos todos no carro e fomos até um restaurante simples.

Durante o almoço, depois de muitas conversas, Cristian segurou minhas mãos sobre a mesa.

— Camila, mais uma vez, eu preciso te pedir perdão por tudo que aconteceu.

— Está tudo bem, Cristian. — disse, olhando em seus olhos.

— Camila... — Ele disse. — Sei que colocou uma pedra sobre esse assunto, mas eu sinto muito mesmo por tudo. Você tinha razão, eu devia ter conciliado meu eu mais jovem com o atual, eu fiquei ouvindo do meu pai que nós temos que encarar a realidade como ela é, que eu não tinha mais idade para achar que podia ser o cara diferentão, e que eu tinha que arrumar um emprego, e ficar rico... Não foi esse o homem que você se apaixonou.

— Cristian, você só queria dar o melhor pra mim, e para nossa família. Eu entendo que fez isso pela família.

— Eu fiz isso por mim também. Quando comecei a ganhar as primeiras comissões mais gordas, e pude comprar um carro, comprar nossa casa. Eu quis mais. Minha chefe, ela.. — Nisso, eu interrompi.

— Cris, isso é coisa do passado, ta? Não importa mais, abrace o futuro.

— Camila… será que a gente não pode tentar de novo? Uma nova chance… nós três juntos.

Meu peito doeu. Eu ainda o amava, sim. Mas eu também tinha mudado.

Segurei as mãos dele com carinho e respondi:

— Cristian, você sempre será bem-vindo na vida do nosso filho. Sempre. Mas no meu coração… não. Eu te amo ainda, mas hoje sou mais feliz sozinha. Pelo menos agora.

Ele me olhou fundo, com um sorriso triste.

— Você amadureceu mesmo. Está linda, Camila. E eu respeito a sua decisão.

Sorri de volta, sentindo uma paz enorme me invadir.

— Obrigada.

E foi ali, naquele restaurante simples, olhando meu filho e meu ex-marido juntos, que eu entendi. Eu finalmente tinha me libertado de todos os fantasmas do passado. Eu estava pronta para viver uma nova vida.

Alguns anos mais tarde.

Faz tempo que não escrevo sobre mim. Talvez porque, pela primeira vez, não sinto mais que minha vida precise de justificativas. Hoje só quero contar que, apesar de tudo, eu fiquei bem.

Meu filho, Cristian, já está quase um adolescente. É engraçado como, às vezes, vejo nele o brilho do pai — aquele jeito teimoso de olhar, de querer sempre ter razão — mas também vejo muito de mim: a sensibilidade, a paixão pela música, a vontade de questionar o mundo. Ele é meu maior orgulho. Não vou negar, criá-lo sozinha foi duro, mas também foi a experiência mais transformadora que eu poderia ter.

O tempo passou, e com ele vieram as conquistas. A creche onde comecei a trabalhar hoje é a mesma que dirijo com muito amor. Aprendi que educar não é só ensinar letras e números; é preparar seres humanos para o futuro. Essa missão me deu forças para me reinventar todos os dias.

Eu também publiquei um segundo livro, que foi um sucesso, maior que o primeiro. Nunca pensei que minhas palavras pudessem alcançar tanta gente. Hoje recebo mensagens de mulheres, de homens, que se sentiram acolhidos pelas minhas histórias e conselhos. É estranho e bonito pensar que aquela menina sonhadora, perdida entre discos de rock e pôsteres colados na parede, virou alguém capaz de inspirar outras pessoas.

Quanto ao Cristian… o pai… Ele tentou, de novo, se reconciliar, mas eu acredito que nossa história já acabou. E o mais importante, é que ele voltou para o seu filho, e me ajudou a cria-lo, ele saiu do posto, abriu seu negócio, e hoje é um empreendedor visionário, que está aos poucos construindo seu sucesso profissional. Ele se casou mais tarde, e está próximo de ser pai novamente.

Hoje, olhando para trás, vejo que minha história nunca foi sobre perdas. Foi sobre descobertas. Descobrir que eu era mais forte do que pensava. Descobrir que amor não é só o que recebemos, mas o que cultivamos. Descobrir que, mesmo depois de tantas quedas, sempre existe um jeito de levantar.

Se me perguntarem se ainda acredito no amor, direi que sim. Mas não no mesmo amor ingênuo de antes. Acredito no amor que constrói, que não sufoca, que permite crescer. Acredito no amor que encontrei dentro de mim e no amor que tenho todos os dias quando meu filho me chama de mãe.

O resto… o resto é vida. E eu estou pronta para viver.

Vou deixar alguns recados abaixo, favor ler:

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Comentários

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Muito boa a história! Muito real. Parabéns!

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Opa boa tarde.

Adorei ler essa história, que de certa forma no inicio parecia simples, mas foi sensacional o final, nos mostrou que somos capazes de continuar, mesmo quando perdemos alguém importante ou mesmo perdemos totalmente o rumo de nossa vida, só temos que ter um pouco de paciência e cabeça no lugar que sempre seremos capazes de nos reerguer.

Parabéns

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Boa Kayrosk

Cara esse conto Você ti ha dito que seria algo mais normal , mas a verdade que esta história é muito real .

A saga em si foi excelente e este final fechou com chave de ouro .

Esse conto como a maioria dos seus contos ( que sao excelentes) nos fazem refletir bastante.

Muitos casais passam por isso , o cônjuge acha que não senti mais aquele friozinho de antes , nao se senti mais viva (o) e nao tem coragem de olhar pra si e ver se nao é ele ( ela ) que mudou e passa a trair .

Depois quando vai ver já é tarde demais.

Quem tiver nessa situação, pensa bem , o que esta ruim pode piorar .

Senta e conversa , tenta entender seu parceiro (a) e de algun modo se nao der certo cada um sai com a cabeça erguida .

Mais uma vez parabéns Kayrosk Vc é foda demais

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No mais, desejo sucesso para seus contos!! Abs

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Boa tarde Kayrosk! E com relação ao conto “A professora de piano” está nos planos finaliza-la também??

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Esse conto é top, mas o conto, minha noiva pediu uma pausa, também tava excelente.

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Alguns recados pessoal:

Eu dei uma pausa no conto peguei meu marido me traindo com a minha sobrinha mas não deixei barato, para poder escrever este mas agora vamos voltar para a história anterior porém eu estarei postando capítulos desta história toda sexta-feira porém neste fim de semana eu pretendo lançar um capítulo novo já que a história já faz um tempo que eu não posto nada.

Também pretendo voltar com uma história que eu prometi continuação e acabei não fazendo, caso queiram ler é a traição do meu irmão, eu já aviso que esta história é pesada, e a segunda temporada vai ter muita putaria traição algumas mortes e um pouco de violência então quem não tiver estômago não tem obrigação de ler kkk

Também estou com uma outra história em mente para começar em breve, mas primeiro pretendo terminar as duas, depois eu pretendo fazer meio que um reboot em um conto que eu cheguei a fazer mas não terminei, acho que todos aqui irão gostar. No mais, são só esses os recados mesmo e valeu

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