O acidente que mudou a minha vida - Cap. 8

Um conto erótico de Pedro
Categoria: Homossexual
Contém 6990 palavras
Data: 19/09/2025 22:41:24

Dizem que com um novo dia, vem uma nova chance de recomeçar.

Acordei às 4h40. Nem cheguei a dormir direito, pra ser sincero. A noite anterior ainda estava viva na minha cabeça, como se tivesse acabado de acontecer. E de certa forma, meio que tinha mesmo.

Levantei em silêncio, pra não acordar ninguém. Fui até a área de serviço, peguei minha toalha e fui pro banho. A água morna me ajudou a despertar, mas não lavou a angústia que eu sentia. Aquilo tava preso em mim como um nó no peito. Eu me olhava no espelho e me perguntava quem era esse cara que eu tava me tornando.

Me vesti pro treino. Calça e blusão preto, regata branca e tênis. Desci pra academia do condomínio antes do dia nascer. Queria movimentar o corpo, como se isso aliviasse a mente.

Entre uma série e outra de musculação, entre um supino e um abdominal, eu pensava em tudo.

Na verdade, remoía.

A verdade é que... eu nunca me vi como um homem mentiroso. Sempre fiz questão da transparência, da honestidade. Sempre fui o cara que dizia a verdade, que não traía, que não criava histórias paralelas.

E agora eu era o quê?

Eu sentia que o justo seria conversar. Com minha esposa. Com o Daniel. Comigo mesmo. Porque mesmo que não aconteça mais nada com o Daniel, eu já fiz algo que muda tudo.

A última mensagem que ele tinha foi o áudio que mandei no elevador. Desde então, silêncio. Eu não sabia como ele estava interpretando. Não sabia nem por onde começar a responder. O celular estava ali, na minha mão, tocando uma playlist aleatória do Spotify. Músicas que vinham como vinham os pensamentos: sem ordem, sem sentido, mas todas trazendo uma lembrança, uma imagem, uma sensação.

Eu me sentia um mentiroso. Mesmo não sendo. Nunca fui. Sempre prezei pela verdade, pela transparência. E o Henrique tinha razão — eu precisava viver aquilo antes de tomar qualquer decisão. Mas o fato é que... eu já tinha vivido. Já tinha feito. E agora?

Agora era tarde pra fingir que nada aconteceu.

E cedo demais pra saber como continuar.

A verdade é que eu queria mandar outra mensagem. Mas eu não sabia o que dizer. Não sabia por onde começar. Talvez o Daniel nem esteja esperando nada. Talvez ache que eu sumi. Ou talvez esteja do outro lado também, com mil dúvidas, esperando uma resposta que nem eu sei como dar.

Eu sentia que ele merecia saber. Mas eu também precisava entender.

Entender o que fazer com tudo isso.

Fiquei ali até umas cinco e quarenta. A academia já começava a receber mais gente, aquele silêncio que antes me acompanhava já dava lugar a vozes, passos. Eu já tinha feito o suficiente. Suava bastante, respirava ofegante, ainda com a mente presa nos mesmos pensamentos — como se malhar o corpo não ajudasse em nada a aliviar a alma.

Saí dali devagar, caminhei de volta pro prédio, subi de elevador. Mais um banho. O segundo do dia. Morno, sem pressa. Não era só pra tirar o suor do corpo — era como se eu tentasse limpar também as dúvidas, as culpas, os medos que me acompanhavam.

Vesti uma bermuda e uma camisa leve, desci pra garagem. Entrei no carro e fui até uma padaria ali perto, em silêncio. Sem música, sem rádio, só ouvindo o barulho do motor e observando o céu nublado que cobria Salvador naquela manhã.

Tudo estava fora dos planos. Tudo parecia acontecer rápido demais. A cabeça girava. Medo. Medo de tudo. De perder o que construí. De não ser quem sempre fui. De não saber como seguir.

Comprei pães, alguns doces, sequilhos. Peguei também uns salgados pro lanche das crianças. Coisas simples. Coisas de quem queria manter a rotina funcionando, mesmo com o mundo dentro de si em colapso.

Voltei pra casa ainda com a sensação de que o ar estava mais denso.

No caminho, parei num sinal e lembrei do beijo.

Do calor.

Do toque.

Do perfume.

Do jeito que ele me olhava.

Eu estava excitado. Tinha gostado do que vivi. Era verdade. Não dava mais pra negar isso pra mim mesmo.

De volta ao condomínio, desci do carro com as sacolas na mão — os pães, os biscoitos, os salgados... e, dessa vez, também trouxe comigo a mochila e o notebook, que eu havia deixado no banco traseiro no dia anterior. Subi pelo elevador em silêncio, observando meu reflexo na porta espelhada, como se ainda tentasse entender quem era o homem que voltava para casa naquela manhã.

Ao entrar no apartamento, tudo estava quieto. Coloquei as sacolas em cima da mesa da sala e levei os pães para a cozinha. Decidi passar um café fresco, preparar um pão com manteiga, tentar me concentrar em algo prático — algo que me ancorasse na rotina.

Enquanto o café coava, abri o notebook ali mesmo na mesa e fiquei navegando por algumas planilhas, e-mails antigos, tentando ocupar a cabeça... mas era em vão. O silêncio do apartamento deixava espaço de sobra pros meus pensamentos gritarem.

Foi quando ouvi os passos pequenos vindo do corredor. O mais novo apareceu, arrastando o seu boneco do Superman e o cobertor, ainda meio sonolento. Veio até mim e subiu no meu colo sem dizer nada. Eu o abracei forte. Beijei sua cabeça e fiquei ali com ele um tempo.

Pouco depois, o mais velho acordou também. Veio direto pra sala, me deu um bom dia animado, pediu bênção, e me abraçou com aquele jeito carinhoso de sempre. Conversamos um pouco, ele começou a me contar um sonho que teve.

E ali, com os dois por perto, eu senti uma paz estranha. Boa, mas dolorida. Porque, no fundo, esse era um dos meus maiores medos: perder aquilo. Perder aquele carinho, aquele afeto, aquele lugar sagrado de ser o pai deles. E por mais que eu estivesse tentando entender o que estava acontecendo comigo, era impossível não pensar nisso. Era impossível não ter medo.

Era quase 7h20 quando minha esposa acordou.

— Bom dia — disse ela, ainda com a voz sonolenta, e me deu um beijo leve.

Eu estava sentado à mesa, de frente pro notebook, fingindo ver alguma coisa útil, e só retribuí com um sorriso cansado. Ela seguiu em direção à cozinha e começou a preparar o café dos meninos, rindo com eles, beijando os dois, pedindo que guardassem os brinquedos espalhados pela sala.

Ela parecia animada. Leve. Presente.

De onde eu estava, fiquei observando aquela cena com um nó na garganta. Até que ela olhou na minha direção e perguntou:

— Tá tudo bem?

Assenti rápido, tentando parecer natural.

— Tá sim. Tudo certo.

Mentira. Não tava. Mas como é que eu ia dizer?

As horas seguiram num ritmo estranho. Eu ali, meio em silêncio, tentando retomar o foco, sentindo que minha cabeça ainda girava.

Perto das oito, decidi levantar. Fui pro quarto, peguei uma muda de roupa, fui direto pro banheiro.

Tomei outro banho. Dessa vez mais rápido. Mais automático. Como quem se prepara pra vestir o uniforme de um dia comum... mesmo sabendo que, por dentro, nada mais parecia igual.

No caminho para o trabalho, deixei o som desligado. Só o silêncio, o volante e a estrada. Saí de casa mais cedo e a cidade ainda parecia acordar devagar. Um céu nublado cobria Salvador, o tipo de tempo que combina com pensamentos densos. E eu estava cheio deles.

Cheguei ao escritório antes das 08:20. Subi direto para a minha sala. Estava tudo como sempre — minha mesa, minha cadeira, os papéis da semana. A rotina intacta. Mas eu... não estava.

Coloquei o notebook na mesa, conectei o carregador, abri a mochila, tirei a garrafa d’água. E então peguei o celular.

Era hora de encarar o que eu vinha adiando desde a noite anterior.

Abri o WhatsApp. A mensagem de áudio que eu tinha enviado pro Daniel, ainda no elevador, depois de uma das noites mais confusas da minha vida, tinha sido visualizada. Mas ele não respondeu. Só tinha reagido com um joinha.

Fiquei olhando aquele ícone. Aquela mãozinha levantada, tão simples... e ao mesmo tempo tão indecifrável. Um sinal de aceitação? Indiferença? Desinteresse? Alívio? Eu não sabia. E aquilo me paralisou por alguns segundos.

No chat com o Henrique, a história era outra. Tinha pelo menos três mensagens dele:

"Fala comigo."

"Não me deixa sem notícia, porra."

"Caralho, Pedro, você é foda. Como é que você tá?"

Respirei fundo e comecei a digitar.

"Bom dia, meu irmão. Tá tudo em paz. Acordei bem, já tô no trabalho... Processando tudo."

"Eu ouvi seu conselho. De verdade. Mas acho que eu não vou seguir. Não consigo. Eu quero contar tudo."

"Quero tirar esse peso. Porque, independente do que acontecer, eu já fiz. E o pior: eu quero fazer de novo. Se não for com ele, pode ser com outra pessoa. Eu já atravessei essa linha. E nada impede que aconteça de novo. Então... eu quero conversar. Quero ser honesto. E o que ela decidir depois de saber, eu vou respeitar."

Enviei. Fiquei ali olhando a tela, até que a resposta do Henrique chegou:

"Tô contigo. Sempre. Você não vai passar por isso sozinho, irmão. Nunca vou largar tua mão."

Fechei os olhos por um instante.

E então mandei mais uma mensagem:

"Eu sou apaixonado por ela, Henrique."

"E é isso que mais tá acabando comigo. Porque tudo isso que tá acontecendo... não tá fazendo eu gostar menos dela."

"O afeto, o carinho, o amor que eu sinto por ela... existe. Tá aqui. Não foi embora."

Henrique demorou um pouco mais para responder dessa vez.

"Talvez... talvez isso seja ser bissexual, né? Acho."

Li. E respondi.

"Não sei."

"Eu só sei que gosto dela. E o engraçado é que... eu também gosto do Daniel. Quero conhecer mais sobre ele. E eu não sei o que eu faço, meu irmão."

"A cabeça tá longe. Não queria nem estar aqui no trabalho hoje."

A conversa parou por um tempo depois disso. Mas só ali eu percebi o quanto era importante ter alguém como o Henrique por perto. Alguém pra ouvir. Pra não julgar. Pra simplesmente... estar.

Mesmo sem resposta do Daniel, mesmo com o dia mal começando, ter um irmão do meu lado já era o que me impedia de desabar por inteiro.

Enviei a mensagem para o Daniel sem me alongar muito: "Bom dia, tudo bem? Eu gostaria de falar contigo, agora pela manhã, pessoalmente. Onde eu poderia te encontrar?"

Eu queria conversar. Olhar nos olhos dele. Falar sobre tudo. Explicar o que estava se passando aqui dentro — sem me esconder atrás de texto, sem me acovardar diante do silêncio. Era um tipo de honestidade que eu precisava ter. Com ele, comigo mesmo, com tudo isso.

Daniel não demorou a responder.

"Oi, bom dia. Tá tudo bem? Aconteceu alguma coisa? Eu estou no escritório. Hoje não tenho audiência, só estou organizando umas coisas. Mas o colega que divide sala comigo não está aqui, então tô sozinho. Se não for um problema pra você, pode vir aqui."

Li a mensagem. Me senti... acolhido, de certo modo. Perguntei em seguida:

"Quando posso ir aí?"

"Até agora, se quiser. Pelo menos até meio-dia estarei sozinho. Ele tem duas audiências hoje, já vai direto pro tribunal."

"Me passa o endereço completo?" pedi, direto.

Ele mandou a localização pelo WhatsApp, junto com o número da sala e o andar.

Confirmei. Levantei da minha cadeira, olhei em volta e decidi não deixar nada para trás. Peguei o notebook, a mochila, tudo. Passei na sala do Paulo, um dos sócios, e falei de forma honesta:

— Preciso resolver umas coisas pessoais, Paulo. Nada grave. Se puderem segurar por aqui, agradeço. Qualquer coisa, me liguem.

Ele assentiu, tranquilo, como sempre.

— Vai lá, Pedro. Fica tranquilo. Qualquer coisa a gente te chama.

Agradeci com um gesto e saí. Já no corredor, encontrei com Ricardo e Fernando, que vinham animados com alguma conversa. Me cumprimentaram com bom dia e um sorriso, mas eu só respondi com um aceno rápido:

— Tô na pressa, gente. Depois a gente se fala, beleza?

Os dois me olharam meio sem entender, mas não disseram nada. Segui direto para o estacionamento, já escrevendo uma nova mensagem:

"Já estou indo. Te aviso quando chegar."

No caminho até o Caminho das Árvores, onde ficava o escritório do Daniel, os pensamentos me atropelavam. Cada semáforo, cada carro passando do lado, parecia um lembrete de que eu ainda não fazia ideia do que estava fazendo ali. Cheguei a rir sozinho, meio nervoso, balançando a cabeça como quem tenta acordar de um sonho estranho. Era tudo rápido, intenso, surreal. Mas era real. Eu estava indo. De novo.

A distância não era grande, o trânsito estava tranquilo. Saí da empresa por volta das 9h10. Quando estacionei o carro, o relógio já marcava quase 9h20 da manhã.

Desci, atravessei a portaria do edifício comercial e fui direto até a recepção. Me apresentei, pedi a sala e o andar, como se fosse uma visita comum — mas por dentro eu estava longe de ser só um visitante.

O elevador subiu devagar. Cada andar que passava era um pequeno aperto no peito. Quando cheguei, caminhei até a sala indicada e parei em frente à porta de vidro. Bati duas vezes, ignorando o interfone.

Foi o próprio Daniel quem atendeu.

A gente se encarou por alguns segundos, e eu sinceramente não sabia qual reação ter. Aperto de mão? Abraço? Um simples “oi”? Ele também pareceu hesitar. Mas então sorriu, abriu mais a porta e disse:

— Entra. Fica à vontade.

Era um escritório bonito, bem organizado. Amplo, com divisórias de eucatex separando os ambientes. Daniel foi me guiando até a sala dele. A sala onde ele trabalhava era aconchegante, com uma mesa grande, notebook, computador, pilhas de livros jurídicos, tudo muito alinhado, bem cuidado.

— Bonita a sala — comentei, sincero, enquanto olhava em volta.

Ele sorriu de leve. Estava bonito. De novo com o terno escuro, camisa clara por dentro. Como no dia anterior.

Antes de sentar, estendi a mão pra ele.

— Como é que você tá?

— Tô bem... e você?

Suspirei.

— Não tão bem assim. Mas... eu precisava conversar. Espero que não esteja te incomodando vindo aqui desse jeito.

— Por mais estranho que possa soar o que eu vou te dizer... — ele respondeu, com um tom calmo — você nunca me incomodaria.

Sorri sem graça. Ele ofereceu um café, aceitei. Ele foi buscar. Voltou com uma xícara fumegante, colocou o pires na minha frente e sentou-se à mesa.

— Então... sobre o que você quer conversar?

Abracei a xícara com as mãos por alguns segundos. Tomei um pequeno gole. E fui direto.

— Eu sou casado. Tenho dois filhos. E você sabe disso. — Fiz uma pausa curta. — E eu... não sei o que tá acontecendo. Na verdade, agora eu sei. E pode acreditar ou não, mas eu nunca tinha ficado com um cara antes. Nunca tive nenhum tipo de relação assim. E o mais próximo, mais fundo que eu fui... foi contigo. Ontem.

Ele não disse nada. Só me olhava, atento.

— Eu amo a minha esposa. Amo a minha família. Mas, desde o dia do acidente... quando você tirou o capacete, quando eu te encarei pela primeira vez... parece que alguma coisa virou dentro de mim. Parece que eu não me conhecia até aquele dia.

Suspirei mais uma vez. Meus dedos ainda em volta da xícara.

— Depois do restaurante na Barra... depois de ontem... eu sinto que quero viver isso. Mas preciso tentar fazer da forma certa. Do jeito mais correto possível. E por isso... — olhei diretamente pra ele — eu queria entender. O que é que você quer com isso?

Daniel viu aquilo e só balançou a cabeça positivamente. Respirou fundo, e por um instante, seus olhos pareceram se encher de água. Então começou a falar, com a voz mais baixa, mas firme:

— Pedro... na madrugada em que eu te conheci — como você já sabe — foi o fim de um namoro de quase quatro anos. Eu achava que aquele homem era o meu porto seguro, a pessoa em quem eu mais confiava, a quem mais me entreguei na vida. E acabou de um jeito que eu nunca esperei.

Fez uma pausa curta, e continuou:

— E por mais inacreditável que pareça... quando eu tirei o capacete naquela noite, e vi o seu rosto, eu achei que ia tomar um soco. De verdade. Mas você estendeu a mão. Você se preocupou em saber se eu estava bem. E, por algum motivo, alguma coisa virou aqui dentro também.

Ele deu um leve sorriso, quase melancólico.

— Eu nunca falei isso antes, mas... eu torci pra você me mandar mensagem. Eu queria. Eu não sabia nada sobre você, não sabia do que você gostava, como era sua vida, mas eu queria que você mandasse mensagem. Sentia que precisava daquilo.

— Quando a gente saiu pela primeira vez, foi um dos melhores dias que eu já tive. E quando você me falou que era casado... cara, eu fiquei mal. Fiquei mal porque, mesmo sem saber se você curtia ou não, eu já estava anulando qualquer possibilidade de algo acontecer entre a gente.

— Você é um cara legal, incrível, inteligente, bonito, maduro... — ele começou, a voz embargada. — E eu fiquei encantado com o seu jeito educado naquela madrugada. Fiquei ainda mais encantado com o seu jeito acolhedor no domingo. E ontem, quando aconteceu aquilo no estacionamento... eu não parei de pensar nisso desde então.

Daniel respirou fundo, desviando os olhos por um instante antes de continuar.

— Porque eu imaginei tudo com você ali. Eu imaginei sentir você de verdade. E isso está me matando, Pedro, porque eu sei que é errado. Sei que você é casado, que tem filhos, que tem uma vida. E eu não quero ser a pessoa que vai destruir isso.

Fez uma pausa, passando as costas da mão discretamente nos olhos. A voz agora saía mais trêmula, mais sincera:

— Tem um lado meu aqui que só quer te abraçar, te beijar, te dizer o quanto eu quero ficar com você. Mas tem um outro lado... um lado que grita que talvez eu esteja me apaixonando por alguém que nunca vai ser meu. E isso dói.

Ele abaixou a cabeça, enxugando discretamente uma lágrima que escorreu pelo rosto.

— Eu não sei como isso aconteceu tão rápido. Não sei como você entrou assim na minha vida, no meio do caos que eu tava vivendo. Mas entrou. E agora eu tô aqui, criando tanto carinho, tanto afeto por você... e morrendo de medo de tudo isso.

Com a voz suave, eu falei:

— Olha pra mim.

Daniel levantou o olhar. E quando me viu sorrindo, mesmo que de forma leve, parecia aliviado. Eu não estava julgando ele. Eu entendia aquele turbilhão de sentimentos — de verdade. Mas também sabia o meu lugar nessa história. E era isso que eu precisava dizer.

— Daniel, eu sou responsável pelas minhas escolhas. Então você não vai estar destruindo nada. Isso... isso é meu. Se algo desmoronar, é porque eu permiti, entende?

Fiz uma pausa curta e respirei fundo antes de continuar.

— Ontem eu conversei com meu irmão. Contei tudo a ele.

Daniel arregalou os olhos, assustado, quase se endireitando na cadeira.

— Você contou?

— Calma — eu disse, levantando as mãos. — Calma. O Henrique é uma das pessoas em quem eu mais confio no mundo. Se eu não desabafasse com ele, eu ia enlouquecer.

Daniel parecia atordoado. Quase interrompeu de novo, mas hesitou. Então, murmurou:

— Por que você não mandou mensagem? Eu voltava... Eu voltava pra ficar com você, Pedro.

Balancei a cabeça devagar.

— Eu não quis incomodar. Naquele momento... eu tive uma crise de ansiedade. Me senti sufocado. Peguei o celular, chamei o Henrique, pedi pra ele ir de Uber me buscar e de lá sairmos com meu carro. A gente saiu, deu uma volta, e acabei contando tudo. Eu precisava.

Houve um silêncio denso, mas não pesado.

Então, encarei ele de novo.

— Me desculpa por não ter mandado mais mensagem. E pelo jeito que mandei aquele áudio. Foi no meio do caminho pra casa, no elevador, ali no impulso. Mas é assim que minha cabeça tem estado... nesses últimos dias. Um redemoinho.

O Daniel me encarou em silêncio por alguns instantes. A sala parecia conter a respiração com a gente. O cheiro do café ainda estava no ar, misturado com aquela tensão que aos poucos virava alguma outra coisa. Talvez acolhimento.

Ele ajeitou-se na cadeira, respirou fundo, e falou com a voz mais firme que conseguiu encontrar naquele momento:

— Eu não sou um cara publicamente assumido. Nunca senti necessidade de me assumir. Não acho que ninguém precise sair se declarando pra todo mundo. Eu só vivo a minha vida... com quem me faz bem. E pronto.

Ele deu uma pausa. Os olhos ainda em mim, mas mais brandos.

— Mas eu imagino o quão difícil deve ser esse momento pra você. Imagino mesmo. E... eu respeito isso. Muito. De verdade. O fato de você estar aqui, querendo conversar, querendo contar tudo... isso só mostra o caráter que você tem.

Ele passou a mão no rosto, num gesto quase involuntário, como quem tenta acordar de um sonho confuso, ou manter os pés no chão.

— E, ao mesmo tempo, que loucura tudo isso... — ele soltou, num tom mais leve, quase rindo de si mesmo. — Não é possível. Eu olho pra você e parece que eu não vivi quase quatro anos com outra pessoa. Eu olho pra você e... eu não consigo sentir falta de ninguém mais. Como pode isso?

Eu ouvi aquilo e não consegui dizer nada. Só balancei a cabeça positivamente. Um sorriso leve escapou de mim.

Ali, naquele momento, era como se tudo parasse. E por mais que o mundo lá fora continuasse girando, por dentro, eu me sentia exatamente ali. Com ele. Sentado naquela sala, enfrentando o turbilhão com uma calma que só a verdade podia trazer.

Daniel se levantou da cadeira em silêncio. Deu a volta na mesa e veio até onde eu estava. Colocou as mãos sobre meus ombros e começou a fazer uma leve massagem. Os dedos dele pressionavam com cuidado, como se soubessem exatamente o que aliviar. Ele falou baixo, bem perto do meu ouvido:

— Deixa eu te dar um abraço?

Eu me levantei. Me virei devagar pra ele. E quando nossos olhos se encontraram, já não havia mais nada entre nós além da vontade.

Eu o abracei.

Forte.

Com os corpos colados, peito contra peito, respiração misturada.

Ele repousou a cabeça no meu peito e respirou fundo. Eu passei a mão no cabelo dele com carinho. E ali, naquele silêncio pesado e quente, a gente ficou por alguns segundos.

Então ele ergueu o rosto. Os olhos estavam fechados, mas ele passou a ponta dos dedos pela minha barba, devagar. E sussurrou:

— Eu quero tanto te beijar de novo...

Eu respirei fundo. Quase ofegante. O calor do momento subiu pelo meu corpo como uma onda difícil de conter. E antes que ele pudesse dizer mais alguma coisa, fui eu quem tomou a iniciativa.

Inclinei o rosto e o beijei.

Com calma, mas com firmeza. Um beijo que misturava desejo, confusão, alívio. Como se aquele toque fosse, ao mesmo tempo, um reencontro e um começo.

No meio do beijo, murmurei, com a testa encostada na dele:

— Não é perigoso alguém chegar aqui e ver a gente assim? — perguntei, ainda com os braços em volta dele, a testa encostada na dele, os olhos meio fechados.

Daniel sorriu de leve, com aquele ar tranquilo que só ele parecia ter.

— Ninguém entra aqui sem eu abrir a porta, Pedro. Se alguém bater, a gente vai saber. Fica tranquilo.

Eu sorri de volta, ainda em silêncio. A presença dele me aquecia por dentro, me dava uma estranha sensação de paz no meio do caos que era a minha cabeça.

Daniel então passou os dedos devagar pelo meu rosto, depois pela minha barba, como se estivesse desenhando cada traço da minha pele com a ponta dos dedos. Seus olhos me encararam com suavidade, sem pressa.

E então ele se aproximou e me beijou de novo.

Dessa vez, o beijo foi mais calmo, mais consciente. Sem urgência, sem medo — mas ainda cheio de intensidade. Um beijo que parecia dizer que, por mais incerto que fosse tudo aquilo, naquele momento, estávamos exatamente onde queríamos estar.

Ele afastou o rosto com delicadeza e continuou acariciando meu rosto com o polegar, como se estivesse gravando aquele instante na memória.

Eu fechei os olhos por um segundo. E deixei a respiração dele misturar com a minha.

Dessa vez o beijo foi mais profundo. Mais demorado. Mais urgente.

As mãos dele foram pro meu rosto, depois desceram devagar pela minha nuca, meus ombros, até segurarem firme na barra da minha cama. E eu... eu já não raciocinava direito. Só sentia. Sentia o toque, o calor, o cheiro dele tão perto do meu, o peso daquele momento.

Era a segunda vez que eu beijava um homem na vida. A segunda vez. Mas parecia a primeira de verdade.

A primeira sem confusão, sem susto, sem medo de alguém chegar. Uma primeira vez com desejo declarado, com entrega. E isso me atravessava de um jeito que eu não sabia nomear.

Eu tava ofegante. Dava pra ouvir a minha respiração contra a boca dele, os dois respirando juntos, entre um beijo e outro, como se o ar do mundo estivesse ali, naquele espaço mínimo entre nós dois.

E o meu corpo... reagia.

Senti a excitação apertar entre as minhas calças, o volume crescente, o desconforto de algo que não era incômodo — era desejo. Era a tensão do toque dele contra meu peito, da barba roçando na minha pele, da mão dele subindo de leve pela lateral da minha cintura.

Ele me olhou de novo. Me encarou. Como se quisesse ter certeza de que eu ainda estava ali. E eu estava.

Mais do que nunca, eu estava ali.

Respirando fundo. Quase tremendo.

Daniel tirou os óculos, colocou atrás de si na mesa, e me puxou mais. Com força. Me virou de leve, me deixando de costas pra porta. Continuamos nos beijando, como se o mundo lá fora tivesse deixado de existir. Como se só existisse ali, naquele instante, aquele toque, aquele calor.

Ele me pressionou contra a porta, firme, como se quisesse que eu sentisse cada centímetro daquilo que acontecia. A palma aberta pousou sobre o meu peito, empurrando-me um pouco mais para trás, até que não houvesse espaço algum entre nós. A outra mão desceu devagar, num caminho que fez minha respiração falhar, até encontrar o volume latejante entre minhas pernas. Um suspiro pesado escapou, grave, quase um gemido — e eu não tive força para contê-lo.

Daniel começou a massagear a região com um ritmo lento, calculado, como se estivesse experimentando até onde podia me levar. Os olhos dele cravados nos meus, a respiração quente misturando-se à minha.

— Posso? — perguntou, com a voz baixa, carregada de algo que era metade cuidado, metade provocação.

Eu só consegui balançar o rosto num “sim” trêmulo, murmurando quase num sussurro:

— Por favor.

O meio sorriso dele se abriu como quem acaba de receber uma permissão preciosa. E então começou a se abaixar, sem tirar os olhos de mim, cada movimento dele tão lento que parecia prolongar o tempo, como se quisesse que eu sentisse cada instante antes do que viria a seguir.

Aos poucos, ele estava ali, ajoelhado à minha frente. O som do próprio corpo se acomodando no chão pareceu ecoar no silêncio do ambiente. Quando ergueu o olhar, de baixo para cima, algo atravessou meu peito com força. Era impossível não sentir.

Eu o admirava ali, aquele homem com a camisa branca, gravata afrouxada, o rosto sério e ao mesmo tempo entregue, ajoelhado diante de mim. As mãos ainda trabalhavam sobre meu membro, que pulsava sem descanso sob o tecido. Cada toque parecia me arrancar o ar.

Então, com um movimento calmo, seguro, Daniel apoiou as duas mãos na bainha da minha calça. O gesto foi lento, quase reverente. Senti o atrito sutil do tecido contra minha pele enquanto ele desfazia o fecho e, sem pressa, começou a abrir a calça, puxando-a para baixo junto com a respiração que eu já não conseguia controlar.

O ar pareceu ficar mais denso quando ele afastou a abertura da calça, revelando o volume preso apenas pela cueca. O toque dele, agora mais direto, fez meus músculos retesarem. Daniel manteve os olhos nos meus enquanto as mãos exploravam, como se quisesse memorizar cada reação.

Senti o calor dos dedos contornando a borda do tecido antes que ele, com cuidado, puxasse para baixo, libertando-me de vez. A respiração dele mudou, ficou mais profunda, mais quente e eu podia sentir o hálito tocar minha pele.

Meu corpo inteiro pulsava. Eu tentava segurar uma moldura que nem existia da porta atrás de mim, como se precisasse de apoio para não ceder ao peso do que estava acontecendo. Ele se aproximou lentamente, a mão envolvendo a base, o polegar deslizando de leve, arrancando de mim um gemido abafado.

O olhar dele subiu outra vez, e havia algo ali, uma mistura de decisão e desejo — que me fez estremecer. Sem tirar os olhos dos meus, Daniel inclinou-se e deixou que seus lábios tocassem a ponta, primeiro num beijo leve, quase tímido, antes de me envolver por completo, num gesto firme e quente que arrancou de mim um suspiro profundo, carregado de tudo que eu não dizia em voz alta.

Era a primeira vez que eu sentia aquilo vindo de outro homem, e parecia que meu corpo inteiro precisava reaprender a existir. Cada movimento dele me fazia apertar mais, como se fosse possível conter o que estava prestes a transbordar.

Daniel me envolvia com a boca num ritmo firme, quente, profundo. Em alguns momentos, ele subia devagar, deixando a língua deslizar preguiçosa pela extensão, provocando cada nervo. No topo, passava a ponta da língua num círculo lento, como se quisesse memorizar o gosto. O contraste entre o calor da boca e o toque preciso da língua me arrancava arfadas curtas, respirações que eu já não conseguia disfarçar.

Os olhos dele se erguiam de vez em quando, e era impossível não sentir o impacto daquele olhar junto com tudo o que ele fazia. Minhas mãos, antes apoiadas na porta, escorregaram até pousar nos ombros dele, sentindo a firmeza do corpo. Uma delas desceu pela lateral, até encontrar a nuca, apertando com mais força do que eu pretendia — não para controlar, mas porque eu precisava me segurar em alguma coisa.

Ele sorriu com os olhos, sem parar o que fazia, e fechou as mãos na minha cintura com firmeza, me puxando ainda mais contra si. A língua alternava entre movimentos rápidos e brincadeiras lentas na ponta, fazendo meu corpo inteiro pulsar, quente, vivo.

Eu suspirava, arfava, e tentava abafar os gemidos grossos que ameaçavam escapar. Mas era inútil. Cada toque, cada pressão, cada volta da língua me empurrava para mais perto de um limite que eu não sabia se queria ou não atravessar tão rápido.

Naquele momento, nada mais existia. Eu já não lembrava de nada — prazos, reuniões, compromissos, preocupações. Tudo parecia ter sido apagado, limpo, como se cada pensamento tivesse sido varrido pelo calor daquela sensação nova. Eu estava entregue. Ao desejo. Ao tesão. À descoberta de algo que, até então, eu não sabia que queria sentir.

A tensão inicial de alguém poder entrar já não existia mais. Não importava. A única coisa real era a boca dele me envolvendo, a língua explorando, o calor pulsando no ponto mais sensível do meu corpo. Mesmo com o clima controlado do ar-condicionado, eu sentia uma fina camada de suor se formar, como se o calor viesse de dentro para fora, queimando sem pressa.

Os gemidos que escapavam eram abafados pela própria presença dele ali, pelo meu membro sendo engolido e trabalhado com maestria. E aquilo me deixava insano. Eu sentia as pernas ameaçarem ceder, como se perder a força fosse parte inevitável da entrega.

Então, Daniel interrompeu o movimento. Tirou da boca devagar, deixando um arrepio subir pela minha espinha. Segurou-me firme, massageando com a mão, como se quisesse manter o prazer vivo mesmo sem a boca. E então, num gesto carregado de provocação, passou-me pelo próprio rosto, como se marcasse a pele dele com o calor do meu corpo. O sorriso surgiu ali, breve, quase travesso, antes de ele me envolver novamente, afundando-se com vontade, como quem sabia exatamente o efeito que causava.

Meu corpo reagiu com um suspiro profundo, um som que misturava alívio e desespero, e que ele certamente sentiu vibrar. Eu estava perto. Muito perto.

Eu não fazia ideia de quanto tempo já tinha se passado. Minutos? Horas? Não importava. A sensação era de que, se pudesse, ficaria ali indefinidamente, perdido naquele calor, naquele toque, naquela boca. Talvez fosse exagero dizer que era a melhor sensação que eu já havia sentido — prazer oral, na vida — mas, naquele momento, parecia impossível pensar diferente. Eu estava completamente entregue, sem reservas.

Daniel estava ali com vontade. Com entrega. Cada movimento dele dizia isso. O jeito como me segurava firme, como a língua percorria cada centímetro, como o ritmo se mantinha certeiro.

Eu já não conseguia segurar por muito mais tempo. Nem sabia ao certo quando tinha começado, mas agora sabia exatamente onde estava prestes a chegar. O corpo avisava — as pernas ameaçando ceder, a respiração mais curta, o calor latejante crescendo até não caber mais dentro de mim.

E então aconteceu. O clímax veio como uma onda forte demais para conter. Eu gemi, sem conseguir abafar, enquanto preenchia a boca dele com meu prazer. Sentia a pulsação intensa no momento exato em que ele engolia tudo, sem hesitar. Cada contração minha era acompanhada por ele, consumindo mais e mais, como se não quisesse desperdiçar nada.

O calor, a pressão, o som abafado da respiração dele misturado ao meu — tudo se confundia. Eu estava ali, de olhos semicerrados, sentindo cada segundo se arrastar e, ao mesmo tempo, passar rápido demais.

Quando enfim consegui respirar fundo, ainda sentia o corpo reagindo, os músculos tensos, o suor frio na pele. Daniel se afastou lentamente, os lábios ainda úmidos, os olhos fixos nos meus como se quisesse prolongar aquele momento para sempre.

Ele permaneceu ajoelhado, olhando de baixo para cima, o sorriso ainda marcado nos lábios. Eu só conseguia respirar de forma irregular, o peito subindo e descendo rápido, como se tivesse acabado de atravessar uma corrida sem linha de chegada.

— Caralho... puta que pariu... — foram as únicas palavras que consegui soltar, num sussurro rouco, entre respirações profundas. Talvez nem os treinos mais pesados daquela manhã tivessem drenado tanta energia de mim quanto aquele momento.

Daniel passou as costas do polegar pelos próprios lábios, num gesto lento, como se apagasse vestígios de um segredo. Sorriu de novo, mas dessa vez com um ar satisfeito, quase triunfante, antes de se levantar.

Eu continuei ali, encostado à porta, buscando apoio como quem precisa garantir que ainda está de pé. Não tinha pressa para me mover. Nem forças para dizer muito mais. O ar no ambiente parecia mais denso, carregado do que tinha acabado de acontecer.

Ele ajeitou a camisa, o olhar ainda preso em mim, e por alguns segundos não houve som algum — apenas o som da minha respiração tentando encontrar um ritmo que já não era o mesmo de antes.

Aquilo era novo para mim. Eu não sabia como agir. Não sentia tesão na ideia de ser penetrado, nem nada parecido, então não havia um roteiro na minha cabeça para o que vinha depois. Fiquei ali, ainda encostado à porta, respirando pesado, tentando entender o que fazer com as mãos, com o corpo, com o silêncio.

Meu olhar, sem que eu controlasse, desceu até o volume na calça dele. Levantei os olhos e perguntei, ainda com a voz baixa, arrastada pelo cansaço e pelo impacto do momento:

— E você… como você fica?

Daniel sorriu, sem desviar os olhos de mim.

— Eu fico feliz — respondeu, com aquela calma segura que parecia sempre ter — porque eu acho que você gostou. E… eu acho que foi a melhor coisa que eu já fiz em muito tempo. Eu estou totalmente feliz. Totalmente realizado.

Sorri de volta, sem saber o que responder. Apenas deixei que o silêncio tomasse conta outra vez, carregando um peso diferente agora — um peso bom, quente, que ainda vibrava no ar entre nós.

À medida que eu ia me recompondo, percebia que, diferente das outras vezes, não havia pânico. Eu já sabia onde tinha mergulhado. Já entendia o que aquilo significava para mim. Mas também sabia que precisava ser transparente. O dilema agora era como prosseguir… porque continuar com aquilo, escondendo, eu não iria conseguir. Tinha que contar a verdade. Tinha que falar o que estava acontecendo. E talvez fosse esse o medo real: o que viria depois de tudo isso?

Daniel voltou, sentou na cadeira, como se nada tivesse pressa. Colocou mais um pouco de café na garrafa que ficava sobre a mesa e tomou um gole. Também ofegava levemente, respirava fundo, mas sorria. Colocou os óculos de volta no rosto com um gesto tranquilo.

O clima era bom. Não havia constrangimento. Os silêncios que se espalhavam ali pareciam necessários, como pausas para respirar. Aparentemente, Daniel entendia que eu precisava de tempo, e respeitava isso, sem me pressionar, sem exigir respostas imediatas.

Uma das poucas coisas que consegui dizer foi:

— Que loucura… que loucura… — repeti duas vezes, ainda sorrindo, como quem tenta acreditar no que acabou de viver.

Olhei nos olhos de Daniel e acrescentei:

— Eu adorei aquilo. Sério… foi uma das melhores sensações que já tive.

Ele sorriu de volta, como se tivesse certeza do que aquilo significava para mim.

— Se eu pudesse, ficaria aqui o dia todo.

Daniel riu baixo, balançando a cabeça.

— Olha… não fala isso, tá? Vou acabar trancando você aqui e fazendo tudo o que você quiser.

Sorri de novo, sem saber se era provocação ou promessa.

Ele se levantou da cadeira, e eu, já recomposto, estava de pé no meio da sala. Balancei a cabeça, rindo sozinho.

— Não acredito que a gente fez isso aqui… que loucura… que loucura!

— Também não acredito — respondeu, ainda sorrindo. — Eu nunca fiz isso aqui. Caso você não acredite… é a primeira vez.

— Sério?

— Sério. Mas isso… isso é muito louco. Eu penso nisso todos os dias… na forma como você entrou na minha vida, e como tudo está acontecendo.

Houve um breve silêncio. Então ele me olhou com mais seriedade, como quem estava prestes a atravessar uma linha importante:

— Pedro… eu não quero estragar nada na sua vida. Mas eu… eu quero conhecer você mais.

— Daniel… — chamei, com a voz mais baixa do que eu pretendia.

Ele, que estava de pé ao lado da mesa, deu um passo à frente, ficando mais frente a frente comigo. Sem pensar muito, estendi a mão e peguei sua gravata, segurando-a como quem segura um laço. Puxei-o para perto.

Quando ele já estava ali, próximo o bastante para sentir minha respiração, tomei a iniciativa. Nossos lábios se encontraram num beijo intenso, carregado de tudo que ainda pulsava entre nós. Uma leve mordida no lábio dele arrancou um suspiro.

As respirações se misturavam, quentes, aceleradas. Meu corpo avançou, quase o pressionando contra a mesa, quase o deitando ali. Não havia mais palavras — não eram necessárias. Apenas beijos, mais e mais beijos, e as mãos explorando, passeando pelo corpo um do outro, como se quisessem memorizar cada contorno, cada textura, cada parte possível de tocar.

O beijo se prolongou até que a necessidade de ar nos forçou a separar as bocas, mas não os corpos. Ficamos ali, testando os limites da proximidade, respirando um no espaço do outro, como se mais alguns segundos pudessem apagar qualquer lembrança do mundo lá fora.

Daniel ainda segurava minha cintura, e eu sentia a força contida naquele toque. Meu corpo queria ficar, mas minha cabeça já lembrava que o tempo não era nosso aliado.

— Eu preciso ir… — murmurei, sem a menor convicção.

Ele soltou um suspiro, como quem sabia que eu tinha razão, mas não queria concordar.

— Eu sei. — A voz dele era baixa, quase um sussurro. — Mas a gente ainda vai se ver de novo.

— Vai mesmo? — perguntei, num tom meio desafiador, meio esperançoso.

— Vai. — O olhar dele cravou no meu, firme, seguro. — E da próxima vez… não vai ser só aqui dentro.

Soltei um riso breve, mas não consegui responder. Dei um passo para trás, sentindo a gravata dele ainda presa entre meus dedos, como se eu não quisesse soltar. Soltei devagar, como quem entrega algo valioso.

Ele me acompanhou até a porta. Abri, mas antes de sair, olhei para trás. Daniel estava parado no mesmo lugar, me observando. O sorriso dele não era de despedida, mas de promessa.

E, enquanto caminhava pelo corredor, senti que não estava deixando só um escritório para trás. Eu estava deixando um pedaço de mim ali, e levando outro comigo.

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Continua

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Olá, amigos! Hoje, sexta-feira, 19 de setembro, trago a parte 8 para vocês.

Peço desculpas pela demora de pouco mais de um mês. Vou explicar melhor isso em capítulos futuros, mas quero que saibam que sinto uma necessidade enorme de levar até vocês o “desfecho” de toda essa história. Para ser sincero, não tem sido fácil.

Não posso prometer nada, mas vou me esforçar para voltar a postar pelo menos quinzenalmente e, finalmente, concluir este relato. Mais uma vez, agradeço de coração a todos que leem, que gostam do meu estilo de escrita, e que acompanham esses textos longos que tanto tento encurtar, com medo de cansar vocês. As mensagens de apoio que recebo me emocionam de verdade; sinto cada palavra de incentivo de vocês.

Sou detalhista, exageradamente expressivo, e acabo escrevendo demais. Depois paro, reviso, modifico palavras, ajusto pontuações… É meu jeito de tentar criar imersão, algo que admiro profundamente nos livros que leio e que, de alguma forma, me contagiou.

Me perdoem se alguns erros escaparem; por mais que eu releia, sempre acabam passando. Mas saibam que cada linha é escrita com cuidado, sentimento e sinceridade.

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Comentários

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seja bem vindo de volta querido, sentimos sua falta, volte logo quando poder. o tamanho da escrita esta no ponto certo, nada é cansativo pelo contrário, seu talento em narrar as acoes com emoção, realismo e cor. a história é densa, profunda e também verdadeira, realista e importante para refletir, emocionar e torcer para as coisas se encaixem e tudo flua para o consenso. Essa mudança deve ser dolorida para as partes, mas nada que o tempo nao cure as feridas da alma. um abraço do seu fã. beijos.

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Bom poder ler a continuação do romance. Por favor, não suma Pedro.

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Nossa. Que conto maravilhoso e profundo. Você consegue ir além da narrativa e fazer nos envolver com o ato e sentimentos. Ora sou Daniel, ora sou Pedro. Obrigado por compartilhar.

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Que alegria poder ler mais um capítulo da sua história, Pedro. Confesso que fiquei ansioso, aflito achando que você tinha abandonado tudo, sempre entro aqui a noite e vou na lista dos enviados recentemente para ver se algo novo seu aparece. Eu amei seu envolvimento com o Diego, curioso para saber cada vez mais o que irá acontecer, mas de coração desejo tudo de bom pra vocês.

Semanas atrás estive em Salvador, passeei pela Barra, foi impossível não lembrar disso, caminhando pela orla passei com amigos em frente ao restaurante que você citou capítulos atrás, achei lindo.

Some não, querido, estarei aguardando ansioso pelos próximos capítulos.

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