DISCERE 2 - TEMPO DE AMAR - CAPÍTULO 6: JULGAMENTO

Um conto erótico de Escrevo Amor
Categoria: Gay
Contém 3452 palavras
Data: 05/10/2025 19:34:34

Era uma quinta-feira fria em São Paulo. As árvores do jardim da Escola Discere balançavam levemente com o vento, e o sol tímido tentava atravessar as nuvens. Valentim, Noah e os amigos estavam reunidos ali, lanchando de forma tranquila. A semana tinha sido cansativa, mas aquela pausa parecia um alívio.

Como poucos alunos haviam entregado o documento para a criação de clubes, a direção estendeu o prazo. Noah aproveitava cada segundo para lapidar sua proposta, a transformando em algo irrefutável. O notebook descansava sobre as pernas, enquanto seus dedos dançavam no teclado. Ele contava até com a ajuda do pai, que revisara o texto diversas vezes e lhe dera dicas valiosas para a defesa diante do conselho.

Já Valentim tinha outra missão: trazia no colo uma prancheta repleta de assinaturas. Estava organizando um abaixo-assinado para trazer de volta a Gincana dos Quatro Elementos, uma tradição da escola que quase fora esquecida. Enquanto Noah digitava concentrado, Valentim ensaiava mentalmente o discurso que faria aos pais, falando da importância da competição para a união dos alunos.

— Valentim, seu cachorro! — A voz estridente cortou o ar.

Todos se viraram na mesma hora. Kelly, do segundo ano "A", avançava como uma tempestade, os cabelos castanhos desgrenhados pelo vento e os olhos faiscando raiva. Antes que alguém pudesse reagir, ela pulou em cima de Valentim, desferindo pequenos tapas contra os ombros do rapaz.

— Que porra é essa?! — Ela gritou, ignorando os olhares curiosos dos outros estudantes.

— Kelly?! O que deu em você?! — Valentim tentou segurar os braços dela, assustado.

Breno, João Paulo e Karla correram para apartar a confusão. João Paulo agarrou Kelly pela cintura, enquanto Karla erguia as mãos em um gesto pacificador.

— Respira, Kelly! — Karla pediu, firme, mas calma. — Conta o motivo antes de arrancar a cabeça do Valentim.

Kelly respirou fundo, o peito arfando. Então, com os olhos marejados e a voz trêmula, disparou:

— Eu achei um aplicativo gay no celular do Walter.

O silêncio que se seguiu foi quase palpável. Todos pararam, a encarando sem entender nada.

— O quê?! — Perguntaram em coro, inclusive Valentim, que ainda tentava se recompor.

— E o que eu tenho a ver com isso? — Ele questionou, confuso.

Kelly arregalou os olhos, indignada:

— Ainda pergunta?! — Ela puxou o celular do bolso e mostrou a tela para o grupo. — Olha isso!

Na tela, estampado no perfil do aplicativo, estava o rosto de Valentim. E não era qualquer foto: eram imagens chamativas, algumas só de sunga, outras destacando o corpo sarado do rapaz.

Todos ficaram boquiabertos. Até Noah, que parou de digitar, encarando a cena incrédulo.

— Esse é você? — Perguntou Noah, cruzando os braços e arqueando uma sobrancelha.

Valentim gaguejou:

— Sim... digo, não! Quer dizer... a foto do perfil é minha, mas eu nunca entrei em nenhum aplicativo! Qual é, Noah! Você tem acesso completo ao meu telefone. Sabe que não é verdade!

Noah manteve a expressão séria por um instante, depois abriu um sorriso divertido:

— Eu sei. — Disse, com um tom quase provocador. — Mas é fofo te ver desesperado.

— Noah! — Valentim exclamou, indignado. — Foco aqui! Alguém tá usando minha imagem em um aplicativo de pegação. Não sei se fico desesperado... ou lisonjeado.

O grupo conteve risos nervosos. Noah, ainda sorrindo, pegou o celular de Valentim com naturalidade, desbloqueando com a senha certa.

— Kelly, eu acredito no meu namorado. — Ele exibiu a tela limpa para ela. — Tá vendo? Eu acesso o celular dele quase todo dia. Sei com quem conversa, sei os aplicativos que usa. Eu lamento que você tenha descoberto uma traição desse jeito, mas... o Valentim é tão vítima quanto você.

Kelly mordeu o lábio inferior, sem saber o que dizer. A raiva ainda estava lá, mas misturada à vergonha.

— Passa esses prints para mim, por favor. — Pediu Karla, já pegando o celular para salvar o contato da colega.

Valentim respirou fundo, pegando a mochila do chão com firmeza.

— Eu vou conversar com o Walter.

— Espera aí. — Noah fechou o notebook, se levantando sem hesitar. — Eu vou com você.

E os dois seguiram juntos pelo jardim, deixando para trás um grupo confuso, uma Kelly sem chão e uma tensão que prometia crescer ainda mais.

— Karla, eu preciso fazer um trabalho agora, mas me deixa informado de tudo. — Pediu João Paulo, antes de seguir para outra parte do jardim.

Enquanto Valentim tentava proteger a própria honra diante dos cochichos e provocações dos corredores, João Paulo seguiu sozinho até a horta do jardim do Instituto. O lugar era vasto, imponente, e ele ainda não havia se acostumado com a grandeza daquela instituição que parecia sempre maior do que a própria vida.

No local combinado, encontrou Narciso já acompanhado de uma pequena equipe de gravação. Entre eles estava Helena, a mãe do jovem, que coordenava tudo com o olhar atento e a postura exigente. Perfeccionista de carteirinha, ela parecia ter escolhido cada detalhe do projeto — das roupas ao roteiro — sem deixar escapar o menor detalhe.

Narciso estava concentrado, os dedos deslizando com certa hesitação pelos controles do pequeno drone. A cada movimento, o equipamento respondia no ar com precisão, pairando e girando suavemente, como se obedecesse a um maestro em aprendizado. Os olhos do rapaz brilhavam de empolgação, e um sorriso orgulhoso escapava em meio à sua concentração.

— Esse drone é demais, Sérgio. — Disse, quase sem tirar os olhos da máquina que se mantinha firme a poucos metros acima deles.

Sérgio, que ajustava outra câmera no tripé, riu da animação do colega.

— Sim. E graças a você consegui essa belezinha. — respondeu, enquanto verificava o foco e a iluminação para o início da gravação.

João Paulo, sentado mais atrás, observava tudo com espanto. Esperava algo simples, talvez uma filmagem no estilo caseiro, mas a equipe parecia preparada para uma produção de verdade. O barulho suave das hélices, o tripé montado, os cabos espalhados, tudo mostrava que aquilo estava muito além do que imaginara.

— Ei, você me empresta o drone? — Narciso pediu, rindo, sem desgrudar os olhos do equipamento. — Eu juro que devolvo em perfeitas condições.

— Claro. — Sérgio ergueu uma sobrancelha em tom brincalhão. — E mesmo que você quebre, pode comprar outro melhor. — provocou, arrancando gargalhadas da pequena equipe que os acompanhava.

João Paulo apenas balançou a cabeça, entre divertido e impressionado. Se antes tinha dúvidas sobre o resultado final, agora começava a acreditar que o projeto ficaria muito além do esperado.

— Queridos, eu mandei fazer as fantasias sob medida. Espero que gostem, viu. Podem se trocar naquela sala. O jardineiro liberou para ser o camarim. — Pediu Helena, apontando para uma construção logo a frente.

Narciso e João Paulo se trocaram em silêncio, mas o frio da manhã cinzenta de São Paulo não dava trégua. João Paulo tremia nas bases, tentando controlar o corpo que insistia em denunciar sua vulnerabilidade. As câmeras também estremeciam sob as rajadas de vento, mas diante da lente, os dois jovens permaneciam firmes, como se o inverno não tivesse poder algum sobre eles.

Narciso trajava uma túnica negra que se apoiava em apenas um ombro, deixando o torso nu reluzir sob a fraca claridade. O tecido pesado caía até os pés, ornamentado por braceletes e um cinto dourado que lhe conferiam imponência quase divina, como se tivesse atravessado séculos diretamente de um templo grego.

João Paulo, em contraste, vestia o branco. Seu traje era curto, leve, expondo grande parte das pernas. O pano, de discretos bordados geométricos, estava preso por um broche no ombro e descia em pregas soltas, mais próximo de uma toga improvisada do que de um figurino planejado. Sobre a cabeça, a coroa de louros completava a imagem clássica — ainda que destoasse do arrepio que marcava sua pele sob o vento impiedoso.

Ambos tremiam discretamente, mas mantinham a postura. O frio parecia zombar deles, lembrando a cada rajada que aquelas roupas pertenciam a outro tempo e outro clima, tão distantes daquele jardim colorido onde a gravação acontecia.

Apesar disso, as cenas foram rodadas. Primeiro, o encontro dos personagens, seguido pela caminhada até o pequeno lago no terreno do Instituto. A cada tomada, Narciso entregava falas e olhares intensos, mas João Paulo permanecia inquieto, mergulhado em pensamentos que iam além da câmera.

Quando a última cena foi finalizada, Narciso tentou se aproximar, arriscando dizer algo. Mas João Paulo não lhe deu espaço. Apenas pegou a mochila e se afastou, apressado, como se fugir fosse a única forma de conter o turbilhão em seu peito.

O coração batia forte. Como Narciso podia mexer tanto com seus sentimentos? Aquilo precisava ser o fim. Decidiu, entre passos rápidos, que não faria mais nenhum trabalho ao lado do colega.

Nos corredores da escola, a pressa lhe trouxe uma nova contradição: ainda trajava o figurino. Alguns riam, outros apontavam, e havia quem não resistisse em registrar o momento.

— Estava sem roupas em casa, José Pedro? — provocou Gabriel, levantando o celular para fotografar.

— Vai se lascar! — Esbravejou João Paulo, empurrando a porta do primeiro banheiro que encontrou.

Dentro, deixou escapar um suspiro trêmulo. Como podia haver tantas pessoas babacas naquele lugar?

***

Walter Godoy era filho de uma tradicional família de São Paulo. Carregava em si o peso do sobrenome, das expectativas e da reputação impecável que seus pais zelavam com rigor. Era um rapaz bonito, de traços delicados, mas de postura sempre contida. Reservado, quase tímido, escondia a verdade que nunca poderia ser revelada em casa: era gay. A família jamais aceitaria, e por isso ele vivia uma vida dupla, sustentada por aparências. Namorava Kelly, uma jovem querida por todos, mas que desconhecia os segredos que ele guardava.

Foi por isso que Walter recorrera aos aplicativos de relacionamento. Eram sua única janela para respirar um pouco de liberdade. Ali, atrás de uma tela, ele podia ser ele mesmo.

Naquela tarde, enquanto o pátio do Instituto fervilhava de conversas e risadas, Valentim se aproximou, sem graça, para falar com o colega. Walter, ao perceber o movimento, negou de imediato qualquer tentativa de diálogo. Não queria confusão, ainda menos chamar atenção. Porém, Noah interveio com um sorriso discreto, garantindo que seriam discretos. A firmeza no tom dele fez Walter hesitar — e, por fim, ceder.

Pouco depois, os três seguiram por corredores silenciosos até encontrarem uma sala vazia. O som da porta se fechando ecoou, e um clima de seriedade tomou conta do espaço. Valentim respirou fundo antes de começar:

— Walter... precisamos conversar sobre o que aconteceu.

Walter desviou o olhar, mas não demorou a admitir. Contou que, dois dias atrás, havia começado a trocar mensagens com alguém que acreditava ser Valentim. A surpresa foi grande quando viu o nome do colega no aplicativo, mas não achou estranho — afinal, já ouvira os rumores sobre a bissexualidade dele.

Para provar, tirou o celular do bolso e abriu o aplicativo. Mas, para espanto de todos, a conversa já não estava mais lá.

— Isso é impossível... — murmurou Walter, deslizando pela tela, perplexo.

Curiosos, Valentim e Noah se aproximaram, observando os perfis próximos. Noah foi o primeiro a reconhecer uma foto.

— Esse é o Ícaro Ramos? — perguntou, sem conter a surpresa, enquanto pegava o celular das mãos de Walter. — Eu sabia! — exclamou, se voltando para Valentim e mostrando o perfil aberto.

— Com licença! — Walter reagiu, puxando o aparelho de volta com firmeza.

Noah ergueu as mãos em um gesto de desculpas, esboçando um sorriso sem graça.

— Foi mal... fiquei curioso. Mas, por favor, se esse perfil fake voltar a te procurar, nos avise.

Valentim, que até então observava em silêncio, se aproximou de Walter. Colocou a mão em seu ombro com uma sinceridade que quebrou o clima tenso.

— E cara, eu já estive nesse lugar... — disse em tom baixo, mas firme. — Faça aquilo que for melhor para você. Se agora for difícil, aguente mais um pouco, mas seja fiel a si mesmo.

Walter o olhou nos olhos, como se aquelas palavras tivessem lhe atingido em cheio. Pela primeira vez, alguém falava com ele não com julgamento, mas com compreensão.

***

A tarde no Instituto Discere parecia interminável. Sem muitas opções, Valentim e Noah seguiram juntos até a secretaria. O corredor cheirava a papel e desinfetante, com alunos entrando e saindo apressados. Noah carregava uma pasta cuidadosamente organizada: dentro dela, a proposta para a criação de um clube queer, algo que ele vinha elaborando fazia semanas.

Já Valentim segurava um maço de folhas amassadas, fruto de horas de pesquisa sobre os benefícios da prática de exercícios físicos, sua última tentativa de recuperar a tão amada Gincana dos Quatro Elementos.

Na secretaria, Noah foi o primeiro a ser chamado. O rapaz caminhou até o balcão, entregando seus documentos com calma. Enquanto falava com a funcionária, suas palavras eram firmes, recheadas de dados sobre saúde mental, diversidade e a necessidade de acolher jovens da comunidade LGBTIAP+. Ele parecia no controle, como se cada frase fosse ensaiada. Valentim, por outro lado, aguardava a sua vez com o coração disparado. Ele ajeitava e rearrumava os papéis repetidas vezes, tentando esconder o suor das mãos.

Logo chamaram seu nome. Valentim entrou na sala destinada ao conselho de pais. O ambiente parecia mais hostil do que ele imaginara: três mulheres e dois homens estavam sentados em fileiras organizadas, o olhando como juízes prestes a dar um veredito. Nenhum sorriso, apenas expressões frias. Ele engoliu seco.

Respirando fundo, começou seu discurso.

— A adolescência é uma fase de várias transformações estruturais e funcionais. — disse, a voz inicialmente firme. — O exercício físico é capaz de promover plasticidade adaptativa sobre o sistema nervoso, reduzindo os riscos de futuras patologias psiquiátricas...

Antes que pudesse avançar, uma das mulheres levantou a mão e interrompeu.

— Tem certeza de que está fazendo isso pelos motivos certos, jovem?

— Como assim? — Confuso, Valentim encarou a mesa.

A mesma mulher passou o celular aos colegas, que franziram as sobrancelhas, cochichando entre si.

— Acabamos de receber uma mensagem. — Continuou ela. — Dizendo que o aluno Valentim Almeida Cardoso está usando um aplicativo de relacionamento dentro da escola. Isso é sério?

O sangue lhe fugiu do rosto. Ele tentou se aproximar, mas em seu nervosismo deixou cair todos os papéis no chão.

— Eu posso explicar...

— Querido, — Interrompeu a mulher, a voz carregada de ironia. — você não deve explicações a mim, mas à diretoria do Instituto Discere. — Ela segurava o celular à mostra, com a suposta denúncia em destaque. — Isso é muito grave. Você já é maior de idade, certo? Usar um aplicativo desses aqui dentro pode trazer consequências sérias. — Passe na sala do diretor, por favor. Sai pela outra porta, pois temos reunião com outro aluno. — Pediu.

Derrotado, Valentim recolheu seus papéis às pressas e deixou a sala com os olhos ardendo de vergonha. Poucos minutos depois, já se via diante da mesa do diretor Fernandes.

— Lamento que esteja passando por essa situação, Valentim. — Disse o homem, tirando os óculos e esfregando os olhos cansados. — Mas vamos precisar investigar o caso. Primeiro a sabotagem na Gincana, agora isso... — Suspirou, quase com nostalgia. — Saudades do tempo em que vocês só comiam terra e corriam de um lado para o outro.

Enquanto Valentim recebia apenas humilhações, Noah colhia o primeiro reconhecimento em meses. Sua proposta para o clube queer foi protocolada pela mesma mulher que havia interrogado Valentim. Noah falava com convicção sobre estatísticas de violência, os riscos de suicídio entre jovens LGBTIAP+, e a importância de debater diversidade e saúde mental dentro da escola.

— Parabéns pela sua contribuição, Noah. — Disse a mulher com um sorriso discreto. — Tenho certeza de que, sendo filho de quem é, conseguirá levar esse clube adiante. Mas qualquer pauta precisa ser alinhada com o grêmio estudantil.

Na mesma hora, o coração de Noah pesou. Isso significava lidar com Gabriel, e essa era a última pessoa com quem ele gostaria de negociar.

Mais tarde, vagando pelos corredores, Noah encontrou Valentim sentado sozinho no jardim com toda a atenção voltada para o croche. O sol já se punha, projetando sombras longas sobre a grama.

— Oi, velhote! — chamou, tentando animar o namorado.

Valentim ergueu o rosto devagar sem parar de crochetar.

— Ah, oi, amor.

Noah se sentou ao lado dele, percebendo a desolação em seus olhos.

— Que desânimo é esse?

— Deu tudo errado. — Valentim contou. — Me atrapalhei todo, deixei os papéis caírem no chão. E, pra piorar, aquele perfil falso chegou até o conselho. Acabei de sair da sala do diretor...

Noah arregalou os olhos.

— Pera aí, eles estão achando que o perfil é realmente seu? Isso é ridículo!

— Sei lá. — Valentim deu de ombros. — Desde que me assumi, parece que todos passaram a me julgar mais. Nem quero lembrar o escândalo que foi na família do meu pai.

Nesse momento, o celular de Valentim vibrou.

— O motorista chegou. — Valentim colocou os materiais dentro da mochila. — Quer carona?

— Não. — respondeu Noah, levantando-se de repente. — Preciso pegar uma coisa na biblioteca.

Ele saiu apressado, sem olhar para trás. Valentim tentou chamá-lo.

— Noah, espera! — ergueu a voz, mas o namorado já estava distante.

Então, ao abaixar o olhar, percebeu o celular de Noah esquecido no banco. Pegou o aparelho nas mãos e suspirou, com a estranha sensação de que aquele pequeno descuido mudaria mais coisas do que imaginava.

***

De saco cheio. Era assim que Noah se sentia. O peito estava pesado, os passos apressados. Já não suportava mais a sensação de estar sendo observado a cada corredor que cruzava. Procurou em todo canto: salas de aula, biblioteca, até mesmo o refeitório. Nada. Até que, ao virar no corredor do grêmio, o viu.

Gabriel Portugal. O ex-namorado. O mesmo que havia destruído seu coração e parecia, agora, empenhado em acabar também com sua paz. Noah parou por um instante, os punhos cerrados, o ar preso na garganta. Tudo tinha que acabar.

Gabriel estava à vontade, rindo e conversando com Vitória, uma colega do conselho de pais. Sobre a mesa, uma pilha de papéis com os clubes recém-aprovados.

— Ei, você! — A voz de Noah ecoou firme, chamando a atenção dos dois.

Gabriel ergueu os olhos lentamente, aquele velho ar de superioridade estampado no rosto.

— Olha só... finalmente tomou vergonha na cara e veio me pedir perdão?

— Pedir perdão? — Noah respirou fundo, sentindo a raiva pulsar nas têmporas. — Eu estou cansado, Gabriel. Cansado de ser perseguido.

Um sorriso torto se abriu nos lábios do outro.

— Perseguido? Você está histérico, Noah.

— O que você quer para me deixar em paz? Ou acha que eu não sei que tudo o que tem acontecido é culpa sua? A sabotagem na prova do fogo... e o perfil falso com a foto do Valentim.

Vitória arregalou os olhos.

— Noah, isso é muito sério. — Murmurou, se voltando para Gabriel.

Mas Gabriel já puxava o celular do bolso.

— Quer saber por que o Noah foi expulso da outra escola, Vitória? — perguntou, com a calma cruel de quem saboreava cada palavra. — Porque ele surtou. Me atacou na frente de todos.

Na tela, um vídeo começou a rodar. Vitória levou a mão à boca, horrorizada.

— Meu Deus, Noah...

Gabriel pousou a mão sobre o ombro dela, com um tom teatral de preocupação.

— Vitória, eu preciso conversar a sós com ele. Acho que está na hora de... nos perdoarmos.

— Tem certeza? E se ele te bater de novo? Melhor eu ficar. — Relutante, a jovem assentiu.

— Ele não vai ter coragem. — O sorriso malicioso voltou. — Deve estar medicado.

— Tá bem... mas me liga depois. — E desceu as escadas, os deixando sozinhos. Assim que o corredor ficou vazio, Gabriel suspirou alto.

— Ainda bem que aquela idiota já foi. — Disse, se aproximando de Noah. Antes que ele pudesse reagir, as mãos de Gabriel o revistaram com brutalidade.

— Me solta, idiota! — Noah se debateu. — Me diz logo o que você quer para me deixar em paz! — Os olhos de Gabriel brilharam com crueldade.

— O que eu quero? Eu quero isso. — O estalo ecoou quando sua mão atingiu o rosto de Noah, deixando a pele ruborizada. — Você sabe o trabalho que me deu? As justificativas que precisei inventar para o meu pai? Seu imbecil! Se tivesse ficado calado, eu não teria passado por nada disso. — Ele agarrou os cabelos de Noah, puxando com força. — Eu quero fazer da tua vida um inferno. Mesmo que isso signifique destruir a tua paz... e a de todos que estão ao teu redor. — A voz dele caiu num sussurro venenoso. — Sim. Eu sabotei a gincana. Eu criei o perfil falso do Valentim. E, quer saber? Carinha gostoso esse... Quem sabe não faço dele meu? Já que você é um fraco, incapaz de segurar um homem.

O sangue de Noah ferveu.

— Idiota! — berrou, revidando com um tapa tão forte que Gabriel caiu no chão, atônito.

O silêncio durou apenas um segundo.

— Noah... — a voz da professora Leda soou atrás deles, trêmula, a mão cobrindo a boca em choque. — Gabriel, você está bem?

Ela correu até o rapaz, o ajudando a se levantar.

— O que aconteceu aqui? — perguntou, a tensão pairando no ar como uma lâmina prestes a cortar.

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DESEJO DE CORAÇÃO QUE GABRIEL TENHA UMA MORTE HORRÍVEL.

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