Mas a nossa dinâmica havia se transformado. Éramos amantes, sim, mas a iniciativa ainda era sempre dele. As chamadas nas madrugadas continuavam, os encontros rápidos e intensos, sempre em seus termos. Mas agora as mensagens eram diferentes. "Preciso de você" havia substituído as ordens secas. "Vem aqui" havia se tornado "Você pode vir?". Pequenas mudanças que sinalizavam uma transformação profunda na maneira como ele se relacionava comigo. A linha entre o que éramos e o que poderíamos ser permanecia tênue, ditada por seus caprichos e pela minha inabalável, e talvez perigosa, disponibilidade.
Até que, depois de algumas semanas dessa nova normalidade, ele finalmente quebrou o silêncio. Estávamos sentados à mesa, a luz da manhã iluminando seu rosto, quando ele olhou para mim, os olhos cheios de uma angústia que me partiu o coração.
"Eu não sei como fazer isso". A confissão pairou no ar, carregada de um peso que eu mal podia compreender. Ele continuou, a voz quebrando ligeiramente, quase um sussurro. "Eu não sei como... como ser isso. Não sei lidar com essa situação." Ele parecia tão perdido, tão assustado. Eu queria dizer algo, qualquer coisa, para aliviar sua dor, mas as palavras não vinham.
Ao ver a confusão em meu rosto, ele balançou a cabeça rapidamente, como se quisesse apagar o que acabara de dizer. "Esquece. É bobagem da minha cabeça." Ele se levantou abruptamente, quebrando o momento, a máscara de indiferença voltando a se assentar em suas feições. Mas eu tinha visto. A rachadura em sua armadura. E sabia que, por mais que ele tentasse negar, algo fundamental havia mudado entre nós.
Nas semanas seguintes, percebi pequenas mudanças. Ele começou a segurar minha mão quando estávamos sozinhos no apartamento, os dedos entrelaçados com uma hesitação quase adolescente. Suas mensagens vinham com mais frequência, às vezes sem motivo aparente, apenas para saber como eu estava, o que eu estava fazendo. Uma vez, ele enviou uma foto de um prato que havia preparado, perguntando se eu gostaria de experimentar. Pequenos gestos que, vindos dele, pareciam monumentais. A máscara de indiferença estava se desfazendo, lentamente, mas de forma irreversível.
A academia havia se tornado nosso território neutro. Treinávamos juntos agora, ele me orientando nos exercícios com uma paciência que surpreendia a ambos. Havia uma intimidade nova nessas interações – a maneira como ele ajustava minha postura, como seus dedos se demoravam na minha pele mais do que o necessário, como ele sorria quando eu conseguia completar uma série difícil.
"Você está ficando forte," ele disse uma tarde, observando-me fazer supino. Havia orgulho na voz dele, como se meu progresso fosse também uma vitória sua.
"Bom professor," respondi, e vi o rubor sutil que ainda tomava conta de suas bochechas quando eu o elogiava. Mesmo depois de tudo que havíamos passado, ele ainda não estava completamente confortável com a ternura.
Foi algumas semanas depois que encontrei algo diferente ao chegar ao apartamento. Velas espalhadas pela sala, música suave tocando baixinho, e ele na cozinha, preparando o jantar. Estava nervoso – eu podia ver pela maneira como seus ombros estavam tensos, como ele evitava meu olhar.
"O que é isso?" perguntei, genuinamente surpreso.
"Eu... eu queria fazer algo especial," ele disse, ainda sem me olhar. "Para você. Para nós."
Era a primeira vez que ele fazia algo explicitamente romântico. A primeira vez que ele havia planejado algo que não fosse apenas sobre sexo ou dominação. Era sua maneira desajeitada de tentar expressar sentimentos que ele ainda estava aprendendo a reconhecer.
Jantamos em silêncio confortável, mas eu podia sentir a tensão crescendo nele. Havia algo que ele queria dizer, algo que estava lutando para encontrar coragem.
"Eu terminei com ela," ele disse finalmente, as palavras saindo apressadas, como se ele temesse se arrepender. "Eu... eu não podia mais. Não era justo com ela. Não era justo comigo... Não era justo com você."
Eu não sabia o que dizer. Parte de mim havia esperado por isso, mas outra parte nunca acreditou que ele realmente faria. A confirmação de que o que tínhamos não era apenas um caso, um desvio. Era real. Pelo menos para mim.
"Por quê?" consegui perguntar, a voz quase inaudível.
"Porque eu não consigo mais fingir que isso é só... só uma fase, ou curiosidade, ou qualquer outra coisa que eu tentei convencer a mim mesmo que era," ele disse, a voz firme apesar do tremor em suas mãos. "Eu quero tentar," ele continuou, seus olhos fixos nos meus. "Quero tentar ser... isso. Com você."
Seus olhos brilhavam com uma mistura de medo e determinação, como se estivesse saltando de um penhasco sem saber se havia água embaixo. Estendi a mão sobre a mesa e toquei a dele. Ele não recuou desta vez.
"Eu não sei como fazer isso," ele admitiu, a voz baixa. "Como ser... como ser o namorado de outro homem. Como lidar com o que as pessoas vão dizer, com o que minha família vai pensar..."
"Nós vamos descobrir," respondi, apertando sua mão.
"Juntos," ele completou, como se estivesse testando como a palavra soava em sua boca, e eu vi um leve sorriso se formar em seus lábios.
Ele me puxou para seus braços, me beijando com uma paixão desesperada, como se estivesse tentando comunicar anos de sentimentos reprimidos em um único beijo. Seus lábios eram macios, e eu senti a doçura de sua entrega, a rendição de alguém que finalmente parou de lutar contra si mesmo.
Quando nos separamos, ele encostou a testa na minha, os olhos fechados, a respiração ainda ofegante, como se tivesse tirado um enorme peso das costas.
Naquela noite, fizemos amor pela primeira vez. Não sexo, não dominação, não jogos de poder. Amor. Ele me tocou como se eu fosse algo precioso, como se tivesse medo de me quebrar. Havia uma reverência em seus movimentos, uma ternura que contrastava completamente com a brutalidade de nossos primeiros encontros. Seus olhos não se desviaram dos meus nem por um instante, como se quisesse me ver, realmente me ver, pela primeira vez. E quando terminamos, ele me segurou nos braços e sussurrou contra meu cabelo: "Fica. Sempre fica."
E eu soube, naquele momento, que o caminho à frente seria incerto, cheio de obstáculos e medos a enfrentar, mas que, finalmente, eu não estaria sozinho. Nós não estaríamos sozinhos.