Apaixonado pelo perigo: Outra vida | Capítulo 6: Precisamos conversar

Um conto erótico de Th1ago-
Categoria: Gay
Contém 3364 palavras
Data: 25/11/2025 17:37:18

Acordei com a luz atravessando a fresta da cortina e um zumbido leve na cabeça, o tipo de ressaca que vem mais do corpo do que da bebida. Por um instante, fiquei parado, olhando pro teto, tentando entender onde terminava o sonho e começava a lembrança.

Mas não era sonho.

A lembrança era nítida. O toque, o calor, a respiração ofegante... o jeito como o Samuel segurou meu rosto, firme, como se o mundo tivesse parado ali dentro do carro. Só de lembrar, senti o corpo reagir de novo e uma descarga quente correndo pela pele, o coração acelerando.

Me virei na cama, cobrindo o rosto com o travesseiro, tentando afastar as imagens que voltavam com força. Mas era impossível. Eu me lembrava de tudo.

De cada detalhe.

E, o pior, eu gostei.

Suspirei fundo, sentando na beira da cama.

“E agora, Yuri?”, pensei, passando a mão pelos cabelos bagunçados.

O quarto parecia pequeno demais pra caber o que eu sentia. Não era arrependimento — era algo mais confuso.

A dúvida vinha em ondas: o que aquilo significava? Tinha significado alguma coisa pra ele? Ou eu era só mais uma experiência em meio ao caos que ele parecia carregar?

Levantei e fui pro banho. A água caiu quente sobre a pele, escorrendo lenta, e por alguns segundos fechei os olhos.

O vapor tomava o box enquanto minha mente voltava pra noite anterior, pro instante em que ele me encarou de perto, os olhos queimando como se pudessem atravessar tudo o que eu tentava esconder.

Senti um arrepio.

Mesmo ali, sob a água, o corpo ainda lembrava o toque dele.

Me vesti rápido: camiseta branca, jeans escuro, tênis surrado. Peguei a mochila e parei um instante diante do espelho.

O reflexo me devolveu um rosto mais leve e eu percebi. Por mais que a confusão estivesse ali, misturada com o medo e a dúvida, havia também algo diferente em mim. Uma faísca.

Quando saí do quarto, encontrei o Erick na cozinha, encostado na bancada comendo um pão e mexendo no celular. Ele levantou o olhar e arqueou uma sobrancelha assim que me viu.

— Ué, acordou de bom humor hoje? — ele disse, rindo. — Milagre.

— Que bom dia simpática, desejo um ótimo dia pra você também — murmurei, pegando um copo d’água.

— Só tô observando — ele provocou. — Ontem você saiu meio... estranho, e hoje tá aí, com essa cara de quem ganhou na loteria.

Dei uma risada sem graça, desviando o olhar. — Besteira tua.

— Besteira nada — ele retrucou. — Eu te conheço, Yuri. Quando é que vai me contar o que aconteceu?

Fiquei em silêncio por um tempo. Olhei pra ele, que me encarava com aquele ar de irmão mais velho curioso, e acabei soltando, meio sem pensar:

— Eu fiquei com o Samuel.

O barulho do pão caindo no prato foi o único som por alguns segundos. Erick piscou devagar, claramente tentando processar.

— Com o Samuel? — repetiu. — Aquele cara que você disse que te deixa... confuso?

Assenti.

— E agora? — ele perguntou, o tom misto de surpresa e cautela. — Tá feliz ou arrependido?

Suspirei. — Nem uma coisa, nem outra. Acho que tô... tentando entender.

Erick ficou me olhando por um tempo, e o sorriso leve dele voltou, mas agora havia um toque de preocupação.

— Você sabe que esse cara tem um jeito meio... intenso, né? — disse ele. — Só toma cuidado, maninho. Às vezes, o que parece fogo pode queimar mais do que a gente aguenta.

— Eu sei — respondi, desviando o olhar. — Mas, sei lá... faz tempo que eu não me sentia vivo assim.

Ele se aproximou, deu um tapa leve no meu ombro e sorriu. — Então talvez já valha alguma coisa.

Sorri de volta, meio sem jeito, e fui até a porta. O sol lá fora batia forte, e o ar da manhã parecia mais leve que o normal.

Enquanto caminhava pra faculdade, não consegui evitar o sorriso que teimava em voltar. O corpo ainda lembrava o toque, a mente ainda repetia o olhar dele, e por mais que uma parte de mim gritasse que aquilo era confusão, outra parte sabia que eu já tinha cruzado o limite há muito tempo.

E talvez, no fundo, eu nem quisesse voltar.

Quando cheguei na faculdade, o sol já batia forte, daqueles que fazem a camisa grudar no corpo. Ainda sentia o cheiro do sabonete do banho, misturado com o perfume leve que passei antes de sair. Tentei me concentrar no caminho, no barulho dos carros, em qualquer coisa que não fosse a lembrança da noite passada… mas era impossível. Bastava fechar os olhos por um segundo e a imagem de Samuel voltava inteira — o toque, o calor, o gosto dele.

Suspirei fundo quando vi o Robinho encostado no portão, me esperando como sempre. Só que o sorriso dele hoje parecia meio nervoso, meio forçado, como se tivesse ensaiado.

— Fala, Yuri. Dormiu bem? — ele perguntou, ajeitando a mochila nas costas.

— Dormi… mais ou menos. E tu? — respondi, tentando parecer natural.

Ele deu um riso rápido, mas o olhar denunciava um certo incômodo.

— Queria te pedir desculpa por ontem… acho que eu tava meio estranho — ele disse, coçando a nuca.

— Que isso, Robinho, relaxa — tentei interromper, mas ele balançou a cabeça e fez sinal pra eu esperar.

— Não, deixa eu falar agora, por favor.

Ele me puxou pro lado, pro canto do pátio, onde quase ninguém passava naquele horário. A voz dele tremia um pouco, e eu fiquei só observando, meio sem saber onde aquilo ia dar.

— É que… eu fiquei pensando muito — ele começou, respirando fundo. — Sobre tudo. Sobre a gente. E eu não sei o que tá acontecendo comigo, sabe? Eu tô confuso pra caramba. Tinha coisa que eu queria te falar há um tempo, mas nunca soube como.

Os olhos dele estavam marejados, e eu podia sentir a tensão entre nós. O ar parecia pesado, mas ao mesmo tempo… eu sabia o que ele queria dizer.

— Robinho, calma, olha só...

— Não, deixa eu terminar, por favor — ele cortou, nervoso. — É que eu nunca me senti assim antes. Nunca senti isso por ninguém, entende? E eu...

Antes que ele conseguisse completar a frase, senti um toque firme na minha cintura. O corpo de Samuel encostou no meu por trás, e o cheiro dele, o mesmo da noite anterior me atingiu como um golpe.

— Bom dia, meu doutorzinho — ele disse, com a voz rouca, antes de me virar e me dar um beijo. Rápido, mas cheio de intenção.

Fiquei completamente sem reação. O Robinho congelou na hora. Ele ficou parado, olhando pra gente, e eu vi o olhar dele mudar, a confusão virou dor.

Samuel soltou uma risadinha e olhou pra ele, como se nada tivesse acontecido.

— E aí, parceiro, não vai pra aula hoje não? Ou quer dar uma volta com a gente? — perguntou, num tom leve demais pro momento.

Robinho forçou um sorriso, mas os olhos dele já não estavam mais ali.

— Acho que vou entrar pra sala — respondeu, seco. — A gente se fala depois, Yuri.

Ele se virou e saiu rápido, sem me deixar dizer nada. Fiquei olhando pra ele se afastar, com um nó no peito que eu não soube explicar.

Samuel me puxou de volta pela cintura, distraído, brincando com meu colarinho como se nada tivesse acontecido.

— Vem, deixa ele pra lá. A gente pode sair um pouco se quiser.

Mas eu só consegui olhar pro pátio vazio, pensando no que o Robinho queria ter dito… e no quanto aquele beijo, que ainda queimava nos meus lábios, tinha acabado de mudar tudo.

Samuel ainda segurava minha cintura quando o Robinho se afastou. Fiquei um tempo parado, tentando entender o que tinha acabado de acontecer.

— Vem, bora sair um pouco — ele disse, me puxando levemente. — A gente podia ir dar uma volta, tomar um café... qualquer coisa.

Balancei a cabeça, meio sem graça.

— Não posso. Tenho aula agora, e não posso ficar faltando, Samuel.

Ele riu baixo, encostando mais perto, os lábios roçando na minha orelha.

— Sempre tão certinho, hein? — murmurou. — Eu tô com muita saudade, sabia? Nem sei como consegui dirigir até aqui sem te puxar pra mim.

Quando percebi, ele já tava beijando o canto do meu pescoço. O toque quente dele me fez arrepiar inteiro, mas eu respirei fundo e segurei o braço dele, tentando afastar.

— Samuel… sério, não faz isso aqui. — Olhei pro lado, nervoso. — É faculdade, pelo amor de Deus.

Ele deu um sorriso torto, mas obedeceu, recuando um pouco.

— Tá bom, tá bom. Eu espero, doutorzinho. — Deu um passo pra trás, abrindo um sorriso leve. — Fica tranquilo, te deixo cumprir suas obrigações.

Revirei os olhos, rindo de leve.

— Você não trabalha não, garoto?

— Hoje, não. Tirei o dia pra te sequestrar no almoço. — Ele piscou, caminhando de costas até o carro. — Vai lá, depois me liga que eu tô te esperando.

Fiquei olhando enquanto ele entrava no carro, ainda com aquele ar confiante, como se nada o abalasse. Respirei fundo e fui pro meu prédio.

Quando entrei na sala, o Robinho já tava lá. Sentado no canto de sempre, o olhar perdido, o caderno aberto, mas a caneta parada. Parecia longe, muito longe. Sentei ao lado, sem saber o que dizer. Ele nem olhou pra mim.

A aula passou arrastada, o professor falando alguma coisa sobre o estágio que começaria no quarto período apenas e eu fingindo que anotava, enquanto minha cabeça girava entre Samuel, o beijo, e o olhar de Robinho se afastando.

Quando o sinal tocou, ele foi o primeiro a levantar. Saiu quase correndo.

— Robinho! — chamei, indo atrás. — Espera aí, cara.

Ele parou, virou o rosto devagar, mas não conseguiu sustentar o olhar.

— Melhor a gente deixar pra conversar outro dia, tá? — disse, rápido. — Hoje eu não tô bem.

E antes que eu dissesse qualquer coisa, ele já tava indo embora.

Fiquei parado no corredor, com aquele gosto amargo de coisa inacabada. Foi quando ouvi uma voz animada vindo de trás.

— Olha quem tá com cara de quem virou a noite! — era o Erick, meu irmão, vindo com a Amanda.

— Que nada — respondi, forçando um sorriso. — Só tô cansado mesmo.

— Aham — Amanda respondeu, estreitando os olhos. — Cansado ou com cara de apaixonado?

— Ih, começou — Erick resmungou. — Deixa o cara em paz, Amanda.

Ela riu, batendo no ombro dele. — Ah, para. Só tô perguntando. — Voltou pra mim, curiosa. — E aí, vai almoçar com a gente?

— Hoje não dá. Já tenho alguém me esperando. — Falei meio distraído, arrumando a mochila.

Ela arqueou a sobrancelha. — Alguém? — repetiu, sorrindo. — E quem seria esse “alguém”?

Suspirei e apontei pra direção do estacionamento. Samuel tava lá, encostado no carro, de óculos escuros e o sorriso de sempre.

Amanda arregalou os olhos.

— Nossa, ele é um gato! — soltou, quase rindo. — Onde é que tu tava escondendo esse homem, Yuri?

— Não começa — falei, tentando disfarçar o riso.

— Ih, irmão — Erick brincou, batendo nas minhas costas. — Se eu fosse tu, levava ele pra almoçar logo antes que a Amanda resolva ir junto.

— Cala a boca, Erick. — Amanda empurrou ele, rindo. — Mas olha, Yuri… se tu não quiser, me apresenta, viu?

Revirei os olhos, rindo, mas no fundo meu coração já tava acelerado de novo. Só de olhar pra Samuel me esperando ali, encostado naquele carro, com aquele jeito provocante, eu sabia que o dia ainda tava longe de terminar.

— Nossa, Amanda — meu irmão falou sério. — Você fala isso na minha frente mesmo? Eu não sou nada pra você?

Ela riu alto. — Claro que não! Eu só tenho olhos pra você, bobo. — E virou pra ele, puxando-o pela camisa e dando um selinho rápido.

— Ai, gente… — reclamei, fingindo nojo. — Eu vou embora antes que comece um filme romântico aqui no meio do corredor.

— Vai lá, Romeu! — Erick gritou enquanto eu me afastava. — Manda notícias!

Balancei a cabeça e segui em direção ao estacionamento, tentando esconder o sorriso. Samuel me viu de longe e abriu os braços, num gesto exagerado.

— Até que enfim, doutorzinho! Já tava achando que ia me dar bolo.

— Eu? Nunca — falei, me aproximando. — Tava só fugindo de uma cena de romance adolescente.

Ele riu, me puxando pela cintura num movimento rápido, que me pegou de surpresa.

— Que bom, porque comigo o roteiro é outro. — E antes que eu pudesse reagir, ele encostou os lábios na minha bochecha, devagar, quase como um aviso.

Senti o rosto esquentar. Dei um empurrão de leve nele.

— Para com isso, Samuel. A Amanda ainda tá olhando, certeza.

— Deixa ela olhar, quem sabe ela aprende. — Ele piscou e abriu a porta do carro. — Entra logo, vai.

Quando sentei, ele já tava me observando com aquele sorrisinho de canto.

— E aí, onde a gente vai? — perguntou.

— Quer almoçar em algum lugar específico, ou posso te surpreender?

— Surpreender me dá medo — brinquei. — Mas eu tô com fome, então te deixo tentar.

Ele riu, ligando o carro.

— Gosto de um desafio.

Enquanto saímos do estacionamento, o vento batia pela janela aberta, trazendo o cheiro da praia próxima. Eu me recostei no banco, tentando não demonstrar o quanto aquele clima me deixava inquieto. Samuel olhava de relance pra mim.

— Dormiu bem?

— Dormi. — Respondi, rápido demais.

Ele ergueu uma sobrancelha.

— Tá com essa cara de quem sonhou de novo comigo, então.

Revirei os olhos. — Você é insuportável.

— Mas irresistível — completou, rindo. — Vamos pra um restaurantezinho na orla. Lugar tranquilo, boa comida, e uma vista que combina contigo.

— Vista que combina comigo?

— É — ele disse, me olhando rápido antes de voltar os olhos pra pista. — Bonita e difícil de ignorar.

Fiquei em silêncio por um instante, tentando esconder o sorriso idiota que insistia em aparecer. Ele tinha essa mania de jogar charme como quem respira, era algo natural, sem esforço.

— Se continuar assim, eu vou achar que você quer me conquistar, Samuel.

Ele deu de ombros, com aquele ar provocante.

— Eu ainda não conquistei? Achei que isso tudo era só um joguinho nosso — disse ele rindo.

Virei o rosto pra janela, fingindo que observava o mar.

— Aí você vai ter que lidar com o fato de que eu sou péssimo de jogo.

— Ótimo — ele disse, diminuindo a velocidade quando o farol fechou. — Sempre gostei de jogar no modo difícil.

O almoço passou rápido demais, talvez porque, pela primeira vez em muito tempo, eu não quisesse que o tempo passasse. O restaurante tinha uma vista incrível para o mar, as ondas quebrando suaves, o som misturado ao burburinho de conversas e talheres. Samuel escolheu uma mesa perto da janela, e, claro, esqueceu de sentar na frente como qualquer pessoa normal faria.

Ele puxou a cadeira ao meu lado, tão perto que eu conseguia sentir o perfume dele, uma mistura de sal, madeira e algo quente que eu não sabia nomear.

Durante todo o almoço, foi... fofo. Essa era a palavra. Samuel, o cara que exalava perigo, que falava com voz rouca e olhar de predador, estava sendo genuinamente carinhoso.

Às vezes me servia, às vezes colocava gelo no meu copo antes de encher de refrigerante, e o pior: toda hora dava um jeito de encostar em mim. Uma mão que descansava sobre a minha por alguns segundos, um toque no ombro, um gesto simples, mas suficiente pra deixar meu coração acelerado.

— Tá gostando? — ele perguntou, sorrindo, com o garfo suspenso.

— Tá ótimo — respondi, e não sabia se falava da comida ou da companhia.

Ele sorriu de canto, satisfeito com a confusão que me causava.

Quando terminamos, ele fez questão de chamar o garçom e pegar a conta antes que eu sequer pensasse em dividir.

— Eu pago — ele disse, já tirando o cartão da carteira.

— Samuel… — comecei.

— Nada de “Samuel”, doutorzinho. Hoje o convite foi meu.

Suspirei, meio sem graça, e deixei ele vencer dessa vez. O garçom se afastou pra trazer a maquininha, e foi aí que ele se virou pra mim, com aquele tom que sempre vinha antes de alguma provocação.

— Na sexta-feira tem um aniversário — começou, cruzando os braços na mesa. — É de uma amiga minha, a Mônica. Minha melhor amiga, na verdade. Eu queria que você fosse comigo.

— Eu? — franzi a testa, rindo. — Você quer me levar num aniversário dos seus amigos?

— Quero — respondeu, como se fosse a coisa mais óbvia do mundo. — Seria legal você conhecer o meu círculo, e eu garanto que vai se divertir.

— Sei não… — murmurei. — Não é meio estranho? Eles vão achar que a gente tem alguma coisa.

O sorriso dele se alargou.

— Mas a gente não tem, né? — perguntou, se inclinando um pouco mais perto. — Talvez seja isso que esteja faltando.

Senti o rosto esquentar antes mesmo de conseguir responder.

— Samuel… — chamei, num tom de aviso.

— Se quiser, eu ajoelho aqui agora e peço — disse, já apoiando uma das mãos na mesa, fingindo que ia levantar.

— Para! — falei, rindo, empurrando o braço dele. — Você é maluco!

— Um pouco — respondeu, divertido. — Mas só quando vale a pena.

Antes que eu pudesse dizer qualquer coisa, o garçom chegou com a maquininha e salvou meu constrangimento. Samuel ainda me olhava de lado, com aquele meio sorriso que dizia tudo sem precisar de palavras.

Enquanto ele passava o cartão, fiquei olhando a janela, o mar lá fora, o brilho do sol refletindo, o som distante das ondas. Eu fiquei tentando entender em que momento eu comecei a gostar tanto de estar ao lado dele.

No caminho de volta, o silêncio entre nós era confortável, daquele tipo raro, que não pesa. A cidade passava rápida pelas janelas, o sol batendo no vidro e o vento bagunçando um pouco meu cabelo. Eu ainda sentia o cheiro do perfume dele preso na minha roupa, e aquilo me deixava meio distraído.

Samuel dirigia com uma das mãos no volante e a outra apoiada perto do câmbio, tão relaxado que parecia dono do mundo. De vez em quando, ele virava o rosto pra mim, com aquele sorriso fácil que sempre me desmontava.

— Você não me respondeu — ele disse de repente, quebrando o silêncio.

— Não te respondi o quê? — perguntei, meio perdido.

Ele manteve os olhos na pista, mas o canto da boca se ergueu num sorriso leve.

— Se você aceita.

Por um segundo, meu coração travou.

— Aceito o quê, Samuel? — perguntei, com a voz meio embargada, nervoso, sentindo o rosto esquentar.

Ele riu, daquele jeito rouco e provocante. — Aceita ir no aniversário comigo na sexta, ué?

Revirei os olhos, tentando disfarçar o alívio e a vergonha.

— Idiota — murmurei, dando um leve empurrão no braço dele.

— Achei que você fosse dizer “aceito” com mais emoção — brincou, me lançando um olhar rápido antes de voltar pra estrada. — Quase parecia que tava esperando outra coisa.

— Você é impossível, sabia? — tentei rir, mas a voz saiu mais fraca do que eu queria.

— Só quando tô perto de você. — Ele disse isso tão naturalmente que eu nem consegui responder.

O carro seguiu em silêncio por alguns segundos, até que ele aumentou o som do rádio. Uma música calma começou a tocar, e o vento frio invadiu o carro quando ele abaixou um pouco o vidro. A luz do fim da tarde deixava tudo dourado, e por um instante, eu desejei que o tempo parasse ali.

— Você tem um jeito estranho de me deixar sem graça — confessei, olhando pra frente.

— E você tem um jeito bonito de ficar sem graça — respondeu.

A frase ficou no ar, como se o carro inteiro tivesse parado no meio daquela troca.

Quando chegamos à frente da faculdade, ele estacionou devagar. O motor ainda ligado, o som baixo, e a cidade continuava viva lá fora, mas ali dentro o mundo parecia menor, mais íntimo.

Ele virou o rosto pra mim, apoiando o braço no banco. — Então… sexta-feira?

— Sexta-feira — confirmei, tentando não sorrir demais.

Ele se inclinou um pouco, aproximando o rosto do meu, e por um instante achei que ele fosse me beijar ali mesmo, em plena porta da faculdade. Mas ele parou no meio do caminho, o olhar firme no meu.

— Boa aula, doutorzinho — sussurrou, com um tom que misturava carinho e provocação.

Eu abri a porta, ainda com o coração acelerado, e antes de descer, ouvi ele dizer:

— Ah, e se prepara… sexta vai ser uma noite que você não vai esquecer.

Fechei a porta tentando disfarçar o sorriso. E enquanto o carro dele se afastava, tudo que eu conseguia pensar era: o que esse cara tá fazendo comigo?

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