Na manhã seguinte, Sarah acordou com o som da porta da frente fechando - era sua mãe, Maria, saindo cedinho para o hospital. O apartamento estava quieto e cheiroso, com os raios de sol entrando pela janela da cozinha.
Sarah decidiu fazer café para todos. Enquanto a cafeteira chiava, ela arrumou a mesa, colocando o pão na cesta e a manteiga perto do mel - lembrava que Paulo gostava de café com uma colher de mel.
Quando ele desceu, já vestido para o dia, ela notou que ele parecia mais descansado.
"Bom dia!", disse Sarah, animada. "Peguei café fresco. A mamãe já saiu, mas deixou recado que você precisa levar o carro na revisão hoje."
Paulo sorriu, aliviado pelo ambiente leve. "Obrigado, Sarah. O café está ótimo." Ele se serviu e experimentou. "Com mel? Você lembra!"
"Claro! E o pão está fresquinho, comprei na padaria ali da esquina."
Ele se sentou à mesa, e os dois começaram a comer em um silêncio agradável.
"O bar foi movimentado ontem?", perguntou Sarah, por fazer conversa.
"Bastante! Teve até um grupo que veio comemorar aniversário. O Jonas - você lembra do nosso bartender? - quase não deu conta dos pedidos sozinho."
Sarah riu. "Parece que foi divertido! Deve ser legal ver tanta gente feliz no seu trabalho."
"É sim, mas também é cansativo", ele respondeu, tomando outro gole de café. "Hoje vou aproveitar para resolver a revisão do carro e depois descansar um pouco."
"Precisa de companhia para a oficina? Posso ir com você, tenho aula só à tarde."
"Que bom! Faz tempo que não conversamos", disse Paulo. "A gente pode passar naquela lanchonete que você gosta depois."
"Combinado!", respondeu Sarah, feliz com a perspectiva de passar um tempo com ele.
Enquanto terminavam o café, o clima era de descontração. Dois familiares aproveitando uma manhã tranquila juntos, sem pressa nem segundas intenções - apenas a simplicidade de uma convivência que poderia ser boa, se permitissem.
Foi numa quinta-feira chuvosa que ela foi ao bar pela primeira vez. "Esqueci a chave", mentiu para ele ao telefone. "Posso buscar a sua emprestada?"
O "Aguardente" era mais escuro e mais íntimo do que ela imaginara. Às quatro da tarde, estava vazio, exceto por um bêbado solitário no canto e o barman, um homem quieto chamado Jonas. Paulo estava no escritório minúsculo nos fundos, a cabeça iluminada pela luz azulada de uma planilha.
"Sarah." Ele pareceu genuinamente alarmado ao vê-la. "O que está fazendo aqui?"
"Preciso da chave, lembra?" Seus olhos percorreram o escritulo - as pilhas de papéis, a garrafa de uísque na escrivaninha, a foto dele com sua mãe, desbotada pelo sol. Um lugar sufocante para um homem que cheirava a liberdade e noites sem fim.
Ele pegou o chaveiro e estendeu a ela, mantendo a distância. Sua mão era grande, veiosa, capable de partir um homem ao meio, ela pensou. Capaz de uma delicadeza infinita.
"Obrigada." Seus dedos fecharam-se em torno das chaves, e por um segundo, em torno dos dele também. "É um lugar interessante. Cheio de histórias."
"É um trabalho, Sarah. Só isso."
Ela olhou para a foto. "Mamãe nem parece ela aqui. Está tão... feliz."
Ele não respondeu. O ar entre eles estava carregado de tudo que não era dito - da ausência de Maria, da tensão sexual que pendia como um vapor, do fato de que Sarah, agora uma mulher, era um reflexo perturbador e jovem da mãe.
"Preciso voltar ao trabalho", disse ele, finalmente.
"Claro." Ela deu meia-volta, sentindo seus olhos em suas costas enquanto saía. A vitória era um gosto doce e perigoso na sua boca