O Condomínio Villas da Aurora era, à primeira vista, um refúgio. Jardins bem cuidados, áreas de lazer impecáveis e uma vizinhança que prezava pela tranquilidade e boa convivência. No Acesso 7, no quarto andar, viviam Léo, 38 anos, um Sargento da Polícia Civil, e sua esposa, Sofia, uma talentosa arquiteta. Eles eram, para muitos, o casal perfeito do andar.
Léo e Sofia estavam vivendo um dos momentos mais doces de suas vidas: Sofia estava no sexto mês de gravidez, e a cada dia que passava, a ansiedade e a alegria de conhecer o pequeno Daniel preenchiam o apartamento. Léo adorava tocar a barriga de Sofia, sentindo os primeiros chutes, imaginando o futuro, os passeios de carrinho nos jardins do condomínio.
Mas, apesar da luz que o futuro filho trazia, Léo notava pequenas sombras. Sofia, embora grávida e bela, parecia cada vez mais absorvida por seu trabalho. As "reuniões essenciais" de arquitetura se estendiam por horas, e Léo sentia uma distância sutil crescendo entre eles. Ele atribuía isso ao cansaço da gravidez, às demandas da profissão dela, mas um alarme silencioso começava a tocar em seu interior. Ele era um policial; sua vida era feita de observar detalhes.
Seu melhor amigo e vizinho, Marcos, do Acesso 5, um advogado com um humor contagiante, sempre tentava dissipar as preocupações de Léo. "Relaxe, sargento! É a fase. Mulher grávida tem mil coisas na cabeça", Marcos dizia, rindo, enquanto brindavam na churrasqueira do condomínio.
Léo tentava acreditar. Tentava ignorar o perfume novo, mais intenso, que Sofia às vezes usava, ou a maneira como ela se esquivava de certas perguntas. Ele queria que a vida no Villas da Aurora fosse tão perfeita quanto parecia na superfície, especialmente agora, com Daniel a caminho. A ideia de que algo pudesse perturbar essa felicidade iminente era quase insuportável.
Apesar de seus esforços para ignorar as dúvidas, a mente de policial de Léo não podia desligar. Ele tentava se agarrar à sanidade, e seu único confidente era Marcos, o advogado do Acesso 5.
"Ela está grávida, Léo. É o estresse", Marcos repetia na churrasqueira, com seu sorriso largo e tranquilizador. A ironia cortava Léo agora, sabendo a verdade que estava por vir. Léo confiava tanto em Marcos que chegava a pedir conselhos sobre como lidar com a "frieza" de Sofia.
O padrão era sutil, mas persistente: as manhãs de quinta-feira. Sofia saía para uma "reunião crucial", e Léo, aproveitando um dia de folga inesperado, simulou uma ida à delegacia. Ele instalou uma microcâmera no vaso de flores da sala, direcionada para a porta do quarto. Era uma medida desesperada, nascida de um medo profundo que a felicidade que eles estavam construindo fosse uma fachada.
A espera foi um inferno de adrenalina e repulsa. Léo continuava beijando Sofia e sentindo o bebê chutar, mas por dentro, uma tensão crescente o consumia. O tesão de desvendar um mistério colidia com a angústia de destruí-lo.
Uma semana depois, uma nova quinta-feira amanheceu. Léo estava em casa. Eram 10h15. Sofia se despediu com um beijo rápido na bochecha, sua barriga de seis meses proeminente sob o blazer. Léo esperou. Dez minutos depois, seu celular vibrou. A notificação da câmera.
Léo viu a figura inconfundível do seu melhor amigo e vizinho, Marcos do Acesso 5, saindo de sua cobertura e caminhando casualmente pela calçada interna, rumo ao Acesso 7.
Marcos estava diferente. Não usava terno de trabalho, mas uma camisa polo de grife, casual e confortável. Ele parecia em casa. Ele parou na porta do apartamento de Léo. Marcos usou uma chave. A chave que, de alguma forma, Sofia havia lhe dado.
O choque atingiu Léo com a força de um soco no peito. Não era um estranho; era a personificação da confiança traída. O suspeito era real, e era a única pessoa que ele havia permitido ver suas vulnerabilidades. A traição agora se estendia além do casamento, aniquilando a amizade, a lealdade e a única âncora que ele achava ter no condomínio.