Entrei em casa de mansinho, achando que todos ainda estariam dormindo, mas, assim que adentrei a sala, dei de cara com Kaique, que encarava o espelho até perceber que eu havia chegado.
Ele olhou para mim, viu minhas mãos tomadas por duas cestas e riu.
— Queeee isso?? — perguntou, vindo me ajudar.
— Cafezinho especial para meus aniversariantes preferidos — respondi e dei um beijo na testa dele.
Colocamos as cestas na mesa e eu o abracei.
— Parabéns, meu amor! — disse-lhe, retirei-o do chão, girei pela sala e nos joguei contra o sofá.
— Obrigado, obrigado, obrigado — ele repetia sem parar, rindo.
Kaká pediu para a gente desmontar as cestas e preparar a mesa, e ficamos conversando.
— Por que despertou tão cedo? — questionei.
— Eu não estou conseguindo dormir direito porque estou muito feliz que a mamãe está grávida de novo — ele respondeu, com um sorriso gigante nos lábios.
— Será que tá pouco ansioso?! — brinquei.
— Mãe, a senhora acha que eu vou ter barba quando? — Kaique me perguntou, se encarando novamente no espelho.
Então era isso que o cara pelada estava fazendo quando cheguei, tentando encontrar alguma penugem em sua face.
— Difícil dizer, filho, mas com certeza não será hoje — brinquei.
— Com uns dezesseis? — ele chutou.
— Talvez dezessete — respondi, só de implicância.
— DEZESSETE? — Kaká me encarou, incrédulo.
— Ou dezoito — continuei tranquilamente.
— Meu Deus! — Kaique exclamou, preocupado, e eu não aguentei manter o personagem. Ri muito.
— É brincadeira, não sei… Com uns quinze anos, Lorenzo já tinha uns pelinhos na cara, mas varia muito. Pode ser antes, depois, pode não ter, pode ter muita… Por que a pressa? — questionei.
— Acho que vou ficar bonito de barba — ele respondeu, convencido.
— Você já é lindo sem, com vai dar um charme a mais — afirmei.
— A senhora acha que eu vou ser um homem alto, forte e barbudo? — Kaká me perguntou, se analisando novamente no espelho.
— Alto é difícil — comecei, rindo.
— Não quero ser um homem de 1,70 — ele lamentou.
— Qual o problema dos homens de 1,70? — questionei, achando graça do posicionamento dele.
Por um momento, Kaique ficou pensativo.
— Sabe aquele grupo do colégio? Não o da turma… — Kaká iniciou.
Quando Lana e Iury começaram a estudar no mesmo colégio que eles, Milena teve a ideia de que esse grupo fosse criado para que os dois fizessem amizades. Mais tarde, Mih e Kaká e alguns amigos deles também começaram a fazer parte. Ou seja, era um grupinho com a faixa etária variada, mas basicamente de adolescentes.
Eles usavam bastante para passar respostas de atividades, trabalhos e avaliações.
— Sei… O que rolou? — perguntei, desconfiada.
— Tinha um cara lá sendo… desnecessário… com uma garota, aí a tia Lana foi defender ela e disse que opiniões de homens de 1,70 não eram válidas e que nem homem ele era — Kaká contou.
— E o que você achou disso? — perguntei, prendendo o riso.
— Primeiro eu ri porque ele mereceu, mas depois fiquei pensando… Eu sou muito baixinho, não quero ser um homem de 1,70!!! — ele exclamou, sentando no sofá.
Eu me sentei junto com meu filho e tentei ao máximo acolher a indignação dele, mas todo mundo aqui tem que admitir que é uma indignação muito engraçada e típica de um adolescente.
— Meu amor, sua tia só quis dar um fecho no colega que provavelmente estava sendo chato… Não pilha nisso de altura, você é um menino gigante, todo mundo enxerga isso, e nem 1,70 você tem ainda — falei.
Kaique pareceu reflexivo com minhas palavras, mas logo um sorrisinho brotou em sua boca.
— E forte? — ele questionou, forçando o bíceps.
— Aí a gente dá um jeito, deixa esse caos de pandemia passar que eu vou te matricular em uma academia, combinado? — perguntei, e ele acenou positivamente com a cabeça.
— E a senhora vai ser minha parceira de treino? — Kaique perguntou, animado.
— Sim, vou te deixar fortão — respondi.
Visivelmente, Kaká ficou extremamente feliz. Estávamos subindo as escadas para acordar Júlia e Milena quando ele parou e virou para mim com outra questão.
— Mas e a barba? — perguntou, sem muita esperança no tom de voz.
— Huuuuuum… você tem muito cabelo. Qualquer coisa a gente corta um pouco e cola no seu rosto com superbonder! — brinquei, fazendo ele sorrir. — Para de se preocupar com coisas que você não pode controlar. Tudo tem o seu tempo, e você precisa viver cada fase com o que ela te oferece. Eu acho que você ainda vai ter barba, sim, e vai ficar ainda mais gatinho com ela.
Foi o suficiente para que ele terminasse o nosso curto percurso animado. Kaká correu até o quarto de Mih, e consegui ouvir o salto que ele deu na cama e as risadas logo em seguida.
— Parabéns, meu amooor — falei, abraçando a minha princesa.
— Obrigada, mãe!!! — ela agradeceu, se agarrando a mim.
Enquanto nós duas dávamos sequências de beijinhos nela, Mih completou, olhando nos meus olhos:
— Por tudo…
— Amo vocês e amo o amor de vocês. Sejam sempre assim, amigos — disse-lhes e os abracei.
— Eu sempre quis um irmão e ganhei um melhor amigo — Mih falou, beijando a bochecha do irmão, que se derreteu todo.
Fiquei alguns minutinhos ali com eles e, quando foram tomar banho, fui atrás da minha gatinha.
Juh dormia profundamente, agarrada ao travesseiro, os cabelos espalhados pela fronha, a respiração lenta e pesada de quem estava claramente em sono profundo. Deitei ao seu lado com cuidado, encaixando meu corpo devagar para não acordá-la, e fiquei ali apenas olhando. Passei a mão de leve pelo cabelo dela, em um carinho quase imperceptível, com pena de interromper aquele descanso gostoso que visivelmente ela estava tendo. Sorri sozinha e permaneci ali, quieta, admirando a beleza da minha esposa.
— Oi, neném — sussurrei, acariciando a barriguinha dela, e involuntariamente sorri novamente.
Milena e Kaique voltaram do banho pouco depois, cheirosos, de pijama, os cabelos ainda molhados. Entraram no quarto falando baixinho; os dois encostaram na cama, olhando para Juh.
— A mamãe ainda não acordou? — Mih cochichou.
— Não, fiquei com peninha de chamar — respondi, no mesmo tom.
— A gente vai descer para o café sem ela? — Kaká perguntou, meio chateado.
— Não… ela ia querer matar nós três — brinquei, e eles riram um pouquinho mais alto.
— Mamãe, acorda — Milena tentou, indo para o outro lado.
— Dá um beijo nela, mãe, que nem em um filme — Kaká sugeriu.
Eu ri, mas acatei. Afinal de contas, Júlia é a minha princesa e, às vezes, eu tenho a sensação de viver um verdadeiro conto de fadas ao lado dela.
Depois do terceiro selinho, um sorriso surgiu em seus lábios, e o quarto beijinho já foi recíproco.
— Missão concluída — avisei aos meus parceiros.
Juh abriu os olhos devagar, ainda meio perdida, piscando algumas vezes até entender a movimentação ao redor da cama. Quando o olhar finalmente encontrou os dois, o sorriso surgiu automaticamente. Ela esticou os braços e os chamou com as mãos.
— Parabéns, meus amores — ela falou, em um abraço, e deu vários beijinhos em cada um.
Eles estavam tão bonitinhos que eu peguei minha câmera e fiz uma foto, com a intenção de postar ao fim do dia.
— Dormiu bem? — Mih perguntou.
— Dormi — respondeu, simples.
— E o bebê? — Kaká quis saber, apontando para a barriga dela.
— O bebê não reclamou de nada, então acredito que dormiu bem também — Juh brincou.
— O café já tá pronto, a gente só tava esperando a senhora acordar — ele informou.
— Você parecia estar em um soninho tão bom que eu fiquei com dó de te acordar — falei e dei um beijo nela.
— Eu estava com saudade de você — Júlia disse, me puxando para mais perto.
— Eu também, fico pensando em vocês o tempo inteiro quando estou longe — falei.
— A senhora deveria parar de trabalhar um pouquinho — Mih falou, como se estivesse me fazendo uma proposta.
— É, eu concordo — Juh disse.
— E ficar mais com a gente — Kaká completou.
— Meu parceiro de treino não me apoia… — zoei.
— A mamãe tem que trabalhar para pagar minha academia ano que vem — Kaique falou, pulando o muro, e me fez rir.
Nós, então, tivemos que contar e explicar a nossa conversa de mais cedo para que elas entendessem o contexto. Conseguimos arrancar várias risadas delas.
— Eu amo trabalhar ajudando pessoas e adoraria passar mais tempo com vocês… É algo que a mamãe e eu conversamos sempre, e, como vem um neném aí ano que vem, com certeza irei diminuir o ritmo… Satisfeitos? — perguntei, passando o dedo nos lábios de Juh.
— Deixa que eu faço sua agenda ano que vem — Júlia brincou, e nós rimos.
No café, finalmente perguntei o que estava martelando na minha cabeça desde que os dois apareceram no quarto: por que tinham tomado banho e colocado pijama logo cedo?
Milena foi quem respondeu, com a maior naturalidade do mundo, dizendo que a ideia era passar o dia inteiro de pijama, afinal seria o tema da festinha.
Avisei, então, que o plano teria um pequeno ajuste, porque mais tarde sairíamos para dar uma passadinha e ver como estava o nosso bebê.
Foi o suficiente para a animação, que já estava alta, simplesmente explodir. Os dois surtaram juntos, começaram a falar ao mesmo tempo e, sem nem pensar duas vezes, saíram correndo para trocar de roupa, mesmo sabendo que a saída só seria à tarde.
Eles colocaram um filme e sentaram no tapete para assistir, depois arrumaram a decoração e a mesa.
Eu deitei no sofá na intenção de descansar um pouco. Me sentia bem exausta e precisava dormir, e foi o que fiz.
Quando acordei e peguei o celular, dei de cara com inúmeras fotos minhas com os piores efeitos possíveis… Com certeza teria volta!
— Esse bebê está me dando muito sono — Juh falou, deitando em cima de mim e bocejando.
— Quando a gente voltar do consultório, dá para você dormir um pouquinho — falei, fazendo carinho nas costas dela.
— Descansou? — minha gatinha perguntou, enchendo meu pescoço de beijinhos.
— Sim, quer gastar minha energia? — brinquei, apertando a cintura dela.
— Não, porque eu estou sem — ela brincou de volta.
A deixei contra o sofá, de frente para mim.
— Meus dedos são ótimos condutores — continuei.
— Huuuuum, guarde seus dedinhos — Juh falou, segurando minha mão.
— Melhor a gente ir ou vou te levar para a cama, e não vai ser para dormir — disse-lhe e roubei alguns beijos, enquanto ela ria das minhas gracinhas.
— Antes vai ver como ficou lindinho — ela disse, me direcionando para a varanda.
Milena e Kaique faziam os últimos ajustes com algumas lâmpadas e, realmente, estava muito bonito.
— Bora? — os chamei, e nem precisei fazer o convite duas vezes; eles logo grudaram em mim, animados.
No carro, fomos tentando achar uma maneira divertida de contar sobre a gravidez. Para isso, levamos um teste, contudo, era tudo o que tínhamos.
Mih queria que a gente tivesse se preparado melhor para poder fazer uma surpresinha, mas era o tempo que tínhamos e eu confesso que existia certa preocupação em mim para saber se esse neném estava bem.
Assim que chegamos, Juh avisou para ela que saiu depois de algum tempo sem entender o que fazíamos ali.
— Viemos te ver, não pode?! — Juh zoou.
— Claro que podem, mas aqui??? — ela respondeu, abraçando os meninos, e os parabenizamos.
— A gente veio aqui tentar fazer três coisas — anunciei.
— O quê? — Sabrine me perguntou.
— Convidar para o nosso aniversário hoje lá em casa — Kaká começou.
— Contar que a mamãe está grávida — Mih falou, dando pulinhos.
Nesse momento, Kaique entregou o teste nas mãos dela, e a pobi estava em choque.
— E tentar ver se está tudo bem com o bebê — Juh finalizou, passando a mão na barriga.
Sabrine ficou parada por alguns segundos, olhando para o teste na própria mão, como se o cérebro precisasse de um tempo a mais para acompanhar a informação. O sorriso não veio de imediato; primeiro apareceu a surpresa pura, escancarada no rosto dela, os olhos indo do teste para Juh, depois para a barriga, e só então para mim. Eu percebia que ela queria muito dizer algo, mas não conseguia.
A gente ria sem parar da reação, e ela foi reagindo aos poucos.
— Vocês conseguiram… Deu certo! — Sabrine falou, nos abraçando.
— Muito obrigada por cruzar nossas vidas e nos ajudar tanto. Se a gente conseguiu, muito foi por quem você foi para nós — agradeci, e ela só me apertou mais forte.
Sabrine nos puxou para dentro e nos colocou direto em uma sala à meia-luz.
Juh se acomodou na maca, com um sorriso lindo que misturava nervosismo e expectativa, enquanto a nossa amiga preparava os equipamentos com um cuidado diferente; não parecia que ela fazia aquilo todos os dias.
Mih e Kaká ficaram bem próximos, um de cada lado, extremamente atentos a tudo.
Quando a imagem começou a se formar na tela, Sabrine inclinou levemente o monitor para que todos pudessem ver.
— Aqui… Isso é o saco gestacional. E aqui dentro já está o bebê — ela iniciou, sorrindo.
Milena arregalou os olhos, se aproximando mais.
— Ele é pequenininho assim mesmo? — perguntou, quase em um sussurro, como se estivesse com medo de dizer algo errado.
— É, Mih, bem pequenininho ainda, mas está exatamente do tamanho esperado — Sabrine respondeu.
Kaique franziu a testa, concentrado, tentando entender cada detalhe da imagem tremida.
— Ele tá mexendo? — quis saber, empolgado.
— Ainda são movimentos bem sutis — ela explicou. — Mas olha aqui… — ajustou um pouco o aparelho. — Viu esse pontinho piscando?
Os dois assentiram ao mesmo tempo. Pareciam hipnotizados.
— Aquilo é o coraçãozinho — Sabrine completou.
No instante seguinte, o som preencheu a sala. Rápido, forte, constante. ERA A VIDA!
Juh levou a mão à boca na mesma hora. Os olhos marejaram e ela respirava fundo, tentando não chorar.
Kaká e Mih seguravam a mão um do outro bem forte, completamente emocionados, sem desgrudar os olhos da tela.
As lágrimas vieram antes que eu pudesse pensar em qualquer coisa. Quando percebi, elas já escorriam pelo meu rosto… Aquele sonzinho, a cena dos meus três filhos ali… Nossa vida passou inteira na minha cabeça. Enfim, havia dado certo. O bebê estava bem e, com fé em Deus, cresceria forte e saudável. Pelo menos era assim que eu desejava.
— Tá ouvindo, mamãe? — Milena cochichou, com a voz vacilante.
Juh apenas assentiu, chorando em silêncio.
Dei um selinho bem demorado nela. Eu não conseguia dizer muito, apenas sentir, e tinha certeza de que ela entendia o meu silêncio.
— O coração está ótimo, ritmo perfeito, tudo dentro do esperado. O neném está muito bem. AAAAAAAAAAAAA, PARABÉNS!!!! — Sabrine disse, olhando para nós.
— Então ele está bem mesmo, não é, tia? — Kaká perguntou, respirando aliviado.
— Muito — ela confirmou.
Juh segurou minha mão com força. Ainda estávamos emocionadas demais para falar qualquer coisa.
Fiquei ali, ouvindo aquele som, apreciando aquela imagem, tentando gravar cada segundo na minha memória… E então lembrei de puxar o celular e fazer um registro em vídeo daquele momento. Eu queria mostrar para todo mundo a maravilha que estávamos vivendo.
Enquanto ainda tentávamos nos recompor, Sabrine seguia naquele equilíbrio perfeito entre amiga e médica. Com alguns cliques rápidos e um olhar atento, explicou com calma que o IMC de Juh estava um pouco abaixo do ideal e que, justamente por isso, o pré-natal precisaria ser ainda mais acompanhado.
Pediu uma bateria de exames de rotina e foi listando os próximos passos. Encaminhou Juh para uma nutricionista, falou sobre a importância de ganhar peso de forma saudável, comentou sobre vacinas que precisariam ser atualizadas e sugeriu acompanhamento com outros profissionais ao longo da gestação.
Indicou fisioterapia pélvica, explicou os benefícios do pilates para gestantes, reforçou a caminhada leve, exercícios adequados para cada fase, priorizar o descanso e repetiu mais de uma vez a importância de beber bastante água.
Eu estava extasiada, e nada soava assustador. Pelo contrário, era extremamente acolhedor. Juh ouvia tudo atentamente, assentindo, e eu sentia uma tranquilidade enorme em saber que aquele cuidado vinha justamente de alguém que conhecia nossa história e que era gostosinho demais tê-la conosco.
— Quantos quilos eu preciso pesar? — Júlia perguntou.
— Não vamos pensar assim para não gerar ansiedade. Só quero que você marque com a nutri e siga a dieta que ela passar. Vai ser mais saudável, e também não é nada alarmante. Por pouco você não está dentro do limite estabelecido — ela informou, acariciando a cabeça da minha muié.
~ Para melhor compreensão: ela estava pesando 45 kg 😶
Apesar desse leve (literalmente) detalhe, saímos de lá flutuando, envolvidas de felicidade. Kaká e Mih foram o caminho de volta inteiro olhando o vídeo que fiz e comentando como foi um dia especial... E o dia nem tinha terminado ainda!
Posso dizer que foi uma gravidez diferente da anterior, mais calma, com certeza. Desafiadora, mas sem tantos enjoos, infelizmente sem o tradicional foguinho matinal e Juh não ficou tão sensível emocionalmente. Houveram novos obstáculos, muito sono, questões que a gente nunca havia vivido e também não deixaram de acontecer certas situações engraçadas, que eu farei questão de contar para vocês!
🥭
