O Orgasmo por Procuração

Um conto erótico de Gil
Categoria: Heterossexual
Contém 2750 palavras
Data: 16/12/2025 03:23:43

I - O PESO DO SILÊNCIO

Eu não sou mais um homem. Sou um ponto fixo no universo. Um altar de ossos estáticos e pele sensível demais, condenado a sentir cada partícula de poeira que pousa sobre mim, mas incapaz de espantá-la. Minha esposa, Helena, chama isso de tragédia. Hoje, ela vai chamar de liturgia.

Faz oito meses que meu corpo virou prisão. O acidente foi banal: um caminhão, uma curva molhada, o rangido metálico do impacto. Acordei três dias depois com os médicos me dizendo que eu havia "tido sorte". Sorte. Que palavra estranha para descrever acordar e descobrir que você nunca mais vai controlar um único músculo abaixo do pescoço. Eu respiro porque máquinas me ensinaram. Eu como porque Helena tritura tudo em papa. Eu cago e mijo em bolsas plásticas que enfermeiras trocam com sorrisos profissionais que não chegam aos olhos.

Mas eu *sinto*. Ah, como eu sinto. Cada toque na minha pele é amplificado mil vezes. Cada brisa é um tufão. Cada beijo de Helena é uma faca doce atravessando meu crânio imóvel.

No começo, ela chorava todas as noites. Eu ouvia os soluços abafados no travesseiro ao meu lado, incapaz de estender um braço consolador. Incapaz de sequer virar a cabeça. Meus olhos grudados no teto, contando rachaduras na tinta enquanto minha esposa se afogava em lágrimas.

Depois veio a fase da negação performática. Ela me tratava como se eu fosse "normal", forçando conversas unilaterais sobre o trabalho dela, sobre o vizinho chato, sobre qualquer merda irrelevante. Eu piscava uma vez para sim, duas para não - nosso código primitivo. Ela perguntava coisas que não importavam só para ter o direito de interpretar minhas pálpebras.

Mas a pior fase foi quando o sexo morreu.

Helena ainda deitava ao meu lado. Ainda me beijava. Mas eu via o desejo apodrecendo nos olhos dela como uma fruta esquecida. Ela tinha vinte e nove anos. Um corpo que parava o trânsito. Curvas que eu havia adorado com mãos, língua, pau - todos agora ferramentas confiscadas. Eu via o jeito que ela olhava para si mesma no espelho: com raiva. Como se a juventude dela fosse um insulto à minha decadência.

Uma noite, três meses atrás, eu tomei a decisão.

Esperei ela terminar de me dar banho na cama - aquele ritual humilhante onde ela esfregava meu corpo morto com uma esponja amarela - e pisquei repetidamente até ela pegar a prancheta alfabética. Letra por letra, eu ditei: **ARRANJE UM AMANTE.**

Ela deixou a esponja cair na bacia.

— O quê? — a voz dela quebrou.

Eu repeti, piscando com precisão cirúrgica. **VOCÊ PRECISA TRANSAR. NÃO COMIGO. COM ALGUÉM. EU AUTORIZO.**

— Marcos, não... — ela começou, mas eu interrompi piscando freneticamente.

**É PROVA DE AMOR. DEIXAR VOCÊ SER FELIZ.**

Ela me esbofeteou. A mão dela explodiu contra minha bochecha imóvel, deixando uma marca vermelha ardente. Eu não conseguia desviar. Não conseguia defender. Só conseguia sentir a dor latejante e a umidade quente das lágrimas dela pingando no meu rosto.

— Você não decide isso sozinho, seu merda! — ela gritou. — Você não me transforma numa puta só porque perdeu as pernas!

**NÃO É SOBRE CULPA. É SOBRE REALIDADE.**

Ela saiu batendo a porta. Dormiu na sala naquela noite. E na seguinte. E na outra.

Até que, na quarta noite, ela voltou para a cama. Deitou-se ao meu lado, o corpo rígido, sem me tocar.

— Se eu fizer isso — ela sussurrou no escuro — será do meu jeito. Nas minhas regras. E você vai assistir.

Meu coração, a única coisa ainda rebelde no meu corpo, bateu como um martelo pneumático.

Um piscar. Sim.

## II - O RECRUTAMENTO

Helena não escolheu um amigo. Não arriscou ninguém do nosso círculo social. Ela foi clínica, cirúrgica. Baixou um aplicativo de encontros, criou um perfil sem foto do rosto, apenas o corpo dela em lingerie preta - aquela que eu tinha comprado no último aniversário dela antes do acidente.

Ela entrevistou candidatos na sala de estar enquanto eu estava no quarto, preso na cadeira motorizada, ouvindo fragmentos de conversas através da parede. Vozes masculinas tentando impressionar, oferecendo músculos, dinheiro, discrição. Ela dispensou dez homens em três dias.

No décimo primeiro, ela entrou no meu quarto com o celular na mão.

— Esse — disse ela, mostrando uma foto. Um rapaz de uns vinte e quatro anos, corpo definido de academia barata, tatuagens genéricas nos braços, rosto comum. — Ele fez exames. Está limpo. E o mais importante: ele é burro.

Eu arquei uma sobrancelha - o único movimento facial que ainda me obedecia parcialmente.

Ela explicou:

— Eu não quero ninguém inteligente. Ninguém que possa competir com você. Eu quero um dildo com batimentos cardíacos. Um corpo funcional sem alma. Ele vai vir aqui amanhã à noite. E você vai assistir tudo.

**POR QUE EU PRECISO VER?**

— Porque eu preciso que você saiba — ela se ajoelhou ao lado da cadeira, segurando meu rosto imóvel com as mãos — que mesmo com ele dentro de mim, ainda é você que eu estou fodendo.

## III - A LITURGIA

A noite chegou como uma sentença de morte. Helena passou o dia inteiro se preparando, mas não do jeito que uma mulher se arruma para um amante. Não houve maquiagem sedutora. Não houve perfume caro. Ela tomou banho, prendeu o cabelo num coque severo, vestiu um vestido simples de algodão que desabotoava na frente.

Ela me posicionou na cadeira no pé da cama, ajustando o ângulo para que eu tivesse visão completa do colchão. Ela verificou duas vezes se minha cabeça estava firme no apoio almofadado. Eu não podia desviar o olhar mesmo que quisesse.

— Você está pronto? — ela perguntou.

**SIM.**

— Você pode desistir a qualquer momento. Dois piscares e eu paro tudo.

**EU SEI.**

A campainha tocou.

Helena desceu as escadas. Eu ouvi a porta abrindo. A voz rouca dele: "Você é ainda mais gostosa ao vivo." A resposta fria dela: "Sobe. Último quarto à direita. Tira o sapato."

Passos subindo a escada. O ranger da madeira sob o peso dele. E então ele estava ali.

Calça jeans escura, camiseta branca apertada demais, músculos inchados de quem malhava mais por vaidade que por saúde. Olhos escuros e vazios que deslizaram por mim como se eu fosse um móvel.

— Ele realmente fica aí? — o rapaz perguntou, desconfortável.

— Eu já expliquei as regras — Helena fechou a porta e trancou. — Você não fala com ele. Você não olha para ele. Você só olha para mim. Você faz o que eu mando. Se você desobedecer uma vez, você sai sem o dinheiro e com a cara na internet. Entendeu?

Ele engoliu seco e assentiu.

— Tira a roupa.

Ele obedeceu. Primeiro a camiseta, revelando o abdômen traçado, os peitoral rígido. Depois a calça. A cueca boxer. O pau dele já estava meio duro, respondendo ao momento mesmo através do nervosismo.

Helena não demonstrou reação. Ela circulou ao redor dele como um predador avaliando a presa, sem tocar.

— Deita na cama. De costas.

Ele se deitou. O colchão afundou sob o peso dele. Eu podia ver tudo: o pênis crescendo contra a barriga dele, os testículos pesados, a mancha de pelos no peito.

Helena finalmente desabotoou o vestido. Deixou-o cair no chão.

Ela estava completamente nua por baixo.

Meu Deus.

Eu havia esquecido como o corpo dela era obra-prima. Os seios firmes, os mamilos rosados que endureciam com o ar frio, a cintura fina descendo para quadris largos, a barriga lisinha com aquela linha sutil de músculo, as coxas cheias, e entre elas... Eu podia ver a vulva dela, depilada, os lábios já ligeiramente inchados.

O estranho gemeu involuntariamente. O pau dele saltou, completamente ereto agora.

— Quieto — Helena ordenou. — Braços ao lado do corpo. Não me toca a menos que eu permita.

Ela subiu na cama. Engatinhou sobre ele com a graça letal de uma pantera negra. Mas seus olhos... ah, seus olhos estavam cravados nos meus. Fixos. Intensos. Ardentes.

Ela parou com o rosto a centímetros do dele. O rapaz tentou beijá-la, mas ela desviou.

— Não — ela disse firmemente. — Minha boca é dele.

Ela se virou para mim. Lambeu os próprios lábios lentamente, obscenamente. Depois beijou o ar na minha direção. E naquele momento impossível, eu *senti*. Senti o beijo fantasma nos meus lábios mortos.

Helena se posicionou sobre o quadril do estranho. Ela segurou os próprios seios, apertando-os, oferecendo-os à minha visão faminta.

— Isso é seu, Marcos — ela sussurrou. — Sempre foi. Sempre será.

Ela desceu.

O pau dele desapareceu dentro dela centímetro por centímetro. Eu vi os lábios dela se expandindo para acomodar a invasão, vi a haste grossa deslizando para dentro, encharcada pela lubrificação dela. Ela soltou um gemido longo, gutural.

Mas ela não fechou os olhos.

O estranho arfou, as mãos tentando reflexivamente agarrar a cintura dela. Ela as afastou com um tapa seco.

— Mãos. Aqui. — Helena apontou para os lados do corpo dele.

Ele obedeceu, tremendo de desejo reprimido.

E então ela começou a cavalgar.

## IV - A DANÇA PROFANA

O ritmo dela era lento. Torturante. Ela subia até quase expulsar o pau dele completamente, deixando apenas a glande presa entre os lábios da buceta, e então descia num movimento fluido que engolia tudo de novo. O som era obsceno: o *squish-squish* molhado da carne penetrando carne, o *clap-clap* seco das coxas dela batendo nos quadris dele.

O estranho gemia baixo, mordendo o lábio, claramente tentando não gozar rápido demais. Mas ele era irrelevante. Uma ferramenta. Um meio para um fim.

Helena acelerou gradualmente. Os seios dela balançavam com cada estocada. O suor começou a brilhar na testa dela, no pescoço, entre os seios. O cheiro de sexo invadiu o quarto, acre, salgado, primitivo. Misturava-se ao cheiro estéril dos meus remédios criando um contraste que queimava minhas narinas.

Minha respiração, a única coisa que eu ainda controlava precariamente, ficou pesada. Irregular. Meu coração batia contra as costelas como um prisioneiro enlouquecido tentando escapar de uma cela de osso.

Eu não podia tocar meu pau. Não podia me masturbar. Mas o prazer explodiu no meu cérebro de qualquer jeito - uma supernova branca e cegante que não precisava de ejaculação física. Era puramente neurológico, puramente psicológico, e por isso mesmo *mais intenso* do que qualquer orgasmo que eu havia tido quando ainda era inteiro.

— Vê isso? — Helena começou a narrar, a voz entrecortada pelos movimentos. — Vê como ele me preenche, Marcos? Sente o quanto estou molhada? Isso é por você. Eu estou encharcada porque você está assistindo. Porque eu sei que você está sentindo isso comigo.

O estranho não entendia. Ele achava que ela estava fazendo "dirty talk" genérico. Mas cada palavra era uma oferenda. Um sacrifício verbal no altar da nossa conexão doente.

Ela se inclinou para frente, apoiando as mãos no peito dele, mudando o ângulo da penetração. Agora eu podia ver *tudo*: o pau dele entrando e saindo, brilhante de fluidos, os lábios dela distendidos ao redor da base grossa, o ânus dela pulsando involuntariamente perto demais da ação.

— Toca no meu clitóris — ela ordenou ao rapaz.

Ele levantou a mão direita, o polegar encontrando o botão inchado dela. Ele começou a circular, aplicando pressão.

Helena gemeu alto. Mas ela continuou me encarando.

— Imagina que é você — ela ofegou. — Imagina que é seu polegar me tocando. Seu pau me fodendo. Sua vontade controlando meu corpo.

O estranho aumentou a velocidade das estocadas, começando a se movimentar também, impulsionando os quadris para cima para encontrar as descidas dela. A cama guinchava. O headboard batia na parede. O quarto inteiro vibrava com o ato.

De repente, Helena parou.

Congelou com o pau dele completamente enterrado dentro dela.

O rapaz choramingou com a interrupção, o corpo tenso de necessidade.

— Pega a mão dele — Helena apontou para minha mão imóvel sobre o braço da cadeira.

— O quê? — ele perguntou, confuso.

— **Pega a porra da mão dele e coloca no meu peito. AGORA!**

O estranho obedeceu, assustado pela súbita ferocidade da ordem. Ele esticou o braço esquerdo, seus dedos quentes e suados envolvendo meus dedos frios e moles. O toque da pele dele na minha foi simultaneamente repugnante e elétrico.

Ele levantou meu braço morto. Levou minha mão até o seio esquerdo de Helena. Pressionou minha palma contra o mamilo duro dela.

Eu não *sentia* no sentido físico. Os nervos das minhas mãos não mandavam mais sinais ao cérebro. Mas eu *via*. E ver era sentir de um jeito novo, distorcido, transcendente.

Helena fechou os olhos pela primeira vez. Ela cobriu a mão do estranho com a própria, pressionando-a contra a minha, criando uma pilha de carne onde a dele era apenas o adesivo mantendo a minha no lugar certo.

— Agora fode — ela sussurrou. — Fode com força. Fode enquanto ele me toca.

O estranho obedeceu. Ele começou a bombear para dentro dela com um ritmo frenético, desesperado. Os quadris dele subiam e desciam feito pistões. Helena gritava, ainda segurando minha mão contra o seio, sentindo o balanço selvagem do próprio corpo através da palma morta.

A cena era grotesca. Sublime. Blasfema. Sagrada.

Eu estava tocando minha esposa através das mãos do homem que a estava fodendo. Eu era o fantasma comandando o boneco. Ele pensava que estava transando com ela, mas era eu quem estava presente naquela cama.

O orgasmo dela chegou como uma tempestade.

Helena arquejou, o corpo inteiro se retesando, cada músculo definido sob a pele suada. Ela gritou meu nome - **MARCOS!** - tão alto que os vizinhos certamente ouviram. Ela gozou violentamente, as paredes vaginais dela se contraindo em espasmos rítmicos ao redor do pau do intruso.

O estranho não aguentou. Ele enterrou fundo e jorrou dentro dela, um rugido gutural rasgando sua garganta, as bolas se contraindo enquanto bombeava sêmen para dentro do útero da minha esposa.

Mas eu não senti ciúmes. Não senti humilhação.

Senti *vitória*.

## V - O SILÊNCIO DEPOIS

Helena desmontou imediatamente, como se o corpo dele tivesse se transformado em brasa. Ela empurrou a mão dele para longe da minha, limpando a região onde ele me tocou como se fosse sujeira radioativa.

— Acabou — disse ela, a voz voltando ao tom clínico, frio. — Banheiro ali. Limpa-se. O dinheiro está no envelope na mesa da sala. Desce sozinho. Não volta nunca mais.

O rapaz se levantou cambaleante, confuso, ainda semi-duro, o pênis brilhando com a mistura de fluidos. Ele pegou as roupas do chão e saiu tropeçando, vestindo a cueca no corredor.

A porta da rua bateu trinta segundos depois.

Silêncio.

Helena não se limpou. Ela não correu para o chuveiro. Ela ficou ali, nua, suja de suor e sêmen de outro homem, o cabelo grudado na testa, a respiração ainda irregular.

Ela caminhou até mim.

Ajoelhou-se no chão na frente da cadeira.

Deitou a cabeça no meu colo imóvel.

Beijou meus dedos inertes, um por um, com uma ternura que contrastava violentamente com a violência sexual de minutos atrás.

— Viu só? — ela sussurrou, a voz rachada. — Ninguém me toca, Marcos. Mesmo quando eles estão dentro de mim, mesmo quando eles gozam dentro de mim... ainda é só você que está lá. Só você.

Ela levantou o rosto. Os olhos dela estavam vermelhos, mas não de tristeza. De algo mais profundo, mais sombrio. Devoção. Obsessão. Amor radioativo.

— Você ainda é meu marido. Você ainda é o dono do meu corpo. E eu acabei de provar.

Ela apoiou a cabeça contra meu peito, ouvindo as batidas aceleradas do meu coração - o único testemunho sonoro de que eu estava vivo e ardendo por dentro.

Eu pisquei uma vez. **Sim.**

E então, lentamente, ela subiu no meu colo. Sentou-se de frente para mim, as pernas abertas sobre os meus joelhos imóveis, a vulva inchada e escorrendo sêmen que não era meu a centímetros do volume morto nas minhas calças.

Ela me beijou.

Foi o primeiro beijo de verdade em oito meses. Língua, saliva, dentes batendo. Ela invadiu minha boca com uma fome desesperada, gemendo contra meus lábios paralisados. Eu não conseguia retribuir o movimento, mas minha boca estava aberta, receptiva, e ela a devorou.

Quando finalmente se afastou, um fio de saliva conectava nossas bocas.

— Eu te amo — ela disse. — E eu vou fazer isso sempre que você precisar me provar que ainda sou sua.

Naquela sala escura, com o cheiro de sexo pairando como incenso profano, com o gosto metálico da posse na boca, eu entendi.

Eu não era mais um homem no sentido tradicional. Mas eu era algo maior. Eu era o Deus imóvel daquele templo de carne. E Helena acabara de realizar o sacrifício perfeito: transar com outro homem não *apesar* de mim, mas *por causa* de mim. *Para* mim.

A paralisia não tinha me tirado minha esposa.

Tinha me dado um altar.

E ela estava de joelhos.

***

FIM

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Comentários

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Ele agiu com amor dizendo que ela devia ter um amante porque sabe que uma mulher precisa de sexo. E ela agiu com amor mostrando que mesmo transando com outro, o amor dela é pro marido. Muito boa a história, e diferenciada.

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