As vendas no nosso Pet Shop iam bem, muito bem. O movimento era intenso e eu já programava uma viagem para a Europa com Estela, minha dedicada e adorável esposa por conta dos lucros daquele ano. Estela era maravilhosa, verdadeira cadela em casa, onde sabia bem roer um osso, e uma poodle na sociedade. Em um passado remoto, antes de nos conhecermos, ela, por conta de sua incrível força de sedução, havia feito um padre terminar seu caso com a Batina para se casarem. Batina era uma mulher gostosa, vendedora de CDs piratas que fazia ponto perto da paróquia onde o tal padre rezava suas missas. Além de abandonar essa pobre coitada, ele também abriu mão do sacerdócio para o qual havia feito votos eternos de castidade. Tudo por causa de Estela, essa mulher incrível. Mas toda essa loucura não deu muito certo porque o pároco já conhecia todos os pecados de Estela, que não eram poucos, pelas suas freqüentes idas ao confessionário. Então, para se livrar daquela fria ele acabou trocando a gata por um dos moleques que o ajudava com as hóstias. Eu acreditei que todo aquele passado sujo de meu amor, que incluía transas com quatro ao mesmo tempo, fodas em lugares como chafariz de parques, caçambas de lixo e até em ultraleves em pleno vôo, havia terminado. Pura ilusão.
Num desses dias chegando em casa, ouvi barulhos que vinham do quarto. Fiquei com a pulga atrás da orelha e fui dar uma olhada. Fiquei pasmo com o que vi: Petrus, um dos cachorros que cuidávamos no Pet Shop traçando Estela! Eu me dei um beliscão para ver se não era sonho. Era real, um pesadelo canino bastante real. O cão por cima, metia com vontade na bucetinha de minha mulher, de quatro na cama. Petrus era um pastor alemão que cuidávamos lá no pet shop. Não era bonito, mas tinha um certo charme que o diferenciava dos demais. Estela nunca o trouxera para casa. Mas agora ele estava lá, no meu quarto, sobre minha cama, com minha mulher, e o mais trágico: havia feito cocô no meu paletó Armani.
A traição é uma coisa que dói demais, magoa, entristece. Pensei em pegar minha espingarda de chumbinho e dar uns tecos no cão e na cadela, mas não era inteligente, pois eu poderia ser preso pelo IBAMA. Eu não poderia agir com raiva, até porque quem estava sendo mordida por um cão ali era Estela. Eu deveria agir como tantos cornos resignados agem: curtir o momento, curtir essa vida a três que dizem ser boa pra cachorro. Porém, essa também não era a minha praia. Corri para o escritório e peguei uma câmera fotográfica digital de alta resolução. Iria registrar todo aquele momento para mostrar para o padre, esse sim um corno!, com quem Estela fora casada durante anos. Tudo bem que eu era o marido atual, mas isso não vem ao caso.
Comecei a bater as fotos (e também uma punheta porque eu não sou de ferro). De onde eu estava os amantes não poderiam me ver. Eles faziam 69 e eu nas fotos. Espanhola, e tome fotos. De ladinho, e fotografia comendo solta. De repente o cão começou a pular latindo pra janela e eu fiquei curioso em saber que foda nova era aquela. Mas não era nada, era só o gato do vizinho que tinha passado por ali. Eram dezenas, centenas de fotos. Peguei um banquinho e sentei porque eu estava cansando e as fotos não podiam sair tremidas.
Então, ambos gozaram. Até que enfim, porque a bateria da câmera já estava pedindo arrego. Eu saí na ponta do pé para não levantar suspeitas do voyeurismo. Estela foi até a cozinha buscar um osso com sabor de bacon para Petrus pelo serviço bem realizado. Ao voltar para o cômodo, minha esposa parou perto da gaiola onde ficava nosso papagaio. Me assustei, pois achei que ela também fosse transar com a ave. Preparei a câmera, me posicionei. Nada. Na verdade ela só foi oferecer umas bolachas para o penoso para que ele, fofoqueiro como todo papagaio, não contasse aquela traição para mim, seu dono.
Eu estava disposto a acabar com tudo. E, naquele mesmo dia, quando nos encontramos à noite, contei tudo e ameacei mostrar as fotos para seu ex-marido, o padre, para que ele a exorcisasse. Ela chorou e pediu para continuarmos juntos, que não faria mais aquilo comigo. Eu disse que não aceitava, pois aquilo foi uma grande cachorrada, algo que não se faz nem com o melhor amigo. Então, ela falou, ah, é? e tirou do bolso umas fotos em que eu aparecia na cama com sua melhor amiga. Eu não sabia que ela tinha tirado essas fotos. O puto do papagaio já vinha sendo subornado desde essa época e não me contou nada também. Aí perdi a razão e ficamos bem. Cancelamos a viagem para a Europa pois ela queria conhecer na verdade a Disney (e o Pluto). O dócil Petrus continuou sendo tratado conosco na clínica e pet shop sem nenhum problema. O malandrinho até que andou tendo um caso com a nossa secretária certa época, mas aí já é uma outra história.
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Fiz essa paródia numa forma de homenagear bons contos que li aqui esse mês: Traição consentida, A mulher do padre e Petrus e a filhinha. Abraços, Mandarim.