E ela derrepente ressurgiu na sua mente, inabitada por anos de não-lembranças. Ressurgiu com aquele mesmo olhar enigmático. Ele se atordoou.
Era esquisito, pensava.
Uma lembrança tola, imprópria...
Seguiu.
Vasculhava por outras lembranças, pensamentos que entretecem, não queria pensar nela.
Pensava em seu trabalho. O que tinha de fazer amanhã mesmo?! Repassava papeis e textos mentalmente. Ao chegar em casa tenho de ler aquela apostila.
...Como seus olhos eram lindos...
Ela, novamente. Espreitando sua memória.
Até que era gostoso tê-la ali, ao menos ali, no intimo de suas divagações.
Não vale a pena pensar nisso, retrucava sua consciência. Voltava-se novamente à direção de seu carro. Ainda amargurava sua perda como a de uma parte de si próprio.
Faz tempo mesmo... Comentava para si. Como ainda pode persistir o vigor de sua imagem?
Ele a amou. Foi um amor singular, o primeiro. O mais intenso. O mais doloroso. O que nunca existiu.
Ficou nervoso consigo. Não queria pensar nela.
E quanto mais se censurava, mais ela ria. Em suas lembranças, ela ria. Quase sentia seu cheiro. Lutava contra a nostalgia. E seu sorriso era uma ironia a sua resistência. Se achava um estúpido!
Depois de tudo que ela fez. Como posso?
E sua alma evaporava a cada lembrança, como uma gota sob a brasa. Era muito forte, mais que sua existência. Era a rainha das suas vontades. Começava a se perguntar sobre aquele amor, tão forte que resistiu ao tempo. E a outros amores...
Entristeceu.
Chegou em casa, largou suas coisas, deitou-se à cama, quis chorar.
Não! Não seja idiota. Se agredia!
Não adiantava.
Ele era dela.
Se tornou desde que a viu pela primeira vez, descendo uma escada de colégio. Linda...
Como por contrato, toda sua ingenuidade foi tirada por ela. Exceto a de seu sexo.
Como queria tê-la encaixada em si, ao menos uma vez. A queria tanto! A queria muito!
Lágrimas escorriam, junto a sua excitação.
Tocava-se, e seu prazer se confundia à dor daquela saudade maldita.
Se tocava mais... se perdia...
A imagem vinha cada vez mais forte, por pouco uma manifestação da sua presença, com seus cabelos negros, compridos. Também chorava. A imagem chorava.
E ao tocar seu corpo, fingiu ser real.
Naquele dia se amaram, com toda dor da paixão perdida.
E enquanto a amava, seu peito doía. A xingava, se punia. Declamava seu amor, recitava sua agonia.
Estourou em gozo assim como em lágrimas. Se percebeu sozinho em seu auto-consolo. Sujo de seu prazer e exausto de seu sofrimento.
Foi permeado por um vazio que encheu seu pensamento.
Ficou ali... até que se limpou, pegou um lápis e papel e iniciou uma escrita;
E ela derrepente ressurgiu a sua mente...