Já fazia onze meses desde a morte de Roberto, Nelson foi uma companhia super gostosa. No início tentei continuar naquela névoa de sofrimento, mas o mano não era de entregar os pontos com facilidade e passou a inventar mil maneiras para me distrair. Aos poucos fui me reacostumando à alegria contagiante do Nelson, às brincadeiras, piadas e, principalmente, às comidas que inventava.
Terça-feira, 9 de julho de 1987
Nelson é um homem muito bonito: loiro, olhos esverdeados, alto e com uma inteligência que deixa a gente estonteada.
Aos poucos fomos alterando até mesmo as posições dos móveis. Era para dar nova forma à casa, falou brincando.
– Não sei o que seria de mim sem tua presença, Nelson – falei percebendo que já não havia tanto vazio em minha vida – Tua vinda melhorou meu astral!
Ele riu e me abraçou forte.
– Minha garotinha não pode ficar sempre triste... – senti o batucar de seu coração e uma estranha felicidade tomou conta de mim.
Conversamos muito sobre a vida e ele contou das experiências em João Pessoa e das aventuras no deserto mexicano.
– Tu ias adorar aquela gente... – estávamos sentado na varanda apertada do apartamento – Apesar de eu não entender quase nada do que eles falavam... – riu divertido das diabruras que ele e os amigos aprontaram por lá.
– E aí? Pintou alguma mexicana em tua cama?
Não sei por que perguntei, mas ele continuou brincando e não percebeu minha agonia crescente.
– Dei minhas pimbadas por lá! – se ajeitou na cadeira de macarrão e virou-se para mim – Juanita foi um achado e tanto!
– Tinha certeza que meu garoto ia deixar alguma suspirando por lá!
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Levantei entristecida.
– Que foi? Falei alguma coisa errada? – ele ficou sério e preocupado.
– Não! Eu é que ando meio carente ultimamente...
Nelson ficou um tempo olhando para mim antes de também levantar-se e entrar para a sala.
– Tu estais com saudades do Roberto, não é?
– Nunca deixei de sentir sua falta...
– Mas, e eu? – me encarou.
– Que tem?
– Tenho me comportado bem, não tenho?
– Já te falei que és maravilhoso... Não sei que faria sem você!
No dia seguinte mamãe veio nos visitar. Nelson havia saído para a faculdade e só voltaria no final da tarde.
– Como está a vida, minha filha! – mamãe me abraçou – Pelo que vejo já não é mais a bezerra desmamada que chora pelos cantos. – rimos e fomos para a copa.
– Graças a Deus que o Nelson veio... – falei enquanto coava café novo – Sem ele eu teria pirado!
Conversamos animadas e ela contou das novidades do papai e das lojas.
– Ele tem se comportado bem? – perguntou de repente e eu não entendi.
– Quem, mãe?
– Nelson! Quem mais poderia ser? – ela tinha um sorriso maroto estampado no rosto – Ainda não te atacou?
Fiquei chocada com o comentário.
– Quem me atacou?
Mamãe balançou a cabeça divertida.
– Ora, Ana Carolina! – passou o braço em meu ombro e fomos para a sala – Não me diga que não aconteceu nada?
– O que teria que acontecer?
Nos sentamos nas almofadas espalhadas pelo chão. Mamãe também casou muito nova e me teve antes dos dezesseis, naquele ano ela estava com 41 e continuava muito bonita, nem parecia que tinha um casal de filhos com 26 e 25 anos e que eu já era viúva.
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– Quer dizer que vocês estão morando nesse apartamento há quase um ano e nunca rolou nada? – parecia que ela não ia acreditar que éramos apenas irmãos e que Nelson jamais havia tentado nada – Porra garota! Na tua idade eu já tinha avançado o sinal...
– Que é isso mãe? – estava realmente estarrecida com o que ela falou – O Nelsinho é meu irmão?
– Nem uns amassinhos, uns toques? – ela estava rindo de mim – É difícil de crer nisso, minha filha.
Sempre fomos assim, não temos essa tal barreira das gerações. Foi mamãe quem me deu as primeiras dicas sobre sexo e me aconselhou em todos os momentos de minha vida.
– Você sabe que não tem essas frescuras conosco... – acarinhou minha cabeça – E que nunca escondi nada de vo-cê...
– Sei disso, mãe! – deitei em seu colo – Mas juro que nunca fizemos nada de errado...
Mamãe se encostou à parede e ficamos um tempão caladas.
– Tu não sentes tesão por ele? – quebrou o silêncio.
– Não como homem... A senhora sabe disso...
– Mas... – incentivou-me a continuar.
– Ele é um gato, não é mesmo? – sorri encabulada – Deve ser um garanhão na cama!
– Mas já pensou? Não pensou?
– Tem noite que sinto vontade de dar uma boa trepada... Mas... Fico morta de vergonha e me sinto uma depravada só de pensar nessas coisas – deitei de bruços apoiando o queixo nas mãos – O que a senhora faria?
Foi a vez dela perder o rebolado e a gaguejar sem saber o que responder.
– Sei não, filha! Nunca vivi uma situação com essa... – levantou arrumando a saia vermelha – Acho que deixava as coisas irem devagar...
– A senhora já praticou incesto?
Mamãe parou estática, notei que a pergunta tinha tocado bem dentro dela, mas ela não tinha irmãos, só duas ir-mãs: tia Ana, mais velha e a tia Clara, a caçula.
– Com quem?
– Com o vovô, por exemplo? – ela me encarou espantada, não esperava que eu mudasse o jogo.
– Não! O papai sempre foi muito respeitador... Nunca sequer se aproximou de mim, ou das meninas... – caminhou até a cozinha de onde voltou com uma garrafa de vinho e dois copos de pé – Por que você perguntou is-so?
– Ora, mãe? Foi a senhora quem começou com esse papo de eu trepar com o Nelson...
Ela abriu a garrafa e encheu os dois copos. Voltou a sentar e ficamos bebericando o vinho branco.
– Tive um arranha-rabo com o Neto... – voltou a falar – Quase deu a maior confusão quando a mamãe nos pegou uma noite – riu divertida – O coitado levou a maior surra da vida...
– Mas ele não é padre? – lembrei do padre Alberto Neto.
– Pois é filha! Hoje ele é padre... Mas era uma perdição, principalmente quando nos reuníamos na quinta do tio João na Mata do Jipão... – reabasteceu nossos copos – Era o primo mais bonito e quase perdi o cabaço pra ele – passou a mão entre as pernas e vi que ela estava acesa – Depois disso a gente nunca mais se viu, até a ordenação em Caxias.
Continuamos conversando sobre sexo até perto das duas da tarde, quando nos lembramos que não havíamos al-moçado. Mamãe ligou para o restaurante do bairro e pediu frango à passarinha. Comemos rindo das loucuras que ela contava.
– E nunca teve nada com as tias? – apimentei.
– Só coisas de crianças, nada sério...
Ela olhou as horas e levantou de um pulo.
– Puta merda! Tô atrasada... – foi ao banheiro escovar os dentes e saiu apressada – Cuidado para não pegar filho!... – me abraçou rindo e saiu correndo.
Minha mãe sempre foi assim e acho que, por isso, viveu a vida do jeito mais saboroso, mas daí a atacar meu irmão era outra conversa. Apesar dos quase doze meses sem ter um homem, ainda não estava preparadaEste Relato é parte de Aninha, publicado no blog Vida de Anjos. Acesse e leia (formatado e com fotos):