No conto anterior…
(…) Desde então a maldição vem passando de geração para geração (…).
(…) – [O senhor me enviou a foto de Marina na faculdade. Por quê?]
– [Sim, eu queria lhe perguntar, quem são duas pessoas ao fundo?]
Em segundo plano na foto, próximos à entrada do refeitório, estavam o professor Magri e o Coordenador Spencer.
– [O senhor já os viu antes?] (…).
(…)– [Não pode ser ele]
– [Não pode ser quem?]
– [Álvaro] (…).
(…) Peguei as chaves do carro e ao sair do quarto apaguei após um soco certeiro (…). Acordei dentro de um furgão em movimento (…).
(…) Chegamos a um casarão, do início do século XX. Logo no Hall de entrada, talhado no piso as iniciais MM (…).
(…) Álvaro foi o nome que ecoou em meus ouvidos.
Após a gravação o emblema com as iniciais MM apareceu na tela.
– Álvaro? Mas aquele era o…
– Jean Magri, Álvaro Costa, Richard Brown, Igor Stratovick. São a mesma pessoa. Na realidade seu nome verdadeiro é desconhecido, mas nós o chamamos A-21 (…).
(…) – O que é a MM? – perguntei antes de tudo.
– Não é o que, mas… quem (…).
Sex In Life 5th Temporada – Cap VIII – Temporada de Caça
Ano de 1380 de nosso Senhor, auge da guerra entre França e Inglaterra. À parte de tudo, numa aldeia normanda, Marry Martinez, casada, mãe de três filhos, tem parte da sua história removida da memória após conhecer Alexander Fiord, um soldado do exercito francês. Teve-o como amante até seu marido descobrir e matar-se em seguida. Após o último suspiro, as lembranças voltaram como relâmpago. Foi a causa de um AVC, que a deixou sem os movimentos do lado direito do corpo. Jurou vingança pela morte do marido, mas tal vingança nunca aconteceu. Alexander Fiord morreu numa batalha quatro anos depois com uma espada transpassada na garganta.
Na mesma época, no Reino de Nápoles, Amadeus Natieli, estudioso da mitologia greco-romana e conhecedor da maldição de Antares, pegou sua mulher na cama com outro. Ele matou a mulher e seu amante. Fugiu para França, onde conheceu Marry e seu caso com o soldado francês e o suicídio do marido. As peças estavam ligadas para que ele começasse a escrever suas notas, que apenas séculos depois viraram um livro, o mesmo passou por diversos leitores, bibliotecas e livrarias até chegar as minhas mãos. Marry imaginou que não seria por acaso que um estudioso se deparasse com o caso dela e soubesse exatamente o que realmente acontecera. Após a morte de Amadeus, ela copiou suas anotações e aprofundou seus estudos, encontrando a linhagem de Antares. Era sua forma de vingança e um modo de salvar as mulheres da perdição certa. Daí foi fundada a MM (Marry Martinez).
– Desde então a MM tem monitorado e vigiado cada descendente do sexo masculino (os descendentes do sexo feminino não carregavam a maldição) – continuava explicando o sujeito (o que gosta de me esbofetear) – Hoje temos monitorado 36 descendentes. E eliminando-os, quando possível.
– Eliminando? – fiquei abismado – Quer dizer que vocês matam pessoas?
– Pena de morte é até pouco para quem faz uma atrocidade dessas numa família estabilizada. Quantos casos já ouvi de mães que largam maridos e filhos, esposos desesperados que buscam a própria morte, outros que não aceitam o fim do relacionamento e tiram a vida da mulher. Eles não estão preocupados com isso. Querem aliciar as mulheres custe o que custar. A polícia e a justiça, nunca nos ajudaram, por isso trabalhamos em sigilo… eliminando os doentes antes que haja uma pandemia.
Já estávamos fora as sala de projeção, seguindo por um corredor estreito com paredes de vidro…
– …a prova de balas – continuava ele – protege nosso laboratório onde fazemos pesquisas genéticas e teste em cobaias.
Entramos. A esse ponto o motorista do furgão já não estava mais conosco.
– Esses equipamentos – eu observei – pensei que só a Universidade de Londres teria.
– Quando o assunto é proteger a humanidade, não poupamos dinheiro.
– Incrível.
– O envelope – tirei-o do meu bolso – Abra.
Era uma seqüência de fórmulas e estruturas moleculares, coisa de biomedicina.
– Sei que entende disso melhor do que eu. Estamos trabalhando no desenvolvimento dessa droga baseada em oxitocina para reduzir consideravelmente a produção desse hormônio na mulher, talvez possa criar uma imunidade ao tal “feitiço de Cronos”, já que a oxitocina é a principal responsável pela atração que ela sente pelos descendentes de Antares.
– Como um antídoto criado a partir do próprio veneno, usando o C43H66N12O12S2.
– Basicamente. Mas como bem sabe a oxitocina é um hormônio e para funcionar teria que ser aplicado próximo a neuro-hipófise para que possa ser afetada e interromper a produção.
– Mas… – discuti – a parte mais próxima possível para a ejeção da droga seria…
– No pescoço… meio sádico.
– Quais seriam os efeitos colaterais? – indaguei.
Ele deu de ombros.
– Perda da consciência, coma, morte… não sei, não testamos ainda. Por isso precisamos que trabalhe mais nisso. Mas não agora. Precisa entender o porquê a MM escolheu você e quem é ela.
– Pelo que me disse MM é Marry Martinez.
– Esse foi o nome da nossa primeira líder. O cargo passou por diversas mulheres até chegar a atual.
Voltamos para o Hall de Entrada e subimos uma das escadas. Seguimos por corredores cheios de salas, quartos. Até que entramos em um desses. Uma porta grande que precisaria ser empurrada para abrir. Do outro lado, uma cama enorme onde daria para dormir quatro confortavelmente, mas apenas uma senhora repousava ali, extremamente idosa, aparentava ter chegado aos noventa anos. Entramos sem fazer muito barulho.
– Sra. Morales, ele está aqui.
Demorou até termos algum sinal de vida.
– Obrigada, Eduardo – disse com voz rouca e demonstrando fraqueza – deixe-nos a sós – assim que ele saiu… – Aproxime-se, Arthur, querido.
À medida que me aproximava tive a sensação de já ter vivido aquilo, uma espécie de dejavu. Aquela senhora, a sua voz, era tão familiar. E como ela sabia meu nome, a maneira como ela me chamara.
– Deus! Como se parece com seu pai!
– Conhece meu pai?
– Como não conheceria meu genro?
– A Senhora é…
– Marta Morales. Sou a sua avó, Arthur.
Para poupá-los da longa conversa de família que também envolve sua entrada na MM, vou tentar resumir com base no que já conhecem, pelo menos quem tem acompanhado desde a primeira temporada da série. Marta não abandonou a família simplesmente, mas assumiu um cargo que estava além da compreensão da maioria das pessoas, era preciso inclusive para tentar proteger a própria filha, missão na qual ela falhou, mas acreditou em meu pai que, para resolver a situação, quase perdeu a vida.
– Tentei contar tudo a Paula depois de tudo isso, mas vocês não me receberam. Desde então tenho seguido os passos do A-21 pessoalmente. Foi assim que encontrei você… novamente.
– Eu tinha seis anos, na época. Lembro-me de estar escutando minha mãe chorar…
– Como ela está hoje?
– Bem, envelhecendo ao lado do homem que ama.
– E seu avô? – perguntou referindo-se ao Dr. P.
– Ele… faleceu há três anos.
– Eu o amava tanto… – nesse momento ela não conteve o choro – Ele faria qualquer coisa pela filha.
– Foi o que a senhora fez.
Ficamos um tempo em silêncio depois disso.
A maioria das minhas questões já havia sido respondida. O que me restava saber era o que seria de Marina.
Eduardo entrou apressado no quarto.
– Desculpe a interrupção, mas temos um problema. Arthur venha comigo.
Seguimos em ritmo acelerado por outro corredor e descemos alguns lances de escadas até chegarmos num estacionamento. Na realidade era só uma garagem, mas era grande.
– O que está acontecendo?
– Sua namorada está com problemas. O A-21 sabe onde ela está. Você tem que encontrá-la e trazê-la pra cá o mais rápido possível. Toma – ele tirou uma pistola da cintura e me entregou – Se tiver a chance de eliminar o A-21, execute. Estaremos de olho em você.
Ele me passou as chaves de um carro, o qual já estava estacionado do lado de fora.
– Não sabemos do que o A-21 é capaz. Então, trate de ser cauteloso – sem mais nem menos ele me esbofeteou outra vez – Não faz besteira.
Ao abrir a porta da garagem um Mustang de pintura cromada me esperava do lado de fora.
– Estamos a vinte minutos de Londres, então acelere. Siga por essa estrada de chão até chegar à rodovia, Londres fica à Leste. Boa sorte. Vai precisar.
Entrei no carro, engatei a primeira e acelerei.
Além da emoção de estar dirigindo uma máquina. Tudo que me acontecera àquela noite era muito fora do comum. Ainda pela manhã eu havia pagado quinhentas libras por um livro sendo que toda a história já me seria apresentada antes do dia seguinte alvorecer. E lá estava eu, voltando desesperadamente para Londres e torcendo para que Marina estivesse a salvo.
O horizonte tomava a coloração alaranjada quando avistei a metrópole. Devia ser umas seis e pouco da manhã. Naquele momento o telefone do veículo tocou e logo Eduardo começou a me falar.
– O A-21 levou a garota, Arthur. Precisa ir à casa dele e executá-lo antes que…
– Eu sei, não precisa me dizer. Estou indo pra lá.
Eu desconfiava que esse momento chegaria, mas nunca imaginei que fosse numa situação assim.
Com o carro, silenciosamente estacionei em frente à casa de Magri. Tudo estava quieto; quieto até demais. Empunhei a arma e aproximei-me sorrateiramente até a porta da frente. Olhei pelo canto da janela, mas a sala de estar estava vazia. Dei a volta na casa, mas a porta dos fundos também estava trancada. Subi no telhado através da grade por onde as trepadeiras se enroscam. De lá era possível analisar cada cômodo do segundo piso. Uma estranha sensação me dirigiu a uma janela na ponta. À medida que me aproximava, meu coração acelerava e meu estômago revirava. Uma estranha sensação de enjôo. Olhei pela janela e mesmo entre as bordas da cortina era capaz de ver lá dentro e ouvi pouco, mas o suficiente para identificar a linguagem grega.
Marina, deitada nua sobre a cama e Jean, ajoelhado sobre ela, mas ele a impunha sobre uma espécie de transe hipnótico. Marina não se movia. Não esboçava nenhum sinal de medo, satisfação ou tristeza. Ela só ficava lá, sem ação nenhuma, como um objeto inanimado.
Jean acariciava seu corpo sensual e a beijava no rosto, no pescoço e no colo. Suas mãos deslizavam pelas pernas até os quadris.
Eu não podia ficar ali parado, foi quando desferi um golpe com a coronha do vidro da janela.
Nada no vidro quebrar, mas chamou a atenção de Jean, que me encarou de olhos arregalados e com um sorriso sinistro e diabólico.
Ele continuava com seu ritual. Segurou o rosto de Marina e a beijou introduzindo sua língua e como se lhe devolvesse a alma ela abriu os olhos e contemplou aquele que agora ela acreditava ser seu amado. Só o que Jean precisava agora é engravidá-la e para isso ela estaria disposta a se entregar.
Com um gesto feito por ele as cortinas se abriram por completo. Era como se ele quisesse que eu assistisse. Gritei por Marina, mas ela não me ouvia, permanecia imóvel. Engatilhei e disparei a arma onde certamente estaria o ferrolho da janela, mas quem poderia imaginar? O projétil ricocheteou e me atingiu no peito.
Continua…