I
Quando era pequeno, acho que com uns dez anos, meu pai e meu tio me levaram prum puteiro. Lembro-me de um comentário, antes de chegarmos, que isso era costume da família, e que quando pequenos ambos haviam ido por conta própria prum puteiro, os dois mais um falecido tio-avô meu que era da mesma idade dos dois. Primeiro subiu o tio-avô, depois meu pai e depois meu tio. Eles tinham também uns dez anos, eram bem mais corajosos que eu naquela época. Ou talvez antigamente os puteiros fossem diferentes.
O importante é que naquela tarde eu fiquei pela primeira vez sozinho no quarto com uma mulher. Vendo agora percebo que ela era novinha, não mais que dezenove anos, e estava meio assustada pelo pequeno garotinho estar ali, se despindo para ela. Suponho que putas reclamem, em pensamento, dos clientes velhos demais, mas não sei se reclamam dos novos demais. Só sei que ela foi me mostrando os caminhos, aonde colocar o que, como pegar nos peitos dela e como morder. Pra mim tudo parecia meio surreal, já sabia do básico de sexo a pelo menos uns 3 anos, mas só era coisa de conversa com amigos de escolinha, e tudo falatório pinçado com detalhes de filmes e revistas de pornografia que um muleque mais novo, o Antonio, trazia pra aula. E naquela hora eu tinha realmente tinha minha mão numa buceta, uma de verdade, não como nas revistas, toda limpa e depilada, era uma semi-peluda e meio melada, com uma garota de quase o dobro da minha idade com receio se fingia um orgasmo ou se me encarava como um aluno e me ensinava: “Não, garoto. Mexe assim, ó. Isso... nã, mais pro lado, pra esquerda, pra esquerda. Pra outra esquerda”. Não me lembro do nome da garota, mas essa foi minha primeira mulher.
Cresci. E não foi a melhor das crescidas. Meu pai morreu quando eu tinha 15 anos, meu tio quanto tinha 18 e minha mãe aos 22. Acabei com a casa dos dois e a vendi logo depois, não tinha emprego pra pagar as contas e não tinha paciência pra trabalhar de forma digna, como dizia minha mãe todo dia uns dois anos antes de morrer. Acabei alugando uma casinha pequena, pouquíssimo custo, e com a grana que sobrou da casa e das coisas que meus familiares deixaram quando morreram eu me mantenho relativamente bem. De vez em quando arranjo algum trabalho idiota, só pra passar o tempo e me pagar alguma coisa que eu precise ou queira, mas grande parte do tempo gasto com bebidas, mulheres e livros, se bem que desde os 24 já nem leio tanto como antes.
E mesmo sendo tão vagabundo e irrelevante, havia coisas que eu conseguia sem muito esforço. Beber de graça e comer garotas de graça era uma dessas, talvez fosse meu rosto de sem vergonha ou minha aparência desleixada, beirando ao sujo, que deixasse na visão delas alguma impressão de que eu estava perdido, solitário, e que precisava dum bom colo, dum bom gole e dum bom boquete. Eu nunca recusei, e era assim que quase todo final de semana terminava na minha pequena casa, bêbado, comendo alguma garota velha ou nova, feia ou bonita, rica ou pobre, e era assim que de manhã eu inevitavelmente acabo por chutá-las da minha casotinha, algumas vezes não antes delas me comprarem comida ou bebida. Infelizmente para Vivan a coisa não foi assim. Vivian era uma mulher um pouco mais velha que eu, talvez nos seus 30 anos, nunca pude descobrir de verdade e só tinha como indicação algumas poucas marcas que começavam a despontar em seu rosto. Cabelos pretos, um nariz longo e batom um pouco mais vermelho que o normal. Tinha pernas longas, bonitas, uma bunda aceitável e seios só um pouco pequenos, o esquerdo maior que o direito. Estava um dia num bar não tão decadente quanto imaginei quando entrei, e ela já estava lá, sentada sozinha numa mesa, bebendo alguma coisa verde sem gelo. Eu me sentei no balcão, as boas coisas sempre acontecem no balcão, e pedi uma cerveja e uma dose de maria-mole, sempre começo a noite com isso, me dá forças e vitalidade. Fiquei bebendo por uns dois minutos a garrafa e me virei pra maria-mole, Vivian sentou do meu lado naquele momento e ficou olhando enquanto eu virava metade do copo, deve ter gostado do que viu porque quando coloquei o copo na mesa e me virei para ela via um sorriso:
- Sim?
Ela me olhou bem, sorriu e me perguntou se queria mais uma dose. Fiz um pequeno movimento de cabeça e ela pediu pro velho que estava do outro lado mais duas doses “disso que ele esta tomando”, o bar era um pouco mais claro do que gostaria e eu conseguia ver perfeitamente que a Vivian estava um bocado maquiada, montada pra atacar esta noite, e que provavelmente eu seria o alvo. As bebidas chegaram, brindamos e bebemos, mesmo sem saber o que eu tomava ela bebeu bem, e quando botou o copo no balcão continuou me encarando, com um sorriso:
- Você é bem novo. Porque bebe assim?
- Tédio.
Outro sorriso. Outro gole. Outros dois copos. Outra pergunta idiota. Quando terminamos de beber a cerveja ela já estava meio bêbada, tentava soar agradável mas sem demonstrar muito o quão estava amargurada com a vida. “Péssimo casamento, trabalho de merda, falta de aventuras, sensação de que o tempo esta passando” foi isso o que pude supor enquanto ela bebia a cerveja e uma gota escorria pelo canto da boca. “boca bonita” Eu estava mesmo ficando bêbado.
Para fazer dessa monótona, longa estória algo curto, acabamos indo pra minha casa e trepado. A primeira vez foi bem normal, ainda tínhamos uma garrafa de sei-lá-o-que do lado da cama e o ritmo ia devagar, parando ambos para bebermos. Depois da primeira a coisa foi ficando forte, talvez porque a bebida havia acabado, a trepada foi ficando mais animalesca e a vergonha-de-mulher-casada da Vivian foi desaparecendo. Ela me mordia e chupava enquanto a cama tremia, e pude ver pela fresta da janela que alguns dos vizinhos do lado ligavam a luz. Ela gritava e pedia, desesperadamente, que eu entrasse mais nela, que eu entrasse mais nela, mesmo que já estivesse bem lá dentro. Vivian era um bocado peluda, e era mais salgada que a grande maioria das garotas e das mulheres. A terceira vez foi mais calma, ao som do meu amigo Tom Waits, e a quarta, enquanto amanhecia o dia, foi tão barulhenta quanto à segunda, talvez mais pra mostrar pros idiotas que iam trabalhar de manhã que a vida passava rápido pra eles e lenta pra gente. Acabei dormindo com ela em cima de mim.
Quando acordei Vivian já fazia café pra mim. Sentia o cheiro vindo daquilo que eu chamava de cozinha, mas que era só um pequeno cômodo com um fogão velho e uma geladeirazinha, daquelas tipo frigobar, estranhamente a ressaca não vinha pra nenhum de nós dois, e quando me levantei percebi que ela estava pelada. Havia comprado pães, mortadela e um café bom, e estava de novo sorrindo aquele sorriso da hora do bar. Sentei-me naquilo que chamava de sofá enquanto algum radio duma vizinha tocava musica evangélica.
- Come um pão.
- Não.
- Café?
- Sim, claro.
Ela pegou o meu café, o dela, sentou do meu lado no sofá e jogou o braço ao redor de mim. Uma mão no meu pau, outra no café. Eu com as duas no copo. Bebíamos um gole de café e um beijo vinha, não sei por que, mas tinha certa pena dessa mulher. Talvez porque agora, com o sol das nove que entrava na janela ou com o café quente eu percebia que aquele primeiro pensamento da hora do bar, de que ela era uma pobre mulher que via o tempo lhe passar rápido demais era verdadeiro, ou talvez porque em minutos iria pedir para que essa mulher desesperada, sem mais muitas coisas pra se agarrar na vida, saísse da minha casa e da minha vida. Ela me deu outro beijo.
Quando percebi a comia de novo, no sofá. Os copos de café no chão, a musica evangélica tocando e Vivian gozando enquanto chupava-a, parte do corpo jogado fora do sofá, a voz falhando e gemendo, o sol batendo nos seus cabelos e eu com uma pena imensa dela.
Quando terminamos no sofá fomos novamente pra cama. E lá trepamos mais duas vezes, ela gritando tanto quanto antes pra mostrar pra vizinha evangélica que esta era uma casa do diabo, onde pessoas tentavam se agarrar a qualquer outra coisa terrena. Meus lábios sangraram quando ela me mordeu um pouco mais forte, e dessa vez acabei comendo-a pelo rabo também, afinal por que não, não é? No fim da segunda vez ela deitou bem do meu lado, os olhos brilhando com o sol do meio dia e me disse: Ainda com Tédio?
Eu não podia mandar esta mulher embora.