A notícia que acabara de receber caiu como um choque e o Miguel não se conseguiu conter, mesmo estando a mãe o antigo professor de física e química junto a ele, por muito que se tenha esforçado, as lágrimas vieram-lhe aos olhos.
Rui: Bem, já tinha ouvido que vocês gostavam muito desse professor, aqui está a prova.
Alzira: O Professor Telmo além de um bom professor é uma óptima pessoa, eu própria que passo a minha vida a lidar com mortes de pacientes, pelo que já devia estar habituada a notícias tristes fiquei um pouco abalada, apesar de não conhecê-lo há muito tempo. No entanto à que lembrar que ele ainda não morreu, pode acordar a qualquer momento e temos de acreditar que isso vai acontecer, ele ainda é novo tem muito para viver.
O Miguel e a sua mãe despediram-se do Rui e foram para casa. Alzira notou na tristeza do filho, inclusive, ela fez a sua comida favorita para o jantar, mas sem sucesso. No dia seguinte, o Miguel mal conseguiu dormir e quando o despertador tocou, ele em vez de se levantar e se preparar para ir para a escola deixou-se ficar na cama por mais um tempo, motivo pelo qual chegou atrasado à escola. Após ter entrado na sala e pedido desculpas à professora de matemática, notou que as notícias sobre o estado de saúde do Professor Telmo já tinham circulado pela escola toda.
Carla: Ainda não acredito no que aconteceu, a primeira vez que temos um professor giro, simpático e atencioso e acontece uma coisa destas.
Gonçalo: É, mas temos de ver pelo lado positivo, pelo menos pode ser que os testes do professor substituto sejam mais fáceis.
Carla: Isso é cruel, parece que tas a desejar o mal ao professor. O que achas Miguel?
O Miguel estava completamente perdido nos seus pensamentos, pelo que nem tinha prestado atenção ao que os amigos estavam a dizer. Ele sentia-se só, apesar de estar numa sala cheia de gente, sentia uma enorme tristeza que não sabia explicar. “Será que gostava do Professor Telmo?” – pensava ele, sentia-se confuso e baralhado. Não era apenas o facto de o Professor Telmo estar no hospital, era também todos os sentimentos e emoções que tinham despertado num momento para o outro após ter tomado conhecimento do acidente. “Será que estava apaixonado por outro homem?”
Gonçalo: Miguel acorda!
Professora matemática: Silêncio!
Entretanto a aula acabou, assim como o dia de aulas:
Carla: O que acham de irmos ao hospital, ver como está o Professor Telmo? Ouvi dizer que quando as pessoas estão em coma falar com elas pode ajudar. Não sei se é verdade ou mentira, mas não custa tentar.
Gonçalo: Acho que é uma perda de tempo. De certeza que isso é mentira, ele não vai ouvir nada, de qualquer das maneiras o que lhe vamos dizer?
Miguel: Eu vou, se não quiseres ir podes ir para casa.
Gonçalo: Ok, ok… eu vou. – disse contrariado.
Uma vez no hospital, após terem-se informado do quarto onde estava o Professor Telmo e entrado nele:
Carla: Que estranho ver o Professor Telmo assim, ele não fala, não vê, é como se estivesse morto.
Gonçalo: Na verdade, são poucas as pessoas em coma que acordam.
Carla: Cala-te Gonçalo.
O Professor Telmo estava deitado numa cama singular, o seu corpo estava tapado com lençóis brancos, apenas a face estava a descoberto. Nela tinha alguns pensos que tapavam feridas e arranhões do acidente. No seu braço tinha um seringa que fazia o soro entrar no seu corpo.
Ao vê-lo assim o Miguel ficou petrificado, tinha pena do professor, tinha saudades das suas conversas, tinha saudades de o ver sorrir…
Carla: Então o que lhe vamos dizer?
Miguel: Não sei.
Na verdade Miguel queria dizer o quanto sentia a sua falta, tinha tanta coisa para dizer, no entanto faltava-lhe a coragem ao pé dos amigos, além disso, se o fizesse sabia que estaria a revelar informações que os amigos desconheciam e podiam não entender.
Carla: Não há-de ser difícil, eu falo pelos três.
A Carla falou pelos três amigos, dizendo que sentia falta das aulas do professor e que esperava que melhorasse rápido. Em poucas palavras despediram-se, deixando um ramo de flores, que tinham comprado a caminho do hospital, junto à cama do Professor Telmo.
O tempo foi passando e as saudades aumentando, as visitas ao quarto do Professor Telmo eram constantes, às vezes o Miguel ia sozinho, outras vezes ia acompanhado. Não havia nenhum dia que o professor não lhe viesse à cabeça, tal fez com que se entregasse aos estudos mais do nunca a fim de se concentrar noutras coisas, pelo que aumentou as notas a todas as outras disciplinas, no entanto a química passava-se o contrário.
Tinha vindo um novo professor substituir o Professor Telmo, mas nada tinha a ver com este, era carrancudo e mal disposto, apesar de as aulas até serem interessantes, era impossível não compará-las com as do Professor Telmo, o Miguel dava consigo a imaginar como seriam as aulas se fosse o outro professor a dá-las, o que fazia com que não se conseguisse concentrar na disciplina, nem nos estudos, pois havia sempre alguém que se encontrava numa cama de hospital que lhe vinha à cabeça.
O facto de guardar tudo para si não ajudava, tinha medo de mostrar o que sentia, era algo que não conseguia explicar, já para não falar do quão irracional era, sabia que paixões entre alunos e professores eram praticamente impossíveis, não era permitido aos professores terem relações com os alunos, pelo que não percebia a razão de querer contradizer esta regra, por mais explícita que fosse. Além de que era menor e mesmo que se o Professor Telmo acordasse, nunca poderia ter nada com ele… no entanto, mesmo avaliando o que era correcto e não era, o Miguel não conseguia tirar os sentimentos que nutria pelo professor da cabeça, ou deveria dizer, do coração?
Havia ainda a questão da sua orientação sexual, o facto de nutrir certos sentimentos por outro homem deveria querer dizer que era homossexual, na verdade, quando pensava nisso lembrava-se que nunca tinha sentido qualquer atracção pelo sexo oposto, sempre sentira atracções por pessoas do mesmo sexo, gostava de ver o corpo dos colegas ou de certos homens nas piscinas, no entanto, nunca ligara muito a isso e negara o facto de poder ser homossexual, contudo agora era inegável, o que de certo modo o assustava.