Pois é... Ele estava morto! Vivi anos e anos da minha vida pensando que era realmente apaixonado por minha ex-esposa, mas o que eu sentia por ela não chegava nem aos pés do que o Rodrigo causou em mim. Estava casado 10 anos com minha esposa, tinha uma filha também de 10 anos, nos casamos logo após ela engravidar. Vivemos anos e anos juntos, ela se formou em psiquiatria, eu me tornei um dos donos de uma empresa de médio porte que a cada ano crescia mais. Ao meu lado também, sempre estava meu melhor amigo, o Henrique.
De uma hora pra outra, descubro que meu amigo, praticamente meu irmão e meu sócio, que eu conhecia a anos e anos vinha me roubando. Tive que denunciá-lo, uma coisa que eu não aturava era traição. O denunciei e sofri as consequências, fui jogado injustamente em um buraco, uma vala, onde permaneci por quase 5 meses. Lá fui estuprado, humilhado e por fim me apaixonei como nunca na minha vida. O Rodrigo era um homem maldito, cresceu no meio da violência, seu pai já era do movimento; Cresceu vendo que o único jeito de conseguir as coisas é tomando na “mão grande”, ou que o tráfico era o melhor dos negócios, mas mesmo sofrido não deixou de ser lindo, parecia o Marcus Patrick, só que menos bombadão. Ele ir pra cadeia era algo já “esperado”, ele possivelmente morrer em uma troca de tiros também, mas se apaixonar por mim era algo nunca esperado. E posso dizer que ele se jogou de cabeça nesse relacionamento, isso ajuda a confortar a dor de não tê-lo mais. Depois de nossas primeiras transas percebi ele mudar completamente seu temperamento, ele estava isolado do mundo, entendi com nossas conversas, que sua violência para comigo, era um meio de me tirar de sua mente, de não ter aquele sentimento que estava nascendo nele. Depois que assumimos nossos sentimentos tudo ficou mais lindo e a paixão germinou e floriu. Os 10 anos que vivi com minha esposa não foram suficiente para acabar com aquele amor pelo Rodrigo.
Ficamos juntos depois que sai de lá e foram os meses mais lindos da minha vida, porém depois de muito mel, o fel entrou na minha vida... Meu amor foi assassinado por algum policial em uma troca de tiros durante uma pacificação na comunidade de um “parceiro econômico”. E o pior de tudo foi ver sua foto na televisão e ouvir a repórter falar com ar de felicidade ou melhor alívio por terem se livrado de mais um meliante, mas esse meliante era meu motivo para sorrir.
Passei um ano “de luto”, na verdade estava em depressão. Nos primeiros meses eu não ia trabalhar, nem nada. O Rafa foi morar comigo pra cuidar de mim porque se eu ficasse sozinho não ia comer. Pode parecer frescura, mas só quem amou de verdade entende o que eu passei.
O Rafinha tentava de todo jeito me animar, me tirar daquela fossa, mas não conseguia, ninguém conseguia; ele era alto, tinha 185, branquinho, cabelo ondulado, parecia um pouco com o Michel Max, que fez Tititi. A saudade que eu sentia dele era enorme, eu olhava suas fotos, via nossos vídeos juntos e percebia tudo o que perdi. Uma vez estava sozinho em casa e liguei um dos nossos vídeos em Búzios. O vídeo mostrava nós dois correndo na praia, ele correndo atrás de mim. Por fim ele me alcançava e caíamos e ficamos gargalhando.
- você é maluco sabia play boy? – ele falava ainda em meio os risos.
- claro que sou, estou aqui com você.
- Ai, isso doeu seu brankelo!
- Sabe que to brincando, eu te amo demais otário!
- fala de novo parceiro!
- eu te amo, eu te amooo, eu te amooo. – ele virou a câmera e se filmou falando:
- ae, essa é a prova de que sou foda demais, oh o gostosão que eu consegui! Te amo também cara!
Aquilo foi demais, eu chorava muito, chorava como nunca, não queria mais sofrer daquele jeito. Então fui no banheiro e cortei o pulso direito e o esquerdo. A dor da navalha não era nada à que eu sentia todos aqueles meses. O sangue escorria e eu me sentia mais conformado, iria encontrar ele, logo tudo ia acabar.
- Will, cheguei! Passei no mercado e comprei umas frutas, você precisa se alimentar melhor cara!... A empresa tá uma doideira... cadê você? Will?
A porta do banheiro se abre e ele vê o chão cheio de sangue e eu deitado. A sensação é um sono que vem chegando lentamente... Vi que o Rafa ficou desesperado, não queria que ele me achasse ali, nem pensei nele quando fiz aquilo, mas já tinha feito.
- MEU DEUS DO CÉU! O QUE VOCÊ FEZ CARA!!
- Eu vou ver ele Rafa, logo logo.
- Não vai não seu filho da puta!! – Ele me pegou no colo e ao me levantar tudo ficou escuro.
Acordei e estava no hospital. Minha vista estava embaçada, mas logo foi clareando. Na enfermaria estavam a minha mãe e minha ex-mulher.
- É culpa minha, porque fui pedir esse divórcio?
- calma minha filha...
- se ele estivesse morto eu não sei o que faria, não iria me perdoar.
- graças a Deus ele vai ficar bem... pobre do meu filho, deve ter sido ficar lá preso, isso deve ter mexido com a cabeça dele.
Eu estava ouvindo tudo e com muita vergonha de abrir os olhos, pensava: “Porque não estava morto logo, tudo seria mais fácil, agora teria que ficar contando o porque disso... Maldito Rafael!” É, mas como teria que abrir os olhos logo, então decidi fazê-lo de pronto.
- Ele acordou! Amor, Will, como você está?
- Meu filho... porque você não pediu ajuda? Você tem uma filha pra criar, sua empresa... porque você fez isso com a gente? – não falava nada, não queria encarar elas, só olhei pra cima e as lágrimas escorriam. – Oh meu amor, não chora! Eu estou aqui com você, não importa que você já é um homem feito, eu sempre estarei aqui pra você. Deixa eu carregar essa dor pra você, deixa? Mas não tenta sair da minha vida, eu te amo mais que tudo nesse mundo.
Eu não tinha forças pra falar nada, só fiquei quieto olhando pra elas e chorando. Olhava meus pulsos enfaixados, a bolsa de sangue, os outros enfermos... o mundo era uma maluquice!
- Graças a Deus você acordou cara! E ai como está se sentindo? Pronto pra voltar pra casa? – falou o Rafael, mas eu também não respondi. Estava com certa raiva dele. – Fala comigo cara!
- Ele está em silêncio desde que acordou.
- porque? Nada mexeu com a voz dele, ele pode falar.
- mas ele não quer. Rafael, me fala, o que ele tem? O que aconteceu pra ele estar desse jeito?
- eu... eu... não sei!
- claro que você sabe, você está morando na casa dele, você sabe, mas não quer nos falar.
- Foi desde a morte de um amigo nosso, mas o que está acontecendo eu não sei. Estou com ele por... por... – os olhos dele se ficam marejados e sua voz embarga – por que não queria que ele estivesse nessa cama agora. Seu merda! – falou pra mim – eu gosto muito de você... ele não te abandonou, mas você queria me abandonar! – fazer o que? Voltei a chorar.
Não queria mais ver ninguém, então fechei os olhos e assim fiquei até que todos foram embora.
Passei mais um dia lá e recebi alta. Me levaram pra casa dos meus pais e terminei de me reestabelecer lá. Mas uma coisa não tinha mudado, eu não falava nada. Eu escolhi não abrir a boca mais pra não ter que dar explicação de nada.
Meus pais tentaram de tudo, mas nada me fazia falar, nem mesmo minha filha, a qual eu só beijava e acariciava. O tempo foi passando meus pais me levaram a um psiquiatra. Não adiantou nada, eu não falava nada, então como ele poderia me ajudar? Foi um mês de silêncio total, com o tempo eu até esquecia que podia falar, não precisava me comunicar com ninguém mesmo, ficava na minha, vendo TV ou lendo.
Um final de semana, minha menina estava lá na casa dos meus pais brincando no quintal e eu a olhando. Ela conversava demais comigo, mas eu não respondia suas perguntas, só sorria ou ficava sério e ela entendia se estava gostando ou não.
- Pai, na escola eu to a maior fera! Só tiro notão – dei um sorriso encorajador. – Bem... menos em matemática né, isso tudo é muito difícil. Não sei como o senhor gosta... Pai, vamos brincar? É UNO, um baralho – ela me explicou como se jogava aquele negócio – ai quando você tiver apenas uma carta, você tem que falar UNO e se eu não te cortar, você ganha entendeu? – fiz que sim com a cabeça. – como o senhor não fala, você bate na mesa ok? – assenti outra vez.
Jogamos quase a tarde toda, era muito divertido. Ela me fazia feliz, quando estava com ela eu esquecia meus problema e só focava em fazer ela feliz também, pois foi pra isso que Deus a tinha me dado, pra eu a ensinar a ser feliz. No final da tarde ouvimos o carro chegando, a mãe dela a levaria pra casa.
- pai, eu adoro ficar com você. Mesmo você estando doentinho, e mudinho, eu adoro, posso falar de tudo com você e é engraçado a cara que você faz – falou ela rindo – eu te amo!
- também te amo, Clara. – ela deu um grito no meu ouvido! – ai assim você me deixa surdo. – engraçado, minha voz saiu mais fina que eu me lembrava.
- pai, você falou! Então você não é mudo, que bom!
- Vai lá, antes que sua mãe reclame. Papai te ama demais.
- eu também pai. – ela saiu cantando “Ele falooou, Ele faloou”.
Logo minha paz acabou, veio minha mãe, minha ex e meu pai. Já vi que ia começar o interrogatório, mas como já tinha começado a falar, não ia poder voltar a trás.
- Will, é verdade, fala comigo, fala.
- É, é verdade.
- Ai, Deus é pai! Podem ficar ai! Vou fazer um bolo pra gente comemorar!
- Que ótimo que você voltou a falar. Sabe... eu ainda me pergunto do porque que você fez aquilo.
- Não é porque eu decidi voltar a falar que vou falar sobre isso.
- desculpe, só me sinto meio culpada.
- não sinta, você não tem nada haver com isso.
- eu posso te pedir um favor?
- não!
- por favor, deixa o psiquiatra te ajudar.
- vou pensar...
- Faz pela Ana Clara, não por mim, tá certo?
É... Ela tinha razão né?! Eu tinha que me cuidar por minha filha, minha vida deveria ser pra ela e foi isso que fiz. Comecei a frequentar o psiquiatra direitinho e aos poucos fui gostando. Demorou muitas sessões para eu falar do Rodrigo e do nosso caso. Depois que isso aconteceu ele me ajudava no ponto certo. Claro que tomava anti depressivo, mas aos poucos fui retomando minha vida.
Enquanto fiquei na casa dos meus pais, tudo estava lindo, mas quando decidi voltar pra casa, parecia que o fantasma do Rodrigo estava lá me assombrando, porque lá, nosso ninho de amor, eu lembrava de tudo, de todas as vezes que ele ficou lá, nossas juras e nossos momentos.
Assim que voltei pra casa, o Rafael veio junto. Eu fiquei muito tempo sem falar com ele por ter salvo minha vida. Até porque eu estava mudo pra todos né, mas mesmo depois de voltar a falar, eu não queria assunto com ele. Mas depois do tratamento fui esquecendo essa vontade de morrer e assim pude pedir desculpas a ele e agradecer por ter me salvado.
Com o passar do tempo fui retomando toda a minha vida. Um ano desde a morte dele. Depois desse tempo eu já levava minha vida, assim como depois que sai da cadeia, era trabalho e casa.
Com o trabalho eu estava muito satisfeito. O Rafael cuidou de tudo, fez o meu trabalho e o dele, claro que a empresa não cresceu nesse ano, mas estava estável e tudo graças a ele, eu tinha que recompensá-lo de alguma forma.
- Rafael, vem aqui na minha sala por favor?
- Claro, só um momento. – logo ele entra. – Oi, como você está?
- Bem, obrigado, e você?
- To bem também rsrs... Então, em que posso te ajudar?
- Você aceita ser diretor dessa joça?
- Esta me promovendo?
- é...
- Claro que sim, pow, fico feliz demais.
- Eu nunca vou poder te agradecer o suficiente por você ter cuidado disso tudo enquanto eu estava... digamos... mau de saúde.
- Que isso William, nada haver, fiz por amizade.
- Eu sei e por ver sua competência que estou fazendo isso. Você cuida dos funcionários, agendas e publicidade, ok? Eu fico com os investimentos e tudo mais.
- Você vai precisar de um outro secretário e eu de um rsrs.
- Verdade, eu cuido disso.
- Will! – me chamou.
- Sim.
- Posso te dar um abraço?
- E desde quando você me pede isso? rsrs Vem cá logo!
Ele me abraçou forte. Senti seu corpo colado no meu, seu coração batendo acelerado e por fim, algo molhando meu ombro. Não entendi o porque do choro dele, mas deixei rolar:
- O que foi cara? – perguntei.
- Você agora poderia se apenas uma lembrança, que bom que ainda posso te tocar.
- É, você teve essa sorte, pena que não posso dizer o mesmo.
- Meu amigo, você precisa sair e conhecer outras pessoas...
- mas ninguém mais me chama atenção...
- poxa, faz uma força! Sai comigo nesse fim de semana pra comemorarmos minha promoção?
- Não cara!
- Por favor?!
- Tá seu chato. É... vamos ver o que pode rolarOi gente! Estou de volta... Bem, não tenho palavras para agradecer os incentivos na primeira parte da história, ela está em primeiro lugar no Ranking. Fiquei tão contente que decidi contar o que rolou depois! Não sei se vão gostar, mas vamos começar a nova jornada pelas minhas memórias... Meu termômetro são os votos e os comentários, se puderem votar e comentar eu agradeço demais! bjus