“O amor verdadeiro além de puro é paciente.”
Capítulo VI – Beijo
Inicialmente ele se surpreendeu com as minhas palavras, mas depois a paz voltou a dominar as suas feições. Encarou-me e disse:
- Estive discutindo com o meu pai antes de vir para o Curso. Durante alguns minutos eu ficava me lembrando do que ele disse. Não é nada demais, nada que você precise se preocupar.
- Preciso! E me preocupo! Você é a pessoa mais próxima de mim Anderson. Não é justo! Quero estar ao seu lado sempre. Os pais, às vezes, são chatos, mas sempre nos aconselham para o bem. Escute o que ele diz. – Sorri para ele e continuamos a caminhada rumo ao estacionamento.
Fui a minha casa, e passei o resto do dia estudando os assuntos atrasados. Estava me adaptando aos poucos a nova rotina, que fora forçadamente imputada na minha vida. Eu tinha que preparar minhas refeições, arrumar a casa, organizar as coisas, e nessa mesma tarde eu percebi, eu deveria arrumar um emprego. O dinheiro que minha mãe me deixou, iria se extinguir rapidamente, se eu não arrumasse um modo de manter as minhas despesas. Logo encerrei minha tarde de estudos e afazeres domésticos. Quando eu estava terminando de limpar a casa, meu celular toca. Era a D. Teresa.
- Oi! Como vai Teresinha?
- Tudo ótimo meu filho!!! – a voz dela soava muito feliz. – Meu filho venha agora para a Delegacia! Rápido!
- O que houve Teresinha? – meu músculo cardíaco começou a pulsar intensamente.
- Pegaram o miserável! Pegaram o infeliz! Venha logo! – eu só tive o impulso de soltar o aparelho no sofá, pegar as chaves e sair. Quando abro o portão para sair, eis ele. O Miguel.
- E aí cara? O que tá rolando?
- Guel! Pegaram o miserável que matou minha mãe. Ele está na Delegacia!
- Mano, vamos lá!
Saímos na minha moto, velocidade elevada. A Delegacia era logo ali! Involuntariamente um ódio crescia no meu coração. “Desgraçado!” Era o que eu dizia para mim mesmo. Queria olhar para ele. Nunca me senti tão eufórico e descontrolado! Era agora! Cheguei à delegacia e adentrei, parecia que correntes imaginárias me guiavam para D. Teresa.
- Onde está? Cadê ele? – procurava com os olhos arregalados um semblante marginal.
- Calma... – falou o Miguel, passando a mão no meu ombro. Estava nítida minha euforia. O delegado se aproximava, com a D. Teresa em seus calcanhares.
- Delegado Silva esse aqui é o filho da Suzana. – o homem de meia-idade, com uma barba grisalha no rosto, estendeu a mão para uma saudação.
- Chamam-me Charles...
- Sua mão está fria. Acalme-se. Vamos para a minha Sala. – Segui-o até uma Sala muito semelhante as que aparecem nas novelas, escrivaninha mais para o fundo, com uma cadeira grande atrás e com um relógio um pouco acima dela, duas cadeiras de costas para a porta e em frente à mesma, um grande arquivo do lado direito e um ventilador de piruetas lentas no teto. O Miguel resolveu esperar do lado de fora.
Apontado os lugares em frente a sua mesa, ele se sentou do outro lado, de frente para nós. E começou a discursar.
- Pegamos o marginal! Usuário de drogas, primeira passagem pela polícia... Homicídio doloso...
- Sim! Meu senhor! Nós já sabemos de tudo isso. Agora, onde está ele. Traga-o aqui, por favor! Eu quero ver quem é o desgraçado que matou minha mãe! – eu estava alterado. O Delegado se levantou, passou por trás de mim e de D. Teresa indo em direção à porta, antes de sair disse.
- Volto logo...
Eu fixei meus olhos no relógio que estava pendurado na parede, acima de onde a cabeça do Delegado estava segundos atrás. Cada movimento do ponteiro era como uma punhalada no meu peito. Ansiedade nunca foi uma sensação boa para mim.
- Calma meu filho, não faça nada que possa se arrepender no futuro...
- “se arrepender?” Eu só quero perguntar uma ‘coisinha’ para ele, e eu estou calmo... – não estava.
- Certa vez eu ouvi uma frase que se encaixa muito bem nesse momento meu filho – D. Teresinha me encarou séria. – dizia que “errar é humano, mas perdoar é divino...” pense nisso Charles. – olhei para ela meio incrédulo, mas ela tinha razão. A minha intenção era agredir esse infeliz, fazê-lo sofrer, no entanto eu sabia que no fundo isso não adiantaria de nada. O Delegado entrou pela Sala e logo após dois policiais segurando um moleque pálido, franzino, vestindo trapos e com um rosto psicótico. Como pode? Um nada daqueles ter tirado a vida da minha mãe!
- É esse aí o safado Charles! – disse D. Teresa. Eu levantei da cadeira, qual estava sentado de costas para a porta, e me virei para encarar o demônio.
- Por quê? – falei quase como um sussurro, senti o sangue tomar conta de cada célula do meu corpo, e então comecei a esbravejar. – POR QUÊ?! POR QUÊ?! POR QUÊ?! POR QUE VOCÊ MATOU MINHA MÃE?! - eu coloquei as duas mãos na minha cabeça, o desgraçado estava com expressões vazias, não demonstrava emoções. – Seu desgraçado você vai apodrecer na cadeia! Alguém como você não merece nem a morte! Você não conhece a dor de enterrar a própria mãe. Saiba MONSTRO, que você vai pagar pelo que fez, e se depender de mim, você iria implorar pela morte. Mas Deus me ensinou a ter piedade de casos perdidos como você. – me retirei da Sala com lágrimas nos olhos e me dirigi à saída da Delegacia, passando pelo Miguel, que estava sentado numas cadeiras da recepção. Lá fora, me sentei na calçada e comecei a chorar.
- Não fique assim brother... – o Miguel sentou do meu lado na calçada e começou passar a mão nas minhas costas. – o mundo tá cheio de malandros como esse cara. Sei que a dor da perda não dá para superar, mas dá para amenizar um pouco. Por isso, levanta daí e vem, deixa eu te abraçar. – Ele conseguiu me surpreender. Somente me levantei e o abracei. E que abraço, era terno e protetor.
- Obrigado Guel...
- Vamos para casa! – saindo do abraço.
- Espera, eu tenho que falar com a Teresinha. – ela já vinha em minha direção, saindo da Delegacia.
- Meu filho, você é, apesar de jovem, é muito maduro, manteve o controle, é assim que se faz. Sua mãe com certeza está muito orgulhosa. Enfim, o Delegado me garantiu que esse infeliz vai passar muito tempo na cadeia, mas você sabe, no nosso país as leis são falhas, e eu não acredito que ele fique tanto tempo.
- Ele vai passar o tempo suficiente para se arrepender dos crimes que cometeu! Tenho certeza. – disse a ela. – Muito obrigado Teresinha. Agora eu preciso ir, estou cansado. – Dei um abraço nela e sai na garupa da minha moto, que Miguel guiava.
Chegando a casa, colocamos a moto para dentro e seguimos para o interior da residência. Sentado no sofá conversamos um pouco e fomos para a cozinha. Lá, Miguel mostrou seus dotes culinários, fez um Macarrão à Milanesa básico, junto de um purê de batatas e arroz. Estava delicioso.
- Depois eu quero que você me ensine essas coisas. – Disse a ele sorrindo.
- Claro! Ensino tudo e até outras coisas. – Disse isso olhando de canto de olho para mim. Havia um duplo sentido, mas deixei para lá.
- Pois é Guel, estou cansado, feliz, mas cansado. – falei para ele, que agora estava lavando os pratos e as panelas. – Deixa que eu enxugue para você. – fui com a mão em direção a uma panela, mas ele segurou minha mão.
- Não precisa mano... – e foi assim, segurando minha mão com a sua, e meu rosto com outra mão, que ele me trouxe para próximo do seu corpo, pressionando seus lábios contra os meus. Era um beijo quente e empolgante. Parecia que eu me desconectei do mundo e que a gravidade cedeu. Sim! Eu estava beijando um homem pela primeira vez na minha vida.
Continua...
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