Foi horrível ter que mentir pro Renan naquela noite. Eu percebi o quanto ele ficou chateado, mas eu tinha que fazer o que era certo. Eu não poderia contar pra ele o que estava acontecendo, ele não iria me perdoar de novo. Mas eu amo tanto aquele garoto...
Logo que ele fechou o portão eu respirei fundo. “Hora de encarar sua segunda vida”, pensei. Comecei a andar em direção ao ponto de ônibus, que não ficava muito perto dali. Enquanto esperava pensei em como o dia foi perfeito. Acordar ao lado dele, a mãe dele nos apoiar, apresentá-lo ao meu pai e conhecer os amigos dele foram as melhores coisas da semana. Fiquei imaginando o que meu pai achou dele, afina, não tinha levado ninguém pra conhecê-lo. Nunca.
Quando meu ônibus chegou, subi rapidamente e me senti em um acento do meio. Como era meio tarde não havia quase ninguém no ônibus. Coloquei os fones de ouvido e fiquei ouvindo musica durante o caminho. Quando cheguei no meu ponto, desci e andei poucos metros até o apartamento. O porteiro me cumprimentou como sempre fazia, mas eu não dei muita bola. O elevador tinha acabado de subir e eu estava sem paciência para esperar, então comecei a subir as escadas quase correndo, pulado de dois em dois degraus. Assim que cheguei no meu andar estava suando um pouco e hesitei ao parar em frente a porta. Respirei fundo e a abri. Entrei em casa e o cheiro de molho me deu água na boca. Não era um apartamento muito grande, mas também não era muito pequeno. A decoração era futurista, com alguns toques de florais. Assim que entrei me joguei no sofá e ouvi aquela voz de todos os dias.
-Nick? – Ela chamou. – É você?
-Sim. – Gritei.
-O jantar esta pronto. Vem comer. – Apesar de falar alto, a voz continuava doce.
-To sem fome, a gente já comeu.
-E como foi? – Ela apareceu na divisa entre a sala e a cozinha.
-Perfeito. – Falei um tanto triste.
Ela sorriu e veio em minha direção. Seus cabelos castanhos e ondulados balançavam conforme seu andar. Ela vestia um vestido florido e estava descalça. A barriga já estava grande, mas ainda sim continuava linda. Assim que se sentou, fez uma careta e começou a acariciar a barriga.
-Ela não para de chutar. – Reclamou.
-Mas esta tudo bem?
-Sim. – Ela respondeu sorrindo. – Mas me conta, como foi?
Expliquei todo nosso dia para ela, que ouvia atentamente. Depois de falar como terminamos mal a noite, ela colocou a mão dela sobre a minha.
-Você sabe que demorar pra contar pra ele só vai piorar as coisas. - Ela disse e a compaixão na sua voz era evidente.
-Eu sei, mas eu simplesmente não consigo. – Falei triste.
-Você o ama, não é?
-Mais que tudo.
-Ele vai entender. Eu sei que vai.
-Não. Da ultima vez ele quase não me perdoou. Eu não posso correr esse risco de novo.
- Ela nasce em, no máximo, dois meses. Depois disso, sim, ele não vai te perdoar. Se eu fosse você eu diria logo.
Respirei fundo enquanto sentia meus olhos encherem de lágrimas. Mesmo depois do nosso término, Amanda tem sido a melhor amiga que alguém poderia ter tido.
-Bom, sua filha esta com fome. Vem, vamos comer. – Ela levantou e esticou a mão pra mim.
-Até quando nós vamos manter isso? Essa mentira? – Perguntei levantando.
-Só até ela nascer. Eu já conversei com meus pais. Eu vou voltar pra casa deles e você fica com o apartamento.
-Mas, você ganhou o apartamento deles. – Repreendi.
-E estou te dando de presente. Você e o Renan precisam ter uma vida. Um futuro. Eu não acho que os pais dele vão dar o dinheiro pra vocês comprarem uma casa, então vocês ficam aqui até ele terminar a faculdade.
-Amanda, eu não posso aceitar. Não um presente assim.
-Então pense como um empréstimo. Assim que vocês conseguirem a casa de vocês, você me devolve o apartamento.
Amanda sempre pensou no futuro, mesmo ele sendo incerto. Ela já criou minha vida com Renan inteira na sua cabeça. Mesmo depois do nosso deslize ela continuou otimista sobre tudo. Eu me lembro do nosso namoro. Ela sempre falava em como iríamos nos casar e construir uma família. Depois que ela engravidou, sem querer, os pais dela nos obrigaram a casa. Ela foi contra, então decidimos morar juntos. No começo foi tudo perfeito, mas nós dois percebemos que não nos amávamos mais, apenas nos aturávamos. Depois de uns dois meses nós terminamos, mas ninguém sabe. Continuamos como um casal, mas somos apenas melhores amigos. Ela foi a primeira pessoa que soube sobre o Renan, e é louca para conhecê-lo. Eles se dariam muito bem. Ela sempre me deu muita força em tudo e se eu pudesse concertar tudo, nós seriamos o casal perfeito. Pra sempre.
Quando terminamos de jantar ela foi para a sala assistir TV e eu fui me deitar. Apesar de não namorarmos mais, ainda fazíamos tudo como um casal, inclusive dividir a cama. Logo cai no sono e, como todas as noites desde o primeiro dia, sonhei com Renan.