— Papai! — gritava me debatendo, mas estavam me levando para o lado de fora.
— Voltem! Não levem meu filho! Filhinho! Armando! Armando!
A voz de papai foi ficando cada vez mais distante, e do lado de fora, nos ombros do policial, avistei Victória e Conrado de mãos dadas, unidos e realizados.
Não sei por quanto tempo eu fiquei ali. Ou porque. Estava tudo tão escuro naquele quartinho. Confuso. Frio. Às vezes entrava alguém e deixava um lanche ali. Mas não sentia fome. Apenas tristeza. E eu queria o meu pai. Apenas o meu papai. Mas não foi ele que entrou quando misteriosamente as luzes daquele quarto se acenderam.
— Nathan? — perguntei confuso ao vê-lo entrar com uns livros na mão.
— Eu vim estudar… Com você. — respondeu ele mais assustado do que eu.
Nathan pôs os livros no chão, e apenas corri e o abracei. Estava tão desesperado. E ali, eu chorei para ele. Ele limpou minhas lágrimas, beijou minha testa e me pôs deitado em seu colo. Contou histórias pra mim. Me confortou. Me fez rir. E num determinado momento me beijou. Aquele galego sardento tocava com seus lábios nos meus com uma intimidade! E era gostoso. Sua língua brincava com a minha. E logo após, sua mão gelada e atrevida entrava pelo meu short e apertava meu pintinho que ainda se formava, me provocando um choque térmico. Rimos. Voltamos a nos beijar, porém fomos interrompidos.
— O que é errado te apetece. E erros devem ser corrigidos com castigo.
Victória! Larguei Nathan e levantei, a afrontando com ódio. Nathan tentou correr, mas me coloquei na frente dele e afirmei que ele estava seguro. Então ele apenas se escondeu de Victória atrás de mim.
— Nathan, vá! — ordenou Victória — Você cumpriu bem o seu o papel.
Olhei sem entender para Nathan e ele simplesmente saiu.
— Isso que você faz é errado, menino. Se chama sodomia, viadagem, entre outros termos. Você não se comporta como um homem. Portanto, teu pai me deixou na responsabilidade de lhe dar o tratamento de realidade. Sua bichinha safada!
Victória começou a caminhar lentamente até a mim com seus olhos arregalados, mas não temi. Continuava a caminhar e tirou uma seringa do bolso de seu vestido, mas não temi. E quando ia aplicar a seringa em mim, apenas consegui desviar, chutar sua canela e empurrá-la, fazendo a cair e se espetar na própria agulha. Nunca mais ia temê-la, pois era um Calvin. Armando Calvin. E daquele quarto sai correndo, descobrindo que estava num sótão da mansão dos Grayson, e conseguindo me livrar e fugir de lá.
— Bom dia, gurizinho!
Abri os olhos e pude sorrir ao ver a imagem do tio João. Eu estava seguro. E estava também numa cama quentinha com um delicioso cobertor que me aquecia. Espreguicei-me e dei um abraço forte e apertado no tio João.
— Obrigado tio. — disse o soltando — Eu não tinha pra onde ir. Eu não sei pra onde levaram meu papai. Eu não sei o que tá acontecendo.
Tio João abaixou a cabeça, parecia que queria me contar algo, mas deteve-se.
— Se acalma. Eu vou cuidar de você. Mas eu não posso mantê-lo aqui, pois…
— Por favor, tio João, não me abandona, por favor, por favor! Eu não posso sofrer o castigo! Eu fiz errado, eu sou errado, a dona Victória quer castigar eu!
— Aquieta, piá. Do que tu tas falando?
— Eu beijei o Nathan na boca. Duas vezes. Eu gostei, gostei muito, mas eu não entendo... A Victória beijou o papai na boca também! Eu beijei o Nathan, que eu achava que era meu amigo, mas é errado e muito feio. Mas eu gostei, eu só...
Não entendia. Estava tudo confuso. E lágrimas caíram no meu rosto.
— Calma, gurizinho. Até nos erros existe beleza, pois é através deles que nos tornamos pessoas melhores. E tu és piá demais pra errar, visse? — sorriu levantando-se e concluindo — E eu preciso ir trabalhar. Teu café da manhã ta na mesa pronto. E vê que se cuida, tá mocinho? A gente ainda vai se ver muito um dia!
Notei estranheza na última frase de tio João e na sua voz embargada ao pronunciar isso, mas apenas concordei. E ele foi embora. Tomei o meu café conforme o instruído e logo cai no sono. Ao acordar, minha visão estava muito embaçada. Sentia que tava sendo carregado pelos braços de alguém. Enxergava várias pessoas a minha volta cochichando e com rostos enternecidos. Vi Victória, mas não consegui esboçar nenhuma reação. Mas foi ao ver tio João, de cabeça baixa e com rosto banhado de lágrimas, que entendi tudo.
— Tio João… Eu sou apenas um guri… Você prometeu… Você errou… — balbuciei chorando e caindo num profundo sono.
Ao acordar, tive que cumprir meu castigo. Na verdade, viver um castigo. Um castigo que durou 11 anos. Victória me deixou internado num centro de cura clandestino gay nos Estados Unidos. Lá, sofria de cobaia nas piores barbaridades de psicologia barata. Tive meus cabelos raspados, minha mente invadida por aparelhos eletromagnéticos, eletroconvulsoterapia sessões de vídeo sexuais (que eu nem sabia o que era) heterossexuais, entre outros métodos aterrorizantes deles. Lá dentro também fui descobrir o que finalmente havia acontecido com o meu papai. Pai. Ele havia sido preso por ajudar patrocinar um atentado terrorista no EUA. Ele, como braço direito do governo de Capeside, autorizou clandestinamente verbas que patrocinaram esse atentado. E apesar de um único culpado, Capeside foi acusada de ser um estado independente financeiramente pelos demais. E com o desprezo dos outros estados brasileiros, Capeside declarou-se um país-estado independente. E justamente por ser filho de um terrorista, que eu tinha um tratamento diferenciado no centro. Os detentos mais antigos, que já se afirmavam machos suficientes, me torturavam. Espancavam. E até me estuprav... Faziam coisas horríveis comigo. Acabei passando a ser o alvo principal de gozações de todo o centro de cura, arranjando um próprio modo de criar minhas defesas. E foram essas defesas que me fizeram ser o primeiro a conseguir fugir do centro assim que completei 16 anos.
Passei meus 16 aos 20 anos nas ruas frias de Nova York. Chupando cacetes, dando o rabo, comendo um, roubando outros e passando pelos desprazeres na vida para ter o prazer de adiar a morte. Mas a morte do meu pai não foi possível de ser impedida.
Em todos os televisores ligados era possível saber da noticia da morte do terrorista David Calvin. Já tinha passado 7 dias, mas os noticiários ainda eram os mesmos. Naquele maldito bar, tinha o desprazer de ouvir os comentários maldosos sobre o ser que me gerou e se tornou um criminoso. Tomava minha bebida, debruçado no balcão, quando notei que um loiro sentou-se ao meu lado. Com certeza, não era da área. Não tinha o perfil dos que frequentavam o bar. Mantive-me concentrado na minha bebida e o sujeito teve o desprazer de comentar a notícia da TV, mas mantive-me calado. Ele então deu uma alta gargalhada, aproximou-se sua boca de meu ouvido e sussurrou:
— Como você cresceu... Armando Calvin!
Fiquei pálido. Meu coração disparou. Olhos saltaram. Levantei, empurrei os copos que estavam sobre o balcão no chão e sai em disparada para fora do bar. O loiro me seguia. Comecei a correr desesperado. Aquilo não podia estar acontecendo, não voltaria para o meu passado, eu não sou Armando Calvin! Corria, corria, corria, e mesmo correndo tanto o loiro mantinha-se no meu encalce. Maldito! Como era de se imaginar, no desespero, entrei numa rua sem saída e quando me virei, dei de cara com o estranho loiro. Apliquei um soco na cara dele, dei um chute nas suas bolas, o imprensei contra parede e tirei um canivete do bolso apontando para sua barriga pronto para furá-lo.
— Armando, não! Sou eu... Nathan!
Aquele galego sardento! O maldito que me abandonou e me usou mesmo sendo uma criança. Nada daria mais prazer em continuar o serviço. Ele se assustou ao ver que eu prosseguiria.
— Não faça isso! Eu sei que você nunca conseguiu me superar na inteligência, mas não acredito que você tenha ficado tão burro — ironizou.
Soltei-o. Larguei o canivete. Sai andando.
— O anjinho sempre evolui pra diabo não é?
— Fuck off! — berrei parando de andar e virando-se para ele.
— Eu vim a mando do seu pai! Antes de ele morrer. Ele era inocente. Eu era amigo dele.
— Meu pai era um mentiroso! Homofóbico, assassino e terrorista! Porque mesmo eu acreditaria em você?
— Porque é isso que querem que você acredite. Esqueça tudo que você acha que sabe, Armando. Seu pai era inocente. Ele foi vítima do Conrado e Victória, os verdadeiros responsáveis pelo ataque terrorista. Eles incriminaram seu pai para livrarem-se da culpa e conseguirem o que eles tanto queriam: Liderar um país. Eu sempre fui muito inteligente e acompanhei toda a história de perto, até participando, como você sabe. Seu pai tinha um fundo reserva muito bem aplicado e guardado, e quando percebeu minha inteligência desvalorizada naquele mausoléu de império, ele investiu em mim. Nos tornamos amigos e ele até me dizia que minha inteligência era parecida com a sua. Com o dinheiro fundei uma empresa em Capeside, NateCorp, onde você tem 49% das ações.
— Nathan, i can’t...
— Seu pai escreveu diários na prisão, hábito que ele incentivava em você, lembra? Nesses diários estão todas as suas respostas e toda história verdadeira.
— Você é um men...
— Victória. Conrado. Lídia. William. Michele. Essas são apenas algumas pessoas que ajudaram na derrocada do seu pai. E se você quer saber de tudo, apenas me siga.
Nathan seguiu andando e eu fui atrás dele. Ele entrou num carro e me deu uma caixa de diários. Peguei aquela caixa e sai desesperado do carro, parando num local abandonado e lendo páginas por páginas de cada diário:
“Meu querido filhinho, Armando. Se está lendo isso duas coisas aconteceram: Finalmente o papai será capaz de te oferecer a vida que lhe foi injustamente negada. E infelizmente não eu poderei participar dela. Espero que esses diários forneçam as respostas que você se perguntou em todos esses anos. Não sou o homem que dizem que sou. Não fiz as coisas que dizem que fiz. Perdoe-me por ter sido tão rude com você naquela noite. E peço que prometa a única coisa que tem sido tão difícil pra mim: Perdoar”.
Essa foi uma promessa que não pude manter. Não o perdão aos seus inimigos. A chance de meu pai fazer justiça com seus inimigos foi tirada dele e sua única opção era perdoar. Eu tenho outras. Como eu disse, essa não é uma história sobre perdão. Por isso, perdoe-me querido diário. Mas quando tudo que você ama é roubado de você, às vezes tudo que resta é a vingança. Ou para os mais conservadores, uma pequena revanche.
— Bem vindo à Capeside, Emmet Thorne! — recebeu-me alegremente Ellen na mansão dos Grayson.
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Valeu pelos comentários no conto anterior, galera. Realmente, Dr. Romantico, esse foi só o início pra entenderem o desenrolar da história. E como to dividindo o conto em A, B, kirasex, pra quem n assiste a série e lê a primeira parte pode n entender, mas na segunda parte tem a explicação. Bem naquele estilo confuso e misterioso que a série tem msm hahaha Que inclusive tem algumas falas do seriado aqui pq curto demais xD Nos próximos dias estarei publicando os outros capítulos e obgdão a quem acompanhou e curtiu (: