Andava entre as árvores com pressa e sem olhar para trás. A cada passo que eu dava mais me distanciava do local onde ele havia me pedido para ficar. Fiquei em silêncio com um nó no meu peito... Eu não conseguia mais acreditar em Enzo. Eu não conseguia mais confiar nele, pois tudo o que ele fez nesses últimos tempos foi querer me destruir. Como poderia confiar no homem que diz que me ama, mas não hesitou em me jogar na miséria e que depois se diz arrependido?
Parei em uma clareira com os pés cansados, sentando em uma árvore caída. O céu era de um branco luminoso e de vez enquanto caiam pequeninos flocos de neve que derretiam antes mesmo de chegarem ao chão. Eu sempre o quis, eu sempre o esperei, mas agora custava a acreditar... O que ele faria? Ele me disse que queria cuidar de mim e de Isabella, mas eu não acreditava realmente. Sabe se lá o que ele realmente quer.
Em um momento, reparei no lugar onde estava. Era um lago congelado onde a tinha árvores altas de madeira escura, com galhos finos cheios de cristais de gelo afiados como faca... Em certos locais era tudo tão fechado, que a luz mal chegava ao solo. O frio era cortante assim como o silêncio. A Floresta Negra era assustadora, dando-me calafrios e arrepios... Sempre tive medo de lugares como esse. Ouvia histórias horríveis a respeito desse lugar, como no ano passado, mais precisamente em julho onde sete garotas foram encontradas mortas e nuas, penduradas com uma corda no pescoço em uma árvore. Todas elas, de acordo com o perito, eram virgens e que todo o sangue delas havia sido drenado do corpo através de cortes no pulso.
Nunca acreditei em magia negra, mágica, bruxaria ou qualquer uma dessas coisas. Acreditava em pessoas más que faziam maldade. E tinha medo delas. Dei os ombros e afastei o meu medo me concentrando em como iria chegar a Florença, pois se ficasse na cabana com Enzo provavelmente eu não resistiria ao... Charme másculo dele, e me entregaria como fiz ainda pouco. Aquele maldito sabia bem como me deixar amolecido só para tirar proveito. Abri a cesta pegando a faca e cortando um filete de carne comendo silenciosamente.
"SCLAK"
Ouvi um som de madeira sendo quebrada... Aquilo me deu um sobressalto de susto. Deveria ser impressão minha, mas mesmo assim fiquei paradinho no meu canto, segurando firme o cabo da faca. Silêncio. Depois mais um estalo.
— Lorenzo! Eu sei que és tu... Pare de gracinhas! – disse, respirando fundo. Era óbvio que deveria ser ele, TINHA que ser ele.
Silêncio. Os "sclaks" aumentaram progressivamente, e engolia o seco.
— .... Grrrrrrrrrrrrrrrrrr – um rosnado bestial ecoou entre as árvores. Meu coração deu um solavanco, e o horror me dominou quando olhei para o lado oposto de onde estava. As patas pesadas e peludas tocaram o solo congelado. Era um urso grande e albino, com o pelo branco imaculado. A íris era rosada e com a pupila vermelho-escuro, como se tivessem sangue injetado nas pupilas.
— Meu Deus... – disse baixinho. Ele andava lentamente, de um jeito ameaçador. Abriu a boca exibindo os dentes extremamente pontudos e afiados. Segurava a faca com força fazendo os nós dos meus dedos doerem, mesmo sabendo que aquela lâminazinha seria o inútil diante daquela fera.
Olhei para cesta vendo a carne e tive a ideia de joga-la ao longe, para que eu tivesse tempo para correr. Mas quanto seria? Minutos? Segundos? Ele devoraria a carne em um espaço de piscar os olhos e depois me seguiria pelo o rastro do cheiro. Se corresse agora, ele me pegaria em cheio por que minha velocidade é inferior a sua. Eu não tinha como lutar, e muito menos como sobreviver. Senti o meu medo fluir nas minhas veias, petrificando e paralisando as minhas pernas e braços. Era esperar para morrer...
— Louis?! – disse uma voz fazendo eu e o urso olharmos. Era Enzo. Eu senti uma onda tão grande de alegria ao vê-lo... Ele iria me proteger. Com certeza, ele me salvaria, afinal ele sempre disse que iria me proteger. Ele estava com um machado na mão e correu até mim se postando na minha frente. Da mesma forma que o urso rosnava e eriçava os pelos para mostrar perigo, Enzo fazia algo parecido apertando os pulsos e inchando o peito de ar fazendo-o parecer mais ameaçador. – Louis pegue essa espada e segure-a bem.
Peguei a espada pelo o cabo, segurando-a em posição de defesa. O urso andou mais rápido em nossa direção, saltando no ar em nossa direção onde Enzo o deu um chute nas costelas fazendo-o saltar para trás atiçando ainda mais a ira dele... Os meus pelos arrepiaram.
— Corra para longe daqui. Não quero que corras perigo! – ele disse sem olhar para mim.
— Eu não irei te abandonar aqui. – disse firme.
— Seu tolinho! Eu estou protegendo-te... Saia daqui Louis! SAIA AGORA DAQUI! NÃO QUERO QUE SE MACHUQUE! – ele gritou comigo. Andei para trás com cautela, ainda apontando a espada quase saindo da clareira. O urso rugiu alto, dessa vez para Enzo. Ele correu agora com tudo, dessa vez atingindo-o em cheio jogando os dois no chão. Enzo empunhava o machado com as duas mãos em cada extremidade, de modo que o animal mordia com força o cabo de madeira. A cada mordida, mais e mais a madeira era destroçada.
Olhei Lorenzo e corri em direção a ele, não me importando se eu iria morrer ou não. Eu queria salvá-lo. Nesse momento, Enzo mais uma vez empurrou com as pernas o urso para longe, e aproveitei esse instante para pegar o machado que estava no chão largando a espada, correndo em direção à fera. Segurei o cabo com força e acertei em direção ao pescoço dele fazendo a cabeça saltar para fora, e o corpo decapitado jorrar sangue pelo o gelo. O machado ficou cravado no piso que começou a rachar... O gelo trincado começou a se desfazer e aí me lembrei de que estávamos em um lago congelado.
— CORRE!!! – gritei, enquanto obrigava as minhas pernas a correrem o mais rápido o possível enquanto o piso de gelo se desintegrava a uma velocidade incrível, mas o lago era grande e o solo firme longe. Desatento enquanto corria, pisei com força em uma rachadura fazendo-a quebrar. Cai dentro da água semicongelada, sentindo-a me atingir como se milhares agulhas estivessem penetrando a minha pele. Era tão fria, mas tão fria que se eu fechasse os olhos era possível ter a mesma sensação de estar sendo queimado com fogo.
Ouvia o meu nome, mas não sentia nada a não ser a dor... A luz da superfície era a única coisa que eu via, tentava subir mesmo não sabendo nadar com rapidez o suficiente. Afundava progressivamente a medida em que perdia a consciência. A luz se distanciava, e a escuridão parecia confortável... Acolhedora. A realidade era dolorosa, vermelha, e intensa. A escuridão era anestésica, calma e tranquila. Não sentia mais o meu corpo. Era hora de me entregar e parar de sentir dor e frio... Não era?
. . .
Eu estava acordado, mas não abri os olhos. Era quente, confortável e macio. Me sentia mais tranquilo, mesmo com o corpo ainda tendo espasmos estranhos de dor. Eu teria morrido? Não. Que tolice! Eu ouvia os estalidos da madeira sendo queimada pelo o fogo e... Espere! Se havia fogo... Eu estou no inferno? EU MORRI E FUI PARA O INFERNO?! Eu era belo demais para viver em um lugar com enxofre e fogo! "Ah pare de ser tolo Louis. Simplesmente escute" disse o meu lado racional.
Sentia uma mão tocando a minha com tanto cuidado como se tivesse medo de quebrar os meus dedos. Uma respiração pesada e amedrontada era ritmada. O meu rosto estava sendo tocado pelos os dedos de alguém, e simplesmente não queria abrir os olhos. Eu sabia que era ele. O silêncio perdurou por algum tempo.
— Por que fizestes isso meu amor? – Lorenzo disse em uma voz cheia de culpa, chorando. Ver um homenzarrão daqueles chorar era algo inédito. – Eu devia ter ficado lá e te protegido! Eu não sou um bom marido... Tudo foi culpa minha! Perdoa-me meu amor. Eu sou um grande imbecil!
"Marido"? Ele disse marido? Senti um leve sobressalto de reações: estranhamento, confusão, um misto de alegria e orgulho próprio. Orgulho por que, eu tinha um "marido" tão galante, bonitão, forte, alto, rico e... Mas que besteira é essa que estou dizendo? Lorenzo não é o meu marido e nunca foi e nunca será! Homens só se casam com mulheres... "Sim... Homens só se casam com mulheres." pensei triste. Quisera eu ser casado com ele, assim a sonsa da Alice ficaria verde de inveja. Ah como eu queria que ela ficasse verde de inveja... Adoraria passar na frente dela esfregando a aliança na face, e ver a infelicidade dela estampada nos olhos.
— Sim. Tu és um grande, completo e tremendo imbecil. – disse fazendo com que a minha voz parecesse o mais frágil o possível. Assim ele se sentiria ainda mais culpado (o que de fato ele merecia) e me pouparia de perguntas capciosas.
— AMORE MIO!!! – ele gritou feliz. Mas que mania é essa de italiano gritar?! – Desculpe por ter te deixado lá sozinho. Eu deveria ter ficado lá e ter garantido sua proteção... – ele chorava de arrependimento. Devo dizer que ver aquele imbecil chorar o fez parecer um... Imbecil "fofo". Ele estava ao meu lado na cama e estava sem camisa, exibindo o físico escultural. Que homem é esse!!!
— Tudo bem... Mas nunca mais me deixe sozinho... – tomei cuidado com o tom de voz, ainda o deixando baixo como um sussurro.
— Eu prometo está bem? – ele beijou a minha mão com cuidado exagerado. Que bonitinho. – Fiquei com tanto medo de que te acontece-se algo pior... Eu não queria te perder. Quando eu te vi lá indefeso eu não pensei duas vezes... Me perdoa, me perdoa, me perdoa!
Olhei para os olhos cinzentos dele que estavam cheios de lágrimas, como uma nuvem de chuva. Fiquei tocado, digamos assim. Ele estava muito preocupado, e me olhava de uma forma tão arrependida que eu quase tive o impulso de ir lá e limpar as lágrimas dele e dizer que estava tudo bem. Lorenzo me olhava como seu eu fosse a única coisa do mundo dele, e isso era muito atordoante a mim. Por que o havia salvado? Quando avancei com aquele machado, eu não pensei duas vezes antes de atacar, mesmo que custasse a minha vida. Eu queria que ele se salva-se. Que estivesse bem e sem perigo.
"Eu havia matado mesmo um urso selvagem?" Pensei comigo mesmo relembrando o passado. Quando era pequeno, papai não deixava ir com ele para as caçadas por que dizia que "filhinho dele não foi feito para viver em florestas atrás de bichos", e mesmo que mamãe deixasse eu também não queria ir. Digamos que gostava mais de ficar são e salvo entre quatro paredes. Agora tinha acabado de meter um machado no pescoço de um urso e o decapitado. E salvado a pele de Lorenzo.
— Louis? – ele murmurou sorrindo, expondo os dentes brancos perfeitos.
— Sim... – disse.
— Eu te amo tudo bem? E... – ele chegou perto do meu rosto, tocando o meu queixo. – Fica aqui comigo. Pense no quanto seria maravilhoso, se eu, tu e Isabella vivêssemos como uma família!
— Enzo eu... – ele me interrompeu colocando o dedo em meus lábios. A mão dele cobria desde o meu queixo até o meio de minha testa, e ele aproximou a boca dele da minha. E iniciou um beijo calmo e bem devagar. Enzo sabia bem o que fazia, e era como se me aquecesse da boca até as pontas dos pés. Ele deitou ao meu lado da cama, me abraçado sem fazer pressão.
— Sabe o que é engraçado? É que eu fui lá para ser o seu herói, mas foste tu que me salvaste. – ele falou rindo.
— É realmente. – falei pomposo. Eu salvei a vida daquele traste!
— Mas por que tu estavas naquele lago sozinho Louis?
— Bem eu... – estava tentando achar uma resposta.
— Iria fugir não é? – ele falou sério. – Por quê?
— Enzo a questão é que realmente não vejo como podemos dar certo. Não percebes? Somos tão diferentes um do outro. E eu não consigo mais confiar em tu... Não depois que fizestes comigo. – falei olhando o rosto dele. – Simplesmente não consigo. E para ser sincero eu ainda sinto raiva de tu.
— Foi tudo culpa do Oliver eu juro que não sabia! – ele falou beijando minhas mãos.
— Mesmo assim. Eu sinto muito Enzo. Eu vou me casar! Serei um príncipe e sairei dessa lama chamada pobreza. – disse me levantando. – E não vou mudar de ideia.
— Eu agora tenho posses! Tenho como dar para ti e para Bella uma vida mais do que confortável... – ele falou.
— Não Lorenzo. Eu quero voltar para minha casa. – disse. – E irei me casar com Camila. Entenda isso.
Ele pensou por um momento e por fim soltou uma risada rouca.
— Eu não vou ficar bravo. E nem vou me desesperar com isso... Sabe o por que? Por que de qualquer modo eu terei os dois de volta para mim. Deixarei tu mesmo perceber que não pode ser feliz sem mim por perto. Por que eu sou o homem certo para tu... Só eu te levo a loucura, te faço subir pelas as paredes. Somos tão errados que somos o encaixe um do outro. – ele falou dando um beijo na minha testa. – Seu cabecinha dura.
Não entendi.
— Pegue – disse tirando o anel de diamantes do meu dedo e entregando a ele.
— Fique com ele. Não se recusa presentes e ainda mais diamantes não é? – ele falou. Ainda bem. Me dava até raiva de ter que se desfazer daqueles brilhantes. Enzo me abraçou dessa vez me apertando, comprimindo o meu rosto no seu peito onde emanava calor e um cheiro muito gostoso. Ele ficava me embalando em uma dança lenta e silenciosa, e abracei os ombros dele tentado em vão ficar na mesma altura que ele. – Sabe qual foi o meu primeiro pensamento quando te vi pela primeira vez?
— Qual? – perguntei emocionado pelo romantismo dele.
— "Que bambino fresco!" – ele gargalhou. Dei um chute na perna dele. – Ai!!! Calma Louis.
— Oras... Vá para o inferno!!! – disse irritado saindo do abraço dele. Ele me abraçou por trás roçando o volume dele nas minhas pernas.
— Desculpe! Eu vou explicar-lhe. Não gostava de tu nos primeiros momentos. Achava-te muito irritante, intrometido, mimado, maldoso, mas estranhamente bonito. Muito bonito sem dúvida, mas com o passar do tempo fomos nos aproximando tanto... – ele disse beijando minha nuca e acariciando o meu cabelo, depois me virando de frente. – Aprendi a amar esse teu jeitinho se ser.
E girávamos devagarinho naquela dança. Por mais que não tentasse demonstrar eu era louco por aquele homem.
— E é por isso que deixarei tu ir se casar. Essa será a prova de que precisas. – ele murmurou.
— E se eu ficar bem? Digo, e se eu viver feliz e próspero. – falei com a minha cabeça encostada no corpo dele.
— Bem, ficaria extremamente infeliz em viver sem o meu fedelho... Sem nunca mais ver o teu sorriso... Ou te ouvir gritando com alguém querendo algo... – ele riu me segurando pelo o quadril. – E para piorar ainda ficaria longe de minha filha. Quer dizer, nossa filha.
Gostei do modo que ele disse "nossa filha". Mesmo sentindo um pouco de ciúme, por quê Isabella até então era só MINHA filha.
— E se eu quiser viver convosco, o que farias? – falei enquanto ele me girou pelo o braço. Dançávamos em sincronia perfeita.
— Sequestraria-te e levaria tu e Bella para bem longe. E assim viveríamos juntos. – ele parou, erguendo o meu rosto. Ele me beijou, me segurando firme por que se não eu cairia no chão como se fosse um boneco de pano de tão amolecido que fiquei. Ele parou aos pouquinhos e terminou dizendo. – Amanhã voltaremos para Florença, está tarde e não quero arriscar.
Enzo caminhou com um elegância de um lorde (diferente do jeito carrancudo que se portava há 3 anos) para fora do quarto.
— Vai aonde? – soltei sem pensar.
— Dormir na sala. Não seria cortês de minha parte dormir com alguém que não me quer por perto. – ele sorriu docilmente.
— Fica aqui comigo... A cama é grande a noite faz frio e... E eu sinto falto de dormir contigo me abraçando... Durma comigo? – falei corando, cedendo um pouco de meu orgulho.
— Nada me faria feliz. – ele sorriu. E assim dormirmos os dois juntos e abraçadinhos.
CONTINUA: )