Anoiteceu. Acontecia a festa em comemoração a Capeside num luxuoso navio. Ali, estavam imprensa e a alta sociedade de todo o mundo comemorando os 15 anos de independência de Capeside. Por toda à tarde, Conrado ficou aos cuidados de Victória. A Rainha até estranhou tudo que aconteceu, principalmente por encontrar o marido num motel, porém Conrado usou a desculpa que parou no motel para descansar antes de encarar a viagem e Victória fingiu acreditar. Já Ellen, que devia organizar a festa, com todo esse incidente ganhou novas ocupações. Então aproveitei e me ofereci, ficando encarregado da organização da festa. Organização de uma festa belíssima. Iniciada com um belo, e falso, discurso feito por mim sobre as belezas de Capeside, deixando todos admirados, e um outro, enciumado.
— Meu Deus, Emmet, você caiu do céu! Até a Rainha Victória dobrou-se aos seus talentos. Fora que você ainda mentiu dizendo que te ajudei! Ai... Meu amigo lindo!
Ellen me abraçou me dando um carinhoso beijo na bochecha. E Daniel, que já nos observava de longe tomando seu vinho, me fuzilava com seus olhos estreitos.
— Parece que alguém está com ciúme... — falei no ouvido de Ellen, a abraçando por trás e encarando Daniel.
Ellen me olhou sem entender, mas ao ver que eu olhava para Daniel, ela olhou para o principezinho, sorrindo feliz, porém ele apenas acenou negativamente e saiu andando.
— Viu? Não é ciúme. É apenas zelo exagerado de que alguém roube o brinquedinho dele. Você não viu como ele me tratou mais cedo? Ele sempre faz isso, pega e...
Adoraria fazer o bom amigo, porém não dá para ficar na escada quando se pode chegar ao império. Afinal, avistei Victória e Conrado conversando num canto bem reservado com Lídia, e essa era a minha oportunidade.
— Pois então trate de se tornar um brinquedo bem caro e trabalhoso. E não me importo de fingir interesse no seu brinquedo. Concorrência sempre valoriza. Pense nisso.
Dei um carinhoso beijo em Ellen e me retirei, sorrindo, me aproximando do trio. Era nítido o pavor de Lídia e Conrado. Era agora. A farsa seria descoberta. E a primeira pedra sobre o império seria atirada.
— Lídia, querida? Que bom encontrá-la! Hoje mais cedo quando eu cheguei ao motel para saber o estado do Conrado, você saiu desesperada quando me viu! Mas também não é pra menos, você fez companhia para ele mesmo devendo estar na financeira, não é mesmo? Ah, e depois que entrei no quarto para verificar como o Conrado estava, eu notei que você acabou esquecendo os seus brincos no criado mudo. Aqui estão. — disse tirando do bolso um par de brincos.
Victória ficou branca como cera, perplexa. Conrado passando as mãos sobre os cabelos, preocupado. E, meu querido diário, Lídia estava desmascarada. Apenas ouviu-se o eco de uma bofetada.
Um belo bofetão. As mãos de Victória pareciam ainda queimar no rosto sonso de Lídia. As duas se encaravam com os olhos cheios d’água. Descontrolada, Victoria cuspiu na cara de Lídia, sorrindo e saindo. Conrado tentou ir atrás da mulher, porém Lídia chorando desesperadamente, o abraçou e o impediu. Aproveitei e saí, estrategicamente.
— Victória, please, wait! — a Rainha parou ao ouvir minha voz — I’m so sorry. Por tudo isso. Eu não queria, eu não sabia, i’m... I’m sorry.
Victória virou-se para mim e seus olhos estavam vermelhos de ódio.
— Não use de hipocrisia comigo tentando convencer-me que é ingenuidade, pois você não é tão bom assim, menino. — engoli seco e assustado — Mas você é bom. Mostrou lealdade. Obrigada. Para revelar algo sórdido com máxima discrição é necessário o mínimo de hipocrisia. E isso é uma qualidade para os Grayson. Agora seja hipócrita o suficiente para se convencer de que se esqueceu de tudo que viu.
Assenti e fingi me retirar.
— Emmet, espera! Você se importaria em me ajudar a fechar essa festa com chave de ouro?
Dos olhos vermelhos de Victória caíram lágrimas e um sorriso surgiu no seu rosto. E era com esse sorriso, que a Rainha de Capeside, belíssima, fazia um discurso fora do planejado o que surpreendeu a todos. Afinal, as festas de Capeside sempre tinham agradáveis surpresas. Porém, eu já sabia que dessa regra teria exceção. Ouvia o discurso junto com os demais, abraçando provocativamente Ellen, por trás. Percebia que Daniel nos observava, extremamente enciumado. E me divertia com Conrado e Lídia, olhando assustados para Victória, como animais pronto para serem abatidos no matadouro.
— Queridos e queridas, vossa Rainha pede encarecidamente que todos saúdem com uma salva palmas o mais novo morador de Capeside: Emmet Thorne.
A luz do refletor caiu sobre mim e recebia os aplausos de todos. Victória prosseguiu:
— Porém, nessa vida, enquanto nos alegramos com a vinda de uns, nos lamentamos com a perda de outros. Sim, sim, sim, não é necessário burburinhos. Falo dela, minha querida amiga, Lídia Davis. O que falar dela? Pobrezinha, passou por tantas coisas. Descobriu que o marido a traia com uma moça mais jovem e bela. Passou a morar de favor na minha casa. Conseguiu um aumento de salário por caridade. E agora um novo baque: Lídia era cúmplice e desviava o dinheiro do governo junto com o ex-marido.
Todos começaram a falar. Lídia acenou negativamente, incrédula. E Conrado pôs a mão na boca, enojado.
— Por favor, senhoras e senhores, por favor. O caso só foi descoberto agora! O nosso querido Emmet, já trabalhou em finanças, e ao dar uma olhada em alguns de nossos anexos, descobriu e me mostrou o caso. E Lídia, eu a entendo. Entendo que você apenas estava do lado do seu marido. Afinal uma boa esposa sempre apoia e esconde os erros do marido. Lídia, infelizmente, você nos deixará. Mas saiba que as portas do meu coração sempre estarão abertas assim como as portas do inferno estarão agora para você. Seguranças, por favor, a acompanhem e a levem.
Lídia olhou apavorada e Conrado saiu discretamente do seu lado. Os seguranças a seguraram e ela começou a gritar, desesperada, porém eles rapidamente a levaram e a colocaram numa lancha partindo para fora de Capeside.
E a festa praticamente seguiu como se nada tivesse acontecido. Afinal Victória apenas se retirou, porém ordenou que tudo prosseguisse. E palavra de Rainha é palavra decretada. E para um vingador, novas confusões sempre são bem-vindas.
— Emmet! Emmet! O Daniel não me quer! Você me quer? Hein? Me quer?
Ellen já estava bêbada. Aliás, a festa toda a pobrezinha brigava silenciosamente com Daniel. E esse parecia também já ter bebido demais. Então apenas consolava minha amiga, que estava sentada quase já desmaiada no meu colo.
— Capeside é um local podre! Você sabia? Podre... Podre! Porque a beleza excessiva é podridão oculta. Nosso principezinho Daniel. Ele aprontava todas! Alcoólatra! Alcoólatra sim! Uma vez, bêbado, o príncipe matou uma pessoa. É o que dizem. Os Grayson trataram de esconder a história. E há podridão na beleza!
Ellen caiu na gargalhada e nunca havia a visto tão mal. E ela nunca havia me sido tão útil. E o agradável chegou. Sim, Daniel. E com seu copo de vinho na mão.
— Ellen, larga desse mané porque a gente precisa levar um...
— Daniel, please, ela não...
— Cala a boca! Cala a boca, seu otário! — gritou exaltado com as veias pulsando no seu rosto de anjo e fazendo todos olharem para nós.
Ellen começou a falar coisas sem sentindo e quando fui me levantar junto com ela, ela acabou esbarrando no copo que estava na mão de Daniel, sujando a roupa do ‘principezinho’. Daniel se irritou. Temendo, a coloquei para sentar na cadeira e quando fui me virar para falar com ele, apenas vi sua mão fechada atingindo minha cara, fazendo minha vista ficar escura, meu corpo desequilibrar e cair no chão.
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Finalizei a festa com as chaves que eu planejava. Lídia deportada. Conrado e Victória desestabilizados. E a Rainha aos meus pés, agradecida, principalmente por concordar em abafar a atitude final do seu filhinho. Tão agradecida que resolveu fazer um jantar no dia seguinte em minha homenagem. Sim, tudo saiu como eu planejava. Afinal me custou muito ser cupido da jovem Bianca com Michel Davis, marido de Lídia, num jantar beneficente que ocorreu anos atrás no EUA. E mais ainda, ter de dar conselhos e estratégias para Bianca, para fazer com que Michel largasse Lídia e fosse morar com ela no EUA. O resto foi fácil. O currículo de fidelidade do Conrado era tão falso quanto uma nota de 3 reais. E com câmeras escondidas, descobri prazerosamente que ele tinha um caso com a melhor amiga da mulher: Lídia. Que de mera secretária passou a consultora financeira quando se calou, mentiu em depoimento, acusando meu pai de desviar dinheiro para o ataque terrorista. Tudo por poder. Cargo. Ganância. E agora, podia riscar o nome dela da lista sabendo que a minha revanche foi muito bem sucedida.
Já madrugava. Estava sem sono. Degustava um vinho sentado na cadeira balanço que ficava perto da lareira na sala. Quando notei a sombra da alguém na porta. Droga, não havia a trancado! Lentamente, a pessoa foi andando e apenas me mantive parado na cadeira, com os olhos cheios d’água. Meu coração disparava.
CONTINUA...