_Eu sou o prefeito dessa cidade. O número um. Você vai trabalhar pra mim, vou seguir as orientações, mas eu sou o número um. Acho que fui claro o suficiente._ Ele se levantou para sair. _A propósito, se você pode perceber eu também sou bem poderoso, e agora vou pra casa jantar com a minha família, como eu disse na entrevista, sou homem de família. E você, aproveite o cardápio, o restaurante é todo seu._
Capítulo 3
Se eu sabia ser petulante, ele havia dado uma aula. Nunca meus clientes haviam me desafiado, sabiam que o futuro deles dependia de como jogaria aquele jogo. De o quão longe iria pra salvar sua imagem. Mas ele não, fazia questão de demonstrar poder, e mesmo tendo feito uma grande burrada, tinha a necessidade de se autoafirmar como quem dominava a situação. Não podia negar que em termos aquilo era, de fato, atraente. Aquele homem que como eu tinha menos de trinta anos, bonito como um modelo de passarela, cheio de atitude como um leão, mas que provavelmente escondia em um armário um menino gay, indefeso e indeciso que implorava pra sair, me deixava muito intrigado. Havia me envolvido de uma forma, que não queria admitir, mas me gerava muita curiosidade. Não era nenhuma espécie de sentimento romântico, por vezes até era raiva, mas sempre curiosidade, me instigava a querer conhecê-lo mais.
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No domingo pela manhã, acordei com meu telefone tocando e seu assessor dizendo que um carro me esperava em frente ao hotel. Tinha uma reunião com ele.
Observei o local que o carro me levou, um sítio isolado o qual chegamos depois de alguns quilômetros. Dois seguranças me acompanharam até poucos metros antes de uma mesa de café da manhã muito bem servida – aquele café da manhã humilhava cruelmente os que as novelas globais apresentavam em horário nobre. Uma cadeira vazia, deduzi, com meu grande senso de adivinhação, que era minha. Do outro lado ele estava sentado e um jornal qualquer escondia seu rosto. Sentei, e por um momento me deixei distrair ao pensar o porquê política exigia tantos cuidados quanto aqueles, era lógico, a oposição percebeu uma faísca e agora iria até o fim para ver tudo explodir. Provavelmente espionavam todos os passos dele, e agora estariam desesperados por perdê-lo de vista. Ponto para ele, bom jogador. Voltei a Terra, ao momento. Ele nem sequer havia se dado o trabalho de descobrir o rosto, então precisava atacar:
_Suponho que não me trouxe aqui pelo simples prazer da minha companhia para o café da manhã?_
_Algum momento em que você não é arrogante e irônico?_ Ele baixou o jornal e fez cara de indiferença.
_Costumo dormir quando há tempo!_ Cutuquei.
Ele sorriu. E logo voltou a ficar indecifrável novamente.
_Fica a vontade, as comidas estão ótimas._ Sugeriu.
_Obrigado, mas sabe como é, não é fácil manter esse corpo escultural, e além do mais, por enquanto a curiosidade é o suficiente pra me alimentar_ Respondi.
Ele levantou, veio até o meu lado e serviu suco e café. Sentou-se novamente. Ok, ou aquilo era um gesto de gentileza – e eu teria que baixar a guarda, ou viria chumbo grosso a seguir.
_Gosto que meus serviçais estejam bem alimentados, é muito trabalho, sabe?_ Ele sorriu maliciosamente.
Odiava ser tratado assim, mas julguei que o melhor seria deixar que ele percebesse o constrangimento e entrasse, enfim, no assunto, para acabar com aquele encontro que era no mínimo bizarro. Funcionou.
_Desculpe._ Ele disse em um tom quase inaudível. _Quero que você me conte todo o planejamento, as ações, cada detalhe. Se tivermos que trabalhar juntos, que seja em parceria, dividindo as ideias.
Por um momento o observei, será que era só isso mesmo? Esperei, tentando incentivar que ele falasse mais, em vão. Então respondi.
_Ok. Pesquisei tudo sobre você enquanto vinha para cá, principalmente a respeito da época da campanha. Conquistou os eleitores pela fama de bom moço. O menino que cresceu na cidade e virou o herói, que nesses dias vai marcar presença com todas as forças em eventos, projetos e ações, mostrar trabalho. É assim que vamos passar pela crise. Trazer essa imagem de volta, mas com o adicional de que vamos destacar que você não tem nenhum tipo de preconceito, e por consequência, tem amigos..._ Exagerei na ênfase nesse momento, nem eu sabia o porquê! _...de todos os tipos._
_Então não vamos negar nada? Isso?_
_E nem confirmar, claro. O que vamos fazer é tirar o foco disso, mostrar seu lado simpatizante e o lado intransigente da oposição. Vamos virar a mesa._ Pausei. _Quanto a sua vida pessoal..._
_...ninguém tem nada com isso._
Apenas meneei a cabeça, em concordância. O clima havia ficado pacifico.
_Gostei da estratégia, nada mais que eu poderia esperar._ Sorriu, como se estivesse por cima. _Mas tem uma coisa. Para ficar no meu time tem que jogar limpo, Felipe._
_Sem problemas!
_Ótimo, então preciso ir, pois tenho um dia cheio de trabalho, certo?_ Disse se levantando.
_Ei, espera aí._ Interrompi e ele me olhou. _ Para o meu time ganhar, preciso que joguem limpo comigo, limpo, certo?_
_O que? Não existe nada mais. Só o que não preciso te dizer por que já sabe. Fui flagrado saindo de uma festa com um amigo._ Desenhou aspas com os dedos. _ Depois disso é tudo suposição da oposição._
_Alguma coisa para se preocupar com o flagra, ou são só palavras contra palavras?_ Questionei, afinal tinha experiência com essas situações em outros casos, que meus clientes não contavam tudo que eu deveria saber.
_Isso aí!_
_Certo. Bom trabalho!_ Desejei.
_Obrigado. Ah, e aproveita para comer o bolo de chocolate, que tá perfeito, e ler a matéria sobre a coletiva, acho que vai te agradar._ Ele sorriu e saiu.
Mais uma vez me deixou sozinho.
Li a matéria. O jornal local exaltava a coletiva oferecida por ele, dizendo que a população confiava nele e que como todos os jovens, sobretudo os solteiros, ele tinha direito de ter suas distrações e contato com todos os tipos de pessoas. Sem preconceitos, a causa mais aclamada dos últimos tempos. Não ter preconceitos era estar na moda, então meu cliente era bastante moderno.
Por um momento pensei que, talvez, ele não fosse como havia imaginado no início. Devia ser o bolo de chocolate que havia me deixado mais doce. Parei de comer, parei de pensar. Ele era político, enganava um número considerável de eleitores. Não poderia ser mais um desses, justo eu que nunca caí na lábia de políticos.
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Próximo capítulo previsto para:Até mais!