Passei a noite remoendo estes pensamentos. Sono e descanso não eram pra mim nesta noite. Eu não misturava negócios com prazer – apesar de já ter recebido belas ofertas.
Como na oportunidade de consolidar meu trabalho eu estraguei tudo? Dormir com meu cliente? Nem pra ser só um sexo casual, agora eu já tinha me envolvido.
Agora, eu era o menino gay assustado, encurralado.
Capítulo 7
Era sábado. De manhã. O dia claro por um sol que era intimidante, e os meus olhos escuros por uma olheira que era assustadora.
Tinha consciência de tudo que havia acontecido. Não aceitava, mas tinha noção. Sabia que precisaria conversar com ele. Talvez, para ele, misturar trabalho com vida pessoal pudesse ser normal. Pra mim era mais que difícil. Agora, eu precisaria de uma consultoria. Vic, pensei.
Ela atendeu a ligação no quarto toque. Sempre dorminhoca.
_Puxa, mas você é mais chato que o meu despertador, heim?_ Esses eram os “alôs” da Vic.
_Vic, me meti em um grande problema. Fiz uma burrada colossal!_ Eu queria dizer com todas as letras o tinha ocorrido, mas eu tinha amarelado bonito! Minha objetividade tinha ficado na mesa do gabinete na noite passada.
Entretanto, ela era objetiva por nós dois.
_Eu. Não. Acredito. Que. Você. Dormiu. Com. Ele._ Ela falou assim, pausado, sabia que ia me torturar.
_Como sabia? Ah Vic, eu não sei o que fazer agora!_
_Veja bem, qualquer idiota que ouvisse você, naquele dia que nos falamos, sabia que você iria virar comida de prefeito, era questão de tempo. Agora, uma coisa que me intriga, você resistiu pouco pra quem odiava ele, não é? Mas isso ainda não é importante._ Ela deu uma risadinha debochada. _Foi em cima da mesa dele?_
_Vic, cala a boca!_ Pausei. _Ai, foi em cima da mesa do gabinete!_ Minha boca disparou que nem uma arma sem controle. Fico descontrolado quando converso com a Vic.
_Eu heim! Pelo visto a prefeitura contratou alguém tão safadinho quanto seu todo poderoso! Aliás, ele é poderoso, Lipe?_ Ela riu de novo.
_Não vou te dizer isso. Mas quando eu lembro, eu perco totalmente o foco._ Suspirei ao telefone. Silêncio.
_Que nem agora?_
_Me diz o que eu faço!?_
_Duas soluções, bem diretas_ Eu tinha medo das diretas dela. _ Ou você assume de uma vez que está apaixonadinho por ele, que quer ser um “primeiro-damo” lindo e loiro, e fazer o governo mais causador de todos os tempos; ou você dá mais uns pegas nele e cai fora. O Felipe que eu conheço escolheria a segunda opção, mas esse aí, do outro lado da linha, me deixa um pouco receosa._ Ela disse calma, como se falasse de algo banal.
_Preciso pensar._ Concluí.
_É mesmo!_ Ela acrescentou. _Lipe?_ Ainda esperou eu assentir com um “hum”. _Eu vou ficar do teu lado para o que der e vier. Mesmo que você só der!_ Risos.
_Beijo Vic._
Sempre Vic.
.
Não tive tempo para pensar. Ou, dependendo do contexto, eu tive e não quis.
Meu telefone tocou. O motorista estava na porta do hotel esperando por mim. Desci e ele apenas me cumprimentou com um aceno de cabeça, solicitando que entrasse no carro. De novo aquele olhar de “eu sei o seu segredo”. Ainda inseguro, questionei:
_Onde vamos?_
_O senhor prefeito está discursando em um evento em frente à prefeitura, pediu que eu lhe buscasse._
Assenti. Alguns minutos depois estávamos lá. O motorista me acompanhou, pelos fundos, até o lado do palco, onde eu tinha uma visão privilegiada e era visto por quem estava ali da mesma forma. Um senhor engravatado discursava. Pelas minhas pesquisas anteriores, era o secretário de educação. Claro, aquele era um evento de recebimento de verbas para a educação. Muito propício. Ao chegar logo fui notado por ele, que sorriu e apenas piscou para mim, como um adolescente que namora escondido. Aquele sorriso era como se ele sugasse todas as minhas forças, e eu já nem sabia mais quem era o adolescente naquela situação. Porém logo fui visto por outro que estava no palco. O secretario, seu fiel escudeiro, fitou-me como se atirasse fogo pelo olhar. Lembrei do que havia acontecido. As fotos, a mentira, a chantagem. E um pouco do brilho foi embora.
Bernardo – acho que já poderia chamar assim, afinal já era mais íntimo dele que muitos naquela prefeitura – assumiu o microfone. O bom e velho garotão carismático da cidade. Com outros olhos pude avaliar sua postura, palavras e mergulhar em seu olhar enquanto discursava. Aquele olhar passava verdade, interesse, paixão pelo que estava fazendo. Os gestos mostravam paixão por tudo aquilo, os meus deveriam estar mostrando paixão por todo ele.
Meu Deus, quando fiquei tão romântico? Me perguntei. E perguntei novamente: e agora, o que eu faço?
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