O designer de cabelos
“Marcello?” Perguntei sem me virar e sem entender direito o que ocorria. “Eu esqueci que havia pedido à tarde de folga daí pensei em passá-la contigo, mas o seu telefone não respondia, eu me preocupei, então resolvi sair à sua captura.” Ele me respondeu enquanto me virava.
“Vivo ou morto?” Perguntei. “Pelado ou vestido” Ele respondeu fazendo aquela carinha cínica de garoto levado que eu tanto gosto. “O que você está fazendo aqui?”
Ele perguntou ao que respondi que pensava em cortar o cabelo. “Foi o que sua mãe me disse, mas eu nem acreditei” ele retrucou e me puxou pela cintura me fazendo subir na sua moto.
“Olha só o tamanho da mão daquele açougueiro” Disse ele apontando para o barbeiro. “Eu não vou deixar esse cara cortar esses cachinhos que eu adoro” ele completou e seguiu dizendo “eu gosto do seu cabelo como está. Porque você quer cortar?”. Depois de muito insistir ele concordou que eu tirasse três dedos no comprimento, meu cabelo estava realmente comprido e começava a causar desconforto.
Marcello concordou desde que ele escolhesse o local onde eu iría aparar; cortar estava fora de questão. Fomos a um designer de cabelos (Cristo, devo estar mesmo desatualizado, jamais ouvira menção sobre designer de cabelos). O barbeiro, digo designer deu umas idéias, falou sobre luzes, sobre diminuir volume... mas quando ele disse que podíamos aproveitar para corrigir minhas sobrancelhas e deixá-las mais arqueadas para valorizar a expressão dos meus olhos, Marcello interrompeu dizendo que queríamos somente aparar três dedos no comprimento.
O designer insistiu que deveríamos fazer então ao menos luzes cor de chocolate e uma escova amassada. Marcello e eu já não conseguíamos segurar o riso e agradecemos a atenção do profissional e dissemos a ele que iríamos amadurecer melhor a idéia e agendaríamos outra consulta. Hihihi.
Eu me senti saindo de um filme de Almodóvar, detalhe, R$50 reais o corte. É isso mesmo que se cobra? Estou desatualizado. É preciso ter uma alma muito mais especial que a minha para aquela produção, sou meio sem jeito, meio duro, não tenho tanto glamour e sou meio tímido.
Gosto das minhas sobrancelhas da forma com são. Hihihi Será que é tão difícil aparar apenas uns poucos centímetros do cabelo?
Marcello se desculpou e disse que ele cortava o cabelo ali só que a moça que o atendia não estava, eu disse que não importava e que havia sido divertido, mas que meu estilo era menos ousado, ele disparou a rir por causa do fora que ele havia dado.
Ele é terrível, dá risada quando não pode e coisas assim, menino demais. Fomos pra sua casa, lá chegando sentíamos tanto calor que resolvemos tomar um banho gelado.
Sentamos na banheira, eu de costas para ele. Marcello lavou meus cabelos devagar e demoradamente, sentir aquela leve pressão que se espraiava em movimentos circulares sobre o meu couro cabeludo produzia em mim uma sensação de bem-estar que eu estava precisando, tenho andado mesmo tenso com as asperezas de minha irmã.
Senti seu peito em minhas costas e a música era suave, acho que vinho branco, mesmo gelado, no meio de uma tarde escaldante é uma deliciosa irresponsabilidade. Marcelo apanhou uma caixa com algumas coisas que fica ao lado da banheira, retirou uma tesoura e perguntou se ele podia.
“Você sabe que sempre confiei na sua habilidade com tesouras” respondi. Bem devagar, ele penteava, cortava meu cabelo e o depositava sobre a saboneteira traçando uma linha paralela pouco acima dos meus ombros. “Você confia mesmo em mim, não é?” Ele me perguntou ao pé do ouvido me abraçando. “Acho que você é a pessoa em quem mais confio no mundo e a que eu mais amo também”.
Daí nos beijamos e nos deitamos em sua cama. Ficamos nos olhando. “Gosto de ficar olhando você” ele disse me puxando para perto dele. Quando estivermos morando juntos será assim sempre.” Respondi a ele que me perguntou o que impedia de ser hoje enquanto ligava o ar refrigerado.
Esclareci que meu pai não está bem e que ele e minha mãe tem se mantido distantes e que talvez precisem de mim. Marcello disse que compreendia, que não queria forçar nada, mas perguntou se ocorrera mudança em nossos planos de estarmos juntos até o final do ano. Respondi que não e nos abraçamos. Fizemos amor e cochilamos um pouco.
Não íamos à aula, ele me deixou em casa. Combinamos de nos vermos mais tarde, por volta das 18h para o jantar, minha mãe gosta quando ele vem. Quando Marcello me trouxe, perto de casa, vi meu pai conversando com alguém que estava dentro de um táxi, parecia ser uma senhora; ele não me viu acenar.
Estranhei o fato dele haver saído do taxi onde ela estava. Começo a me preocupar com isso. Quando cheguei a casa, minha irmã logo notou que eu havia trocado de roupa e me perguntou onde eu havia tomado banho. Disse a ela na casa de um amigo e que eram roupas emprestadas dele.
Ainda bem que minha mãe não ouviu esse comentário indiscreto. Procuro relevar essas pequenas implicâncias, mas tem ficado aborrecido. Parece que fui transportado para minha infância quando ela se ocupava quase que todo o tempo em me chatear.
Às 18h, como combinado, Marcello chegou trazendo uma garrafa de licor para minha mãe e um dvd com alguns jogos do Timão pro meu pai. Minha mãe o apresentou como meu amigo a minha irmã que o cumprimentou sem muito interesse, sem se levantar e continuou assistindo à tv. Fiquei com vergonha porque sou tão bem tratado na casa dele e quando ele conhece minha irmã ela quase o ignora. Guto que veio com Marcello só acenou a ela.
À mesa não sei se por timidez ou por pouca educação minha irmã se dirigia à minha mãe em castelhano, coisa que irrita meu pai. “Eu já advertir à ambas sobre essa mania.” Minha mãe se desculpou com Marcello dizendo que minha avó só conversava em espanhol dentro de casa com os filhos, assim era entre ela e os irmão e tentou seguir a tradição da família, mas que meu pai não gostava e que a única com quem podia falar era com minha irmã, pois eu nunca levei a sério tradições de família. Sei que meu cunhado também não gosta disso.
Marcello sorriu e disse que entendia porque às vezes entre os pais dele e os tios é assim e em reuniões de família conversam em italiano entre si sem perceber. “Então todos nos entendemos, mas aqui na minha casa vamos falar português” disse meu pai que contou com o apoio do Guto que disse “Que bom, eu sempre achei um saco esse negócio de falarem em outra língua perto de mim” .
Seguiu-se três segundos de silêncio após isso que foi rompido por uma gargalhada estridente do meu pai que disse “esse é dos meus, fala na lata” hihihi Minha mãe pareceu não ter gostado muito, mas sorriu, sorriso de anfitriã, jamais pude ter certeza se era sincero. Guto se desculpou com um tímido “perdoe o mal jeito” enquanto olhava para baixo como criança que sabe que fez coisa errada. Hihihi. Tratamos de outros temas e a conversa seguiu, minha mãe foi até a cozinha apanhar mais de paella para meu pai que agora se dirigia a Guto com quem falava da situação do Corinthians...
Minha irmã fitava Guto a todo tempo, Marcello esquecendo onde estávamos ocupava-se discretamente de roubar camarões do meu prato, ele sempre faz isso, já me acostumei. Como estava sentado ao meu lado ele descansou o braço sobre meus ombros e notei que minha irmã passou a nos observar.
Esse comportamento de Marcello já foi assimilado pelos meus pais que o atribuem ao seu sangue italiano, mas minha irmã parecia observar curiosamente a forma como ele me tratava.
Percebendo isso tratei de me conter um pouco e a Marcello também que às vezes pousava a mão sobre minha coxa por baixo da mesa, coisa natural entre nós, mas que se minha irmã notasse, nem sei.
Depois do jantar minha mãe nos serviu um doce de leite que minha irmã trouxe, uma delícia, ela deveria comer mais dele para ver ser melhora o humor. Hihihihi
Após o doce de leite, passamos à sala; meia hora de conversa e Guto disse que tinha de ir e Marcello o acompanharia, queria saber como o pai estava.
Notei que Guto sistematicamente ignorou minha irmã a todo tempo, penso que ele não gostou dela, ele é assim, não consegue esconder quando algo ou alguém o desagrada, mas se assim for ele até que disfarçou bem.
Guto desceu primeiro e quando desci com Marcello nos beijamos no elevador, ao surgirmos no hall Guto já nos esperava dentro do carro, Gutão acenou e Marcello entrou dentro do carro dele.
Ao subir de volta minha irmã me olhava de um modo novo, como se soubesse de algo sei lá. Ao chegar à casa Marcello me telefonou e passamos meia hora conversando, rimos do Gutinho, falamos mais sobre encontrar um aluguel e nos despedimos.
Dormi, mas acordei de madrugada para ajudar minha irmã cuidar de sua filha, ela ainda é novinha, carente demais e penso como vai receber o bebê. Minha irmã está meio sem paciência ultimamente com ela e eu a peguei no colo, cantei um pouco e ela dormiu.
No dia seguinte:
Hoje o dia foi corrido até agora quando tornei à casa, Marcello almoçou comigo na empresa e nos veremos mais tarde depois da facul. Ao chegar certo silêncio. Não sei o que ocorreu, mas todos estão meio calados.
Um beijo a todos e se não tiver tempo de poder dar notícia alguma entre hoje e segunda, tenham um bom final de semana, um beijo a todos e obrigado pela força.
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Ah Guto não fica assim, Eu estou sozinho, podemos nos dar bem até melhor que Coelhinho e Cachorrão! kkkkkkkkkk. Acho tão interessante quando outra(s) pessoa(s) convive(em) com casal(is) homo e percebem que há realmente amor, carinho, respeito entre outros, que acabam querendo pra si mesmo, mesmo sendo do próprio sexo.
Agradeço a todos pelos comentários e votos!!! (Finalmente li tudo que postei, estou curioso pra saber a reação das famílias)