A lua cheia continuava a brilhar iluminando a piscina e a cena estranha que lá acontecia. Eu estava deitado com a cabeça no colo do garoto que mais me odiava recebendo um cafuné enquanto chorava de uma maneira inapropriada para qualquer ser racional.
. – Por quê? – perguntei após uns dez minutos deitado em silêncio.
Gelo passava os dedos por meus cabelos, afagando, enquanto mantinha seu rosto virado para cima, olhando o céu.
. – É assim que deve ser – disse sem olhar para mim – Tudo deve chegar a um fim.
Pensei um pouco na resposta enquanto olhava para a lua refletida na piscina.
. – Isso não explica nada, ele não merecia morrer.
O garoto ficou em silêncio por um tempo, só olhando o céu.
. – Me fiz essa mesma afirmação durante muito tempo.
Mais uma vez, se passaram dez minutos antes que alguém dissesse algo.
. – Onde... – engasguei com o choro – Onde você ouviu essa música?
Ele não respondeu e lá se foram minutos em silêncio.
Não sei exatamente o quanto demorou tudo aquilo, mas de repente me dei conta do que estava acontecendo e levantei rápido, interrompendo o carinho e quase caindo na piscina (ninguém mandou ficar deitado na ponta). Pensei em ir embora, mas achei que não fosse uma boa idéia sair sem falar nada depois da “ajuda” que Gelo havia me dado. Foi quando olhei para a cena total: Estava a sabe-se lá quanto tempo deitado, chorando, no colo da pessoa mais odiada da sala, que por acaso estava seminu e balançando as pernas na água. Fiquei estático, sentado e encarando o vazio.
. – Arrependido? – a voz baixa e rouca dele me despertou do transe, e pela primeira vez reconheci algum sentimento, zombaria.
. – Arrependido de quê? – falei rápido, atropelando palavras – Não há nada para me arrepender, se tem alguém que devia...
Ele riu.
. – Você parece uma criança pega fazendo arte, Lucas.
Emburrei e olhei para frente.
. – Falando em arte... – lembrei-me subitamente – O que você está fazendo na piscina há essa hora?
Outra risada.
. – Não gosto de tirar a roupa na frente de pessoas – disse gesticulando para a cadeira onde estava um bolo de tecido – E você, sempre se levanta há essa hora ou só gosta de ficar espiando garotos na piscina?
. – Eu... Eu ouvi um barulho! – enrubesci e disse irritado – Você me acordou com essa coisa de ficar nadando no meio da noite.
Gelo riu e deitou, sem tirar as pernas da água.
Mesmo começando a ficar irritado, olhei para meu companheiro um instante e percebi que aquele ser só não tinha todas as garotas do colégio por que era uma espécie de celibatário recluso, afinal, seu corpo todo era bem definido, cada músculo trincado na pele, mas não de uma forma exagerada, com poucos pêlos (ou pêlos muito claros, o luar não ajuda muito a definir), um rosto de alguma forma infantil e másculo ao mesmo tempo e agora com um corte militar que caíra muito bem nele. Na hora não percebi, mas após um tempo observando-o deitado percebi alguma coisa diferente em mim, aquele mesmo sentimento de me aproximar e fazer amizade que tive no dia em que entrei no colégio.
. – Sabe, gosto muito disso. – disse repentinamente, me dando um calafrio.
. – Disso o que?
. – Do céu, todas essas estrelas, muitas já provavelmente mortas, mas ainda assim tão belas.
. – Outro motivo para sair durante a noite?
Ele riu baixinho.
. – Só quando minha constelação está no céu.
Pensei um pouco sobre o que ele falara e minha ficha caiu alguns segundos depois.
. – Nossa... Feliz aniversário. – disse olhando para uma estrela específica.
. – Não me dese... – interrompeu-se – Obrigado, Lucas.
. – De nada... Gelo...
Ele bufou.
. – Estávamos indo tão bem... – Ouvi-o levantando o corpo e recolhendo os pés – Por favor, não me chame assim.
Desviei a atenção da estrela e olhei para Gelo, que se sentara com as pernas cruzadas, apoiando um cotovelo no joelho e a cabeça com a mão.
. – Queria que te chamasse como? – fiquei surpreso ao saber que ele não gostava do apelido, nunca dera a mínima impressão de se importar com isso – Geminiano?
Outra risada baixa.
. – Descobriu meu aniversário com meu signo – fez um gesto com a mão livre – Agora descubra meu nome – acrescentou em um sussurro – É só pular um.
Essa eu demorei a entender, mas quando cheguei à conclusão me pareceu a coisa mais óbvia do mundo.
. – Leonardo? – perguntei me virando para ele e dando as costas para a piscina.
. – Quase... – respondeu de maneira arrastada.
Era óbvio.
. – Leo.
O garoto abriu um sorriso e levantou a cabeça, me olhando nos olhos, e aquela foi minha perdição. Se ele não houvesse levantado a cabeça naquele momento provavelmente esse conto não existiria, muito menos uma série e outras coisas que ainda contarei, justamente por que naquele momento ele me encarou com seus olhos negros e neles vi refletida toda a beleza da lua cheia, que brilhava acima de nós com toda sua imponência. Dizem que a lua cheia é a responsável pelas grandes paixões da vida e naquele momento tive uma amostra daquilo: meu coração acelerou, minha respiração ficou ofegante e não consegui desviar o olhar daquele par de olhos negros, únicos em toda terra.
. – Leo – Gelo repetiu com sua voz baixa, que me deu calafrios - Em cheio, caro mio.
Não consegui dizer nada, aquela visão do reflexo de um satélite tirara todo meu ar.
. – Lucas? – depois de alguns segundos ele me chamou – Você está bem?
Disfarcei o melhor que pude, puxando da memória uma pergunta que há muito tempo queria fazer.
. – Desculpe, mas por quê? – perguntei rápido.
. – Por que escolheram para mim...?
Balancei a cabeça.
. – Não me referia ao nome especificamente – fiz um gesto irritado – Mas à situação. Porque está sendo legal comigo agora?
Leo não respondeu.
Levantei-me. Tudo aquilo fora demais para mim, na mesma noite chorei durante horas, talvez, fui consolado, descobri o nome, fiquei emocionalmente traumatizado com uma música, descobri o aniversário e fui tratado cordialmente pelo único ser que aparentava passar um filme sobre a minha pessoa em todos os equipamentos de tortura alguma vez inventados pelo homem toda vez que eu lhe dirigia a palavra.
. – Lucas! – ele chamou, pondo-se de pé também – Me desculpe, e que... Eu não estou acostumado com isso.
Encarei-o.
. – Com isso o que? Ser uma pessoa cordial? Ser educado? Ser...
. – Ser tratado como gente. – havia uma pontada de dor em sua voz.
Calei-me e olhei para o garoto. Alguma coisa estava errada, pensei.
. – Você mesmo cavou essa cova – comecei com cautela – Todos tentaram, mas você não quis aproximação de ninguém.
Ele me olhou confuso.
. – Não fique assim – disse fazendo um gesto – Tiago me contou como foi esse processo.
Leo riu, mas dessa vez uma risada diferente, dolorida.
. – Claro, claro. – ele se aproximou de mim, ficando a sessenta centímetros de distância – Tiago... Eu devia ter imaginado.
Me mantive firme, mas ele se aproximou ainda mais diminuindo a distância para cinqüenta centímetros.
. – O santo Tiago – a voz dele parecia realmente dolorida, embargada, como se viesse reprimindo alguma coisa por muito tempo – O máximo, senhor de tudo Tiago – agora a distância baixara para quarenta centímetros – E mais uma vez, o pierrô cai na armadilha. Sabe, realmente achei que você fosse diferente, mas pelo visto é só outro deles.
Aquela mudança de humor me assustara muito, se antes eu me mantinha firme por teimosia, agora era simplesmente por que o medo não me deixava mexer.
. – Leo, o que... – tentei dizer.
. – Não ouse a falar meu nome de novo. – não sei o que houve, mas o garoto gentil e tranqüilo que havia conhecido há poucos minutos desaparecera, dando lugar ao velho e frio Gelo – Não ouse a me dirigir palavra. – ele colocou a mão sobre meu peito, encima do esterno e aplicou pressão.
Esqueci de onde estava e o choque de realidade foi forte... E molhado. A leve pressão fora o suficiente para me desequilibrar e cair, afundando na piscina como uma pedra. Mesmo não tendo demorado muito para voltar à superfície, quando me dei conta estava sozinho, não se via sequer o menor sinal de Leo ou sequer indícios de que ele esteve ali. Icei-me para fora e fiquei um tempo deitado de bruços na calçada de pedra ao redor.
. – O que diabos aconteceu? – falei ofegante.
Uma coisa era certa, pensei enquanto me levantava do chão: Alguém estava escondendo alguma coisa, e foi um grande erro me meter no meio disso tudo.
Va bene signori, como de praxe, agradeço a todos pelos comentários, eles só me incentivam a continuar e...
. CarmoD'Belair - Fico agradecido com sua opinião sobre o conto, e, bene, a canção é mesmo linda, mas não é lá muito apropriada...
. Geraldo.Farias - Signori, agradeço a sinceridade. É difícil para mim, mais vou tentar parar de escrever em Hawaiiano se lhe agradares e , bene, se tiveres qualquer sugestão...
. Shot - Hallo, fiel leitor! Bene, sim foi sacanagem, mas tu se acostumas depois da terceira ver que eu fizer ^^
. Wanderson 16 e Lucas M - Hail! Estou tentando mas é meio difícil para mim não fazer isso ^^ deixa um quê de suspense no ar :3
. - por do sol - Gratzie, signori. Só temo que sua impressão será destroçada daqui para frente...
Pessoas e outras formas de vida, vou deixar meu contato em um comentário mais tarde, assim fica um pouco mais fácil de continuar escrevendo...
Gratzie :3